Ver como Carly tinha conseguido ler aquela página só me convencia mais ainda de que eu tinha que ser forte. Secando o rosto, soltei Carly e peguei a sacola que eu tinha levado. Corey me olhava, o nariz vermelho.

– Eu acho...acho que também...preciso... – Era difícil falar entre soluços. – Preciso me despedir.

Tirei o embrulho de dentro da sacola e me ajoelhei do lado da cova, tremendo. Respirei fundo, pegando o enfeite de dentro do plástico. Coloquei o gatinho em cima do caixão, sorrindo por entre as lágrimas.

– Claire, eu quero te dar isso... – Era um enfeite de gatinho, feito de madeira, pouco menor que meu antebraço. Um gato deitado, tomando sol. – Sei o quanto você ama gatos. Quero que você possa levar pelo menos uma das coisas que você ama com você.

Corey se ajoelhou do meu lado, secando o rosto.

– E ele também quer que você saiba que todo mundo te amava. Inclusive eu. – Dei um abraço nele. Era mais na cabeça dele do que nele, mas tudo bem.

– É, e pedir perdão, Claire. Eu fui tão... – Suspirei. Teria que viver pensando em como seria se eu tivesse ficado ao lado dela. – Espero que esteja num lugar melhor.

E me juntei a Carly de novo. Corey ficou na nossa frente, tentando secar o rosto. Eu gostaria tanto de poder dar algo além de um enfeite. Queria ter dado mais da minha amizade.

– Não tinha porquê pedir perdão. – Carly falou num sussurro, segurando minha mão. – Fui eu quem te fez se afastar.

– Eu o fiz porque eu quis. – Respondi, apertando a mão dela de leve. – Eu podia ter servido de apoio para ela, eu sabia Carly. Fui eu quem fingiu que não viu.

– Não dava para fazer nada. – Meu pai parou atrás de mim, com uma mão no meu ombro. – Não se faz um prédio só com paredes e teto. Você precisa de um alicerce. O alicerce de uma pessoa é a família, Keane. Ela não tinha um.

– Então ela desmoronou. – Concluí, passando a mão no nariz. Eu detestava chorar.

– Ninguém poderia ser a base dela. Só os pais... – Ele falou, suspirando. Eu sabia que ele tinha razão, mas ainda assim, eu sempre carregaria dentro de mim culpa e arrependimento.

Assim como todos ali.

Todo mundo tinha dentro de si uma certa culpa.

Olhei para Derek. O garoto não olhava na direção da cova, os braços cruzados. Será que ele tinha preparado alguma despedida e não conseguia se pronunciar?

Eu podia imaginar como ele estava. Eu já tinha sido o amigo próximo de Claire. Entregar aquele gatinho foi algo que eu me forcei a fazer, porque precisava pedir perdão. E porque precisava provar para mim mesmo que eu sempre sentiria sua falta.

Saudade era o sentimento que ficaria, acima de qualquer culpa, qualquer arrependimento. Porque eu podia apenas imaginar como seria se eu tivesse agido diferente, mas eu podia me lembrar de quando brincávamos juntos na rua depois da aula. De como ela gostava de escrever. E de como ela tinha descoberto a senha do meu armário só de me olhar de longe.

Saudade da menina doce que ela sempre fora.

Carly tinha razão em uma coisa. Funerais podiam ser difíceis, mas ajudavam a aceitar. E por mais triste que pudesse parecer, eu já tinha começado a aceitar.

– Tudo bem? – Carly perguntou para Corey, passando a mão pela sua cabeça. Ele concordou, secando o rosto de novo.

Keane sorriu. Viu Lily e Kramisha se preparando para alguma despedida também. As duas deviam ser as únicas amigas meninas de Claire. Lily tinha levado a guitarra e Kramisha uma tela, ainda coberta.

– Carly, vou tomar um gole d’água. – Falei, soltando sua mão. Ela concordou, sorrindo fraco.

Fui correndo até uma lanchonete ali perto. Era a única, na verdade. Comprei uma garrafa d’água e tomei quase metade de uma vez. Já tinha parado de tremer.

Sorri.

Sai da lanchonete e fui caminhando de volta para perto de Carly e Corey. Entreguei o resto da água para Corey, sorrindo. Ele sorriu em agradecimento e deu um gole.

– Estou orgulhosa de você. – Carly falou, sorrindo fraco.

– O que elas vão fazer? – Perguntei, olhando Kramisha e Lily.

– Você vai ver. E vai gostar, eu acho.

Mais tranquilo, voltei a prestar atenção nas despedidas de cada um.

E dando meu adeus mais uma vez.