Serendipidade escrita por Roxanne Evans


Capítulo 23
23


Notas iniciais do capítulo

Data de término: 20.02.2018
Data de publicação: 26.06.2020

Olá pessoas do meu coração. Esse capítulo tinha alguns detalhes que me incomodavam bastante, por isso demorei a postar, pois fiquei mexendo aqui e acolá, revisando uma e outra vez. Mas a verdade é que gostei bastante do resultado. Agora estamos de fato na reta final e o Jake e a Nessie finalmente se reencontram. Agora ela é um pouco mais velha e mais capaz de lidar com as situações e dificuldades. Eu sempre achei importante ela passar e queria desde o começo que eles passassem esse tempo separados, pra que ela tivesse um tempinho para amadurecer.
A questão é: O que acontece agora, minha gente? :P

Obrigada aos que leram e acompanharam, cada comentário me deixa imensamente feliz e por isso que estou postando o final. Espero que gostem e que sacie as expectativas de vocês hehe
Desculpe pela demora ♥



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23

 

—Mamãe, o que você está fazendo aqui? - os olhos arregalados e o cabelo mal preso na cabeça, estava parada, com os olhos arregalados.

 

—Oi meu amor, como você está? - e os olhos de chocolate percorriam a menina com saudade, antes de ela se inclinar e abraçá-la. Nessie permanece dura e estóica no lugar.

 

A moça entra na casa e olha em volta por um momento.

 

—Acho que eu ainda não tinha visto sua casa - tão mais podia ser lido naquela única sentença. Entrelinhas, palavras não ditas, sentimentos mal resolvidos. A morena suspira.

 

—Mãe, o que você está fazendo aqui? - ainda sem se recuperar do choque, repetia como um disco riscado. Bella ri baixinho.

 

—Não vai nem oferecer um chá à sua mãe?

 

Totalmente sem reação a menina se guia para a cozinha, seguida de perto pela mãe. Lá, Nessie pega a chaleira do escorredor e põe a água no fogão.

 

—Como você está?

 

Nessie não sabia por que, mas as perguntas e a mera presença de sua mãe a deixavam incrivelmente desconfortável.

 

—Estou bem mãe. E você e o papai? - a voz dela falha e tem de limpar a garganta. Nervosa, tira o cabelo do rosto. Ainda não obtivera resposta para a sua primeira pergunta.

 

—Estamos todos bem, mas com saudades. Você pretendia vir nos visitar?

 

O bule apita, salvando a menina por um triz. Ela ajeita a manga caída de sua blusa e serve duas xícaras fumegantes.

 

—Tenho uma entrevista de emprego mais tarde.

 

—É mesmo? - e ambas se sentam nos bancos altos da bancada da cozinha. A realidade parecia distante. Nessia tinha certeza, caíra no buraco e saíra no universo das Maravilhas. - em que área?

 

Nessie não parecia conseguir voltar a si. Volta a limpar a garganta, ajeita o cabelo no coque mal feito e limpa o suor das mãos nos shorts jeans. Não conseguia ouvir um cachorro ou um passarinho na rua. O mundo parecia ter se calado para assistir àquilo que se desenrolava entre elas.

 

—Em uma empresa de animação, para ilustrações. - e tamborila os dedos na mesa, de forma ritmada - você quer algum biscoito ou alguma coisa?

 

Bella nega, com olhos embaçados.

 

—Não, obrigada querida. Quando foi a última vez que fizemos isso?

 

—Isso o que? - a menina não sabia para onde aquilo seguia e se impacientava.

 

—Só conversamos, jogamos papo fora - nesse ponto, a voz da morena engasga e ela começa a chorar. - Desculpe, eu prometi pra mim mesma que não faria isso.

 

E ela limpava as lágrimas que continuavam a vir de seus olhos, chocando e panicando Nessie cada vez mais. De um choque para outro. Não há nada mais desesperador e íntimo do que presenciar o luto de outra pessoa. Principalmente agora, que havia essa barreira e distanciamento entre elas.

 

—Mãe? Mãe? Tá tudo bem? - a menina fica de pé e põe a mão no ombro de sua mãe, esquisita com a intimidade de tocá-la. O ombro era quente e macio. Estranhamente nota, o contato era reconfortante para si também.

 

—Desculpa filha, não vim aqui pra isso, desculpa.

 

—Mãe, o que aconteceu? Tá tudo bem? Aconteceu alguma coisa com o papai?

 

—Não, eu só - e ela puxa o ar, em um tranco - Estava com saudades.

 

—Mãe - e se alonga no suspiro, para em seguida sorrir, inconformada. Abraça sua mãe, primeiro sem jeito. Bella até fica imóvel, parando até de respirar em seus braços, para depois voltar a chorar, pouco a pouco abraçando-a de volta.

 

—Nos desculpe! Eu sei que nem sempre tomamos as atitudes certas, mas a gente sempre faz tudo pensando em você. Eu sinto tanto a sua falta. Nós sentimos. A gente queria dar o seu tempo, o seu espaço para deixar as coisas se resolverem naturalmente, mas acabamos deixando só o tempo passar. A gente devia ter feito isso antes, nos desculpe.

 

Sem conseguir se controlar, Nessie também começa a chorar, principalmente porque alguém mais estava chorando, sem conseguir evitar se sentir contagiada pelas lágrimas a seu redor. Tristeza sempre parece ser um sentimento contagiante.

 

—Não chora, porque senão eu choro também.

 

—A gente não queria perder você, meu amor. - e a mãe segura a filha forte contra si. Ela não queria se render, porque abrir aquelas portas era doloroso e fingir que tudo aquilo não existia, a decepção com seus pais, com Jake e acima de tudo com ela mesmo era muito difícil de lidar. Era tão mais fácil apenas fingir que nada daquilo era real e que estava tudo bem. Mas lá no fundo de si mesma ela ainda sentia raiva, ela ainda sentia mágoa, de tudo e todos envolvidos, tudo recalcado no mais fundo de sua consciência. Ela não havia lidado com nada daquilo, pois tudo parecia ser demais, demais para sua cabeça.

 

E com aquela atitude, com aquele único passo, finalmente as barragens se rompem e tudo se alaga. Tudo voltava, como luzes de acendendo depois de um apagão.

 

Ela empurra Bella para longe.

 

—Se você não queria me perder, então por que diabos você…Vocês-Eu sei que eu-Mas vocês-- a voz dela estava estridente e rouca, embargada, falhando em algumas partes. Seu sistema dava tela azul e tantas emoções passavam pelo seu corpo e pela sua mente, todas de uma vez. Era mais do que conseguia aguentar. Ela tenta se agarrar a uma qualquer, com força, apenas para conseguir evitar o desligamento de todo o seu sistema.

 

E o primeiro que agarra pelo braço é a raiva. Uma raiva forte e sem dono, de tudo que a cercava, um ódio branco e sem nome, que tomava toda a sua consciência.

 

—Por quê? ! Por quê? ! Quem vocês acharam que eram para destruir todas as minhas escolhas? Tudo o que eu tinha escolhido pra mim? ! Eu sei que eu era nova, que eu sou nova, mas com que direito vocês passaram por cima de mim como se eu não fosse nada, como se eu não valesse nada, meus sentimentos não fossem nada? !

 

A morena chorava tanto que seus olhos estavam vermelhos.

 

—A gente não queria… A gente não pensou…

 

Nessie bate na mesa.

 

—Não pensaram? Não pensaram? Uma atitude que destruiu todo o nosso relacionamento e você vem até aqui e diz que vocês não pensaram? A pior parte é que talvez a gente viesse a terminar, sabe? Algum dia, nós dois. Mas vocês passarem por cima de mim, isso é algo que dói! Vocês são meus pais, não deviam pensar em como eu me sinto? Conversar? Eu ia contar, eu estava pensando na melhor forma! Agindo assim, vocês justificaram todos os meus medos e destruíram minha confiança, a nossa confiança! 

 

—Não, não! É que…

 

—É o que? ! É o que? ! 

 

—Filha, me deixa falar…

 

—E o que você poderia ter para me dizer? Aconteceu! E eu odiei vocês por isso! Depois de todo esse tempo? Por que agora? Por que…. Agora?

 

O silêncio se prolonga por um, dois, muitos instantes. Ambas lívidas, ambas em prantos. E assim como viera, o ódio que a sustentava a deixa, todo de uma vez, a deixando exausta. A menina se ajoelha no chão, sentindo os arredores girarem. 

 

Não notara, era ela quem estivera gritando. A garganta doía, o corpo doía, tudo em si estava dolorido e em carne viva. Respirar era difícil, então arfava por ar, com desespero. Bella aparece a seu lado, subitamente, voltando a abraçá-la.

 

—Eu… A gente sente tanto - a ruiva segura no braço que a abraçava com força, como em um bote salva-vidas em um naufrágio. Por um instante frágil queria machucá-la o tanto que ela a machucara. 

 

Era sobre isso que tudo aquilo fora? Sobre pequenas vinganças em cima de grandes erros? Era nisso que sua família estava presa e a isso que estavam fadados?

 

Volta a arfar, consciente do ataque de pânico e sua cabeça volta a girar.

—.-.-.-.-.-

Quando acorda novamente, seu pai estava ali também e ambos estavam a seu lado, Edward em pé, no telefone e Bella segurando sua mão.

 

—Mãe?

 

Sua própria voz estava grogue e se sentia desorientada.

 

—Oi amor - e tira alguns fios de cabelo de seu rosto. - você teve um ataque de pânico eu te trouxe para cá, tentando te acalmar, até você dormir. Você se lembra? Seu pai estava lá embaixo, esperando. Eu o chamei, pois estava preocupada.

 

Que realidade alternativa era aquela que estava vivendo? Sem conseguir se controlar, a menina volta a chorar, segurando a manga de sua mãe com toda a força.

 

Não sabe dizer por quanto tempo ainda chorou. Só sabe dizer que, por todo o tempo, eles a abraçaram sem dizer uma única palavra.

 

Por quanto tempo esperara por aquilo? O quanto queria que eles realmente tentassem? Via agora, dentro de si, muito mais do que jamais imaginou possível.

 

Afinal de contas, nada iria melhorar até eles começarem a tentar.

 

Depois daquilo, eles se sentaram e depois brigaram, choraram e conversaram mais um pouco.

 

Nessie sabia que estivera errada, completamente errada de esconder um relacionamento, principalmente dadas as condições dele e a posição em que ela tinha colocado Jake. Sabia que isso os machucara, mais do que qualquer coisa.

 

Assim como eles sabiam que a reação que tiveram havia sido a mais errada possível. Haviam sido egoístas, possessivos e haviam tratado uma situação delicada no impulso, destruindo tudo o que estivesse em seu caminho. Incluindo os sentimentos de Nessie.

 

Era bom poder conversar abertamente sobre o assunto, sem precisar de reserva. Era bom sentir que a comunicação amortecida ainda funcionava, expurgar a mácula de dentro de si. Quase uma semana se passou, até que sentissem que tudo havia sido dito e sentissem que podiam voltar para casa.

 

Dentro de si ainda havia uma mágoa recente, um sentimento de que algo estava errado, mas, ao mesmo tempo, surgira um sentimento novo, uma vontade de querer tentar, algo que não estivera ali até então

 

Fingir até conseguir, não é?

—.-.-.-.-.-

Em sua casa, nada havia sido mexido. O seu quarto estava exatamente da mesma forma que o deixara, a última vez que tinha estado ali. Isso faz mais um caroço surgir em sua garganta e ela volta a chorar.

 

Nos últimos dias sentia que tudo o que estava fazendo era chorar.

 

Se recuperando, ainda se sentindo nostálgica por quem costumava ser, agora parecendo tão distante, liga imediatamente para Jane. Pois se estava em casa, veria Jane.

 

A amiga vai ao seu encontro imediatamente. Reunidas, se sentindo um pouco menos oca e mais como ela mesmo, as duas se programam para vários rolês nostálgicos. Vão ao shopping, fazer compras e passam na Sephora e na Mac para comprarem uma nova base, batom líquido e iluminador.

 

Rindo, se divertem tardes adentro, fazendo Nessie se esquecer de qualquer problema que pudesse ter. Pouco a pouco, lentamente mas com progresso, as peças do quebra-cabeça vão se encaixando no lugar e o ressentimento diminui, a cada vez que falava dele em voz alta.

 

Voltou a brigar com seus pais, mas também teve a chance de conseguir conversar com eles a respeito, uma e outra vez, tirando um peso oneroso de seus ombros.

 

Não imaginara que estivesse tão cansada, ou constipada. Durante esse tempo, chama Bree para passar uma semana na sua casa, apresentando a amiga a Jane. Para seu imenso deleite, as duas se deram super bem e trocaram altas dicas para maquiagem, algo que Bree tinha certa dificuldade.

 

Outra coisa que lhe deu prazer foi saber que Jane havia arranjado pretensões futuras, teimando em se tornar maquiadora. Já havia feito vários cursos e, no momento, trabalhava como freelancer e abrira um canal no YouTube. O trabalho dela melhorava a cada dia. Era bom vê-la empolgada com alguma coisa.

 

E assim, Junho passa voando, como um sonho, que mal tinha acontecido de verdade. Julho segue e já ia alto, quando tem uma agradável surpresa, serendipidade.

 

Nessie refestela-se no sofá, sonolenta, confortável. Um sorriso travesso cobria seus lábios cheios, brincando em sua expressão. Curtia a preguiça das férias como há alguns anos não tinha tempo ou pique para fazer, mesmo que estivesse sem trabalhar por aquele período de tempo.

 

—Alguém parece de bom humor! - Alice ri, olhando para a menina e Nessie lhe lança um cansado, porém alegre olhar assertivo, fazendo-a gargalhar ainda mais. A menina deixa o volume de “O Morro dos Ventos Uivantes” cair de seu colo.

 

—Estou com preguiça! - e resmunga, manhosa.

 

—Eu notei! - e a morena se senta ao seu lado, fazendo leves cócegas, que a fazem espernear e gargalhar. Pouco depois, Edward entra na sala e se senta na poltrona à frente delas, sorrindo da cena. Já era noite e ele passara o dia inteiro fora.

 

—Terminou o projeto? - Nessie se ajeita no sofá, colocando os pés para cima da almofada e Alice posiciona as pernas de índio, puxando o celular.

 

—Sim, já estava ficando doido! Meus olhos estão até doendo - Nessie ri e coça o rosto, afastando a franja.

 

—Cansado demais para sair e passar em um drive thru? Estava com vontade de comer trash food - A menina reclama, mimada, se espreguiçando como um gato.

 

—Podemos ir, mas antes precisamos esperar sua mãe. Temos uma novidade para te contar! - Seu pai desperta sua atenção com aquela informação, por parecer nervoso. Um silêncio se estende no cômodo depois disso, quando os três puxam seus celulares e conversam em silêncio, através de mensagens.

 

Alice e Nessie trocam olhares e arqueiam sobrancelhas.

 

Imediatamente, Nessie estava em seu grupo com os amigos, onde discutiam avidamente o que aquela insinuação de seus pais poderia significar. Uma nova bronca, uma nova discussão. Até ideias de divórcio pareciam pipocar nas possibilidades, embora Nessie achasse que seus amigos estivessem viajando. Ela ainda estava para conhecer duas pessoas mais apaixonadas que seus pais.

 

As intrigas, discussões e possibilidades continuam por algum tempo mais, até serem interrompidas, com a chegada de sua mãe, pela porta. Ela cantarolava baixinho, enquanto tirava seu suéter fino. Era uma noite atípica para Julho, onde um frescor levemente frio perpassava as árvores.

 

—Olá! - Bella diz para os presentes, enquanto tirava as sapatilhas e se sentava na cadeira, ao lado do sofá em que Alice e Nessie estavam acomodadas. Ela se inclina e dá um selinho no marido, trocando um leve olhar apaixonado. 

 

—Como foi?

 

—Minha mãe está bem e Georgiana adorou a matéria, além dos novos capítulos do livro. - Edward acaricia a mão da esposa, que lhe agradece com um sorriso, colocando parte do cabelo para trás da orelha.

 

—E o que é essa reunião aqui? - a morena pergunta, divertida, enquanto olhava para as três figuras, que pareciam tão concentradas.

 

—Estávamos te esperando, mãe. 

 

—Aparentemente você e o Ed tem algo muito importante para dizer a Nessie. E eu quero estar aqui para saber o que, quando vocês contarem.

 

—Ah! Mas você já se adiantou! - E Bella parece irritada, enquanto se levantava e batia no ombro do marido, se sentando no braço da cadeira. Logo em seguida, ela também troca um olhar claramente preocupado com o marido.

 

Isso só deixa Nessie ainda mais intrigada. Ela segura a mão de Alice, para adquirir apoio. Um instante de clara ansiedade e nervosismo, antes de recomeçarem a falar sobre o assunto.

 

—Na verdade amor, pensamos e conversamos muito sobre isso - Começa sua mãe. - Muito, de verdade. Há bastante tempo, como acertar as coisas.

 

—Sobre aquela noite e como isso sempre vai pairar sobre nós. A gente gostaria de pôr um ponto final nessa história, se ainda for possível. Nós não queremos que seja desse jeito. Já conversamos com você, pedimos desculpas e fizemos as pazes. Mas sentimos que isso ainda não é o suficiente. Na verdade… - Uma pausa prolongada, uma hesitação e uma troca de olhares - Queremos que a decisão seja sua, que você consiga deixar isso para trás também. E queremos que você saiba que vamos estar aqui para você, para te apoiar, não importa o que aconteça, ou o que você decida da sua vida, de agora em diante.

 

—Sobre o que é tudo isso, pai? - E relanceia Bella a seu lado, que no momento estava calada, mas parecia bastante empolgada - Mãe?

 

—Nós vamos visitar seu avô, Ness - E a morena não se contém, revelando, de forma entrecortada.

 

—O que? O vovô? O que ele tem com isso? - Confusa a menina olha em volta. Alice olha de volta e sorri para ela, até que sua ficha caia - Ow! Ow! - Mais um silêncio prolongado recai sobre eles.

 

—Se não quiser fazer nada a respeito, você pode ficar só na casa do seu avô, nós vamos aceitar sua decisão, seja ela qual for. Será apenas uma visita normal, mas nós entendemos, se você quiser resolver qualquer coisa do seu passado, no meio disso. Sabemos que isso não é uma resposta, é apenas uma possibilidade. Mas é o que podemos fazer agora e esperamos que isso ajude, de alguma forma - Edward complementa. Ele falava de forma rígida, que transparecia o quanto aquilo era difícil para ele. O quanto aquela demonstração de vulnerabilidade era contra a sua natureza. O quanto tirava de cada um. O quanto aquilo deixava seus pais sem graça. Eles certamente deveriam ter debatido longamente sobre o assunto. Sem saber exatamente como reagir, tudo o que consegue manejar no meio disso tudo é um agradecimento entalado.

—.-.-.-.-.-

A verdade é que, depois da notícia, passou um longo tempo pensando sobre aquilo. Sobre o que tudo significava, para ela e para sua vida. Tanto tempo havia passado, que custava acreditar que existissem segundas chances. Em seu coração, por mais que tivesse custado muito, tinha se forçado a colocar um ponto final naquela história. E, por mais que tivesse conseguido se acertar com seus pais, isso era outro assunto. Família é família. Que espécie de pais seriam os seus se não lutassem por ela? Os conhecia e os amava, apesar de tudo. Sabia, mesmo que tivesse negado desde o começo, que fariam isso, hora ou outra. O laço que tinham era muito forte para ser quebrado dessa forma. Ela era uma pessoa com consciência de sua sorte. 

 

O que acontecera com Jake, no entanto, era outra história. Indecisa, ela relanceia o anel que tinha ganhado aquele dia na praia, tantos anos antes. Nem sabia direito porque o guardara. Só sabia que, antes mesmo que soubesse o que estava fazendo, o havia tirado do porta jóias e o estava encarando, enquanto pensava.

Não havia tocado em nada daquilo desde o acontecido, assim como não havia tocado em seus sentimentos, guardando-os em seu próprio porta-jóias, memórias lindas e dolorosas, guardadas em um lugar importante, inacessível.

 

Muito tempo havia se passado e os dois não tinham laços. Diabos! Nem tinham mantido contato. E não é como se tivessem acabados em um ponto bom de seu relacionamento. Justamente naquele dia, haviam brigado e em grande parte, por sua infantilidade. Não havia nada no que se segurar. Na realidade, tudo podia ter acontecido. Ele podia estar casado e com filhos. De alguma forma, mesmo agora, isso a deixava incomodada e um pouco magoada.

 

Coisas mal resolvidas realmente deixam um pedacinho delas com a gente, incomodando, mesmo que enterradas lá no fundo, trazendo todos os tipos de consequências em sua vida. Ela suspira, enquanto o sino de vento da sua janela mexia, fazendo o típico barulhinho das pedras, que se chocam. 

 

Se o encontrasse, será que poderia acabar com tudo aquilo de uma vez? Finalmente se decidir e seguir em frente? Honestamente, não conseguia conjurar uma só forma de aquilo acabar bem. Ainda assim, ali estava ela, pensando e pensando e pensando...

 

O tempo pareceu voar ainda mais rápido, com uma ansiedade muda, enquanto Nessie remoía o que aquilo significava. Nervosa, não teve nem a coragem de contar a Seth a verdade sobre o ocorrido. Sendo sincera, não contou a nenhum de seus amigos, considerando o quanto andavam próximos e conversando. Temia que a informação vazasse. Não conseguiria lidar com isso atualmente. Estava muito amortecida para conseguir sentir alguma coisa, o que aquilo significava, se sequer significava algo. Precisava lidar com isso ela mesma, em primeiro lugar, para que depois discutisse com outras pessoas.

 

O problema é que parecia haver um bloqueio. Um bloqueio entre ela e seus sentimentos. E por mais que racionalizasse tudo de forma perfeita, nada parecia fazer sentido, no seu emocional. Nada do que pensava a fazia sentir. 

 

Respeitosos, seus pais não tocaram mais no assunto, deixando que lidasse com a situação no seu ritmo e da sua forma, no seu espaço pessoal.

 

Mesmo com o dia se aproximando e com preparativos sendo feitos, de alguma forma, nada daquilo parecia real. Ainda não sabia muito bem o que iria fazer ao certo. Como eco, tudo era distante e difuso. Não sabia nem o que pensar sobre o assunto.

 

Ainda no dia, com os planos feitos, malas preparadas e despachando a bagagem no avião, tudo permanecia estranho e indistinto. Havia decidido que seria o que tivesse de ser. Não havia avisado ninguém e não sabia o que iria encontrar pela frente, mas só iria enfrentar, descobrindo quando chegasse lá.

 

Estava incrivelmente nervosa, suas mãos suavam, mas se recusava a perder o controle. De uma vez por todas, de uma forma ou de outra, poria fim àquela história.

 

A vantagem de tudo aquilo foi que seu avô estava mais nervoso ainda que ela, quando finalmente se encontraram, uma vez que fazia cerca de dez anos desde que haviam se visto pela última vez. De forma nervosa, ele a abraçou, em um instante que foi desconfortável para ambos. Ao contrário de si, Bella parecia super bem ao abraçar seu pai, forte, emocionante.

 

Fazia tantos anos, que Nessie mal se lembrava da casa de seu avô, uma vez que a última vez que o vira, havia sido em uma visita em sua casa e não o contrário. A casa, apesar de pequena, era confortável. E enquanto Edward e Bella ficariam no quarto antigo de sua mãe, ela teria de ficar na sala, no tempo em que passassem ali. Charlie chegou a oferecer seu próprio quarto, mas Nessie não se sentiu confortável com a oferta.

 

No primeiro dia, os quatro jantaram na hamburgeria do lado da casa dele. Tinha de admitir, era bom mudar de ares, visitar a família. O desconforto inicial foi diminuindo aos poucos e em cerca de dois dias, já se sentia instalada e pronta para seguir, com qualquer que fosse seu plano.

 

O dia estava particularmente quente, principalmente considerando a cidade cinzenta em que estavam. O ar estava parado e mosquitos pareciam ter preguiça de voar, permanecendo parados no ar, enquanto outros insetos cantavam suas canções cerradas, ao longe.

 

Distraída, com as pernas cruzadas como as de um índio, tentava se concentrar na sua leitura de A Rainha do Castelo de Ar, de Stieg Larsson. Era o último volume escrito por ele e realmente gostava da série, embora, nos últimos dias, estivesse difícil se concentrar em qualquer coisa. 

 

Na sua cabeça, tudo o que se passava era que precisava agir rápido. Em um lugar como Forks, as notícias voavam rápido e se não agisse com velocidade, provavelmente iriam descobrir que ela estava ali, isso se Seth ou Jake já não tivessem descoberto. Isso a poria em uma situação muito desconfortável com seu amigo. Além de colocar uma decisão difícil e injusta nas mãos de Jacob, sobre ele ter de vê-la ou não.

 

Ele podia não querer visitá-la. Ele podia não querer decidir sobre isso.

 

Se fosse fazer isso, seria nos seus termos. Afasta toda aquela nuvem de sua cabeça e lê pela quarta ou quinta vez o mesmo parágrafo, antes de fechar o livro a sua frente. Respira fundo e endireita as costas que estavam curvadas, descruzando as pernas da sua posição de índio, que estavam.

 

O quarto que estava era o de sua mãe, sentada na cama, enquanto lia. A luz natural da janela começava a acabar, com a chegada do fim da tarde, do crepúsculo. Seus pais haviam chegado à pouco, uma vez que haviam saído com seus antigos colegas de classe, para colocar a conversa em dia, se reencontrarem.

 

Ela tinha sido convidada, porém negara. Tinha de confessar, estava hesitante sobre todo o processo de sair de casa, sobre quem iria encontrar. Sente a umidade no ar e espanta um mosquito, que fazia barulho, insistente, em sua orelha, pondo-se de pé.

 

Anda de um lado para o outro por um instante e olha seu celular. Eram mais de cinco horas. Volta a andar de forma circular pelo quarto, cruza os braços e começa a mordiscar a unha do dedão. Percebendo o que fazia depois de alguns minutos, se obriga a parar.

 

De onde estava, podia ouvir o barulho de seus pais, cadeiras sendo puxadas, a geladeira sendo aberta e fechada, pratos sendo pegos dos armários. Eles deviam estar preparando algo para comer. O burburinho abafado de sua conversa chegava pela janela, de forma indistinta.

 

Em um rompante de coragem ajeita seu shorts jeans, enxuga suas mãos suadas e se olha no espelho, como reflexo, ajeitando o cabelo de leve. Se lembra de agarrar sua bolsa pequena e um agasalho leve, antes de descer as escadas em um trote rápido.

 

Chega no primeiro andar ao mesmo tempo em que seu avô abria a porta.

 

—Oi oi menina, onde está indo com tanta pressa?

 

Nessie sorri, remexendo no colar longo que usava, em um toque que se tornara seu costume, recentemente.

 

—Oi vô, na verdade-

 

É quando seu pai sai da cozinha, vindo para o hall. Ele sorri e beija o topo da cabeça de Nessie e em seguida cumprimenta Charlie.

 

—E então, como foi a tarde? - Fala, enquanto abraçava a filha contra a lateral do corpo. Nervosa, tenta não transparecer, enquanto fazia parte daquele ‘little talk’.

 

—Foi normal. Eu li um pouco só… E passei calor. Muito!

 

Seu pai ri e a aperta um pouco mais.

 

—E olha que isso não é comum por aqui. - Nisso, Bella se junta a eles, dando um beijo de boas-vindas em Charlie, antes de parar a seu lado, com os braços cruzados, sorrindo.

 

—Não mesmo! Aqui são só chuvas e neblina! - Bella e seu avô trocam um olhar, cheio de entendimento, que só fazia sentido para eles, antes de voltarem a rir.

 

—E como foi o passeio de vocês? - Tenta prolongar o momento, embora soubesse. Sua coragem começava a escorrer e considerava voltar a subir e tomar um outro banho, com uma nova tentativa de ler o seu livro.

 

—Nada de novo sobre a terra. Seu pai fez muito sucesso, vamos-han por dessa forma - Dessa vez os três ao seu redor trocam olhares e começam a rir.

 

—Jéssica, Lauren e Angela? - É a vez de Charlie. Bella confirma e eles voltam a rir.

 

Nessie respira fundo. Era agora ou nunca. Um instante de silêncio segue a risada. Era um momento confortável e natural entre a família. Não seria assim por muito tempo.

 

—Na verdade eu estava pensando em-han - E Nessie limpa a garganta - Visitar a reserva. Eu ainda não vi o Seth desde que cheguei.

 

Como imaginara o momento seguinte é seco, silencioso e desconfortável. Volta a remexer em seu colar, dessa vez sentindo um peso morto cair dentro de seu corpo, fazendo todo o caminho de sua traquéia e descendo até o centro de seu peito.

 

—Claro, faz todo o sentido - É sua mãe, que tenta falar de forma leve, embora ela soubesse, era tudo um ato um tanto estranho. Ainda assim, ela olha para Bella com gratidão e sua mãe segura seu olhar de volta, de forma encorajadora. A seu lado, seu pai a abraça com um pouco mais de força, embora não diga nada.

 

Seus pais a orientam com cuidado e a abraçam antes de ir. Bella chega até mesmo a sussurrar um ‘boa sorte’ em seu ouvido, antes que saísse.

 

Ela dirigia o caminhão que havia sido de sua mãe. Era de uma cor horrível, amarela e super difícil de conduzir, mas ainda assim, entre uma marcha e outra, fazendo o carro morrer de vez em quando, conseguia fazer funcionar. 

 

Ela perde a entrada certa umas três ou quatro vezes e tem dificuldades, pois seu celular estava sem sinal ali, então não podia nem ao menos usar o Google Maps ou Wazee. Por fim, já eram cerca de sete horas da noite, quando finalmente se vê entrando pela estrada de cascalho, que fazia seus pneus cantarem abaixo de si. O chiado era alto e o único que ouvia, além de grilos a seu redor.

 

Com o final do dia, de uma hora para a outra, todo o calor evaporara e deixara a noite com um frio seco, mesmo ali, tão perto do oceano. Estaciona em algum ponto próximo as árvores, podendo ver várias casas de madeira há alguns metros de si. Desliga o motor e se põe a olhar em volta. Suas pernas estavam geladas com aquela temperatura. Seu pé estava quase adormecido, mal conseguia sentir seus dedos.

 

Põe o agasalho kimono bege que trouxera e fricciona os braços, para criar calor. De sua boca, saía um pouco de vapor. Como a temperatura podia ter mudado tanto? Ainda assim, tira um instante para admirar a seu redor.

 

Com os faróis desligados, tudo estava perfeitamente escuro, destacando as casas ao longe perfeitamente bem, com suas luzes. O céu era uma briga de estrelas para todos os lados, manchado delas, como uma rede de pisca piscas em um dia de Natal.

 

Desce do carro e começa a caminhar. Debaixo de seus pés, o cascalho continuava a fazer barulho ao ser esmagado contra seus tênis All Star pretos. Podia ouvir grilos, assim como algumas corujas ao longe, um barulho leve do vento ou de outros animais pequenos.

 

Se abraça com mais força, enquanto apressava o passo. Logo podia ouvir o som baixo de uma televisão, enquanto alcançava as primeiras casas. O burburinho de pessoas conversando chega em seus ouvidos e ela dá a volta na casa. Na parte da frente, quatro pessoas estavam sentadas, conversando de forma animada, mas todos param imediatamente 

 

—Olá! - Ela cumprimenta, sem jeito. A seu favor, todos sorriem, de forma amigável. - Vocês sabem me informar a casa do Seth Clearwater? - Rindo e trocando olhares maliciosos, o grupo faz uma explicação razoável do caminho. Ela agradece e volta a andar.

 

—Você vai à fogueira? - Eles voltam a conversar no momento em que lhes dá as costas, mas não dá muita atenção a isso. Era interessante andar por ali, com grande espaços de escuridão e silêncio. Seus dedos estavam gelados. Assopra neles, tentando criar calor.

 

No caminho, encontra uma mulher bonita, de cabelos curtos e lisos, onde volta a perguntar pela casa do amigo. Ela lhe dá uma boa olhada, de cima a baixo, medindo-a, antes de dizer.

 

—E o que você quer com ele?

 

Pega de surpresa pela negativa, gagueja um pouco, trombando nas palavras que deixavam sua boca, de forma desajeitada.

 

—Nós somos amigos.

 

—Hm. - É tudo o que a mulher diz, antes de analisá-la novamente e simplesmente sair andando, sem lhe dar qualquer satisfação. Estupefata, fica parada por mais alguns segundos, antes de retomar a andada. Devia estar perto, quando outra coisa lhe chama a atenção.

 

De portas abertas, o galpão era grande em relação às casas, puxando os olhos em sua direção. As luzes estavam todas acesas e, parada onde estava, há vários metros da entrada, podia ver claramente do que se tratava. Era uma oficina mecânica. É óbvio que poderia haver mais de uma, ele poderia não trabalhar mais lá, podia nem mais estar morando na reserva, mas ainda assim, sua garganta trava, seu coração afunda e um torvelinho se forma em sua barriga, tudo de uma vez.

 

Pisando sobre pequenos galhinhos que se quebravam, se aproxima devagar, incerta sobre o que estava fazendo. Seus passos eram tão hesitantes quanto as batidas de seu coração ou sua respiração, entrecortada.

 

Entra na ambientação rústica e silenciosa. Alguns carros estavam enfileirados lado a lado, um deles suspenso em um macaco hidráulico. Ela olha em volta, passando o peso de um pé para o outro. Havia ferramentas para todos os lados, caixas e tonéis de metal no chão de cimento. Ali dentro estava tão frio quanto lá fora e foi isso, acima de qualquer coisa, que a fez se voltar para a saída, devagar.

 

Estava quase lá, quando seu pé esbarra em uma barra de metal, que faz um clangor, ao se chocar contra um tonel, também de metal.

 

—Quil? Embry? É algum de vocês? - O corpo inteiro de Nessie gela e um arrepio estranho perpassa as suas costas, ao ouvir aquela voz. Algo estava entalado no centro de seu peito tão forte, que mal conseguia se mexer - Vocês podem pegar para mim a chave de inglesa vermelha, que está em cima do tonel, perto da porta?

 

Sem reação, ela olha a chave inglesa. É quando se vira e o nota ali, enfiado debaixo de um dos carros, apenas suas pernas à mostra. Seu coração batia tão rápido, que podia ouvir um zunido em seus ouvidos. Rápida, desajeitada e com mãos escorregadias, agarra a ferramenta, ouvindo claramente quando ela cai no chão, com um estrondo.

 

—Tudo bem aí? - Ela não responde e caminha rapidamente, entregando a ferramenta na mão esticada. Fica um segundo parada, olhando para ele ali, enquanto ouvia os pequenos sons de metal contra metal. Algo sendo desrosqueado.

 

Volta a cruzar os braços com força. Não estava pronta. Não estava pronta para nada disso. O que ela estava pensando em uma hora daquelas, em um lugar como aquele?

 

Sem segundas chances, corre para a saída, sentindo-se completamente sufocada. Para do lado de fora, puxando o ar frígido, com força, sem conseguir respirar. Só falha em notar, o som de metal havia parado.

 

Como um instinto, mais do que curiosidade, Jake olhara os pés que lhe passaram a ferramenta. Mas foi só quando ouviu a pessoa correr que realmente se perguntou o que se passava e se deu ao trabalho de sair debaixo do Camaro que trabalhava.

 

Ele se levanta e limpa suas mãos no pano que guardava no bolso traseiro, olhando em volta, ao mesmo tempo que carateava, ao ver a sujeira na sua blusa. Graxa, graxa e mais graxa. É quando dá alguns passos para fora, à procura do intruso.

 

—Nessie?

 

Naquele momento, ouvindo a surpresa em sua voz, todos os sentidos dela falham, enquanto se virava, automática, para encarar à pessoa que chamara seu nome, só notando, tarde demais, o que acabara fazendo.

 

 


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