“Me inclinei para atacá-lo mas por trás de todo aquele sangue vi os olhos dele, ele estava coberto de sangue, sangue pelo qual minha sede clamava, mas ele era o Jake, o homem que eu amava.”
Meu coração batia apressado nos milésimos de segundo que se seguiram entre a voz de Jane e a tragédia que se seguiu. Dor e culpa assolavam meu peito e me devastavam mais do que se Jane houvesse me agredido. O amor que eu sentia por Jake e a mágica do momento que me consumia me fizeram esquecer de tudo, mas as palavras de Jane trouxeram tudo a tona.
- Como pôde?
- Jane eu...
- Pode explicar? – a voz dela tremia de raiva conforme ela ia entrando cada vez mais na clareira. – Me diga Renesmee como você pode explicar isso? Vai me explicar como você traiu o meu irmão que sempre amou você? Vai me explicar como você traiu a todos nós que te criamos, que te amamos, que SALVAMOS VOCÊ? HEIM, ME DIZ COMO VOCÊ VAI ME EXPLICAR ISSO?
- Jane eu...
- Pra trás Nessie.
Jake se meteu na minha frente como se quisesse me proteger de um possível ataque. Jane riu alto.
- Vai protegê-la? – sua voz era toda sarcasmo – Vai lutar comigo? Vai cachorro? Como se você pudesse. Já vimos esse filme antes não é? Há cinquenta anos. Você não era capaz de me vencer naquela época por que pensa que pode agora vira-latas?
Eu não entendia nada do que ela queria dizer. Cinquenta anos atrás Jake nem era nascido. Toquei o braço dele para tirá-lo da frente e percebi que ele estava muito quente, o contraste da pele fervendo dele na minha fria me queimou. E não era só isso, ele tremia violentamente.
- Jake o que está acontecendo? – ele não respondeu, apenas continuou olhando pra Jane – Saia da frente Jake, esse assunto é entre mim e ela.
Mas ele não se moveu. Apenas continuou encarando a expressão profundamente debochada de Jane.
- E então cachorro, não vai me enfrentar? Perdeu a coragem?
Jake deu um passo furioso a frente mas parou em seguida e olhou pra mim.
- Jake sai da minha frente.
Mas ele ainda assim não se moveu. Encarou Jane com uma expressão decidida.
- Se você quer assim cachorro.
Jane o olhou com uma expressão mortal e seus olhos vermelhos faiscaram. Antes que eu pudesse me mover Jake estava no chão se contorcendo de dor. Passei por cima dele e avancei até Jane.
- Pare com isso por favor Jane, isso é entre mim e você, deixa ele em paz.
Ela olhou pra mim. Seus poderes não funcionavam em mim, é claro, mas o olhar dela me doeu por dentro.
- Como pôde fazer isso Nesme? Eu confiei em você, amei você como uma irmã desde que chegou até nós e é assim que nos recompensa?
- Quer falar de traição Jane? Então me explique você. Você diz que você me amava mas nunca fez nada para aplacar minha dor não é? Todas as vezes que segurou a minha mão e me consolou depois que eu matava aquelas pessoas você sabia como fazer isso parar e nunca me falou, você sabia que havia outra forma de viver e não se preocupou em me dizer não é?
Ela me olhava perplexa.
- Pois é Jane, eu encontrei uma família aqui mesmo, nesta cidade, que vivem sem beber sangue humano, que vivem bebendo sangue de animais e vocês sabiam da existência deles, de todos eles.
- Você os encontrou então... – ela murmurou.
- Sim eu os encontrei. Você me traiu também Jane, você e Alec sabiam o tempo todo e ainda assim não queriam me contar.
Ela se enfureceu novamente.
- Eles são uma aberração, sempre foram. Olhe pra você Renesmee, com o seu poder você poderia ser grande. Era só viver comigo e com o Alec. Fizemos tudo pro seu próprio bem. E quanto ao Alec? É só ele sair por um tempo que você esquece dele. Esquece seu compromisso com ele? Ele te ama e você sabe disso. Você simplesmente acha o primeiro cachorro da rua e sai beijando ele. Francamente Renesmee eu esperava tudo de você exceto que se comportasse como uma perfeita vadia.
Aquelas palavras me feriram gravemente.
- Não é assim Jane. Eu nunca enganei o Alec, eu sempre disse que não o amava desse jeito. E eu descobri que amo o Jake.
- Um cachorro?
- Eu não entendo o que está querendo dizer Jane mas eu o amo. E quero dizer mais uma coisa pra você. Vocês me traíram, todos vocês, e você sabe que eu não tolero mentiras ainda mais uma mentira que me fez sofrer tanto. Eu tomei minha decisão. Vocês dizem que me amam tanto, mas eu não preciso desse amor que mente pra me usar em benefício próprio, eu não preciso mais de vocês. Vá atrás do Alec e vão embora. Eu amo o Jake e ficarei aqui com ele e com a família da Bella. Eu não quero mais lutar com a guarda e não quero mais procurar os Cullen, o que quer que tenham feito comigo eu esquecerei. Eu encontrei minha felicidade Jane, e é aqui que eu vou ficar.
Jane me olhou por um momento, sua boca formou as palavras “não quero mais procurar os Cullen” embora nenhum som saísse de seus lábios. De repente ela pareceu entender e um sorriso de deboche preencheu seu rosto.
- Então é isso. Você não quer voltar pra nós porque não lhe contamos a verdade não é? E o que você acha que ele fez. – ela apontava para o Jake que lutava pra se levantar, Jane havia caprichado na dose de tortura – Então é por isso que você não me atacou não é cachorro, não contaram nada a ela não é? O que foi, tem medo que ela não queira mais você quando descobrir a sua verdadeira forma? Tem medo que ela se arrependa de ter trocado um vampiro bonitão por um cachorro fedorento?
Eu não conseguia entender o que ela estava tentando dizer e nem tive tempo pra isso. Antes que eu percebesse Jake havia cruzado os poucos passos que me separavam de Jane. Ela reagiu instantaneamente mas não como eu esperava, em vez de fazê-lo ir ao chão com seu poder ela partiu pra cima dele. Ouvi um grito de dor e Jake se fez ao chão. Aquilo já era demais pra mim, um movimento e meu escudo já havia empurrado Jane pra longe com toda a força fazendo com que ela quebrasse várias árvores antes de cair no chão. Ela me olhou furiosa e partiu pra cima de mim, meu campo de força a atacou de novo e a manteve suspensa no ar.
– Vai me atacar Jane? Mesmo sabendo que você não é capaz de fazer isso?
Mantive meu escudo prendendo ela e fui atrás do Jake. Ele estava caído a alguns passos de distância. Eu me agachei e vi que ele estava muito ferido mas ainda consciente.
- Tá tudo bem Jake, vou cuidar de você, você vai ficar bem. É só um pouco de... sangue...
Tudo ficou vermelho. Não havia mais lutas ou feridos, apenas a sede. Me deixei levar pelo cheiro, não era tão bom quanto os que eu já havia sentido, mesmo assim era cheiro de sangue, o que fazia cada célula do meu corpo clamar pela necessidade de saciar a sede incontrolável que me dominava. Eu já não pensava ou sentia, eu era apenas um instinto. Quando o instinto nos dominava eles já não tinham rosto, já não tinham nomes, eram comida, apenas isso. Minha mente vagava mas meu corpo pedia que eu o atacasse, e no fim das contas ele venceu. Me inclinei para atacá-lo mas por trás de todo aquele sangue vi os olhos dele, ele estava coberto de sangue, sangue pelo qual minha sede clamava, mas ele era o Jake, o homem que eu amava. Lembrei da Bella naquele momento, anos de auto-controle. Usei todas as minhas forças e respirei, o cheiro me invadiu mas tentei clarear minha mente. Analisei a situação. Ele estava muito ferido, coberto de sangue e alguns ossos estavam expostos, me admirava ele ainda estar vivo. Se eu pudesse correr até La Push e pegar o carro poderia levá-lo até um hospital. Levantei ele do chão com todo o cuidado e transferi o peso pras minhas costas, tentei deixar minhas pernas livres pra correr.
- O que pensa que está fazendo?
- Tudo bem Jake, tô levando você pra um hospital vai ficar tudo bem.
Dei uma última olhada na Jane, ela estava furiosa, soltei o escudo mas ela não se moveu, apenas continuou me olhando. Corri a toda a velocidade pra a Push, se ao menos eu conseguisse atingir toda a velocidade que os vampiros normais atingem. Eu ouvia a respiração sofrida do Jake nas minhas costas, era óbvio que aquele não era jeito de se carregar um ferido com as costelas partidas mas era o único jeito, ou ele ia sangrar até morrer naquela clareira.
- Isso é muito humilhante sabia?
Ele parecia fazer um esforço imenso pra falar. Cheguei até a casa e contornei pela floresta até chegar no carro, não seria muito normal alguém ver uma garota aparentemente frágil como eu carregando alguém como o Jake nas costas. Acomodei ele no carro o melhor que pude e arranquei a toda a velocidade.
- Onde fica o hospital mais próximo?
- Esqueça Nessie, eu vou ficar bem em um minuto.
- Jake você tá sangrando e com metade dos ossos quebrados é óbvio que você precisa de um médico. Onde fica o hospital?
- Nessie eu já disse eu não quero hospital nenhum, eles não entenderiam...
- ONDE?
- Vire a esquerda.
Na velocidade que eu dirigia em poucos minutos estávamos no hospital. Apoiei Jake no meu ombro de modo que parecesse que eu o estava ajudando a se apoiar quando na verdade eu praticamente o carregava com um braço só. Cheguei na recepção desesperada.
- Moça por favor é uma emergência, ele foi.. hum... atacado por um urso.
- Urso? Hum, vou chamar o doutor.
Em questão de minutos dois enfermeiros apareceram com uma maca e o levaram para uma sala no fim do corredor, Jake me olhava com uma expressão amargurada até desaparecer no corredor. Eu me preparei para acompanhá-lo quando a recepcionista me chamou.
- Por favor moça você não pode entrar.
- Por que não?
- Por não permitimos acompanhantes na emergência, e além do mais você tem que preencher a ficha.
A ficha eram umas cinco folhas que perguntavam absolutamente tudo que se podia imaginar sobre mim e sobre o Jake, todas as doenças que ele já teve na vida, tudo que ele era alérgico, como é que eu ia saber? Coloquei não em todas as perguntas e comecei a andar de um lado pro outro esperando notícias. A recepcionista já estava a ponto de me expulsar do hospital quando o médico chegou com a “ficha” que eu havia preenchido na mão.
- Senhorita Renesmee... Volturi?
- Sim.
Cerca de dez passos me separavam do homem que me encarava com uma expressão tão chocada quanto eu o encarava. O doutor, ou pelo menos era assim que ele estava vestido, era alto, loiro, absolutamente lindo e tinha olhos castanho amarelados, não podia ter mais que vinte e cinco anos. Mas não era a beleza dele que me chocava, tampouco os olhos familiares, ele era um vampiro, com certeza ele era um vampiro e trabalhava em um hospital! Aquilo era tão bizarro.
- Pode me acompanhar por favor?
Me animei com a idéia de ver como o Jake estava mas a sala que ele me convidou a entrar estava vazia, a exceção de uma cama a um canto.
- O que significa isso? Onde está o Jake?
- Renesmee, eu sou o doutor Carlisle ...
- Desculpe a indelicadeza doutor mas seu nome não me interessa eu quero ver o Jake, saber como ele está.
- Queria conversar um pouco com você antes. Jacob disse que você o trouxe até aqui, que vocês se conhecem há algumas semanas.
- Sim, somos amigos.
- Posso perguntar a quanto tempo está na cidade?
- Quase duas semanas.
- E posso perguntar por que está aqui?
- Isso vem ao caso?
- Na verdade pelo seu sobrenome deve pertencer à guarda dos Volturi correto? – eu concordei com a cabeça – É sempre bom sabermos o que os Volturi fazem perto da nossa área, se o assunto é conosco ou se estão só de passagem.
- Ah, não se preocupe, estávamos procurando alguns vampiros mas o rastro deles nos leva para outra direção, não ficaremos aqui por muito tempo.
Ele me encarava com seriedade.
- Posso saber o que estão buscando?
- Me desculpe mas não. Posso ver o Jake agora?
- Vai vê-lo em um minuto. Tente entender Renesmee eu e minha família vivemos aqui há algum tempo, tenho que preservar a segurança deles, quantos vocês são?
- Somos três, eu, a Jane e o Alec. Alec está seguindo uma pista ao norte, como eu disse não ficaremos muito tempo. Tem mais alguma coisa que queira me perguntar?
Ele me olhou com uma expressão triste.
- Há muitas coisas que eu queria perguntar mas acho que não é o momento pra isso, vou levá-la até o Jacob.
Voltamos para o corredor e entramos em uma outra sala, dessa vez era o Jake que me encarava sorridente com a perna enfaixada.
- Nossa Jake você parece muito melhor.
E ele parecia mesmo, não tinha corte nenhum e a exceção da perna enfaixada ele parecia perfeitamente saudável.
- Eu disse pra você que eu ficaria bem, foi você que insistiu pra que eu viesse.
- Como ele está doutor?
- Hum, vai sobreviver. Você disse que ele foi atacado por um urso?
- Sim, um urso.
Eu corei, era muito fácil saber que eu estava mentindo. Ele me olhava como se estivesse me analisando.
- Bom, nada de andar na floresta sozinho de novo rapaz.
O tom dele era de censura mas estava claro que ele estava brincando, Jake me olhou como se estivesse me repreendendo. O doutor me ajudou a colocar Jake no carro. Eu o agradeci e me virei para entrar no carro quando ele tocou o meu braço. Quando senti sua mão fria no meu braço uma série de cenas passou pela minha cabeça. Era uma noite chuvosa, eu olhava pela janela um lobo enorme que andava de um lado para o outro na chuva. Eu desenhava no vidro da janela com minhas mãos pequenas, e eu sentia medo, muito medo. Aquele mesmo homem veio para o meu lado e me abraçou.
- Não se preocupe querida, vamos cuidar de você, ninguém vai tirar você de nós.
Estiquei minha mão até pousá-la no rosto dele. Várias imagens passaram da minha mente pra ele, entre elas uma que se destacava. Aro, com os olhos brilhando de cobiça.
- Ele me quer não é?
Minha voz fina e melódica quase desapareceu com o som da tempestade lá fora.
- Ele não vai levá-la querida, eu prometo.
Um lobo uivava do lado de fora.
Voltei a realidade para ver o mesmo rosto, nem um pouco envelhecido, que me olhava emocionado.
- Posso fazer uma pergunta doutor?
Ele parecia surpreso.
- É claro.
- O senhor é da família da Bella?
- Por que diz isso?
- Seus olhos, são iguais aos dela.
-Sim, somos da mesma família. Então ela conhece você?
Ele parecia muito sério, como se Bella estivesse fazendo algo errado em me conhecer.
- Sim, eu desmaiei e Jake me levou até a casa dela, já que eles são amigos e acabamos nos tornando amigas também. O que foi?
Ele me olhava profundamente surpreso.
- Você desmaiou? Mas vampiros não desmaiam.
- Bom, eu não sou, exatamente, uma vampira. Sou meio-vampira. É uma longa história. O senhor me chamou, ia dizer alguma coisa?
Ele parecia confuso, como se tivesse esquecido o que ia dizer.
- Ah, sim. Eu só queria dizer que... você é uma garota muito bonita e... teria orgulho que fosse parte da minha família.
Eu o encarei por alguns instantes e então compreendi o que ele queria dizer. A filha da Bella tinha sido sequestrada, era normal que ele sentisse falta dela também.
- Bella me contou o jeito que vocês vivem, o modo como se adaptaram. Eu admiro muito vocês, teria orgulho em fazer parte da sua família.
Ele continuou me observando enquanto eu entrava no carro e seguia pela estrada até La Push.
- O que vocês tanto conversavam lá fora?
- Nada de importante, só umas recomendações pra você.
- Nessie, você é uma péssima mentirosa.
Eu corei, sabia muito bem que isso era verdade. Paramos em frente a casa.
- Aproveitando que você não sabe mentir, por que não me conta como uma garota com um bracinho desse tamanho conseguiu me carregar nas costas da clareira até aqui?
- Na verdade Jake, essa é uma longa história.