— O que você quer, Caleb?

— Conversar. Será que pode ao menos fingir que não está furiosa?

Olhei para cima, ele era alto!

— Claro, você poderia fingir que não é um cretino?

Ele suspirou.

— Que tal um acordo de paz? Eu não sou um cretino por uma noite e você não fica furiosa.

Olhei-o desconfiada.

— Tudo bem — concordei. — Vou me comportar.

Caleb sorriu de forma triste para mim. Uma parte — provavelmente masoquista — de mim queria confortá-lo.

Caleb passou as mãos pelo cabelo e respirou fundo.

— Eu sei que você está brava, mas podemos, por favor, conversar sobre isso? Deixe-me explicar o que você viu.

Cruzei os braços, irritada.

— Eu sei o que vi, obrigada. Não preciso de você para lembrar daquilo.

— Não estou negando que eu estava agindo de modo impróprio com Pietra e tampouco que foi abominável da minha parte tê-lo feito logo após ter me declarado para você, no entanto eu imploro que você me perdoe porque não era para você ter visto aquilo.

— Tenho certeza que não era para eu ter visto.

Caleb corou.

— Não foi o que eu quis dizer. Eu estava explicando que teria que mandar Pietra embora e então a garota me agarrou. Eu juro a você que não foi nada do que parecia. Como poderia sê-lo? — Tudo isso foi dito rapidamente. Parecia que quanto mais agitado, mais formalmente Caleb agia. — Você me conhece, Alexia! Jamais seria tão abominável, ainda mais com você.

— Eu não te conheço melhor do que as outras 14 meninas que você mantém aqui, Caleb. E não se esqueça que uma delas é a garota com quem você estava praticamente transando no corredor.

— Acabei de te conquistar, você acha mesmo que eu colocaria tudo a perder? Eu juro por Deus que foi ela! — Seus olhos castanhos pareciam me perfurar.

— E — continuei diante de seus protestos — não me venha com essa de "ela me agarrou" porque você poderia perfeitamente ter se afastado. Nós ouvimos os gemidos de vocês dois bem antes de termos visto aquilo. E quando digo nós estou me referindo a mim e ao seu irmão de cinco anos de idade.

Caleb abaixou a cabeça.

— Me sinto péssimo sobre isso, acredite-me. Eu simplesmente gostaria de apagar o dia de ontem. Você não me amaria, mas também não me olharia com asco, como está fazendo nesse segundo.

Ergui friamente as sobrancelhas.

— Não é asco, está mais para eu-não-vou-cair-nessa-de-novo — sim, eu sei que estava agindo como uma criança de três anos de idade, obrigada.

— Ouça, eu sei que você está zangada, mas eu quero te mostrar uma coisa. Só te mostrar isso e então você pode voltar a ficar furiosa. Apenas… por favor?

— Jure que depois disso você vai me deixar em paz.

Ele me encarou com aqueles olhos inacreditavelmente tristes.

— Eu juro — murmurou como se seu coração estivesse se partindo.

Levantei-me e Caleb me guiou por uma porta pequena e discreta.

Não prestei muita atenção ao caminho que seguíamos até que reconheci um quadro na parede. Ele estava me levando à torre. Ao nosso lugar especial.

Caleb abriu a porta.

— Feliz Natal.

Meu queixo caiu.

A parede leste da torre havia sido laboriosamente pintada com um retrato realista de mim. iluminado por centenas de luzinhas de Natal como uma vitrine. Embora não mostrasse todo o corpo eu sabia que era a imagem usada no formulário da Seleção.

— Caleb... o que é isso?

— Uma pintura. Você disse que gostaria de ver um dos meus retratos. Bem eu tenho trabalhado há algum tempo nesse. Claro que demorou muito para ser feito, mas eu queria fazer uma coisa especial para você. — Deu de ombros. — Você gostou?

— Sim, é lindo. Isso não muda nada. — Tentei soar desinteressada, mas a verdade é que o talento de Caleb me impressionava e impressionava mais ainda o fato de ele ter tido todo esse trabalho por mim.

— Na verdade eu também fiz outra coisa para o Natal — ele ergueu o pulso para consultar um relógio de ouro que eu nunca o tinha visto usando. — Ainda não passou da meia-noite, mas acho que está valendo.

Caleb me puxou para o chão delicadamente e eu sentei meio desconfiada enquanto ele pegava alguma coisa num canto mais escuro. Reconheci imediatamente do que se tratava.

Gemi outra vez.

— Ah não. Nada disso!

Ele abriu um sorriso enquanto passava delicadamente os dedos pelas cordas.

— Ei, eu sei que canto mal, mas não é para tanto — brincou.

— Você não vai cantar, né? Pelo amor de Deus, Caleb!

— Na verdade, vou sim. — Caleb respirou fundo e passou os primeiros acordes.

Settle down with me

Cover me up, cuddle me in

Lie down with me

And hold me in your arms

And your heart’s against my chest

Your lips pressed to my neck

I’m falling for your eyes but they don’t know me yet *

Caleb continuou cantando olhando nos meus olhos, vez ou outra baixando o olhar só para ter certeza que não ia errar.

No último acorde, seu olhar prendeu significativamente no meu.

— Então você achou que era só fazer uma coisa bonitinha que eu ia deixar tudo pra lá? Que eu ia esquecer que você me enganou? — tentei a abordagem mais furiosa possível no entanto parte da emoção de tê-lo cantando para mim vazou e minha fúria ficou parecendo mais uma súplica.

— Hã, sim? — tentou com os olhos brilhando.

Cruzei os braços no peito.

— Era brincadeira — se apressou a dizer. — Eu te conheço e sei que você está muito irritada comigo, mas eu só quis, não sei… O que você viu não era o que de fato estava acontecendo, como eu falei antes, e acho que quis dizer que você sabe, eu vou te amar mesmo que você me odeie.

Eu nunca tinha visto Caleb lutando tanto com as palavras, ele sempre tinha sido muito eloquente e calmo mas naquele momento ele estava mordendo os lábios, batendo o pé e passando a mão no cabelo em sinal de nervosismo.

Mesmo contra minha vontade eu senti parte da minha raiva se dissipando. Como aquele infeliz conseguia fazer isso comigo?

— Eu vou tentar não ser uma vaca com você — prometi. — Mas ainda estou com raiva, só para você saber.

— Eu sei. Não vou alimentar esperanças de você me perdoar de uma hora para outra, vou te dar tempo até você entender. — Caleb estendeu a mão para me ajudar a levantar do chão, os olhos fixos nos meus lábios.

— O que foi? — perguntei com a voz trêmula só por estar tão perto dele e tirando minha mão da dele.

— Hum, você provavelmente vai acertar esse violão na minha cabeça e eu sinceramente acho um ótimo investimento — sussurrou aproximando-se ainda mais, um feito e tanto.

— Nem vem, Caleb.

Ele se aproximou.

— Vou, vou sim.

Rápido como o bote de uma cobra ele me pegou nos braços e a boca macia encontrou a minha.

O beijo foi intenso e furioso de ambas as partes, minhas mãos estavam em seus cabelos, as dele passeavam por minhas costas e o coração dele batia feito louco contra o meu igualmente ensandecido. Caleb murmurou meu nome contra meus lábios e aquela partezinha masoquista de mim que queria reconfortá-lo quando brigamos estava simplesmente exultante por aquele reencontro em nosso lugar especial.

Pouco a pouco a loucura foi cedendo e eu lembrei do motivo que nos levou até ali. Afastei-me dele, as mãos na frente do corpo como se para me defender.

Os olhos de Caleb estavam em brasa, fixos em mim.

— Alexia…

Sacudi a cabeça para ele e saí, deixando-o sozinho. Pude sentir seu olhar acompanhando-me mesmo quando eu já estava dentro do meu quarto com a cabeça apoiada nas mãos.

Um pensamento daqueles que só aparecem quando você está quase dormindo aflorou de repente em minha mente: é difícil odiar alguém que se ama.