Do Lado De Dentro escrita por Mi Freire


Capítulo 22
Confiança


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoal. Estou muito feliz que o número de leitores esteja aumentando, assim como o numero de comentários. Obrigada a todos. Espero que continuem comigo nessa jornada até o final



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"De vez em quando me pego planejando futuros tão absurdos."

Mamãe sempre foi somente uma dona de casa depois de se casar com papai. Antes, ela era garçonete no restaurante no centro – o qual não existe mais – onde conheceu meu pai. Mas agora, mamãe parecia realmente interessada em encontrar uma ocupação. E foi o que ela fez aliando-se com a vizinha. Uma senhorinha rechonchuda com um sorriso jovial. Dona Carlota. Ela e mamãe se uniram para começarem a fazer bolos para vender. Bolos por encomenda. De todos os tipos e sabores.

Foi uma brilhante ideia. Mamãe passa a tarde inteira até o anoitecer fazendo bolos com a vizinha em sua casa. Em sua grande cozinha bem planejada. Mamãe parece ótima com isso. Ela sempre foi uma cozinheira de mão cheia. E não se importa mais se papai não aceitou muito bem a ideia.

— Vejam só quem finalmente apareceu – observou papai, com um sorriso sacana. Quando Oliver entrou pela porta dos fundos enquanto tomávamos café da manhã. Oliver estava em péssimo estado, um maltrapilho, parecendo um morador de rua. — Onde se meteu Oliver?

Oliver se limitou a responder, passando por nós sem ao menos levantar os olhos. Subiu as escadas correndo e bateu a porta do quarto se trancando lá dentro. Pelo visto, ele dormiria pelo resto do dia até voltar a se sentir bem outra vez para sair e sumir como sempre fez.

Enquanto meu irmão está lá em cima dormindo, mamãe saiu para fazer seus bolos com dona Carlota e papai também saiu sabe-se lá pra onde e pra que, eu me joguei no sofá, vendo a uma série de zumbis na tevê.

A campainha tocou.

— Posso entrar? – Jesse sorria, triunfante. Dei espaço, mostrando-lhe que poderia entrar e ficar a vontade. — Você gosta disso?

Ele se referia à série de zumbis.

Jesse se sentou e eu voltei a me jogar no sofá sem me importar com sua presença ali. Afinal, mais que qualquer outra coisa, somos amigos, não somos?

— Eu gosto. Você não? Tem tudo a ver comigo, não acha? – ele riu, balançando a cabeça negativamente em resposta. — Então, o que te trás aqui nessa ilustre tarde?

— Então – ele passou a língua em seus lábios levemente roxeado por causa do frio. — por acaso você não gostaria de dar uma volta comigo de novo mais tarde? Depois do ensaio, claro. Vou ensaiar com a banda...

— Hum, pode ser. – balancei os ombros. — Desde que você não tente me beijar outra vez. – soei como desafiadora, apenas fazendo piada.

— Sobre isso, não posso dizer que não vou tentar. – ele sorriu também. E nós rimos com a brincadeira. — Tô brincando. A não ser que você queira.

Ele levantou uma das sobrancelhas.

— Jesse...

Rimos de novo. Foi engraçado, vai.

— Vocês, a banda, estão ensaiando onde?

— Estão todos hospedados na casa do Jonathan, que é o que mora mais perto daqui. Na cidade vizinha. Meia hora de carro. – ele falava tranquilamente. — Estamos ensaiando na casa do tio Alec. Eu já te disse que minha família é louca por música? Então, tio Alec é um de nós e na casa dele, no que era pra ser um porão, há uma espécie de “estúdio”. Lá tem tudo que a gente precisa pra ensaiar.

— Ah. Legal. – não imaginava que Alexander tinha um “estúdio”. Estava verdadeiramente surpresa, apesar de não saber me expressar muito bem. — Mas então, sobre o nosso passeio mais tarde: aonde vamos?

— Hayley, não seja tão curiosa. - Jesse brincou.

No meu quarto, estava acessando a internet quando ouço alguém bater a porta. Não. – pensei comigo mesma. — Não pode ser o Jesse. Não agora. Eu nem tomei banho ainda! Fui correndo ver quem era.

Mamãe estendeu o telefone em minha direção.

— Quem é?

— É melhor você atender.

Fiquei preocupada. Quem poderia ser? Pela cara de mamãe não parecia ser boa coisa. Mas resolvi arriscar, fechando a porta e voltando pra dentro do meu quarto logo depois dela ir embora.

— Alô. Quem é? – sentei-me na ponta da cama, esperando por uma resposta do outro lado da linha.

— Oi. Hayley? Sou eu. – impossível não reconhecer aquela voz. De quem tanto me odiou. — Podemos conversar?

É a mãe de Brandon. Helena.

— Claro que sim. – tentei manter a compostura, apesar de quase poder sentir o coração entalado na garganta. — O que você quer comigo? – soei grosseira.

— Soube que você saiu do internato, onde está estudando, pra poder passar o feriado com família. Ao saber disso, pensei por muito tempo, se deveria ou não fazer o que estou prestes a lhe dizer. Custou muito chegar a uma conclusão. Mas acabei julgando ser o certo e o melhor a se fazer. Não ter porque ainda manter isso guardado comigo. Isso nem me pertence...

Isso o que? – a voz dela me enfraquecia cada vez mais. Detesto quando não vão direto ao ponto comigo.

— Coisas, Hayley. Coisas.

Passamos alguns segundos em silêncio.

— Acabei de mandar alguém até aí, na sua casa, para lhe entregar algumas coisas. Coisas que pertencem a você e que esteve todo esse tempo, aqui, guardadas comigo. Eu não queria ter que me livrar das ultimas coisas que restaram dele. – dele Brandon. — Tente entender. Ainda é tão doloroso pra mim... – jurei que ela queria chorar. Mas se ela chorasse, eu choraria também. — Mas sei que se ele pudesse fazer uma escolha, escolheria que certas coisas fossem destinadas a você. Eu sei que, vocês se amavam muito. Até mais do que eu gostaria...

— Chega. – interrompi. — Não quero ouvir nada disso. Você já disse o que tinha a dizer, não disse? Bom, estarei esperando por essas coisas.

Desliguei, jogando o telefone sobre a cama.

Esperei, impacientemente, até poder ouvir o soar da campainha no andar de baixo. Corri, mesmo de meias nos pés, para ver o que era. Nunca estive tão curiosa, tão aflita, louca pra saber o que era exatamente aquelas coisas na qual Helena se referia.

Era uma caixa. Pesada e grande.

Voltei a me trancar no quarto, deixando meus pais sem entender o que havia acontecido comigo após receber aquela caixa de um desconhecido. Cuidadosamente sentei na cama e coloquei a tal caixa ao meu lado e fiquei olhando pra ela por um bom tempo. Reunindo forças e coragem para abri-la e me deparar seja lá com o que for.

Deve ser importante.

Faça logo, uma voz soou no fundo da minha mente. Não seja medrosa, vamos lá. Abra. A voz insistia.

Suspirei fundo, de repente me sentia tão exausta, cansada de tudo aquilo, como se carregasse um peso nas minhas costas.

Levantei a tampa da caixa vermelha cuidadosamente, com as duas mãos, colocando ao lado. Deixando-a aberta com suas coisas visivelmente a mostra sob a pouca luz do meu quarto.

De todas as coisas que preenchiam a caixa até em cima, peguei um pedaço de papel branco. Folha de caderno. Dobrada em várias partes.

Abri, o que parecia ser um bilhete, ou uma carta.

Janeiro, 2009.

Mais um ano começou. Poderia ser só mais um ano qualquer como muitos foram antes de você aparecer, mas agora, tudo mudou. Agora que tenho você é tudo tão diferente. Melhor. Como se você, fosse pra mim, um tipo de encorajamento, uma motivação, a oportunidade de ser verdadeiramente feliz.

Pra muitos, eu sempre fui aquele garoto ideal, com a vida perfeita, cheio de amigos maravilhosos, sem defeitos, inteligente e sem razões para ser infeliz. A grande verdade, é que estão todos enganados. Eu tenho sim problemas, passo sim por dificuldades, tenho defeitos, nem sempre me dou bem como gostaria e sou falho como qualquer outro garoto da minha idade.

Mas desde que encontrei você, Hayley, não é como se eu tivesse que me lembrar disso todo o tempo. Porque você faz de mim uma pessoa que é capaz de tudo. E é isso que eu gosto em você desde o primeiro momento em que passei a olhar pra você de verdade. Você tem esse gênio difícil, o jeito espontâneo, fala o que pensa, age como acha certo, faz o tem vontade e vive como se nada fosse mais importante do que ser feliz todo o tempo. E saiba, que é exatamente isso que eu gosto em você. Gosto mesmo. Gosto porque você é tudo aquilo que nunca fui e que muitas pessoas gostariam de ser, mas assim como eu, têm medo ou receio.

Você é sempre tão invencível, tão durona e ao mesmo tempo tão sentimentalista, frágil, carinhosa. Coisas que só conseguimos enxergar em você depois de verdadeiramente te conhecer. O que você precisa é de pessoas que possam enxergar o melhor que você possa ser. E agradeço todos os dias por ter tido essa oportunidade, essa chance. Pois hoje vejo que você é a melhor pessoa que já conheci. Diferente de tudo e todos e apesar dos defeitos, das loucuras, você é simplesmente você mesma e é por isso que te amo e te aceito cada vez mais.

E seus os nossos tantos planos não chegarem a onde a gente sempre quis chegar juntos, eu espero do fundo do meu coração, que você encontre alguém que te compreenda, que te aceite, que te enxergue e que possa ver o quão importante você é.

Por nada nesse mundo eu gostaria de te soltar. Mas se isso for preciso, em algum momento de nossas vidas, eu o farei. Vou seguir enfrente como tem que ser, mas ainda assim, quero estar por perto para ter a certeza que alguém será capaz de te fazer feliz de verdade. Porque é isso que você merece: alguém que não tenha medo do que você é, alguém que não te culpe ou te recrimine pelo que é. Alguém que sem precisar de esforços faça com que você se sinta extraordinariamente importante e especial, alguém que sem precisar pedir faça de você uma pessoa ainda melhor do que já é.

Só não se esqueça: onde quer que eu esteja, terei sempre orgulho de quem você é. Pra mim, você é muito mais significativa do que pode imaginar. Antes de você, nada mais importa. E depois de você, eu não serei nada além de alguém que te amou profundamente.

Brandon Harrison

Antes mesmo de terminar de ler a carta eu estava me despedaçando em lágrimas. Mas nada me faria parar de ler.

Não posso ao certo medir o tamanho da minha emoção ao ver outra vez a bela caligrafia de Brandon. Foi como se ele estivesse ali, de alguma forma, lendo pra mim cada palavra escrita com convicção, como se pudesse cravar no meu coração cada declaração feita.

Porque ele nunca me entregou aquela carta?

Não tem porque pensar nisso agora. – disse a mim mesma, deitando sobre a cama com a carta pressionada contra o meu peito, enquanto as lágrimas ainda escorriam de meus olhos. A dor que sentia era tão forte que por um momento acreditei que pudesse morrer também junto com ele. Queria poder morrer, só pra encontra-lo. Queria poder não ter que me sentir assim, tão pequena, tão destruída, sem proteção, sem esperanças de que as coisas poderiam melhorar.

Já faz tanto tempo, mas depois da carta, parece que foi ontem que ele morreu e me deixou pra trás. Porque um garoto como ele, tão perfeito aos meus olhos, por mais que dissesse que não, teve que morrer tão cedo?

Nada parecia justo.

Será que algum dia eu encontraria um garoto como Brandon? O primeiro garoto que olhou pra mim de verdade e me amou por tanto tempo de uma maneira que nem eu mesma acreditava ser capaz de amar. Claro que não! Claro que jamais encontrarei outro garoto como ele. Só se ama de verdade uma vez na vida. E minha chance já se foi. Na verdade, eu nem quero comparar outro garoto com Brandon. Brandon é Brandon e outros são apenas os outros. E será sempre assim. Meu coração sempre terá espaço só pra ele. Não cabe mais ninguém e é assim que deve ser.

— Hayley? – mamãe bateu a porta. Parecia preocupada. — Tá tudo bem ai querida? Tem um garoto lá em baixo. O sobrinho de Alexander. Ele está esperando por você minha filha.

Jesse.

Por um momento, pensei na possibilidade de pedir a minha mãe que dissesse a Brandon que eu não iria por mais desapontado que ele ficasse. Ela teria que inventar uma desculpa qualquer. Perdi completamente a vontade de sair de casa. Queria apenas ficar ali, pelo resto da noite, vendo o que tanto havia naquela caixa que deveria ser minha, mas nunca foi, e só agora estava sendo. Parecia tarde demais.

— Mãe, peça pra ele me esperar!

Tomei um banho quente rapidinho e coloquei qualquer roupa de frio sem me importar muito com a minha aparência. Para não ter que me atrasar ainda mais, apenas joguei o cabelo pra trás e amarrei.

— Você demorou. – ele sorriu ao meu lado, já descíamos os poucos degraus da varanda de frente a minha casa.

Caminhávamos silenciosamente pelas calçadas pouco movimentadas no centro da cidade. E só agora, desde que voltei pra casa há uns quatro dias atrás, reparei que tudo estava muito bem decorado com os enfeites de natal: pisca-piscas, papai-noel, guizos, arvores de natal e renas.

Admito que o natal seja um dos dias comemorativos mais bonitos do ano. Tudo parece combinar perfeitamente com a neve.

— É aqui. Vamos entrar.

As portas e janelas são todas em vidros do chão até o teto. O lugar tem um pé direito muito alto. É tudo em madeira e tons alaranjados e marrons. As mesas são circulares cobertas por panos finos e brancos. Há lareiras pelos quatro cantos. Ali dentro é tão reconfortante e quente. Há pouca iluminação. Sobre cada mesa há um arranjo de flores e velas. Além de taças, talhares de prata e pratos de porcelana.

Romântico, casual e discreto.

Eu nunca estive ali. E nem sei como nunca antes reparei nesse restaurante sendo que morei a minha vida toda aqui nessa cidade.

O garçom, bem arrumado, ou seja lá o que é esse homem, tira gentilmente o meu sobretudo assim como o casaco de Jesse e nos leva até uma das mesas vazias em um canto do lado direito.

Jesse afasta a cadeira pra eu sentar. Um ato verdadeiramente de cavalheirismo assim como abrir a porta do carro. Brandon foi o único garoto que me tratou assim. Por mais estranho que isso possa parecer nos dias de hoje, um ato cavaleiro é muito apreciado por qualquer mulher.

— Estranho. Nunca estive aqui.

— Esse lugar sempre existiu. – Jesse falava baixinho, olhando diretamente para mim. Sua voz era como uma bela melodia.

Todos se comunicam razoamento baixo a nossa volta. Então percebo que há um senhor sentado atrás de um piano tocando música clássica.

— Ficou fechado por seis anos. Até ser vendido e reformado pelo novo e atual dono. Ele é italiano. E como eu sei? Você deve está se perguntando. – assenti, sorrindo. — Eu e meu tio conversamos muito.

Alec certamente tem um bom gosto. Sua mulher deveria ser tratada como rainha. O sonho de toda mulher.

— Se eu soubesse que viríamos jantar aqui, teria pelo menos vestido algo mais apresentável. Não que eu tenha um vestido longo ou um salto. Mas algo mais descente do que isso. – olhei pra mim, toda desleixada.

— Você está linda! Como sempre. – Jesse tocou a minha mão por cima da mesa. Reconfortando-me.

Fiquei sem graça pela maneira como ele me olhava tão docemente como se estivesse analisando cada centímetro do meu rosto. Ao abaixar o olhar, percebi que sua mão vinha de encontro ao meu rosto e em questão de segundos senti o seu toque. Jesse, um tanto ousado, desprendeu meu cabelo, fazendo-o cair livremente sobre os ombros.

— Bem melhor assim.

Minhas bochechas queimaram. Corando. Sorte minha o restaurante ter tão pouca luz. Não queria que meu rubor me entregasse.

— Já sabem o que vão pedir? – o mesmo homem que nos recebeu anteriormente voltou a se aproximar da mesa com um bloquinho de notas.

Olhei para o Jesse. E ele mesmo quem fez os pedidos.

— Você tem grana pra pagar tudo isso? – perguntei, não de maneira rude. Apenas preocupada. Tudo ali parecia tão fino e caro.

— Claro que sim, Hayley. – ele riu, de maneira reconfortante. — Se não nem teria te trazido até aqui.

Os pedidos não demoraram muito e saboreei aquela comida com muito prazer. Comida italiana. E realmente estava tudo muito gostoso, delicado, fino e com um gostinho irresistível de quero mais. Mas me contive. Bebendo um pouco do meu suco de laranja com pedras de gelo.

— Eu não queria ter que se chato, tocando no assunto – Jesse depositou sua taça com água gelada suavemente sobre a mesa. — mas não tem como, simplesmente, deixar pra lá. Isso realmente me incomoda de uma maneira que não sei explicar. Me incomoda saber que você não está bem, ou não estava. – ele me olhou bem, com a cabeça levemente inclinada. — Você estava chorando, não estava?

— Eu? – franzi o cenho, confusa. Tinha me esquecido que horas atrás estava entre lágrimas com a carta de Brandon em mão. — Ora, pare com isso Jesse. É claro que não. Eu não estava chorando.

— Hayley... Não minta...

— Jesse... Por favor. Vamos deixar isso pra lá. – abri um sorriso formidável, dando um ultimo gole no meu suco. — Não estrague essa noite. Está tudo tão... Encantador. Por um momento posso esquecer-me de tudo...

Jesse estendeu o braço para que eu pudesse me agarrar a ele, na tentativa de nos proteger do frio, quando já voltávamos para casa discutindo sobre preferencias por comida.

Quando chegamos enfrente da minha casa senti uma sensação estranha ao lembrar o que me esperava em meu quarto: a caixa de Brandon. Olhei pra casa, olhei pra Jesse e olhei para o outro lado da rua, completamente vazia, me sentindo muito perdida. Não queria ter que entrar em casa e enfrentar a minha realidade. Ainda não me sentia preparada para dá de cara com o restante das coisas de Brandon. Lágrimas inesperadas apareceram no canto dos meus olhos.

À noite com Jesse, o jantar no centro, havia sido maravilhoso. Por um momento eu pude esquecer-me de tudo, mas agora ali, de frente pra realidade, poderia tudo, menos enfrenta-la. Não sozinha.

— Então é isso. Chegamos. Está entregue em casa.

Jesse parecia divertido. Nem percebeu que eu estava prestes a chorar. Não conseguia olhar pra ele e ver seus olhinhos me encarando.

— Posso ficar com você? – perguntei em voz baixa. Sentindo uma tremedeira tomar conta das minhas pernas. — Essa noite. Em qualquer lugar. Fica comigo? Sei lá. Pode se aqui fora mesmo. Só fica.

Ele me olhou sem conseguir entender minhas paranoias.

— Está tarde, Hayley. Você precisa entrar.

— Não agora. Se você não quiser. É claro.

Jesse olhou para os dois lados da rua. Só havia nós dois ali.

— Vamos adoecer se ficarmos aqui fora. Está muito frio! – ele respirou fundo. — Tive uma ideia! Vamos lá pra casa.

— Seu tio Alec...

— Eu sei. Ele não vai gostar. Mas podemos entrar pela porta dos fundos como da ultima vez. Ficar aqui fora não tem condições. Está realmente muito frio! O que você acha?

Assenti. Segurando a mão dele enquanto atravessamos a rua até a casa de Alexander. A porta dos fundos estava trancada. Mas Jesse sabia onde estava a chave: debaixo do carpete.

— Não faça barulho. Vem. Vamos subir. – ele ainda segurava minha mão. Cada vez sentia meu coração bater mais forte.

Que loucura estávamos fazendo?

— Jesse? É você? – paramos ao ouvir a voz de Alec no andar de cima. A voz vinha de trás de uma das portas do imenso corredor. Alec deve estar em seu quarto. E ouviu o barulho dos nossos passos na escada.

— Sim tio, sou eu. Acabei de chegar. – Jesse gritou em resposta, olhando pra mim com um sorrisinho sacana. — Vou dormir. Boa noite!

— Boa noite Jesse.

Jesse fechou a porta do seu quarto assim que entramos passando a chave para tranca-la. Não fiquei impressionada ao ver seu quarto, afinal, já tinha estado ali na noite passada. E tudo estava em devida ordem.

— Só não faça muito barulho. – Jesse observou, sorrindo ao tirar o casaco preto de lã.

Ele sentou em sua cama, tirando as luvas e em seguida o tênis ficando apenas de meia. Já eu, continue parada perto da porta, sem saber ao certo porque eu estava ali, quando poderia estar em casa vendo as tantas coisas que Brandon havia deixado pra mim.

— Você não vai me dizer por que não quis entrar em casa, vai? – ele me encarou. Esperando por uma resposta.

— Não. Coisas minhas. – eu consegui sorrir, para quebrar a tensão. Indo em direção à cama dele e me sentando ao seu lado.

— O que vamos fazer? Pra passar o tempo. Você tem alguma sugestão. Porque eu não faço a mínima ideia.

Há tantas coisas para se fazer. Mas naquele momento, eu não queria fazer nada, além de receber um carinho, um conforto.

— Não vamos fazer nada. Simplesmente nada. – sorri, parecendo meio louca. Mas Jesse não viu problema nisso. E deitou-se sobre sua cama, de lado, encostado na parede.

Sua expressão era um tanto convidativa. Assim, me vi na liberdade de deitar com ele. Um de frente pro outro, há poucos centímetros de distancia. Com os olhares fixos um no outro. Calados.

— Você quer dormir? Parece cansada. – ele falava baixo, de maneira suave. Jesse levou a mão até o meu rosto e começou a mexer, de forma natural, no meu cabelo próximo a orelha.

— Não é um cansaço qualquer. Estou cansada psicologicamente. Só isso. – sorrimos um para o outro. Por sorte, a janela estava fechada, impedido a entrada do frio. Com as cortinas a cobrindo. E a luz do quarto apagada com apenas um abajur ligado ao lado da cama.

A pouca luz do abajur refletia nos olhos claros de Jesse, deixando-os claro assim com a textura dos seus cabelos dourados.

— Quando eu era pequeno, antes dos meus pais morrerem, minha mãe passava horas comigo em meu quarto, dividíamos a cama. Ela mexia nos meus cabelos e começava a conversar comigo até que eu pudesse pegar no sono. – era exatamente como ele estava fazendo comigo.

— Sua mãe, deve ter sido uma mãe incrível. – foi tudo que consegui dizer. Pensando na maneira como ela tratava Jesse, como se ainda fosse um bebê, conversando com ele, fazendo carinho até ele dormir. — Ela também te contava historinhas?

— Muitas. – ele sorriu distante, acho que pensando nela. Senti um aperto no meu coração. Mas ele parecia tranquilo ao tocar no assunto, então não vi problema em puxar conversa. — E também tocava pra mim ou cantava. Ela era maravilhosa! Exatamente como sua mãe deve ter sido ou ainda é pra você e o seus irmãos.

— Minha mãe nunca foi o tipo de mãe como nos comerciais da televisão. Ela nunca contou histórias para que eu pudesse dormir como muitas mães fazem com os filhos. Mas eu também, nunca fui o tipo de criança que parava pra ouvir uma boa história pra dormir. Então não a culpo totalmente por isso. Eu também tenho uma parcela de culpa.

— Queria te ter conhecido antes, Hayley. – ele ainda acarinhava meus cabelos. Senti os olhos cada vez mais pesados. — Queria que você tivesse tido a chance de conhecer minha mãe também. Meus pais.

— Teria sido muito bom. – eu não mentia, sentia mesmo, uma compaixão enorme dentro de mim por Jesse e seus pais. Eles deveriam ter sido maravilhosos com um filho exemplar.

— Minha mãe dizia que quando eu encontrasse a garota certa pra mim saberia no mesmo instante. E que por nada do mundo eu deveria deixa-la escapar. Mas independentemente disso, ela dizia, que eu deveria tratar todas as garotas como se fossem uma flor: delicada e sensível. E que se eu pudesse, evitaria partir o coração delas, ainda mais se o coração de uma delas estivesse comigo. Que eu deveria ser justo todo o tempo, mesmo que amasse apenas uma delas. Pois não há nada pior no mundo que uma mulher ferida e pior ainda, ser o causador de tantos danos.

— Sua mãe tinha razão. – eu sorri. Peguei-me pensando qual fora a aparência da mãe de Jesse. Ela deveria ser linda! — Mas você – pensei na melhor maneira de formular aquela pergunta. — acha que já encontrou a garota certa? A qual sua mãe se referia.

Ele não respondeu de imediato. Mas deixou escapar um lindo sorriso. E por alguma razão, tive receio da resposta para a minha pergunta. Senti um leve tremor percorrer por meu corpo.

— Ainda não ser dizer. Quando ela disse que no mesmo instante eu saberia, caso encontrasse, acho que ela se enganou. Porque eu estou muito confuso. – Jesse fez uma careta.

Ele estaria confuso em relação à Alexa?

— A confusão não é uma boa resposta. Acho que sua mãe tinha razão, mas se você se sente confuso, quer dizer que ainda não encontrou a garota certa.

— Acho que você também está enganada. Eu só ainda não sei bem o que responder. – Jesse desviou o olhar. Fiquei olhando pra ele, admirando cada traço bem desenhado do seu rosto iluminado pelo abajur. — Eu só espero que eu tenha a resposta em breve e que essa garota confie em mim o suficientemente para entregar seu coração a mim. Eu cuidarei dele mais que a própria vida. Jamais partirei seu coração. Serei justo todo o tempo e eu espero que ela saiba disso. Que confie em mim. Pois eu nunca seria capaz de causar qualquer dano a ela. Nunca.


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Notas finais do capítulo

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