Começa a chover por volta das três horas da tarde, e eu, Kristin e Mack temos que voltar da praia correndo, com nossos biquínis, porque o céu escurece em cinco minutos, e elas ainda estavam dentro da água quando as gotas começaram a cair.  Minha irritação vai embora quando Mack começou a falar comigo na casa, depois que eu e Perry voltamos, porque ela estava mais silenciosa e quieta, menos espalhafatosa, e eu lembrei outra vez porque gosto da minha irmã. Mas agora, quando a gente volta, estou irritada. Ela está toda saltitante e feliz e eu me envolvo na minha irritação como se fosse um escudo contra a felicidade dela.

-Qual é o seu problema, Em? -Ela pergunta,  enquanto escutamos a chuva lá fora. 

-Nada.

-Eu sei que tem alguma coisa.

-Vai tomar banho, Mack. -Tento dizer gentilmente, porque ao mesmo tempo que quero que ela saiba que eu estou com raiva, não quero mostrar a ela que eu estou com raiva.

-O que aconteceu? -Ela me olha, dessa vez séria. Sem pulinhos ou gritinhos ou sorrisos. 

Então eu decido que eu não vou mostrar a ela. Vou contar a ela.

-Estou irritada, Mackenzie.

-Ah, sério? -Ela diz, sarcástica. -Por que?

-Porque você está tão feliz? Eu não entendo. É isso que está me irritando. -Ela me olha com uma cara surpresa, como se não esperasse pelo que eu acabei de falar. Eu também não esperava. Sou muito melhor mostrando raiva que falando sobre ela. Mack senta na minha cama. Kristin está tomando banho no banheiro de fora. 

Minha irmã está molhando toda minha cama, mas não tenho tempo pra pensar nisso.

-Em, eu estou fazendo tudo isso por você. -Sento na cama de Kristin, agradecendo por minhas roupas estarem secas.

-O que quer dizer? 

-Eu estou sendo feliz por você. -Ela responde, óbvia. 

-Mas eu não quero que você seja feliz. -O.K. Escolha de palavras erradas. Ela me olha incrédula, e eu me corrijo. -O que eu quero dizer não é isso. É óbvio que eu quero que você seja feliz... só... não precisa mostrar toda hora. É como se nada de ruim acontecesse com você. É como se nada te atingisse. -Não queria que minha voz saísse como uma acusação, mas não consigo controlá-la. A expressão de Mack fica cada vez mais dura. 

-Em. -Respira fundo. -Antes de eu vir pra cá, nas duas vezes, mamãe conversou comigo. Ela disse que você tinha uma tendência a absorver a tristeza de todo mundo e que eu não podia ficar triste, se não você ficaria também, e ninguém quer te ver triste. Não mais. Então eu ajo como se nada estivesse errado pra não ter nada de errado com você enquanto eu estou aqui. 

-Isso quer dizer que...

-Isso quer dizer que eu estava tentando te ajudar. -Ela diz, brava. -Me desculpe se minha ajuda te irrita. 

Mack, quando está furiosa, se parece comigo. As linhas no rosto dela aparecem porque seu rosto está tenso. Não entendo porque ela está assim, ninguém falou nada demais. 

-Mack, calma. Me desculpa. Não foi isso que eu quis dizer. Nada disso. Agradeço sua ajuda, de verdade. Você pode parar de fingir agora. -Digo, doce. Mas não ajuda. Ela só revira os olhos.

-Que seja. -Então sai. Fico encarando a parede do quarto vazio, escuto umas vozes lá fora, o som da batida da porta ainda ecoando no quarto. Não estou acostumada isso. Geralmente, são as pessoas que reagem a minha raiva. Não eu reagindo a raiva das pessoas.

Não posso deixar minha irmã se tornando uma Emerson. Saio do quarto. A senhora Kowki está parada na sala.

-Emerson, -Ela diz, lentamente. -O que você falou pra ela? 

-Eu não falei nada. -O.K. Errado. -Estávamos conversando. Ela ficou irritada. Pra onde ela foi? 

-Pra floresta. -Perry responde, do sofá, fazendo uma cara difícil, como se estivesse preocupado e com dor ao mesmo tempo.

Não entendo mais nada. 

-Floresta. -Repito, idiota.

-Sim. Dê um tempo a ela, se ela foi pra fora, mesmo com essa chuva, é porque estava com muita vontade de ficar sozinha. 

Floresta. Algo no meu coração aperta, me avisando que tem algo errado. A chuva continua caindo, forte, enquanto eu paro, congelada, tentando lembrar de algo.

A ponte Nola. A ponte está errada. Meu peito se enche de horror.

-MACK! -Grito, inutilmente, enquanto corro para fora, e as gotas ricocheteiam minha pele. Caminho pelo gramado, até entrar na floresta. Qual a probabilidade de ela entrar na floresta e ir direto para a ponte? Ela ao menos conhece o caminho? Chris já pode ter arrumado as tábuas de madeira, não é? -MACK! -Grito outra vez, tentando soar mais alto que o barulho da chuva.

Mesmo se ela for pra ponte, ela vai perceber que tem algo errado não é? Coisas não acontecem assim, com a gente prestando atenção em tudo. Se algo ruim fosse acontecer, Deus pelo menos me daria a chance de não perceber que algo ruim esteja a espreita, ele não me daria tempo para imaginar o futuro próximo quando ele ainda nem aconteceu, daria? 

Ah, Deus. Mackenzie não vai se tornar a nova Lorena e Nora. Não vão mudar o nome da ponte para o de minha irmã. Não é possível. Não posso permitir.

-MACKZENZIE! -Mais um passo. Dois. Três.

No décimo quinto, chego na ponte, respirando aliviada quando vejo ela no meio, mas viva, e estável sob a tábua de madeira. Ela se vira. -Mack! Cuidado! Escute o que eu estou dizendo! Não dê um passo! -Dou um em sua direção, pisando cuidadosamente nas tábuas alinhadas. Estou a um metro de distância, e ela pisa na frente, alarmada, sem saber o que está acontecendo. Então a tábua cai, e minha irmã escorrega. Deixando o pânico de lado, seguro na sua mão, com uma rapidez impressionante e consigo puxá-la para cima antes que ela caia pelo enorme vão que dá direto no rio agitado abaixo de nós. Ela se segura na corda de apoia, se apoiando para o lado e a ponte se mexe um pouco. Meus pés escorregam, eu caio, e tento me segurar, com o coração batendo a mil, mas a inclinação e agitação da própria ponte me jogam para o lado, e eu não caio no vão das tábuas; eu caio pelos lados, onde o espaço é maior, em direção a água.

Mackenzie não vai se tornar a próxima Lorena e Nora.

Acho que eu é que vou.