Para ser sincero, eu não me lembro muito bem do John Watson que eu costumava ser até conhecer Sherlock Holmes. Lembro-me vagamente que o antigo John tinha o infantil sonho de se tornar um médico e talvez, só talvez, entrar para o exército britânico. Lembro que o antigo John tinha o costume de sonhar com a grande Londres, de sua casinha no interior da Inglaterra. Eu não tinha sonhos muito instigantes e minha vida não prometia grandes conquistas; seria mais um homem da família Watson a entrar para o exército, como citado anteriormente, me tornaria um médico de classe média e encontraria uma mulher bacana para morar em mais uma casinha no interior da Inglaterra.

O que Sherlock Holmes diria a respeito disso? Chato, chato e chato!

Juntando o meu sonho de finalmente conhecer a grande e mística Londres com o sonho dos meus pais, avôs e bisavôs de me ver no exército, meus pais juntaram algum dinheiro e me mandaram junto com minha turma da faculdade em nossa excursão de formatura para conhecer a cidade, me fazendo prometer que eu me alistaria no exército assim que pisasse na capital. O grupo que ia comigo era bem esquisito. Várias meninas usando roupas provocantes para chamar atenção dos meninos londrinos e os poucos garotos presentes só queriam conversar em voz alta no ônibus que demoraria sete horas para chegar à cidade. Nem parecia que aquele tipo de gente estudava comigo no curso de medicina. Tudo o que eu queria era dormir e acordar em baixo do London Eye.

A despedida da minha família foi bem dramática. Eu passaria apenas um final de semana fora e meus pais já estavam fazendo todo aquele drama, imagina só como seria quando eu finalmente entrasse no exército? Recebi muitos beijos estalados de mamãe, muitos abraços de papai e alguns olhares invejosos de Harriet, que parecia estar me odiando por deixá-la sozinha no meio de todos aqueles adultos melodramáticos. Depois de mais uns dois beijos de mamãe, eu finalmente consegui colocar minha mala dentro do ônibus e finalmente sair daquela cidadezinha tão pequena e irritante. Era como deixar um peso para trás, finalmente sair daquele marasmo, daquele lugar onde as pessoas eram todas iguais e faziam a mesma coisa desde o século passado.

Com os olhos quase se fechando por causa do sono, dei uma última olhada nos meus parentes que já estavam bem longe, dei uma última olhada naqueles prédios que eu conhecia tão bem e finalmente senti que estava saindo da cidade. Abri um sorriso abobalhado e fechei os olhos desejando acordar em baixo de prédios maiores e mais interessantes. Eu era um médico recém-formado, com planos de entrar para o exército em breve, eu não tinha nada que atrapalhasse meus planos.

Nada até conhecer Sherlock Holmes.