O Garoto da Última Casa escrita por Bruna Ribeiro


Capítulo 3
Capítulo 2




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CAPÍTULO 2 - MULHER DE PRETO

– O que quer saber, exatamente? - ele parecia curioso com meu pedido.Eu acho que era muita idiotice da minha parte, perguntar para Olaf uma coisa que, provavelmente, ele nem sabia.

Você deve estar se perguntando sobre toda essa minha curiosidade com a última casa, mas, sinceramente, eu também não sei ao certo.O que eu sei é que algo naquela casa me puxa e talvez eu seja fraca demais para me soltar, talvez essa corda que me prende tão fortemente, seja minha curiosidade.Desde quando avistei aquela casa, meus sentidos foram aumentados e eu fiquei em alerta.

Aquela casa consegue ser mais estranha que a cidade inteira e, talvez, eu descubra não só mais sobre a casa-curiosamente-estranha, mas também sobre Owens.

– Nada de mais - tentei disfarçar - Quem mora naquela casa? - decidi pelo obvio e mais fácil, com o tempo eu saberia mais.

– Aquela casa pertencia aos Hãnsel, até onde me lembro - se levantou e caminhou até a janela.Depois de tirar a cortina e dar uma olhadinha na rua ou na casa, se voltou para mim novamente. - Parece que ninguém mora mais lá...

– Não, ainda tem alguém lá - interrompi - Eu vi quando chegamos.

–Então deve ser o filho que sobrou - Olaf sussurrou para si mesmo, no entanto eu escutei.

– O filho que sobrou?

– Acho que já está tarde - desconversou.Ele tirou a bandeja que , antes tinha meu lanche, de cima da minha cama e colocou na mesinha.Quando me viu já deitada, me ajudou com o cobertor. - Amanhã pode ser sábado, mas temos coisas em Owens que precisamos fazer, sem falar que, precisamos conversar sobre a escola.

– Porquê... - tentei

– Hora de dormir.Até amanhã, pirralha. - ele nem esperou replica, apenas desligou a luz e fechou a porta.

–Droga - murmurei

Enquanto fitava o teto em meio a escuridão, me perguntava e pensava em várias coisas.Como estaria agora, se meus pais estivessem vivos?Porquê Olaf ficou tão esquisito com o assunto sobre a última casa?Porquê sinto que algo me pucha mais e mais para aquela droga de casa estranha?Porquê Owens parece tão triste?Acho que eram tantas perguntas que nem mesmo um cérebro tão curioso - quanto o meu - conseguiu aguentar e eu cai num sono pesado.Mas pesado não é sinônimo de sem sonhos.Ou pesadelos.

''Eu esta em uma floresta, o que não era nenhuma surpresa, considerando que Owens era cercada de várias.

Corria, corria, corria, mas parecia que não chegava a lugar nenhum.

– É melhor segurar essa criança enxerida, antes que seja tarde - uma voz rouca e desconhecida falava, no entanto eu não via ninguém e corria mais.

–Deixe-a - Outra voz ordenou, e essa voz me era conhecida.Só não sabia de onde.

– Ela vai acabar se machucando - Cantarolou a voz diabolicamente.

– Não ouse - A outra-e-conhecida voz parecia brava.

'Isso é um pesadelo, um pesadelo, é, apenas, a droga de um pesadelo' repetia para mim mesma enquanto corria.

Eu bati em algo e no começo achei que fosse uma árvore.

Estava enganada.

E a última coisa que vi foram, impressionantes, olhos azuis.Azuis escuros.''

Acordei com um salto e quase pulei da cama.

Queria gritar, mas não queria acordar Olaf.Olhei no relógio e constatei que eram 06:00h.Então apenas deitei de novo. Eu não queria dormir, não queria ter o sonho novamente, e mesmo assustada com as duas vozes - uma até mesmo sendo conhecida - brigando enquanto eu corria, sabe Deus para onde, meus pensamentos estavam focados no dono dos olhos azuis.

Quem era?Eu conheço?Provavelmente, pelo menos, já o vi.Teve uma época em minha vida, quando mais nova, que sempre tinha pesadelos, o estranho é que agora não me lembro de nenhum.Minha mãe me dizia que sonhamos com pessoas que avistávamos em algum lugar, mesmo que nossa memória limitada as delete, nosso cérebro se ''lembra'' e pode transferir essas imagens para os sonhos ou pesadelos.Tipo, o assassino de seu sonho pode ser um trabalhador do posto de gasolina que você avistou apenas alguns segundos.

Tudo bem,mas se ela estava certa - e quase sempre estava - duvido que vislumbrei o dono dos olhos azuis mais bonitos que já vi na vida, num posto de gasolina, ou em qualquer outro lugar.Eu sei que não esqueceria daqueles olhos, muito menos do dono.Eu nunca o tinha visto.Tinha certeza.

Será que o tempo dos pesadelos esta voltando?Quem era aquelas duas que brigavam?Era de mim que falavam?Se sim,por quê me machucaria?

–Parece que acorda cedo,não é mesmo? - Olaf interrompeu meus pensamentos curiosos.Ele estava encostado na batente da porta. - Vim aqui dar uma olhada para ver como estava e pelo visto, já está até acordada. - Me sentei na cama e o fitei.Ele realmente parecia ter acabado de acordar.

–É, costumo acordar cedo - Essa era a primeira de muitas mentiras que contaria para Olaf.

–Se arrume,vamos tomar café e depois fazer um pequeno passeio pela cidade, enquanto compro algumas coisas que faltam.

–Tudo bem, me dê apenas alguns minutos. - Pedi

Ele concordou e eu fui me arrumar.Eu queria muito fazer aquele passeio.

...

–O café estava bom? - Olaf perguntou pela 5°vez

–Olaf você já perguntou isso e já disse que sim,estava muito bom.

Já estávamos no carro rumo a algum pequeno mercado ao ar livre de Owens.E como já devem ter percebido, já tínhamos tomado nosso café da manhã também.

Owens parecia menos infeliz e assustadora de manhã, e também eu conseguia ver mais pessoas, algumas até, tentavam um pequeno sorriso.

– Porque parecem tão infelizes? - perguntei para mim mesma em voz alta - Será que todos que nascem em Owens são assim?

–Ah, não diga isso - Olaf falou - Eu nasci em Owens e nem por isso sou infeliz

–Você?

–Não só eu. - corrigiu - Seus avós,sua mãe,seu pai...

–Eles nunca me contaram sobre Owens - estava confusa.Porque meus pais esconderiam de mim o lugar onde nasceram? - Alguns minutos antes, jurava que eles tinham nascido e crescido em Nova Iorque.

–Seu pai?Nova Iorque? - ele riu - Não, não.Ele nasceu e cresceu em Owens, só se mudou por causa da faculdade mesmo.

–Não entendo por que nunca , pelo menos, falaram de Owens.

–Isso eu já não posso te responder. - eu não falei mais e Olaf pareceu entender.Só que eu não entendia por quê disso, e estava chateada também.

O silêncio foi o que pairou no carro.

– Pronto, é aqui. - Depois de alguns minutos, Olaf informou.Em nossa frente em podia ver um pequeno, mas considerável, amontoado de pessoas, envolta de pequenas barracas. - Você pode ver algumas barracas mais interessantes do que as de peixe e verduras, mas volto daqui a 40 minutos.Esteja aqui nessa hora, pirralha.

Fiz o que ele disse.

Enquanto Olaf parava em barracas de comida, eu continuei andando.

As pessoas me olhavam como se eu estivesse com roupas extravagantes ou algo chamativo.Me olhavam também assustadas.Talvez, se perguntassem o que eu fazia ali.

Havia diversos tipos de barracas.De comida, de roupas usadas, bijuterias e livros antigos.

Parei na primeira que avistei.

Os livros pareciam velhos e cheiravam a poeira, as capas eram de couro também.Eram meus tipos preferidos de livros.

Passei meus olhos por cada título e percebi que a maioria dos temas envolvia bruxas.''Bruxas puras'',''Descendência bruxa'',''Caça as bruxas''.Mas um livro me chamou atenção.''Horda Dos Sete''.

Quando eu estava prestes a pegá-lo,alguém foi mais rápido e pegou o livro na minha frente.

–Desculpe, esse já foi vendido. - foi uma senhora.Ela era baixa e um pouco corcunda, tinha cabelos levemente grisalhos e olhos escuros e , pelo que percebi , ótimo reflexos. Devia ser a vendedora e dona dos livros - Mas pode escolher outros, senhorita... - Ela me incentivou a me apresentar.

–Meu nome é Alexis, Alexis Miller. - eu disse

–Ah,uma Miller - ela apertou minha mão - Faz tempo que não vejo os Miller.Meu nome é Georgia.Como está sua família?

– Meus pais e meus avós morreram - informei já acostumada com esse tipo de pergunta - Só tenho meu tio Olaf agora,mas estamos bem.

–Ah,eu sinto muito.Adorava sua avó,um doce de pessoa - ela conhecia minha avó?Ao que parece sim - Olaf esta aqui?Nunca mais vi aquele pestinha...

–Conheceu minha família?

–Ah,sim. - ela deixou o livro que pegou de mim embaixo da barraca.Fora de alcance - Eu, como já de ter percebido, não sou tão novinha.Sua vó era minha amiga, ela adorava ir na biblioteca que sempre pertenceu a minha família.

–Você ainda tem a biblioteca?

–Mas é claro.

–E ainda funciona?Não que eu esteja desrespeitando a senhora, é só...

–Tudo bem, eu entendi. - ela sorriu - Mas sim, tenho e funciona perfeitamente.

–Eu adoraria conhecer.

–Eu vou te dar o endereço e você vai qualquer dia.

– O.k.- ela pegou um papel e uma caneta e escreveu algumas coisas.Depois deixou a caneta em algum lugar e me estendeu o papel.

–Está aqui - Georgia soltou o papel em minha mão e eu guardei no bolso de minha calça - Mas nos finais de semana ela fica fechada, é que eu fico aqui no mercado.

–Entendi.

–Alexis não é? - concordei - Que tipo de livro estava procurando?

– Não sei ao certo. - disse pensativa - Ah,que tal aventura?

– Achei que falaria romance,as adolescentes em Owens costumam procurar muito esse gênero.

– Eu não sou muito fã.Só leio romance quando está acompanhado de outro gênero e, mesmo assim, são raras as vezes. - tentei parecer simpática - Sou de Nova Iorque.

Nos duas rimos.

–Então deve ser por isso - ela me disse.

Enquanto eu sorria, ela procurava por algo que eu gostasse, falava sobre o amor que tinha pelos livros, relembrava histórias de Owens e da minha família.E, pela primeira vez, eu estava me divertindo.

Percebi que alguém me olhava.

A mulher estava a umas duas barracas antes da minha, onde vendiam verduras e legumes.Enquanto pegava as cenouras e colocava numa sacola, ela não parava de me olhar.Não era algo descarado, pois, pelo que me pareceu, ninguém percebeu.

Só eu.

Ela estava vestida de preto, tinha cabelos castanhos e seus olhos também deveriam ser escuros.Eu até dei uma olhada ao meu redor, mas não havia nada que pudesse prender sua atenção.Será que ela estava olhando para mim mesmo?Daquele jeito?Porquê?

Acho que estava ficando paranoica.

Ela, finalmente ,pareceu perceber meu olhar e desviou o seu para as cenouras.Eu, por outro lado, ainda continuei a observar.

–Ah, aqui esta um de meus preferidos. - Georgia reapareceu e eu lhe dei atenção - Eu também adorava aventura.

A senhora me estendeu um livro de capa avermelhada.O título era ''A Pequena Caçadora ''.

– Quanto é? - perguntei já tirando o dinheiro do meu bolso.

– Ah,não.Esse é por minha conta.

–Não,eu...

–Os Miller não mudam mesmo. - soltou um risinho abafado - Faz assim,me devolva ele quando for a biblioteca.

–Certo, mas se eu gostar, vou comprar - Avisei

–Como queira,Alexis Miller.

–Ah,Georgia - chamei.Ela fez um aceno com a cabeça como se dissesse ''Sim?Pode falar'' - Quem é aquela senhora? - apontei para a barraca , no entanto não tinha mais ninguém.

Droga.

–Que senhora? - seguiu meu olhar - A dona daquela barraca?O nome dela é Ella. Ela é uma boa pessoa, mas por quê quer saber?

–Nada de mais, só gostei da barraca - Menti horrivelmente.Tinha que começar a melhorar isso.

–É uma bela barraca - concordou,entretanto eu sabia que não tinha acreditado

– Preciso ir,Georgia.Até mais - me despedi antes que falasse mais alguma idiotice.

–Até mais,pequena Miller.

Apressei meus passos e nem me importei com os olhares.Logo cheguei no carro de Olaf e xinguei baixinho por ele ainda não estar ali.Mas era idiotice,j á que ele disse que estaria comprando algumas coisas e me deu um prazo de 40 minutos.

...

–Já esta ai? - Olaf fez uma pergunta que presumi ser retórica. - O que tem na mão? - Se referiu ao livro, enquanto abria o carro.

Entrei no carro e esperei ele guardar as comprar no porta malas e entrar também no veículo, logo em seguida.

–É um livro que achei numa barraca. - mostrei a capa e depois ele ligou o carro - Uma senhora me indicou, ela parecia conhecer bem nossa família.O nome dela era Georgia.

–Ah,me lembro dela - disse sem se virar - Ela e minha mãe eram amigas.Mamãe vivia na biblioteca da família dela.

–Ela me disse.

–Como ela esta?

–Parece muito bem.

–Ela é bem forte e muito legal, acho que como sua avó, você vai gostar dela.

–Acho que sim.

...

Não demorou muito para chegarmos.

Owens, sem dúvida, era uma cidade muito diferente das outras, mas, até agora, eu estava gostando mais e mais desse lugar pacato e curioso.

–Me ajuda a descarregar as compras? - pediu Olaf me tirando de meus devaneios comuns.

–Claro.

Eu o ajudei, de certa forma.

Enquanto ele pegava suas três sacolas, eu peguei apenas uma.

–Fecha a mala para mim? - Ele se virou, antes de entrar no nosso novo ''lar''- Isso, é claro, se não estiver muito sobrecarregada. - O idiota começou a rir da própria piada e entrou, finalmente, na casa

Revirei os olhos.Um de meus vícios

Voltei para o carro, deixei a minha sacola - muito pesada, por sinal - no chão e quando estava prestes a fechar a mala, eu a vi.A senhora que me fitava.A mulher do mercado.

Ela estava entrando em uma casa, mas não qualquer casa.Na última casa da rua.


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Notas finais do capítulo

Que tal dar sua opinião?Vou adorar.



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