Luz Dos Olhos escrita por Mi Freire


Capítulo 38
No ensino médio


Notas iniciais do capítulo

Há alguns dias atrás eu postei um capítulo que relata como Melina "conheceu" Henrique: através de um sonho. Aqui vai um novo capítulo onde pode explicar melhor essa situação um tanto confusa. Uma história do passado que mal chegou a acontecer.



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Algum tempo atrás.

Melina estava no primeiro ano do ensino médio. Com seus dezesseis anos. Antes mesmo de conhecer Thomaz.

Depois do sonho que teve com Henrique, que até então era um desconhecido para ela naquele momento de sua vida, ela se perguntava de onde o conhecia, tinha a impressão que já tinha o visto algumas vezes. Mas onde? Ela não sabia dizer.

Pensava em seu sonho com frequência, durante a aula, em casa, com os amigos, em passeios e não saberia explicar importância que aquele sonho tinha para ela. Afinal, um desconhecido havia dito que a amava e cuidaria dela para sempre. Suas palavras foram impactantes e soavam em sua cabeça diversas vezes por dia.

Por mais que sua melhor amiga na época lhe dissesse que sonhos eram apenas experiências da imaginação do inconsciente durante o período de sono, Melina estava crente de que não era simplesmente só isso. Havia muito mais coisas por trás daquele sonho, ela sabia que sim, só não poderia provar em palavras o quanto seu sonho era significativo e queria lhe dizer ou lhe mostrar algo.

Mas como compreendê-lo?

Certa vez, durante o intervalo Melina caminhava vagarosamente distraída pelos corredores em direção à biblioteca. Nos braços ela tinha uma porção de livros para serem entregues e em uma das mãos, a qual estava disponível, ela tentava segurava seu aparelho celular próximo ao rosto. Tentando se conectar a internet da escola através do Wi-Fi.

Certas coisas acontecem quando a gente menos espera, e é verdade. Foi exatamente o que aconteceu aquele dia: Melina acabou, pelo caminho, se esbarrando em outra pessoa. Os livros se espalharam pelo chão e seu celular voou longe.

As pessoas de seu colégio costumavam serem duras, ignorantes e frias sempre que algo do tipo acontecia. Mesmo que acidentalmente. Não era como nas cenas de um filme americano, onde os dois se abaixavam para se pegar as coisas derrubadas, se entreolhavam e se apaixonavam no mesmo momento. Nada daquilo acontecia na vida real.

— Me desculpe. – foi tudo que ele disse, com as bochechas levemente rosadas. Estava constrangido.

— Tudo bem. – Melina não perdia a paciência com facilidade. — Acontece. – ela sorriu. — Você pode me ajudar?

Ele assentiu calado e se abaixou para ajuda-la recolher os objetos espalhados pelo chão antes que alguém pisoteasse.

— Aqui o seu celular. – ele estendeu o aparelho. Melina ainda não tinha olhando para ele atentamente. Com seu gesto, ela levantou os olhos e o olhou fixamente surpresa.

— É você! – ela disparou, automaticamente pegando seu celular e enfiando no bolso do uniforme. — Claro que é você!

Ela sorria, por outro lado o garoto foi pego de surpresa, arqueando uma das sobrancelhas e sorrindo torto. Não estava entendendo nada do que acontecia ali. Ela parecia reconhecê-lo, mas ele só a vira algumas vezes pelo colégio, especialmente durante o intervalo, já que eles meio que dividiam o mesmo local isolado no pátio do colégio.

Melina ajeitou os óculos de aro preto e lentes grandes em seu rosto. Ela queria ter a certeza de que não estava enganada. Era ele. O garoto do sonho. Ali de frente para ele, ela tinha certeza.

— Melina! Eu pedi que você me esperasse. – sua amiga se intrometeu entre eles, rompendo a troca de olhares entre os dois, um momento de transe, uma conexão. Como se os olhos tivessem criado um vínculo entre eles que só ambos poderiam saber.

Henrique aproveitou aquele momento para sair dali. As duas amigas continuaram a seguir em direção à biblioteca da escola. Antes de entrar, Melina olhou para trás e viu o garoto se distanciar. Ela não sabia se odiaria sua amiga para sempre por ela ter rompido aquele momento ou se seria mais sensato ela ir atrás dele antes que fosse tarde demais.

Mas o que diria? Como explicaria a ele seu sonho? Como diria que ele a amava, mesmo que fosse somente na ficção? Certamente, ir atrás dele não era uma boa ideia. Ele não teria uma boa impressão dela.

Depois daquele encontro repentino os dias seguiram normalmente, ou quase.

Melina e seus amigos, que eram ao todo cinco, sentavam todas as manhãs durante o intervalo no jardim do colégio, sob o gramado, em um circulo mal feito. Aproveitavam o sol fraco da manhã para aquecer seus corpos frios.

Não muito longe dali, Henrique também se sentava com mais seis garotos. Que Melina deduziu que eram seus amigos, já que sempre estavam todos juntos, ou boa parte deles. Eles também sentavam em circulo e jogavam baralho. Todos os dias.

Entre eles, Henrique se destacava. Por sua beleza ingênua, natural, quase como se fosse um anjo, de traços sutis e delicados.

Melina passava boa parte de seu intervalo, meia hora, apenas olhando para ele. Mesmo que de longe ela observava seus gestos, admirando seu sorriso descontraído, a maneira como ele passava seus dedos nos cabelos lisos e castanhos, suas bochechas rosadas por causa do sol e como ele parecia se divertir entre os amigos.

— Você está se apaixonando por ele. – sua amiga comentou, interrompendo os pensamentos de Melina. Ela já havia contanto toda a história para a amiga, ela era de confiança.

— Não. Não estou. – Melina tinha convicção do que dizia. — Não é possível se apaixonar pelo que não se conhece. Eu nem sei como ele se chama, do que gosta, seus defeitos, as qualidades.

— Então, você está atraída por ele.

Melina não teria que admitir que sim, estava atraída por ele. Não tinha como não estar, além de lindo, era o garoto de seus sonhos e não podia ignorar isso. Havia um porque em tudo aquilo e ela queria desvenda-lo a todo custo.

Mas havia um porém: ela não sabia se ele sentia o mesmo. Estava mais que obvio que não, ele não dava a mínima para ela. Mas havia ocasiões em que ela olhava para ele e ele já estava olhando para ela. E isso fazia com que ela imaginasse a possibilidade dele também estar sentindo algo. As duvidas sempre prevaleciam.

As coisas poderiam ser mais simples se ela tivesse coragem o suficiente de se aproximar e jogar diretamente. Mas Melina não tinha coragem, pois não sabia qual seria a reação dele. Poderia perdê-lo, antes mesmo de tê-lo. E todas as vezes que se sentia impulsionada a fazer algo a respeito, as pernas falhavam, ficavam pampas. Ela sentia a boca seca, as mãos suavam.

Não. Eu não consigo.

Quando tinha que passar por ele pelos corredores por acaso, sentia as faces queimarem com a timidez. Quando trombava com ele, não conseguia olha-lo diretamente. E quando sentia que ele se aproximava, ela travava e se encolhia.

Sou uma tola.

Um mês depois de ter descoberto que ele era o garoto do sonho, ela teve outro sonho, ainda mais estranho que o primeiro.

“Era noite, o céu estava escuro e fazia calor. As estrelas rodeavam a lua cheia. Melina estava sentada no gramado, em um campo desértico rodeado por flores e vegetação. Ela abraçava as pernas diante do peito e se balançava para frente e para trás. Ela esperava alguém. Não sabia quem era, mas sabia que esperava. Ele não demorou muito para aparecer e se sentar ao lado dela com um sorriso doce. Nenhum dos dois disse nada, apenas se entreolharam por um momento. A troca de olhares habitual, cheia de magia e mistério. Depois, os dois voltaram a atenção para o céu negro. Melina começou a cantarolar baixinho, uma musica qualquer. Ele pareceu gostar, esboçando um sorriso. Não demorou muito para o melhor acontecer. Ele se aproximou devagar, pousou a mão no rosto dela, acarinhou. Melina fechou os olhos e sentiu seu toque gélido. Um pouco depois ele colou seus lábios nos dela. Muito devagar, suas bocas se abriram e as línguas se encontraram. Ele tinha o hálito bom, fresco, de menta. Enquanto se beijavam sob o céu estrelado, ele acarinhava seu rosto, pausava e depois voltava a beija-la de maneira carinhosa. Romântica. Melina sentia como se estivesse voado, sentindo a brisa gelada bater em seu rosto e nos cabelos. Ela poderia beija-lo por toda a eternidade, nunca se cansaria. Não precisava de mais. Apenas do seu beijo, do carinho, do contanto. O resto pouco importava. Quando ele parou de beijá-la, ficou olhando para ela por um bom tempo, com um meio sorriso, os olhos escuro brilhando como se estivesse prestes a chorar de emoção. Ele não chorou, para o alivio de Melina. Deu um ultimo beijo nela, rápido. Depois sussurrou que a amava, que estaria sempre com ela, mesmo que ela não tivesse mais com ele. Melina acreditou em suas palavras, e o abraçou.”

Ela acordou logo depois, lembrando-se do seu sonho e se odiando por ter acordado e não poder ter continuado a vivê-lo.

Melina sentia que conforme os dias passavam o que ela tinha por Henrique, por mais desconhecido fosse seus sentimentos, só aumentavam. Ela queria vê-lo sempre, procurava por ele em todos os lugares: no supermercado, na padaria, nas ruas. Nos finais de semana vê-lo era impossível, já que não tinha aula. Ela ansiava pelas segundas-feiras, pelo começo de uma nova semana, na esperança de que algo novo acontecesse. Mas não aconteceu.

Ela não tomou uma atitude. E muito menos ele. Na verdade, ela sentia que ele se distanciava. Poucas vezes o flagrava olhando para ela. Outras vezes, ele nem estava no lugar habitual que costumava ficar com os amigos durante o intervalo. Era como se ele a evitasse. Achando que ela era uma louca. A verdade, é que Melina também acreditava que estava delirando. Nada fazia sentindo.

— Você precisa fazer algo. – sua amiga comentou, vendo a aflição nos olhos de Melina. — Tive uma ideia!

A ideia de sua amiga foi criar uma rede social anônima. Assim, Melina podia descobrir a respeito dele coisas que não tinha coragem de perguntar pessoalmente. Mesmo achando a ideia uma loucura, foi o que ela fez e criou um perfil falso naquela rede social onde se faz perguntas para o outro, podendo até ser em anônimo.

Foi dessa maneira que Melina descobriu como ele se chamava, onde gostaria de fazer faculdade, que curso tinha em mente e muitas outras coisas que ela perguntou anonimamente.

~*~

Henrique não era de se apaixonar facilmente, na verdade, pouco pensava nessas coisas. Relacionamento nunca esteve dentro dos seus objetivos. O que ele mais gosta é de estar com os amigos e a família.

Desde que se esbarrou com aquela garota no corredor sentia algo de muito estranho. Coisa que ele não poderia descrever em palavras. Ela pareceu conhecê-lo, mas ele, não a conhecia de verdade.

Mas o que os unia?

Ela era encantadora, bonita e atraente. O que mais lhe atraia em uma garota eram os cabelos. Por incrível que pareça. E os cabelos de Melina eram certamente um dos mais bonitos de todo o colégio: cumpridos, lisos escorridos e castanho natural. Ele se pegava imaginando que perfume os cabelos dela teriam.

Ele já olhava para ela muito antes deles se trombarem. Ela é atraente, não tem como não notar. Muitos garotos a observam, sem ela nem perceber. Algumas vezes, ela lhe retribuía o olhar. Com muita mais frequência que o normal e todas as vezes que seus olhos se cruzavam ele se sente deslumbrado, como se pudesse dizer algo, mas não soubesse exatamente o que ou como.

Henrique queria poder conversar com um amigo a respeito daquilo, sentia que estava entalado em sua garganta, cheio de incertezas e duvidas. Mas garotos não são de conversar sobre esse tipo de assunto. Então ele guardou para si o que gostaria de expor para o mundo. Gostar dela o fazia se sentir bem, maravilhado, satisfeito.

Mas nem sempre tudo parecia certo e normal. Ele ainda não conseguia entender porque ela e se ela sentia o mesmo. Tais pensamentos o deixavam inquieto. Esses dias ele a evitava, na esperança que as coisas amenizassem. E o que ele “achava” que sentia por ela fosse apenas um blefe, uma ilusão.

Quanto mais tentava se afastar, mais ele se sentia envolvido e acabava por fim desistindo. Sendo que o que ele mais queria era tê-la por perto, dentro do seu campo de visão. Já que não tinha coragem suficiente para se aproximar, tentar uma conversa, um contato mais intimo e acabar de uma vez com suas incertezas.

Henrique sempre foi muito tímido, desde pequeno. Especialmente quando se tratava do sexo oposto. Ele se sentia ridículo por isso, quase incapaz. Com os amigos, ele sentia que era capaz de tudo. Mas sozinho, não tinha tanta certeza se conseguiria.

O tempo passou e as coisas continuaram na mesma. Tudo que Henrique sabia a respeito da tal garota era seu nome. Um nome um tanto diferente, talvez único em todo o colégio: Melina. Também sabia que ela era do mesmo ano que ele e que tinha a mesma idade. Apesar de ela ser alguns meses mais velha. Fora isso, não sabia mais de nada. E não conseguia imaginar outra forma de descobrir.

O primeiro ano da escola se foi e nada aconteceu.

Para a infelicidade de Henrique, através de um amigo, ele soube que ela estava namorando. Henrique chegou a ver de longe, de costas, o namorado dela uma vez indo busca-la de carro na porta da escola.

Henrique teve que admitir a si mesma que se sentiu enciumado, como nunca antes em toda a vida. Deveria ter feito algo a respeito enquanto teve oportunidade. Mas agora, ela estando namorando, era tarde demais. A única alternativa era esqueça-la. Se fosse possível.


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Notas finais do capítulo

Deu pra ficar claro? Ou ainda há dúvidas? Qualquer dúvida, deixe um comentário que eu tentarei explicar da melhor forma.



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