No meio de colinas, morros e montanhas, que eram ásperos, frios e lamacentos, havia duas pessoas paradas, de pé, uma de frente para a outra, pelo que parecia, conversando.

Deveria estar chovendo, pois tudo estava muito embaçado para se enxergar nitidamente, conseguindo definir apenas as silhuetas das coisas ao redor, mas não elas em si.

– Eu tenho um plano para você e seu exército saírem dessa... prisão, mas vocês terão que seguir as minhas ordens. – Falou uma das pessoas, a voz feminina e repleta de poder.

– Há! Você acha que nós seguiremos as suas ordens? – Dessa vez, a outra pessoa sentenciou a frase, a voz alta e grave.

– Procuramos algo em comum: vingança. Teremos que colaborar se quisermos alcançar nossos objetivos.

– E como eu poderei confiar em você? Como saberei que você não está do lado deles? Me diga.

– Se eu estivesse do lado deles, não teria vindo até aqui, ora! Precisa de prova maior?

A outra pessoa ficou em silêncio, e o ar parecia ficar mais carregado á cada segundo que ninguém pronunciava uma palavra sequer.

– Tudo bem. Confiarei em você, mas preciso de algo que prove que não mudará de ideia.

– O que? Quer que eu jure pelo Rio Estige? Pois eu juro pelo Rio... – Começou a mulher, mas a outra pessoa a silenciou com um gesto da mão. – O que foi?

– Não quero saber de um simples juramento. Eu quero que, enquanto você estiver do nosso lado, fique aqui no que você chama de prisão.

A mulher soltou um grito de terror, e, apesar de tentar fugir, ela tropeçava e caia, e outras pessoas, cada uma mais gigantesca do que a outra, foram segurá-la.

Tudo o que Nicolas conseguiu ouvir, antes de acordar desse terrível pesadelo, foi a tal mulher gritando por piedade.

Nicolas acordou assustado, dando um grito quase tão alto quanto o da mulher do seu sonho. As três harpias que ficavam no seu quarto (que serviam como as criadas dos palácios), apenas olharam para ele, resmungaram alguma coisa que o garoto não entendeu e continuaram a trabalhar no que estavam fazendo antes.

O garoto esfregou os olhos, certificando-se de que não estava em mais nenhum sonho maluco, vestiu uma roupa simples e saiu do quarto. Ele precisava falar urgentemente com Zeus sobre esse e outro sonho que ele teve, pois, mesmo não sabendo muito a respeito sobre sonhos, ele sabia o suficiente para entender que aquilo não era alguma coisa normal.

Ele andava cautelosamente pelo Olimpo, primeiramente para não irritar nenhum deus, segundamente pelo fato das selecionadas estarem dormindo, pois ainda era madrugada, e a penumbra caia solta pelo lugar, as sombras parecendo se locomover, mas uma áurea mágica parecia mantê-las no lugar, até encontrar uma silhueta humana, que parecia ser metros e metros mais alto que Nicolas. Ao ver a sua aproximação, essa pessoa diminuiu o tamanho até ficar apenas alguns centímetros mais alto.

O garoto deu um passo á frente, fez uma breve reverência e pronunciou o nome da pessoa que se encontrava no local. Zeus.

– O que lhe traz aqui, Nicolas? – Perguntou o deus. Nicolas teve vontade de fazer a mesma pergunta, mas resolveu não falar nada, o Olimpo era o lar dos deuses, incluindo Zeus, mas não de Nicolas, era normal os deuses ficarem no Olimpo.

– Eu tive sonhos muito estranhos. Eu... eu não sei o que significam, mas sei que tem algo errado. – Ele respondeu.

– Você é um semideus, Nicolas. É normal para vocês, semideuses, terem sonhos estranhos.

Nicolas assentiu com a cabeça. Apesar da frase ter ficado confusa, ele entendeu o seu significado.

– Tem alguma outra coisa que o perturbe?

O garoto estava prestes a dizer não, mas ele não queria terminar essa conversa com Zeus tão rapidamente. Ele nunca tivera um diálogo tão grande com o seu pai quanto esse.

– Bem, eu andei olhando as fichas das selecionadas e... Ah! Me lembrei. Tem algumas garotas que são... deusas?

– Você deve estar se referindo a algumas das selecionadas que tem pai e mãe divinos, né? Eu também andei pensando nelas, elas são, tecnicamente, deusas, mas, de certa forma, não são.

O garoto olhou confuso para o pai. Como assim elas eram e não eram deusas ao mesmo tempo?

– É um pouco confuso – Começou Zeus. “Só um pouco?”, pensou Nicolas. – Mas, apesar delas terem pai e mãe divinos, elas não vivem como deusas, não foram nem proclamadas como nenhuma deusa, e tem mais a vida de semideusas ou mortais comuns do que deusas, por isso, apesar da sua origem, não podemos considerá-las como deusas. Entendeu?

O garoto assentiu com a cabeça. Isso tinha explicado muita coisa, mas ainda estava um pouco confuso para ele.

– Eu tenho outra pergunta, pai. – Nicolas empertigou-se. Poucas vezes chamara Zeus de pai. – Por que apenas selecionadas gregas? Quer dizer, nada contra, também sou um semideus grego, mas... por que não romanas?

– Não é que eu não goste de romanos, mas não daria certo. Apesar dos gregos e romanos conviverem em paz, se misturássemos semideusas gregas e romanas, quando ficássemos diante delas, teríamos que assumir apenas uma forma: grega ou romana. E, ao fazer isso, seria como se nós escolhessem um lado, o que poderia gerar brigas. E, como você é grego, decidi escolher apenas semideusas gregas.

– Faz sentido. Agora, acho melhor eu ir dormir, amanhã vai ser um longo dia. – Nicolas terminou a conversa, já tinha conseguido falar o bastante com o seu pai. Zeus concordou com a cabeça sobre o dia de amanhã.

– Mas, se você quer saber... – O deus do Olimpo deu uma pausa dramática – Há uma romana entre nós.