Do Lado De Dentro escrita por Mi Freire


Capítulo 11
Afogamento




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"O mundo está cheio de coisas óbvias que ninguém jamais observa."

Pude suspirar aliviada quando elas terminaram de falar.

Não tinha nada a ver com o roubo, pelo contrario, elas queriam comunicar o planejamento da grande festa fantasia de Halloween que aconteceria dali a um mês no salão de festa do internato para todos os alunos presentes. A galera ficou tão empolgada que não se falava em mais nada além dessa festa.

Foi dito que uma lista ficaria no mural lá no pátio, para que assim que cada um decidisse qual fantasia usaria, escrevesse na lista, que eles dariam um jeito de trazer os trajes até nós. Até porque não se é permitido a sair dessa prisão sem autorização dos responsáveis.

— Já pensou na sua fantasia Amy? – Natalie mal conseguia conter a animação. Estávamos em nosso quarto, depois da aula. — E você Hayley?

— Eu ainda não. – Amy deu de ombros, sem ânimo.

— Eu pensei em um anjo do mal, ou uma exterminadora, bruxa ou uma guerreira. O que você acha Nath? E você Amy? – sorri largo.

— Ah não, Hayley. Não gostei. Credo! – Natalie é um tanto fresca, confesso. Ela nunca está de acordo comigo. — Porque você não deixa, somente dessa vez eu e a Amy darmos uma ajudinha?

— Com o que, por exemplo? – perguntei curiosa.

— Uma fantasia mais feminina, talvez. Assim, você vai diferente, pelo menos por uma noite, do que você está acostumada a ser.

— Não vejo pra que. – encolhi os ombros. — É isso que eu sou.

— Tá, Hayley. Eu não estou me queixando do que você é – Nath disse sem muita paciência. — Eu gosto de você! Apenas quero... Ajudar.

— Hum. Eu posso pensar a respeito.

— Ótimo! – ela pulou da cama, batendo palminhas. — Mas não demore a decidir. O tempo é curto para adquirir as fantasias.

Ela voltou-se para Amy, muito calada e quieta.

— E você, Amy? – Natalie insistiu. — Já pensou em algo? – a morena não respondeu. Parecia muito distante. — Amy você ficaria linda de branca-de-neve. Combina com sua pele e seus cabelos. Eu, por exemplo, estou confusa entre uma dançarina de cabaré ou uma rainha de copas.

— Eu fico com a dançarina. – sugeri.

— Ótimo! Mas e você Amy, alguma sugestão? – Nath e eu encaramos Amy por um tempo. Mas ela não respondeu. Apenas se levantou e saiu do quarto sem dizer nada. — Que bicho a mordeu?

— Não faço ideia. – me joguei deitada na cama. Parando pra pensar de que forma Natalie queria tanto me ajudar na escolha da fantasia.

— Tudo bem. Depois ela me conta. Eu vou ver no que o Eric está pensando para sua fantasia. Acho que ele precisa da minha ajuda.

Ela saiu. De repente, Natalie acha que todos precisam de sua ajuda.

Encontrei Jesse na sala de música, sozinho atrás do piano.

— Ei, posso entrar?

Ele sorriu como resposta. Eu só o procurei para saber se ele sabia o porquê de Amy está tão estranha. Talvez tivesse algo a ver com a conversa que eles tiveram no final de semana.

— Desculpe te atrapalhar. – me aproximei timidamente. — Você viu a Amy em algum lugar? Ou sabe o que aconteceu com ela?

— Que Amy? – ele pareceu surpreso. — Ah. Amy sua amiga. Ah não, eu não a vi hoje em lugar algum depois da aula.

— Foi o que imaginei. – revirei os olhos, depois ri. — E ai, empolgado para festa fantasia de Halloween? Já pensou na sua fantasia? Pelo visto, a festa não vai ter nada a ver, diretamente, com o Halloween, pelo o que estou escutando pelos corredores quanto as fantasias.

— Eu sabia que não ia dá certo. – ele riu. — Não é todo mundo que quer se vestir de Drácula, bruxos, múmias, entre outros. – ri também. — Eu nem parei pra pensar na minha fantasia. Mas vou me decidir logo.

— Ótimo! – fiquei sem saber mais o que dizer.

— E você, pensou em algo? – ele perguntou, ainda sentado atrás do piano e me olhando com um sorriso bobo.

— Na verdade, vou deixar que Natalie, minha amiga, tome conta disso pra mim. Já que ela faz tanta questão.

Sorrimos. Sem jeito. Não sei. Algo ficou diferente. Acho que foi depois de todas as revelações que ele me fez naquela noite sobre seus pais. De repente me senti tão intima e ao mesmo tempo tão desconectada.

— Eu vou indo. Vou te deixar tocar em paz. Já que você não gosta de se visto tocar. – soltei um risinho. — Até mais tarde, Jesse.

Não encontrei Amy, nem saberia mais por onde procurar. Estava mesmo preocupada. Apeguei-me a ela como nunca me apeguei antes a nenhuma outra garota da minha idade. Acho que finalmente posso nos considerar amigas. Não tão intimidas. Mas amigas.

— Ei Nath – interrompi os amassos entre ela e Eric. Sorri afetada sem me importar. — Pode escolher minha fantasia.

Ela me abraçou saltitantes, eu tive que corresponde-la.

Sentei com Tyler perto da piscina. Ele acabara de sair da água para ficar comigo e estava incrivelmente sexy com o corpo molhado.

— Como você é grudento! – resmunguei entre risos, enquanto ele me abraçava na tentativa de me molhar um pouco.

Jake nos interrompeu, ainda dentro da água, com o queixo sobre a quina da piscina. Ele tem mais ou menos o mesmo porte físico de Tyler: de esportista. A pele morena-clara, cabelos pretos e curtos, olhos esverdeados, dentes a mostra e completamente brancos e um brinco brilhante em uma das orelhas.

— Ei Hayley, sabe qual vai ser a minha fantasia para festa? – como eu disse não se fala em outra coisa. — Vou de lobo-mal e azarar todas as gatinhas possíveis. Vai ser uma noite e tanto!

Tyler e eu rimos. Ele passa o braço por meus ombros e me puxa.

— Querem algo para beber? Tá muito calor! – Tyler se levanta, ajeitando a bermuda branca no corpo ainda molhado. Detalhe: ele está sem camiseta. — Vou pegar uns sucos.

Jake acena e dar um mergulho desaparecendo dentro da piscina funda com os muitos outros presentes naquele fim de tarde.

— E ai, Hayley. – Alana passa por mim com um sorriso provocativa e suas amigas igualmente a ela. — qual vai ser a sua fantasia? – não ouso responder, se não a jogo dentro da água.

Ela está de biquíni, mostrando seu corpo atraente.

— Já sei. – ela ri com as amiguinhas antipáticas. — Talvez seja uma capetinha? Hum. Ou pode ser uma gatinha selvagem? Ou quem sabe até uma vampira? Estou confusa Hayley e bastante curiosa.

— Sai fora daqui. – levanto, estufando o peito igual a um galo de briga. Quero intimida-la e acho que funciona por sua reação. — Agora!

Ela se vai, toda risonha.

— O que é que aquela garota quer com você? – Tyler volta, entregando-me um copo com suco de limão. — Quer te tirar do sério? Quer eu faça algo contra ela? Posso resolver isso pra você.

Acho bonitinho que ele esteja preocupado, mas recuso.

— Não, obrigada Tyler. Eu sei me virar.

Fui dormir tarde a noite passada, virei à noite mexendo na droga daquele computador velho e lento do colégio. O que está em nosso quarto. Revendo umas coisas antigas que deixei pra trás. Acho até que a lentidão da conexão a internet é lenta por pura pirraça aos alunos, já que esse internato é tão bem conceituado pelo país.

Dormi a primeira aula inteira. Na segunda bem que eu tentei, mas fui atormentada até perder o controle.

Alana me cutucava na intensão de me tirar do sério, com ela bem sabe fazer. Mas de uns dias pra cá faz com mais frequência. E eu a ignorava com baixos resmungos e incomodo.

— Professora, não consigo me concentrar. – abri os olhos, mesmo com a cabeça ainda baixa entre os braços, só para ter certeza de que estava ouvindo bem. — a Hayley está dormindo e ressonando alto...

Não me virei a tempo de dar uma braçada na cara dela, a professora de biologia, foi mais rápida e me encarou friamente quando levantei a cabeça e percebi que todos me olhavam.

— O que foi? – perguntei, forçando um sorriso. Perguntei pra professora e não para os alunos.

— Srta. Collins, saia já da minha aula! – ela não precisou pedir duas vezes e sai. Sem me importar se ela comunicaria ou não a direção por meu mau comportamento.

Alana, mais cedo ou mais tarde, me pagaria.

Deitei-me no gramado vazio do jardim. Um dos meus lugares favoritos em todo o internato, depois da sala de artes. Deite-me de baixo do sol - que não estava tão forte - ainda com sono, apenas fechei meus olhos e tentei voltar a dormir.

Alguém pigarreou.

— O que faz aqui Amy? – perguntei, ao abrir meus olhos e me deparar com ela de pé na minha frente fazendo sombra.

— Fui à biblioteca pegar uns livros para o professor de geografia e te vi aqui largada no meio do mato. Tá tudo bem?

— Eu quem te pergunto. – sentei-me, meio zonza. — O que aconteceu com você ontem? Porque não queria conversar?

— Ah Hayley, não é nada demais. É que, desde que conversei com Jesse, há poucos dias atrás, não consigo parar de pensar nele. Ainda mais que o normal. E isso meio que assusta. Entende?

Pelo visto ela não estava conseguindo lhe dar com esses lances de amor ou paixão. Seja lá o que de fato ela sente por Jesse.

Assenti em concordância.

— Vou voltar pra lá. Você vem?

— Só quando bater o sinal.

Esperei por mais dez minutos. A próxima aula era de Artes e eu não perderia por nada, nem pelo sono.

Infelizmente a professora Eliza não passou nada além de uma grande discurso a introdução da próxima matéria dada.

Ficamos sem desenhar ou pintar.

Os dias se passaram rapidamente. Meu ódio por Alana só estava aumentando a cada dia. Dela e das amigas. Só não tinha esmurrado a cara dela ainda, porque não queria se mandada de volta pra casa. Logo agora que meu plano em ajudar Amy estava dando certo. Algumas outras vezes ainda consegui fazer com que ela ficasse sozinha com Jesse conversando. E a cada dia, depois da conversa entre eles, ela parecia ficar mais abobalhada.

— Jesse! – gritei por ele, logo depois de vê Alexa sair de perto dele após mais uma conversinha intrigante entre eles.

Estávamos todos juntos na beira da piscina conversando atoa, os amigos de Tyler e os meus, que na verdade se resume em Amy e Nath.

— Quer jogar com a gente? Vamos jogar basquete aquático. – eu sorri contente. — Que tal?

Eu não sei nadar, mas vamos jogar no raso, então tudo bem.

— Obrigado pessoal. – ele sorriu timidamente, sem olhar pra ninguém especifico. Seus olhos claríssimos estavam semicerrados. — Mas não posso. Não agora. Vou ensaiar com a banda. Até a próxima.

Ele se afastou, mesmo assim resolvemos jogar, só pra passar o tempo de mais um dia normal.

No final daquele mesmo dia, fiquei sozinha ouvindo música no meu Ipod lá fora no jardim. Contemplando mais uma noite calorosa e estrelada.

— Me desculpe por hoje mais cedo – ele sorriu graciosamente. — por não poder jogar com vocês. Eu tinha mesmo que ensaiar.

— Tudo bem. – sorri de volta, feliz por vê-lo. — Haverão outras oportunidades.

Ficamos em silêncio, o tempo suficiente para Alexa se aproximar e chamar por Jesse.

— Espere ai – ele acenou, voltando-se de novo para mim antes de ter que ir pra perto dela.

— É impressão minha ou ela não gosta de te ver perto de mim? – perguntei na lata, sem rodeios. Louca pra saber o que ele acha sobre isso.

— Deve ser impressão sua. Não acho isso. – Jesse sorriu mostrando seu aparelho bucal. — Tenho que ir agora. Boa noite.

Surpreendentemente, antes de ir, ela beijou meu rosto.

Não sei o que houve comigo aquela sexta-feira à noite, mas acabei tendo pesadelos e gritei alto transpirando muito. Amy me acordou assustada. Levantei-me para beber água e pegar um pouco de ar.

Todos estavam dormindo. O internato estava muito calado e sombrio aquela madrugada. Suspirei fundo. Ouvi risadas não muito longe dali e avistei Tyler com um grupo de amigos jogando baralho.

— Tyler! – gritei, apenas para acenar e dar um oi. Ele acenou de volta todo sorridente. Mas acabou vindo até mim, correndo.

— O que aconteceu? – ele passou uma mecha do meu cabelo desalinhado por trás da minha orelha. — Não consegue dormir?

— Tive um sonho ruim. Nada demais. – forcei um sorriso, tentando parecer o mais convincente possível para ele não se preocupar.

Tyler me olhou de baixo pra cima.

Estou de pijama. Um shortinho branco de malha fria com detalhes pretos e uma blusinha de alça. Sem sutiã. Por sua reação, ele gostou do que viu. Senti-me como se estivesse nua.

— Não quer dormir comigo essa noite? Eu já estava indo mesmo ir me deitar. Está ficando tarde.

— Ora Tyler, não sou ingenua como as outras. – rimos. — Você não quer dormir realmente. Você quer outra coisa. Mas isso eu não posso te dá.

Com a mão em minha cintura, ele me puxou pra junto de si.

— Eu sei. Só sugeri mesmo por sugerir. – ele soltou um risinho. — Na esperança que você mudasse de ideia. Dormir comigo é bem melhor que voltar a ter pesadelos.

— Pode até ser. Mas não posso. – ergui a ponta do pé para beija-lo no lábios. — Sinto muito ter que decepciona-lo. Vou voltar pro meu quarto.

Antes, ele me beijou calorosamente apertando seus dedos na minha pele nua, quase me fazendo mudar de ideia.

O que as pessoas mais sabem aproveitar nesse colégio são as piscinas em dias de sol como esses. Elas passam o dia inteiro ali como se não precisassem de mais nada.

De longe observo.

Alana passa por mim, encaro-a provocativa. Ela carrega consigo um sorriso malicioso. E quando dou por mim, sou empurrada para dentro da piscina.

Lembrando outra vez: eu não sei nadar. Nunca aprendi e a ultima pessoa que se dispôs a me ensinar foi Brandon. Mas ele morreu.

Ela me jogou justamente na parte funda de uma das piscinas mais próximas. De roupa e tudo. Não sei se ela sabia que eu não sabia nadar. O golpe foi dos mais baixos.

Cheguei ao fundo da piscina com os olhos abertos pude ver as perninhas de outros alunos movimentando-se por baixo da água. Com um único impulso, bati meus pés no fundo e tentei voltar pra cima. Na superfície vi que Alana não estava mais ali. Bati meus braços na tentativa de salvar a minha vida. Mas acabei voltando a afundar.

Tive a impressão que a água entrava em meus pulmões. Já não conseguia segurar a respiração e acabei soltando-a. Meus olhos se fecharam e em questão de segundos, tudo acontecia muito rápido, perdi todos os meus sentidos.

Não enxergava nada além da escuridão.

Pronto! – pensei comigo mesmo – vou acabar morrendo aqui. Nessa piscina, por causa daquela vaca.

E isso não me pareceu justo. Não seria um fim muito glorificante. Se é que os fins podem ser bons.

Senti que estava mesmo morrendo aos poucos. Sem saídas, sem mais nada que eu pudesse fazer para reverter aquela terrível sensação de afogamento. Desejei que Alana estivesse ali em meu lugar.

Pronto. Acabou. Morrerei.

De repente, fui "teleportada" para outra dimensão. Ou é o efeito colateral da morte ou eu estava delirando ainda viva. Vi-me em um túnel imenso e não sabia para onde ir.

Pisquei diversas vezes tentando sair dali. Mas acabei vendo o que eu já não tinha mais esperanças em ver: Brandon. Bem diante dos meus olhos. Ele não sorria e nem nada. Sua expressão de pavor me preocupada.

Porque ele não estava feliz por mim?

Não havia felicidade maior em reencontrá-lo depois de tanto tempo.

Mas porque só eu estava feliz por isso?

Não conseguia entender. Tentei me aproximar. Mas com um gesto grosseiro ele me impediu. Como se pedisse para mim não dar mais nenhum passo a frente. Tudo que eu queria era no mínimo um abraço. Com isso, eu quis chorar. O que aconteceu com o meu Brandon?

— Hayley, volte. Não desista. Não chegou a sua hora. Volte!

— Brandon – vi ele sumir diante dos meus olhos. Aos poucos. Como fumaça. — Não! Por favor, não me deixe. Eu quero ficar aqui com você.

Comecei a chorar descontroladamente.

— Brandon, por favor, eu preciso de você. Não vá! Não agora! Eu só quero poder te olhar por um momento. Eu sinto tanta a sua falta!

— Hayley, não. Por favor. Não insista. Apenas resista.

E ele sumiu.

Depois disso, depois dessa grande decepção, não consegui ver nada além da escuridão. Perdi-me no escuro e me afundei em um túnel sem fim.

Não sei em que momento depois do incidente, acordei e voltei a abrir os olhos. Olhei em volta e me vi em um quarto pequeno e branco. Com o mínimo de objetos possíveis. Um pouco mais afastada dali, estava Amy e Nath cochichando algo.

— Hayley! Oh, Hayley. Você acordou! – e as duas vieram para mais perto, para poder me ver. Não entendi nada.

— Parem com essa melação! – resmunguei, na defensiva. — Onde é que eu estou? O que significa isso aqui?

— Hayley, você está na enfermaria. Você se afogou lá fora. – Amy começou a chorar com as mãos no rosto. — Pensamos que você iria morrer. Oh Hayley, eu senti tanto medo de te perder.

Oi?

— Amy, não a assuste. – Natalie afastou Amy de perto de mim. — Hayley, você se afogou. Foi isso. Mas foi salva a tempo. Porém inconsciente, mas com vida. E te trouxeram pra cá a tempo.

Consegui me lembrar de tudo. Especialmente do exato momento em que Alana me empurra na piscina. Com seu sorriso diabólico.

Levanto-me atordoada. Cheia de energia. Pronta para acabar com ela mesmo que eu tenha que voltar para casa por isso. Ela me paga!

— Não, mocinha. Você não pode se levantar. – umas das enfermeiras surgem do nada, me impedido. — Não agora.

— O quê? – arregalei os olhos, enquanto ela me colocava de volta deitada naquela cama horrível, junto daquele cheiro horrível de... hospital. Eu nunca fui muito fã de hospital. É tudo tão horrível. — Mas por quê?

Ela ignorou as minhas perguntas.

— Nós já avisamos seus pais sobre o ocorrido.

— Ah, não!

Passaram-se horas. Não pude sair dali e nem consegui dormir outra vez. Mas vieram me trazer uma sopa horrível pra comer. É claro que só consegui engolir uma colherada no máximo. Amy e Natalie já não estavam mais ali, tiveram que ir embora a pedido das enfermeiras. E eu fiquei sozinha, completamente entediada e me sentindo muito bem, apesar das enfermeiras dizerem que não. Elas não acreditavam que eu estava bem.

— Vi te ver princesa! – Tyler sorriu, beijando minha testa. — Eu fiquei muito preocupado, Hayley. Quase morri do coração quando soube.

— Não exagere Tyler. – eu ri. — Que horas são agora? Porque você demorou tanto?

— São oito da noite. – ele verificou no relógio de pulso. — Desculpe. Eu estava com o time de basquete. O treinador nos convocou.

Ele ficou ali por mais dez minutos tagarelando sem parar sobre o treino de basquete daquela tarde enquanto eu quase morria afogada. Mas uma das enfermeiras, todas muito chatas, pediram para que ele se retirasse. Antes de sair, Tyler me beijou.

Com os medicamentos acabei dormindo por muito tempo. E só acordei no outro dia bem tarde. A enfermeira disse que já eram dez da manhã. Fiquei imaginando qual era a verdadeira situação da minha aparência àquela altura. Deveria estar bem mais assustadora que o normal.

— Ei, posso entrar? – Virei-me rapidamente para ver quem era. Para minha terrível surpresa. Eram meus pais. Minha mãe.

— Já entrou. – deitei de ombros. Mamãe se aproximou e beijou minha testa em gesto de carinho e solidariedade. — Oi querida.

— Oi Hayley. – meu pai, mais cheinho do que eu costumava lembrar, foi mais seco ao cumprimentar. Não esperava por mais.

— Vocês não vão me levar de volta pra casa, vão?

— Não Hayley – mamãe riu, passando a mão em meus cabelos. E dando uma ajeitadinha. Agradeci internamente. — Está tudo bem querida?

Ela não deu tempo para que eu respondesse.

— Pelo visto você está mesmo gostando aqui. – ela sorriu. — Eu disse que gostaria. – mas ela logo mudou de expressão. — Onde é que seu irmão estava na hora do acidente? Ele deveria ter estado por perto, para te proteger.

Limitei-me em dizer que Oliver não está nem ai pra mim. Há dias eu não vejo desde a nossa ultima conversinha.

— Estou bem melhor mamãe. Não foi nada. – tentei sorrir. — Apenas um susto. Já passou. Estou pronta pra outra.

— Eu sei Hayley. – ela riu, exagerada. — Eu sei.

Mamãe e papai começaram a me alertar sobre todos os cuidados que eu deveria ter tomado antes de me aproximar da piscina, já que não sei andar. Tiver que escutar a tudo pacientemente calada.

— Nós conversamos com o garoto que te salvou. – arregalei meus olhos, surpresa. Dessa eu não sabia. — Ele é um amor de menino.

— Quem?

Eu havia me esquecido de perguntar o mais importante: quem me salvou? Eu que não me salvei. Não havia possibilidades. Estava morrendo de verdade. Sem forças nenhuma.

— Eu não faça a mínima ideia de quem ele seja. Nunca o vi antes e esqueci seu nome. Mas é um lindo garoto! Sei que ele está lá fora, te esperando em algum lugar.

Mamãe e papai se foram meia hora depois, pra minha sorte. Já não aguentava mais tanto falatório. Eles foram legais em se preocupar e tudo mais, mas sinceramente, não tenho muita paciência.

Sou liberada às quatro da tarde. Não sei por que não fui antes se estava realmente me sentindo melhor. Como se nada tivesse acontecido.

Encontrei o quarto vazio. Tomei um bom banho quente, apesar do calor. Era como ainda poder sentir o gélido da água entrando por meus pulmões. Foi um susto e tanto. Uma sorte de sobrevivido. Troquei de roupa e penteei meus cabelos já desbotados.

Cruzei com Jesse no caminho até o refeitório. Eu precisava muito comer algo descente. Aquela sopa da enfermaria me dava calafrios.

Jesse me abraçou. Muito rapidamente. Mas abraçou.

Fiquei sem reação.

— Pelo visto está bem melhor. – ele sorriu. — Está indo até o refeitório comer algo? Posso ir com você?

Assenti. Sentamos na mesma mesa. Apesar dele não pegar nada pra comer. O refeitório estava tranquilamente vazio.

— Jesse – de repente algo me veio a cabeça. — Você sabe quem foi que me salvou?

Ele ficou sem reação. Completamente travado. Nem piscava e eu realmente fiquei assustada. O que aconteceu? Eu disse alguma coisa de errado? Então ele piscou e sorriu doce como tantas outras vezes, voltando ao seu "normal".

— Não te contaram? – ele riu. Mas logo parou. — Fui eu. Eu quem te salvei ontem. Estava passando por ali, quando ouvi os gritos de Amy. Ninguém parecia disposto a ajuda-la. Como se não acreditassem no desespero dela. Mas algo em sua voz me fez ir até lá ver o que era. Quando dei por mim, era você ali, se afogando, perdendo os sentidos. Então, sem pensar duas vezes me joguei na água e te salvei.

— Ah – mordi os lábios inferiores. — Então era de você que minha mãe estava falando hoje. Você a conheceu, não foi?

— Sim. Margareth. Ela é uma boa mulher, Hayley. Você parece um pouco com ela. Conheci seu pai também, Bruce. Eles realmente se importam com você. Sorte a sua.

Engoli em seco. Sem conseguir imaginar o quanto sentia falta de seus pais e o quanto ele ainda sofria por isso.

— Não importa. – segurei sua mão, parando de comer. Sentindo sua temperatura. — Obrigada Jesse. Você salvou a minha vida.


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