— Seu maluco, doido varrido!

Eu não parava de dizer isso, mesmo horas depois de encontrá-lo, enquanto tomava nossos acentos no avião. Nesse ínterim contei a ele tudo que acontecera e ele me contava como deixou tudo para trás e veio me buscar.

— Helen deve estar uma fera! Ela vai me engolir quando eu chegar. – soltei um risinho. Meu humor estava excelente, Dom tinha um efeito surpreendente sobre mim – Uma pena Ang não ter acordado para ver você! Eu tentei de tudo, até Dona Elza entrou na jogada! Por falar em Dona Elza ela foi um verdadeiro anjo por me deixar ficar na casa dela e tudo mais... – continuaria a tagarelar se não o visse trincar o queixo daquele jeito. Dom estava furioso.

— Você não deveria ficar assim! Se culpar é perda de tempo e não foi culpa sua e de ninguém se quer saber... Esses mal entendidos acontecem!

— Mas Lana ela é sua mãe! Como pode achar que... 

— Você nunca prestou atenção no que eu te disse?!

— Mas isso é exagero garota!

— Para você – me virei para a janela – Eu entendo e não culpo você. Sua família é unida, feliz e seus irmãos amam você... Não vivemos a mesma realidade. Ninguém que tem uma família que se ame de verdade entende por que minha família é assim – suspirei – Frustrações e decepção são venenos que quando uma pessoa cultiva, se transformam num combustível poderoso para raiva... Mamãe é cheia dela! Acha que ela queria essa vida?

— E a culpa é sua?

— Talvez? – dei de ombros e ele arquejou – Meus pais são pessoas que não puderam realizar seus sonhos e isso reflete em nós de alguma forma... Eu não a culpo. Ela nos vê da maneira como terminamos e acha que fracassou e se odeia por isso! Ela precisa descontar em alguém... – virei- me para ele – Não me arrependo de nada se isso o faz feliz! Mamãe está furiosa por que não entende o que está acontecendo entre nós, mas ela vai aceitar um dia ou então me repudiar de vez!

— E você acha isso bom?

— Ah Dom! Já chorei tanto ontem que acho que basta pelo ano inteiro – eu o abracei – Não sinta culpa por nada. Não sinta culpa por ter ido devolver a câmera pessoalmente, nem que seja só por que você queria uma transa. – ele sorriu sem graça –  Eu o perdoo, mas só dessa vez.

Ele gargalhou e me aconchegou mais no seu abraço. Senti-me tão segura com ele e ao mesmo tempo desconfortável por tudo que pensei dele durante a noite!

— Nem acredito que você veio! Largar tudo em Nova York só para vir... Eu ia dar um jeito!

— Eu vi o jeito que você deu! Ficar na casa da sua amiga, voltar para aquele emprego que você detesta...

— Ficar com vocês não será tão diferente de ficar com Ang! Quanto ao trabalho...

— Escute. Agora você pode considerar a possibilidade de trabalhar com Helen, ela está precisando de uma assistente e você já sabe mais ou menos como é a coisa toda! Seria perfeito e estaria trabalhando como tanto quer.

— Eu? Assistente de Helen? – o fitei cética

— Não deve ser muito difícil! Uma boa ideia não é?

— Gênio! Será muito divertido claro, até chegarem às férias e todo mundo ir para um lado – entortei a boca – Mas eu tenho que arrumar um lugar para ficar mesmo! Ter onde morar quando as pausas aparecerem...

— Mas já pensei em tudo! Você vai ficar comigo em Londres.

— Ficou maluco Dom! Eu e seu um milhão de garotas no seu apartamento?!

— Como vai explicar a elas a minha presença? Você quer me ter a mão? – balancei a cabeça incrédula. E nesse momento me passou um pensamento horrível: E se Dom quisesse, eu sempre estaria à mão para quando ele não quisesse ter muito trabalho! Do jeito que eu não sabia dizer não e estava caidinha por ele, era o que ia acabar acontecendo.

Vi pelo canto dos olhos a decepção dele com a minha rejeição do seu plano perfeito. Ele nem negou, patife! Sim, era exatamente o que eu estava pensando e eu ia sofrer o diabo! Lana, idiota! Repreendi-me.

— Mas é uma opção morar em Londres enquanto não estivesse trabalhando... Vou conversar com Helen, afinal, é uma boa oportunidade!

O sorriso voltou e tentei sorrir também, na esperança de espantar as “nuvenzinhas negras” dentro da minha cabeça. Passamos um tempo devorando os sanduíches horríveis do avião até que me lembrei de algo.

— Ei Dominic, e Matt e Natalie?

— Eles terminaram tudo, mas não sei dos detalhes sórdidos. – Dom deu uma piscadela conspiradora – Mas parece que a mulher-dragão foi para o limbo de vez! Sabe o que isso significa não?

— Ela deve estar achando que é por causa de mim!

— Mas é Lana! Quem quer enganar garota? O caminho está livre agora. – ele me olhou estranhamente cauteloso.

— Não é bem assim Dom... – baixei os olhos. Como explicar a ele tudo que estava acontecendo? Parecia hipocrisia e ele nem ia acreditar em mim, talvez me chamar de tola!

— Afinal, é uma boa oportunidade! – ele imitou meu tom de minutos atrás

— Se você ta dizendo...

— Por que é tão difícil cristo! – ele se impacientou, virou seu rosto para mim – Você gosta dele e acho que ele gosta de você. – essa frase tinha um “quê” de resignação e tristeza e isso me surpreendeu – Por que não tentar uma segunda vez Lana?

— Por que agora não é bem assim.

Nossos olhares se encontraram e eu me perdi no dele que parecia profundo e aflito. De novo surgiu aquela atmosfera só nossa, como se não houvesse nada ao redor. Estávamos próximos e essa proximidade me deixava sem fôlego! Dom se aproximou ainda mais, os lábios carnudos e vermelhos entreabertos e eu acabei me aproximando também, antecipando o contato doce deles nos meus.

A voz terrivelmente perfeita da comissária nos despertou do transe, avisando que íamos aterrissar em breve. Afastei, eu muito sem graça e vermelha feito um tomate, Dominic apenas se voltou para a janela sem dizer nada.

“Sua doida, o que acha que está fazendo?!” Me repreendi.

* * *

— Garota. Chegamos! Você ainda está na lua?

Eu estava perdida na minha confusão desde o avião e nem percebi que tínhamos chego ao hotel. Dominic estava completamente à vontade ao meu lado, como se nada demais estivesse acontecido. Tão típico dele! Talvez quem estive bancando a idiota era eu, ao levar tudo tão a sério. O que fora afinal? Um beijo perto do que já fizemos!

Matt esperava por nós no hall e me recebeu com um abraço aconchegante assim que me aproximei. Foi tão terno que fez com que as lágrimas marejassem meus olhos, afundei meu rosto em seu pescoço para que ninguém visse.

— Venha, você precisa descansar – disse ele. Fomos para o elevador – Eu sinto muito, de verdade Lana.

— Esqueça isso, sim? Não vamos mais falar sobre isso.

Dom e Helen combinaram que eu ficaria com Dominic essa noite já que no dia seguinte todo mundo estava indo embora aproveitar as merecidas férias. Segundo Dominic (e sem margem para questionamentos, segundo Helen) iríamos todos para Londres e eu ficaria morando com ele. Não deu tempo de brigar com ele por que assim que cheguei ao quarto, David os levara para o ultimo compromisso oficial do Muscle em Nova York e eu ficara no quarto com Helen.

— Duvido que você consiga argumentar com Dominic, ele está...

— Eu o agradeço por ter ido me buscar e tudo, mas acho que já chega! Tenho um dinheiro guardado, acho que consigo um lugar bacana para alugar até arrumar dinheiro suficiente para comprar uma casa – suspirei – Eu já tinha planos de arrumar um lugar só para mim... Só não esperava que fosse logo!

— Deve estar sendo uma barra Lana! – ela afagou meu braço, Helen era muito bacana – Se quiser conversar...

— Se aceitar o emprego ficarei sem apetite que nem você? – Apontei para ao sanduíche quase intacto dela. Eu já estava no segundo sanduíche! Ela começou a rir.

— Que bom que vai aceitar o trabalho, eu já andava meio desesperada sabe. Tudo bem que agora as coisas vão acalmar por que o Muscle vai dar uma pausa, mas assim que eles terminarem o novo álbum... Vai ser um pandemônio!

— Dom me disse que eles vão gravar no novo estúdio de Matt. – a idéia de um novo álbum me deixava arrepiada, principalmente depois que soube de algumas ideias de Matt – Um engenheiro e eles apenas.

— É, Matt e Dom acham que o Muscle está maduro o suficiente para produzirem um álbum sozinho... Vai ser interessante.

— Interessante! Helen é o acontecimento do século – me joguei na cadeira. Como ela não estava entusiasmada com isso cristo?! – O Muscle produzindo seu próprio álbum! Vai ser o melhor de todos você vai ver.

— Quero ver você ficar animada assim quando descobrir o quanto isso dá trabalho!

— Pelo menos vou estar bastante ocupada para esperar sentada, os meninos chegarem dos seus compromissos.

— E Morgan? Soube que ele adora levar você para jantar e passear pela Times Square de vez em quando – ela me olhou de soslaio – Você e Morgan hein...

— O que você anda escutando por aí?

— Ah os seus “meninos” não falam de outra coisa! Morgan passou maus bocados esses dias – ela caiu na gargalhada

— Aí Helen eu só me meto em confusão – passei os dedos pelos cabelos – Isso está ficando complicado e olha que essa marcação toda vai piorar tudo! Nunca vou namorar decentemente desse jeito!

— E você quer namorar decentemente com Morgan?! – ela riu ainda mais – Morgan?

— É pecado por acaso? Se ele não é o cara decente que espero, então não é problema nenhum em me divertir com ele por enquanto. Melhor ele do que os meninos!

— Nisso você tem razão – ela respirou para se controlar – Não se meta com Chris e Dominic garota ou você vai sofrer! Não há patifes iguais a eles.

— Nem me diga – nem sei por que ela estava falando de Chris, eu estava pensando apenas em Dominic – Por falar em Chris onde ele está? Por que ainda não veio me ver?

— Ih! É uma longa história – olhei para ela, que franziu o cenho – Nem queira saber.

— O que foi que aconteceu?

— Bem, ele apareceu hoje de manhã bêbado feito um gambá e caiu praticamente inconsciente no hall do hotel – olhei para ela boquiaberta – Foram preciso quatro para trazer ele até aqui! Tive que chamar um médico para vê-lo e tudo.

—Helen!

— Lana o que está acontecendo com ele me diz? – ela me olhou angustiada – Chris sempre foi o mais responsável dos três, mesmo quando faz suas patifarias e tudo! Nunca deixou de pensar em Ema e nos filhos... Eu não estava aqui na época da turnê do Origem, mas ouvi de David e de Steven coisas escabrosas! Matt estava furioso e houve um acordo tácito de que Dominic não pode saber disso por que se ele souber... Ainda bem que ele foi buscar você!

— Que confusão! Mas Dom não pode saber por quê? – comecei a andar pelo quarto. Agora tinha entendido por que Helen estava tão feliz por Dom ter viajado de repente para ir me buscar. Minha confusão acabou evitando outra ainda maior!

— Ficou louca?! Dominic vai fazer uma confusão dos diabos, principalmente por que ele está há tempos dizendo que ele precisa se tratar!

— Ele não é o único – Desde que voltei que andava percebendo esse problema de Chris, apesar de que ele ainda parecia controlado. Mas depois disso, era difícil acreditar.

— Dominic vai ficar uma fera.

— Você tem razão... Dom é doido varrido! Ele me arrastou lá do Brasil e eu nem resolvi nada por lá. Tenho que trancar a faculdade, resolver minha papelada... Sei lá!

— Dominic é a pessoa mais cabeça dura que eu já conheci! E confusa também – ela soltou um risinho – Ta na cara que ele é afim de você, mas não quer admitir – Fitei Helen surpresa. Ela estava ficando louca só pode!

— São por comentários assim, que mal entendidos começam. – observei seca. Fora por absurdos assim que Roxy me odiava e a mãe de Dominic pensara besteira. – Toda a confusão em Devon aconteceu por causa de mal-entendidos como esse.

— Ah Lana, por favor! Só você que não percebe!

— Quantas vezes eu tenho que dizer que eu e Dominic somos amigos. – falei sem me virar – E mesmo assim, ele é um verdadeiro patife quando se trata de mulheres... Não vou estragar nossa amizade por causa de besteira.

— E se for de verdade hein garota? E se ele realmente gostar de você? – olhei para ela e sua expressão era séria, seus olhos analíticos fixados em mim – Ele foi até o Brasil buscar você!

— Só por que se sente culpado pelo que aconteceu e é dado a reações exageradas... E também por que é meu amigo. – completei com um sorriso.

— Ah ta!

— Vou ver Christopher... A porta está trancada?

— Não, só se ele já acordou.

Deixei Helen e fui ver Christopher. Era uma barra o que estava acontecendo com ele e isso me intrigava por que para mim, ele parecia ser o cara mais centrado e feliz que eu conhecia. Nunca poderia imaginar que ele sucumbisse dessa maneira, por que a bebida estava sendo a sua válvula de escape para alguma coisa. Pobre Chris!

O quarto dele era apenas a duas portas do meu, ele ainda estava no mesmo quarto de antes de eu viajar. Forcei a maçaneta e estava trancada, dei batidinhas na porta até ouvir o resmungo dele lá de dentro:

— Não quero receber visitas!

— Nem a minha, bonitão?! – respondi alegremente.

Chris abriu a porta, estava só de calça e parecia um bagaço! O sorriso que me deu era cansado e constrangido, talvez por já previr que a essas alturas eu já soubera de tudo. Abraçamo-nos e ele me apertou forte, pareceu mais para se confortar do que o contrário, isso me confrangeu. Com um gesto, me convidou para entrar e foi se jogar na cama outra vez, como rosto enterrado nos travesseiros. Sentei ao seu lado e comecei a acariciar seu cabelo molhado, ficamos assim em silêncio por um tempo.

— Então estamos resolvidos – ele se virou e me olhou rompendo o silêncio – Você não vai me dizer o que aconteceu com você e eu não digo o que houve comigo?

— Pode ser assim se você quiser – falei com doçura – Sei que você já escutou demais e nada do que eu disser realmente vai importar se você mesmo não tomar consciência do que fez... Só quero que me prometa que vai se cuidar.

— Eu não estou doente Lana – ele se levantou impaciente, mas não me olhou e isso significava que estava inseguro com relação ao que dizia. – Foi apenas um deslize. Eu estava com umas coisas na cabeça, alguns lances que aconteceram e... Estou me sentindo cansado e precisava extravasar. Mas já passou!

— Então tudo bem, já que é assim...

— Você não vai me contar sobre o que aconteceu lá no Brasil?

— Você quer mesmo saber?

Ele se acomodou na cama confortavelmente e me olhou a espera. Então comecei a contar a ele tudo que acontecera desde quando decidira voltar para casa.