Serendipidade escrita por Roxanne Evans


Capítulo 2
02




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"Nada nos excita mais
Ninguém mais nos mata
A vida é uma enorme obrigação
Quando é...
Entediante"

A semana passou voando, parecendo ter pressa em acabar. A menina acordou, encarando seus cachos a sua frente, vendo o cobre brilhar com o dia do sol. Sente a preguiça matutina e a malemolência, e enterra o rosto no travesseiro.

Já era sexta-feira. Há alguns dias atrás, no colégio, combinara com Jane de ir a uma festa, mas agora se punha indisposta. Não tinha vontade de ir, mas também não queria ficar em casa, muito menos com aquela sensação estranha e sufocante que a acompanhara durante toda a semana.

Levanta-se da cama em um pulo, espreguiçando-se, ouvindo os ossos estralarem.

Ainda sentindo-se dormente, coloca um vestido azul, curto acima dos joelhos, sem mangas, lavando o rosto e colocando um tênis em seguida. Penteia os cabelos devagar, voltando a prendê-los. Agora que eram grandes o suficiente e lhe cobriam as costas, era assim que passavam a maior parte do tempo, presos. Sua mãe os amava, por isso nunca tivera coragem de corta-los. Fora que, se fosse fazê-lo, não saberia para quê mudar, então deixava como estava.

Desce as escadas devagar, olhando para o cabideiro que ficava logo ao lado da porta, para segurar os agasalhos, sua mochila logo ao lado, sentindo-se dominada por uma urgente vontade de correr, mas obrigando-se a se manter no lugar. Tinha perdido sua estabilidade, a gravidade parecia querer deixa-la solta. Nunca estivera tão confusa.

Era como se sua cabeça girasse e girasse, os sons da cidade, os barulhos, as conversas, as festas, mas na verdade, tudo dentro de si fosse oco, um vazio que nada atingia, um vazio que fazia barulho com seu eco. Era desesperador, e quanto mais percebia isso, a mais festas e lugares com barulho ia, esperando não ouvir mais nada.

Continua a descer, cautelosa, quase felina, alcançando a sala. Sua mãe estava ao telefone, e seu pai já saíra. Tão entretida estava, que Bella não se lembra de cumprimentá-la. Aquilo não a abala, e come lentamente, sem prestar atenção a uma palavra da conversa alheia.

Termina de comer, levantando-se, cruzando o espaço para o outro lado da ilha, depositando seu prato na pia, saindo devagar. Nisso sua mãe deposita a mão no aparelho, abafando o som para quem quer que ouvisse e vira-se na cadeira.

-Tenha um bom dia Nessie, querida! – A ruiva lhe sorriu, como de costume, mordendo o lábio inferior, fazendo um gesto com as mãos, dizendo-lhe 'pode deixar', para em seguida sair. Mas, subitamente, ao ter os pés fora de casa, não sente vontade de ir à escola.

Suspira pesado, ponderando suas opções por apenas um instante, antes de pegar o Iphone na bolsa, discando o conhecido número de Jane.

-Jane? Está a fim de matar hoje? – Não queria ir a aula, não queria tolerar o tédio ou o tempo de introspecção, queria apenas aproveitar um pouco o tempo, agora livre, que tinha arranjado.

Saiu de onde estava, parando para esperar a loira na frente de uma lanchonete em um canto mais abandonado da cidade, como sempre faziam. Senta-se em um dos bancos do lado de fora, suspirando baixo, irritadamente.

Encara seus próprios sapatos, indagando-se por que escolhera um tênis. Mas, considerando que sairia a andar por aí com Jane, uma das pessoas mais loucas que conhecia, talvez a idéia não tivesse sido tão ruim.

Consegue ouvir seu riso um pouco histérico, antes de vê-la se aproximar pela rua, os cabelos loiros e despenteados soltos contra o vento, a maquiagem preta e pesada, mesmo pela manhã passando uma nítida imagem de problema, a saia curta, também escura, a meia rasgada, o tênis desgastado e a babylook cortada, tudo apontava para uma adolescente com problemas, embora ninguém se aproximasse. As pulseiras com penduricalhos ou de plástico ocupavam quase que seu antebraço esquerdo inteiro. O cigarro em uma mão, acompanhado por unhas pretas descascadas completavam o visual diário básico daquela que era a melhor amiga de Renesmee.

-Nessie! – A loira sorri, jogando o cabelo para trás, seus olhos brilhando com sua costumeira malícia. – Vamos indo?

A ruiva não a espera terminar, pulando de onde estava, jogando a bolsa pendurada por um ombro só de qualquer jeito no lugar, acompanhando-a.

-Tem idéia de onde vamos?

-Claro que não, qual seria a graça daí? – As duas riem um pouco, voltando a apressarem-se.

Passaram horas apenas andando, entrando pelos subúrbios da cidade, perdendo-se neles, entre risadas histéricas e bebida. Renesmee tomou o cuidado certo para não beber muito, querendo voltar para casa sóbria e não cheirando a álcool, mantendo sua mãe despistada do que fizera.

Jane sempre lhe oferecia um cigarro, o qual recusava sem se importar. A loira também não parecia abalada.

Não fumava. Gostava de coisas que a fizessem esquecer, que a tirassem momentaneamente da realidade, não de algo que a fizesse parecer má ou rebelde. Drogas, embora de tempos em tempos lhe parecessem uma idéia tentadora, estavam fora de questão. Não queria ir tão fundo, não queria ter a chance de arruinar seu futuro só porque queria esquecer seu presente, porque se sentia culpada. Nada que pudesse realmente prejudica-la ou mesmo a seus pais. Era uma idiota na verdade e sabia disso. Nem se rebelar corretamente conseguia, afinal, não era exatamente isso que desejava. Mas beber para esquecer era sempre e sempre seria viável.

Estavam na cobertura de um telhado, sentindo-se no topo do mundo, Jane em cima da beirada, olhando para baixo, aonde o movimento ia e vinha, comércio, pessoas, as duas encaravam, caladas, concentradas.

Jane, em alguma parte do dia, acabara maquiando Renesmee, fazendo-a mais combinativa com o ambiente que a rodeava.

Mais algumas pessoas faziam uma pequena festa particular no telhado.

-É uma merda não? – A voz grave da loira parece ecoar um pouco em seus ouvidos. – Todo esse movimento, esses vermes, essa colônia... – Falava com tanto desprezo na voz que parecia genuinamente somente desejar-lhes mal por estarem vivos. Se não estivesse acostumada, aquilo teria lhe feito algum dano.

Ao invés disso, simplesmente concorda com a cabeça, suave e imperceptivelmente. A menina loira volta a levar o cigarro a boca, uma última vez, manchando-o com seu batom vermelho, antes de joga-lo para baixo, indiferente a onde pudesse vir a acertar.

-Vamos dar o fora daqui, isso aqui tá uma merda. – Mecanicamente a menina de cabelos acobreados a acompanha, seguindo-a até onde a porta de metal enferrujado estava. Antes de descer dá uma última olhada para trás, vendo o brilho laranja do final do dia bater contra a pele das pessoas que riam, vazias, se beijavam, se drogavam. O que estava fazendo naquele mundo?

E bate a porta, seguindo Jane.

As duas voltam a perambular.

-Preciso voltar para a casa. – A loira não pergunta, sabia que se a outra não o fizesse estaria com problemas com a mãe e já sabia que não era isso que desejava. Já estavam acostumadas uma a outra.

-Beleza. – E sendo assim, se despedem brevemente, a ruiva indo para um lado, a loira para o outro.

Anda com cuidado, parando em um farol para cheirar seu próprio cabelo e ver o quanto ele cheirava a cigarro ou algo mais ilícito. O suficiente, seria bom que tomasse um banho logo que chegasse, não queria complicações para cima de si.

E o pior é que ainda teria de estudar. Tinha uma prova importante dentro de alguns dias. Estala os lábios. Como arranjaria cabeça para isso? De alguma forma, teria de fazê-lo, pois aquela era uma prova importante, onde precisava tirar uma boa nota, caso contrário poderia ficar de recuperação.

Suspira baixo, irritada consigo mesma. E tinha de tirar boas notas para uma boa faculdade. Uma que ainda não sabia se ia querer fazer. Tudo realmente perdera sua razão de ser.

Entra em casa silenciosa, não querendo incomodar sua mãe, que provavelmente escrevia, subindo devagar, a escuridão predominando a casa, uma vez que as luzes estavam apagadas e o sol já se retirara.

Nisso, vê uma luz acesa e estranha. Era a luz do fim do corredor, o lado oposto ao quarto de seus pais, um pouco depois do seu próprio. Segue o caminho, entrando sem bater, apenas para se deparar com a mãe, que terminava de arrumar uma coisa ou outra.

-Mãe? – Chama, suavemente, vendo-a olhar de volta.

-Oi amor, já de volta? – E a mulher se aproxima, beijando-a de leve na testa, mas franzindo o cenho logo em seguida – Que cheiro é esse? – E segura uma mecha avermelhada em sua mão, cheirando-a.

Droga, esquecera-se completamente disso!

-Saí com a Jane depois da aula – Mente sem precisar pensar, mas abaixa o rosto depois disso, um pouco envergonhada de tê-lo feito.

-Nessie... – E ouve sua mãe suspirar, a menina voltando a morder o lábio inferior, ao ler as entrelinhas e saber tudo o que se passava na mente da outra, cada uma das palavras perdidas. As duas ficam um pouco em silêncio, até a mais nova decidir quebrá-lo.

-Então... Han... Por que arrumava o quarto? – E levanta uma sobrancelha de leve, a expressão idêntica a de Edward, fazendo Bella sorrir um pouco ao reconhecê-lo.

-O Jake chega amanhã, esqueceu? – Completamente. Faz um gesto mecânico com a cabeça e a mãe deixa o quarto. Renesmee aproxima-se da cama, circulando-a devagar, felina, como se a analisasse, apenas para jogar-se em cima das colchas macias, fechando os olhos em um suspiro. E, antes que percebesse, adormece.

Acorda grogue, ouvindo a voz macia da mãe a chamá-la da escada. Levanta-se, coçando os olhos, esquecendo-se da maquiagem, borrando-a, sonolenta demais para se importar. Demora vários instantes para reconhecer onde estava, as paredes de cores pastéis, a luz do abajur acesa. Era o quarto de hóspedes.

Sai desse devagar, indo para o seu próprio. Embora o jantar estivesse pronto, se recusava a descer para comê-lo antes de tomar um banho. Joga o vestido na cesta do banheiro, ligando a água quente. O banho e o sono eram sempre as melhores partes de seu dia.

Desce já de camisola, os cabelos úmidos batendo-lhe nas costas. Usava uma camisola simples, que a deixava com cara de menininha. Quando entra na cozinha, os pais lhe sorriem, parecendo pensar na mesma coisa.

A ruiva se senta, começando a comer em silêncio. Era um silêncio um pouco pesado e denso e a menina consegue imediatamente dizer que tinha a ver com o que fizera hoje. Seus pais não tinham palavras. De alguma forma, sabia que era verdade, mas não conseguia dar um jeito em si mesma. Esperava, sinceramente, que tivesse algo a ver com a idade.

Comem em silêncio, e, assim que termina, diz boa noite para os pais, beijando-lhes o rosto, subindo para o quarto. Ainda tinha uma longa noite de estudos a percorrer.

Empurra os papéis, caderno e bagunça que reinavam sobre sua escrivaninha, jogando-os no chão, sem se preocupar, puxando a cadeira e sentando-se em seguida, abrindo os livros e acendendo a luz do abajur que ficava ao seu lado, exatamente com essa função.

Como era de costume, demora a conseguir se concentrar, mas uma vez que o faz, desliga do universo a sua volta, perdendo-se nos estudos horas a fio, só acordando para a vida quando alguém bate a sua porta, fazendo-a pular no assento de susto.

A cabeça de Edward aparece pela porta entreaberta, sorrindo.

-Não acha melhor ir dormir? – E a menina sorri, devolvendo o sorriso torto do pai, sentindo-se feliz pela primeira vez em algum tempo.

-Já vou, preciso só terminar esses exercícios.

E ela conseguiu ver o tanto de satisfação que brilhou em seus olhos, fazendo-a sentir-se realizada por isso.

-Está bem, só não demore muito, boa noite – E ele fecha a porta devagar, seus passos sumindo no corredor. De alguma forma, aquilo quebrara todo o seu clima. Provavelmente não conseguiria continuar dali.

Algumas vezes chegava a pensar que era mais parecida com seu pai do que imaginava. Seu temperamento um pouco explosivo comprovava isso. Boceja, espreguiçando-se, sentindo o corpo doer, devido sua inércia pelas últimas horas.

Levanta-se, decidida a encerrar o dia por ali.

Enquanto escovava os dentes, o vazio pouco a pouco vai retornando. Uma insatisfação, na verdade. De alguma forma, sentia que sua felicidade ou infelicidade nada tinham a ver com ela, e sim com o que seus pais pensavam dela, que a faziam ou não feliz. Não gostava disso, e era apenas mais uma coisa para desaprovar em si mesma.

Sem querer analisar o assunto, volta a jogar-se na cama, pela primeira vez em dias com a roupa certa, sentindo-se imensamente confortável onde estava. Eram quatro horas e meia, e estava desligando.

–/-

Acorda sentindo-se exaurida, tudo o que queria fazer era continuar na cama, dormindo para sempre, até se sentir saciada, mas, quando ouve sua mãe bater pelo que deveria ser a quarta vez, deduz que não conseguiria realizar seu desejo.

Levanta-se mal humorada, trocando-se de roupa, colocando uma qualquer, sem observar qual era, lavando o rosto, descendo sem pentear os cabelos, resmungando. Tudo o que queria era dormir naquele momento.

Ouve risadas altas e aquilo a anima, fazendo-a sorrir. Entra na sala, deparando-se com Rosalie e Alice, que conversavam com Bella, as três entretidas.

-Pensei que não fosse te ver hoje! – E a belíssima loira solta, jogando o cabelo de cetim por cima dos ombros, majestosa, vindo em sua direção com um sorriso traquinas no rosto, abraçando-a. – Estava com saudade!

Alice vem em seguida, abraçando-a também. A visita delas sempre parecia animar um pouco seu dia.

Mata um longo tempo com elas, percebendo que estavam tão animadas quanto ela para passarem o dia juntas. A ruiva se troca e se arruma um pouco, quando decidem sair para almoçar.

-E então Rosie? Como vai com o bebê? – A voz de Bella parecia sempre calma.

Nisso a loira joga o rosto para frente, escondendo-o com a cabeleira cacheada, que lhe encobria a expressão.

Estavam em um restaurante oriental agradável, na sacada do mesmo, esperando enquanto seu pedido não chegava.

Ela solta um sorriso um pouco amargo.

-Acho que não posso engravidar. – solta, fazendo as que estavam a seu redor se calarem.

-Mas você tem certeza disso, já foi a um médico ou algo do tipo? – Alice toma à dianteira, tocando de leve a mão da amiga, tentando transmitir-lhe apoio. A moça joga a cabeça levemente para o lado.

-Ainda estamos esperando os resultados chegarem, mas parece bem claro.

O silêncio volta a cair. Ninguém queria ser o primeiro a quebrar o estranhamento que se formara. Nessie se voluntaria, quase sem saber o que fazia, automática, o silêncio a incomodando mais do que as palavras de constrangimento.

-Por que quer tanto ter filhos Rosie? – A pergunta escapa de seus lábios, antes que conseguisse se conter, e enquanto Alice e Bella a encaram, incrédulas com sua pergunta, a loira sorri diante ela, parecendo procurar as palavras certas dentro de si.

-Pode parecer idiota – Ela começa, falando devagar e excessivamente pausada, voltando a chamar as atenções para si. – Mas, desde que era criança, sempre sonhei com uma vida 'perfeita'. Isso para mim consistia em uma carreira perfeita, em uma área que eu desejasse, alguém para amar, que me amasse de volta e por fim, um filho que fosse fruto de tudo isso. Sempre tive vontade de ter alguém para cuidar dessa forma, dizer que coloquei algo de mim no mundo assim. É um pouco patético, mas sempre pensei dessa forma.

Outro silêncio volta a se instalar, a loira abaixando o rosto, mas esse dura menos, quando Nessie retorna, colocando a mão sobre a da outra, que estava sobre a mesa.

-Não se preocupe, se é isso que você realmente quer, vai acabar dando certo, de um jeito ou de outro – E sorri de leve, tentando anima-la, abaixando o rosto, tentando fazer com que ela lhe encarasse de volta.

Rosalie levanta o rosto, lhe sorrindo, grata.

-Ela tem razão Rosie, você não devia se preocupar, há de haver uma solução. – Alice complemente, encorajadora e sorrindo e Bella acena com a cabeça, veementemente.

E a moça sorri de leve, grata com o olhar pelas amigas que tinha.

–/-

Volta para casa mais cansada do que o esperado, mas já pronta para a maratona que viria a seguir. Tomar banho e se aprontar para sair, mas, quando subia as escadas é interrompida.

-Aonde você vai Nessie? – Vira-se, encarando a morena no vim da escada.

-Vou tomar banho para sair, por que? – E levanta a sobrancelha, como era seu costume, ainda se segurando ao corrimão.

-Achei que fosse comigo ao aeroporto, preciso ir buscar Jake – A menina a encara muda, a expressão impenetrável.

-Desculpa mãe, mas realmente não queria faze-lo. – A de cabelos castanhos faz um aceno leve.

-Se é assim que se sente a respeito, não vou te obrigar – E vira-se, mas volta-se rapidamente – E trata de voltar antes do amanhecer, por favor!

A ruiva concorda enfaticamente, voltando a subir. Ouve sua mãe sair enquanto estava no banho. Acaba escolhendo um vestido marrom, extremamente curto, rodado em camadas, onde a parte de cima era um colete, para ser usado com uma blusa por baixo.

Com a blusa branca e o vestido a postos, seca e prende o cabelo em uma trança embutida, como fazia comumentemente, deixando-o bonito, arrumado e mais fácil de controlar, a maquiagem em tons terrosos bem escura para combinar com a noite.

Uma meia arrastão e botas pretas de salto completam seu visual, fazendo-a sair e fechar a porta de casa enquanto ninguém ainda voltara para ela. Seu pai provavelmente só estaria por lá segunda-feira. Afasta da cabeça sua mãe indo se encontrar com um homem que não via há vinte anos da cabeça, não querendo se preocupar. Sua mãe estaria bem, sabia disso, e segue seu caminho.

–/-

A festa estava quente e abafada, o que pareciam milhares de pessoas dentro de uma mesma casa. O som estava alto, um rock pesado, misto, com batidas de techno tocava e a galera dançava, sem se preocupar, as bebidas na mão às vezes batizando o chão enquanto se mexiam. Havia gente por todo lado, e, depois de cinco horas daquilo, Nessie se via cheia, já dançara, já bebera e no momento, não estava interessada em ninguém do lugar.

De onde estava, conseguia ver Jane se pegando com um moleque que tinha certeza nunca ter visto antes. Estava sozinha e entediada, e já levara dois copos de cerveja na roupa, que tinha certeza, ficaria manchada. Ainda assim, sentia como se não quisesse voltar para casa e aquilo a irritava.

Olha para o relógio. Eram quase duas horas. Ou seja, ainda era cedo para qualquer um com que pudesse voltar de carona, e, bêbada como estava, não era louca de tentar voltar para casa sozinha. Na verdade, não tinha nem certeza se conseguia ficar em pé sozinha.

Acabara exagerando e esse era outro dos motivos de sua irritação.

Estava encostada em um móvel qualquer do lugar que parecia ser a sala, sentada em uma mureta, onde uma sala mais baixa tinha sua vez. Era ali, logo a seu lado que os casais usavam para se pegar.

De saco cheio, a menina se levanta, aproximando-se da multidão, decidida a dançar um pouco mais, mas percebendo o erro que cometera ao se ver no meio das pessoas. Ali, mais do que antes, não conseguia respirar.

Desesperadamente, sente sua pressão baixar, e sua visão falhar um pouco, enquanto tentava dar travadas de ar no tórax, tentando absorver o ar com mais força.

Tenta empurrar um menino que dançava a seu lado para passar, mas ele lhe empurra de volta, quase a fazendo cair na pista de dança. Sua visão volta a falhar e ela sente algumas lágrimas escorrerem pelo rosto, de puro desespero. A música alta, os risadas, os corpos, era hipnotizantes e ficava tonta. Não tinha onde se segurar. Atravessa a multidão empurrando quem pudesse a cotoveladas, tentando puxar o ar.

É só quando consegue sair da casa, onde ainda havia várias pessoas ao redor, mas estava bem mais calmo, que consegue respirar, o rosto em contato com o ar gelado. Cai no chão, ajoelhando-se, puxando o ar com violência, percebendo que ainda chorava.

Enxuga o rosto como podia, vendo as mãos sujas da grama e terra do quintal agora ficarem borradas com a maquiagem pesada que antes usava. Sem pensar muito se levanta, seguindo em frente, até se apoiar na cerca da típica casa americana.

Pega o telefone celular no bolso, discando o número que conhecia de cabeça. Ouve o aparelho tocar uma, duas, três vezes antes da voz conhecida de sua mãe, agora preocupada, ser ouvida do outro lado.

Ouvindo sua própria voz chorosa, pede para a mãe vir lhe buscar de carro, pois não passava bem e tudo o que mais queria era voltar para casa. Pode ouvir a agitação que aquilo causa do outro lado, enquanto a moça tratava de anotar o endereço de onde estava, parecendo fazer tudo atrapalhada, porém apressadamente.

A menina desliga o aparelho, segurando o telefone na mão, jogada, exaurida, olhando para baixo, o muro em que encostava parecendo extremamente desconfortável, machucando-lhe as costas. Suas pernas estavam com frio, assim como seus braços, expostos pelas mangas curtas.

A jovem abraça o próprio corpo, percebendo que seus sapatos estavam sujos, provavelmente de vômito, achando-se desconfortável.

Por que viera hoje em primeiro lugar? Não era como se estivesse com vontade, mas pelo menos, durante um tempo, enquanto dançava, pudera esquecer-se das preocupações, aliviando-se.

Sente o queixo bater de leve, pelo frio.

Um rapaz de um grupo de rapazes que estava por perto se aproxima dela.

-Está com frio? – Ele pergunta, e ela simplesmente o encara, sua maquiagem borrada sendo uma visão nada agradável, tinha certeza – Quer meu agasalho?

E ele simplesmente o tira, oferecendo-o a ela, que aceita, sem pensar muito no caso, sentindo-se imediatamente melhor quando o couro encosta a sua pele.

-Está passando mal? – Ele pergunta, encostando no muro, parando a seu lado. Ela o encara durante alguns segundos, muda, seus olhos de chocolate analisando-o, tentando achar o que pensar a respeito dele. Parecia um jovem normal, os cabelos repicados, curtos e escuros, os olhos verdes, a fisionomia agradável. Ele lhe sorri ao se perceber analisado.

Ela deixa o pescoço relaxar, voltando a olhar para frente, para o chão.

-Estava, mas estou melhor agora – Responde por fim, passando a tentar, com a bota limpa, limpar a bota suja.

-Está sozinha aqui? – Odiava aquele tipo de pergunta, sempre faziam seus pensamentos alertarem para o perigo.

-Minha amiga está lá dentro e estou esperando minha carona que está chegando – Responde rapidamente, simplesmente querendo que sua mãe se apressasse a chegar.

-Humm... – E ele começa remexer o pé contra o cimento, o tênis desgastado sofrendo por isso. A menina pensa em devolver o agasalho e agradecer, mas ele retoma – Está a fim de sair com a gente agora? Estamos procurando um lugar melhor para ir.

Ela ri, irônica.

-Com essa aparência? Acho que não – E estava prestes a retomar, mas é interrompida.

-Ah, vamos lá, não é nada demais, fora que é só você lavar o rosto que estará nova em folha. – A persistência dele a incomodava.

-Obrigada, mesmo, pela proposta, mas estou cansada e vou apenas esperar minha carona mesmo. – E tira o agasalho, entregando-lhe – Obrigada.

Ele aceita o tecido de volta, quieto, pegando-o, propositalmente fazendo suas mãos se roçarem. A ruiva revira os olhos pela infantilidade. Como se aquilo fosse funcionar para alguma coisa.

-Tem certeza? Você ainda tem tempo para mudar de idéia. – Começava a deixa-la com um pouco de medo.

-Tenho sim, mas já vou indo, de qualquer forma, com licença – E ia se afastar, só para ficar em uma distância mais segura do rapaz, mas ele segura o seu pulso.

-Mas vai ser só uma festa, não seja tão teimosa – Ela tenta puxar seu braço de volta, mas ele segurava com relativa força, a agitação parecendo chamar a atenção de seus amigos, que agora olhavam, a menina sentiu o corpo gelar de medo.

-Nã-não quero! – Gagueja, puxando de volta, mas dessa vez, uma sombra enorme que surgira atrás de si parece surtir mais efeito, um braço rápido segurando o dele, obrigando-o a soltá-la. Aquilo faz seu coração revirar pelo que parecia a nongentésima vez da noite.

-Ela disse que não quer – A voz era grave e um pouco rouca, imperativa, grande o suficiente para serem mais de duas da menina que dá um pulo para o lado, não querendo ficar entre eles.

-Hei, hei, entendi, entendi! – O menino que a importunava a encara com pavor nos olhos, voltando a encarar o homem que aparecera do nada. Nessie o olhava com a mesma expressão. A situação assustando-a mais que a pessoa.

Só conseguia ver que era um homem alto, enorme para dizer a verdade, mais alto do que Emmett, e maior do que ele, se possível, e moreno, o rosto virado para o menino fazendo-a não conseguir vê-lo.

Ele o solta e os meninos parecem correr, assustados. O recém-chegado se vira para encara-la e ela acha que ia perder o ar. O rosto moreno escondia as feições mais perfeitas postas em um homem. As sobrancelhas eram afiadas, os olhos pequenos pareciam brilhar com constância, o maxilar quadrado e bem definido, masculino era absurdamente atraente, assim como a boca bem definida, grossa, de aparência macia.

-Você está bem? – Ela perdera a voz, encarando-o, tendo certeza que estava parecendo uma idiota ali, imóvel. Ele morde de leve, o maxilar se movendo com a expressão e dá um passo em sua direção.

-Nessie! – A voz de sua mãe quebra o momento, fazendo-a virar-se para encarar a mãe parada logo a seu lado, que a abraça, fazendo-a sentir sua preocupação e alívio ao vê-la bem. A ruiva demora alguns instantes para assimilar o que acontecia. E ainda com os olhos arregalados, através do abraço de sua mãe, encarava o homem parado há alguns passos de si, de camiseta branca e jeans, um pouco deslumbrada, um pouco assustada, sem entender o que acontecia.

-Mã-mae, qu-eem... – Mas não termina, pois a mãe se vira, encarando o estranho nos olho, parecendo lembrar-se de algo que parecera óbvio, voltando-se para filha, sem soltá-la.

-Nessie, esse é meu amigo de infância, Jacob Black, lembra-se de que lhe falei dele? – Mas a menina parecia muito surpresa ao encarar aquele par de órbitas pretas para conseguir se lembrar, tendo certeza de que havia algo de muito fora do normal naquele encontro.

Afinal, nunca antes ninguém a deixara tão sem reação, e não queria que começassem agora.




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Notas finais do capítulo

E aí pessoal? O Jake aparece nesse capítulo... Encontro dramático o deles não? Quer dizer, nada tão dramático quanto o relacionamento deles será por aqui hehehehe

A música do começo do chap anterior é The Lonely da cantora Christina Perri, enquanto a desse capítulo é Boring do The Pierces.

Espero que gostem e acompanhem ^^~

Capítulo terminado em 27.11.2011

Postada em 01.07.2013



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