Capítulo 19: Raiva

Dei uma retocada na maquiagem do pescoço e enrolei novamente a echarpe. Vampiro idiota. Quando olhei no espelho e vi a marca da mordida dele, entrei em pânico. Imagina se alguém ver aquilo? O que eu ia dizer?

Lembrei então das propriedades maravilhosas que o sangue de vampiro tem, e pedi a Edward que — e respirei mil vezes antes de fazer aquele pedido — me desse um pouco do seu sangue, como fazia com sua doadora. O mínimo possível. Pedi isso já me lembrando do remédio para enjoos que guardava em casa, para não passar mal.

— De jeito nenhum — respondeu, como se eu tivesse dito o maior absurdo.

— Como assim “de jeito nenhum”? Então quer dizer que sua doadorazinha pode ser curada e eu não? — alfinetei.

— Isabella, não comece novamente com uma crise de ciúmes besta.

— Claro, porque perseguir sua namorada e o amigo dela pela cidade não é besteira alguma!

— Isabella. Bella. Para. — Edward respirou fundo antes de voltar a falar. — Olha, não é que eu não queira te curar. Você não sabe o que olhar para essa marca está causando em mim nesse momento. Só que o meu sangue não vai apenas curá-la, vai modificar seu cheiro, sua personalidade. Você vai deixar de ser você, vai deixar de ser minha humana.

E foi assim que ele me convenceu de que maquiagem era o melhor remédio. Acontece que maquiagem nenhuma tapava bem aquilo, então precisei recorrer à echarpe também. Vampiro idiota. Depois de verificar que estava tudo no lugar, saí do banheiro para encontrar um Jacob preso em um jogo qualquer que passava na televisão. Revirei os olhos. Homens.

— Ei, eu me locomovi lá de Forks para ver você assistir a um jogo? — Ele desligou a televisão bem rápido, como uma criança que é pega fazendo algo de errado.

— Pronto, pronto. Nada de futebol. — Levantou as mãos em rendição, fazendo-me rir. — Preparada para virar mecânica?

— Claro, estou até com o figurino adequado! — Apontei para a jardineira jeans que eu vestia.

— Espero que sus habilidades estejam além do figurino, para o nosso próprio bem!

Fomos até a garagem rindo. Jake tinha me mandado uma mensagem na noite anterior me convidando para passar a tarde com ele em La Push, e quem sabe aprender a concertar um carro? Aproveitei que Charlie iria para uma segunda tarde de pescarias e peguei carona com ele. Só mandei uma mensagem ao Edward quando estava no meio do caminho, avisando que estaria em La Push. Eu sabia que ele não pisaria lá e eu precisava compensar o coitado do Jacob por aquela noite desastrosa.

Entrei na garagem esperando encontrar só uma carcaça de carro, mas me surpreendi ao ver que estava quase pronto.

— Uau. Achei que realmente ia ter que te ajudar em alguma coisa, mas pelo jeito...

— Eu preciso de ajuda. — Ele apontou para uma coisa enorme no canto da garagem. — Preciso colocar aquele motor e ajeitar algumas peças. Então poderemos dar uma volta por La Push motorizados. — Piscou para mim. — Achou mesmo que eu ia precisar dos seus dons de mecânica?

— Bom, achei, mas tenho que admitir que prefiro dessa maneira. — Ri. — Bem, o que estamos esperando então?

Ajudei em pouca coisa, fiquei assistindo ele trabalhar a maior parte do tempo. Jake levava jeito para a coisa, então rapidinho seu carro estava pronto para ser estreado. Lembrei da primeira vez que o vi. Ele havia jogado alguma piada sem graça e falou que estava tentando montar um carro. Parecia que foi ontem.

— Qual o nosso destino? — perguntei quando entramos no carro.

— Sei lá, pode ser a praia, só quero colocar meu bebê para funcionar.

Revirei os olhos. Homens. Mas ele realmente deveria ficar orgulhoso, o carro ficou incrível e funcionava melhor que a minha pobre Gladis. Fiquei mal por pensar na coitada daquela maneira, mas era a verdade. Abri a janela e deixei a brisa entrar. Nem percebi quando finalmente chegamos.

— Esse lugar é lindo — falei.

— Com você aqui e claro, o meu carro — Balancei a cabeça. — o cenário fica ainda mais perfeito.

Olhei para o outro lado tentando disfarçar a minha bochecha, que estava queimando. Detestava quando o Jacob avançava o sinal daquela maneira. Foi como no cinema e sua mão boba. Quando ele ia entender que eu estava namorando, muito bem, obrigada?

— Ei, o que acha da gente dar um mergulho? — perguntou, já tirando a camisa. Uma coisa eu tinha que admitir: que corpo!

— Melhor não, nem trouxe roupa de banho — disse, afastando-me.

— Largue de ser fresca, Bella. — Ele começou a andar em minha direção e eu me afastei na mesma velocidade. — Se não entrar, eu te jogo lá dentro.

Saí correndo sem falar nada e Jake correu atrás de mim. Logo me alcançou e agarrou pela cintura.

— Me larga! — gritei.

— Se não vai por bem, vai por mal — respondeu rindo, antes de me jogar dentro d’água.

— Isso vai ter troco, Black! — Levantei indignada, roupa e cabelo completamente encharcados.

— Até parec... — Ele parou de rir do nada, apertando os olhos em minha direção. — O que é isso, Bella?

Tateei meu corpo tentando encontrar o que ele estava vendo e só então me toquei: minha echarpe tinha desaparecido. Comecei a procurar no meio da água feito uma louca, mas não estava em nenhum lugar visível. Droga, droga, droga, mil vezes vampiro idiota!

Jacob me puxou para perto dele, esfregando meu pescoço no lugar da mordida, tirando o resto da maquiagem e eu arfei. Meu desespero devia estar estampado em meu rosto.

— Bella, o que é isso? — perguntou ainda mais sério.

— Eu... Eu me machuquei quando cocei o pescoço. Unha grande, sabe como é. — Unha grande? Sério mesmo, Bella? Não consegui pensar em nenhuma desculpa melhor.

— Você coçou e deixou dois furos no pescoço? — perguntou incrédulo. De repente, sua expressão mudou. Que ele não tenha somado dois mais dois, pensei. — Espera um pouco. Não, não, aquilo era só uma história! — Jacob se afastou de mim, como se eu tivesse alguma doença contagiosa. Eu mesma não conseguia sair do lugar.

— Bella, me diz que aquilo era só uma história — pediu. Lembrei de quando ele me contou a lenda sobre os lobos e os frios. Queria dizer que não passava de uma lenda, que realmente havia me machucado com a unha, mas minha língua se recusava a me obedecer. Mordi o lábio por conta do nervosismo. — Vampiro? Bella, não me diga que realmente está namorando um vampiro. DIGA QUE A DROGA DE UM VAMPIRO NÃO TE MORDEU!

Jacob começou a tremer, sua expressão completamente modificada pela raiva. Meu corpo finalmente me obedeceu e avancei em sua direção, pegando seu braço, e arfei em surpresa. A pele dele estava queimando. O que era aquilo?

— Jake... — Ele se afastou de mim, balançando a cabeça em descrença e saiu correndo, desaparecendo de vista. O que tinha acontecido? Por que eu só fazia burrada?

Senti uma coisa se enrolando em minha mão na água. Olhei para baixo e vi a bosta da echarpe. Agora ela aparecia, como que para ironizar a situação. Torci para tirar o excesso de água e a coloquei no lugar. Sentei no banco do motorista do carro do Jake. Até o carro ele deixou para trás na hora da raiva, o carro que teve tanto trabalho para montar.

Segui para a casa dos Black, gritei por ele, mas Jacob não estava lá. Eu não tinha mais nada para fazer além de esperar e os únicos que chegaram foram Billy e Charlie. A viagem para casa foi silenciosa, eu estava completamente confusa. O que ia acontecer agora?