Ju mal acreditava no que via. Ele estava de volta!

–Como assim? Quando foi que você voltou?

–Tudo bem, Ju?

Lia grunhiu, demonstrando irritação com a presença de Dinho em seu quarto. Era amparada pela avó, que tentava acalmá-la um pouco afastada do grupo que se aglomerava à entrada do quarto. Dinho entendeu o recado e se dirigiu à sala, sendo seguido pelos outros.

–Acho melhor mesmo a gente deixar a Lia com a minha mãe até se acalmar.

–O que foi isso, tio Lorenzo?

–A Lia começou a chorar, eu tentei abraçá-la, ela se esquivou, eu fiz a bobagem de apertar o abraço e ela me confundiu com um tal de Sal. Quem é esse Sal? – Dinho perguntou.

–Muitas coisas aconteceram desde que você partiu, Dinho. Aliás, por que mesmo que você voltou?

–Dr Lorenzo, se eu não tivesse voltado, não teria salvo a Lia.

–Você salvou a Lia? – Gil estava feliz que sua amiga tivesse sido salva, mas ainda assim... Por que logo ele? Um problema a livrando de outro problema, mas ainda assim um cara que a fizera sofrer mais que qualquer um. Pensou estar livre de Adriano, mas como se não bastasse a morte de sua mãe e o seqüestro de sua melhor amiga, Lia ainda foi “salva” por aquele...

–Não é romântico? O Dinho salvando a Lia da confusão que o outro namorado arranjou? Parece novela!

Dinho sentiu o baque.

–A Lia tá namorando? – sua voz falhou.

–Que foi? Pensou que ela fosse ficar chorando por um otário feito você? – Gil perguntou, ríspido.

Sabia que a ex não viveria de castidade lhe esperando, mas ainda assim doía. Sentiu um vazio, como se sua viagem não tivesse servido para nada. Contudo, mesmo podendo ser mais difícil, ainda queria lutar por sua marrentinha.

–E o pior é que a Lia não sabe mesmo escolher... Foi de um imbecil traidor ao irmão de um criminoso que a coloca em risco!

–O tal Sal? – Dinho ainda tremia, tentando entender porque Lia havia se metido naquilo. Não que nunca tivessem ficado em perigo juntos, lembrava-se bem de Vaguinho e seus capangas, mas fora uma fatalidade, nada diretamente ligado a ele. O nó em sua garganta só fazia crescer e Adriano estava dividido entre ficar e saber o que estava acontecendo e invadir o quarto de sua amada.

Enquanto Ju, Lorenzo e Olavo explicavam a história para Dinho, Lia se acalmava em seu quarto. Paulina estava aliviada por ter sua neta ali, salva e mais tranqüila, mas temia pelo dia seguinte. A morte de Marcela, a volta de Dinho, o medo de ser seqüestrada novamente... Era tudo muito novo e ao mesmo tempo. Riu da ironia do destino. Quando ela e seu filho mais queriam Lia longe de Vitor, Adriano aparecia novamente. Um a salvara do sofrimento pelo segundo, que, por sua vez, a salvara do sofrimento causado pelo irmão do primeiro. Por que sua neta não encontrava alguém que não a fizesse sofrer? Mãe, namorados... Lia definitivamente não tinha sorte. No entanto, Paulina não podia esquecer de como a neta brilhava quando estava perto de Dinho. Era comovente vê-los juntos, o que tornava mais triste o final, com o garoto a fazendo chorar tanto e sumindo por meses... Mas aquele era o mesmo Dinho que teria estado ao lado da namorada mesmo se ela estivesse grávida dele, algo estava errado. Talvez fosse possível uma segunda chance. Poderia dizer que era por Adriano não oferecer tanto perigo à garota, mas era mais que isso. Lia não gostava de Vitor como gostava de Dinho, estava em seus olhos, em seu sorriso. Jamais vira a neta tão feliz e tão apaixonada como quando a vira com o garoto de cachos.

Ouviu a porta se abrir e observou em silêncio Adriano entrando no quarto. O garoto aproximou-se da cama e em seu olhar Paulina pôde ver a confirmação do que sempre soubera: Dinho amava muito a ex-namorada. Interpretou sua expressão hesitante e respondeu antes que lhe perguntasse.

–Ela está mais tranqüila. – sorriu para o garoto.

–Quem está aí?

Lia virou o corpo de modo a encarar o estranho que havia chegado. Sua respiração parou ao ver Dinho, mas não brigou, como pretendia. Estava cansada e ainda confusa com o retorno do garoto.

–Você me desculpa? Eu não percebi, eu... Eu não queria te fazer lembrar de tudo, é que...

–Tem tantas coisas pelas quais eu nunca vou te perdoar, Dinho, e são tantas lembranças indesejáveis que a sua presença traz à tona... Qual a diferença? Olha, eu to cansada, você pode sumir e fingir que nunca voltou, por favor?

A dor e o nó na garganta voltaram. Cada patada de Lia era quase um tiro, mas esperava por aquilo.

–Lia, o Dinho salvou a sua vida! – Paulina estava indignada com a marra da neta até mesmo naquele momento.

–Eu sei... – Lia não tinha energia para aquilo, queria apenas dormir, era tão difícil entender?

–Eu não vou sair. – avó e neta olharam surpresas para Dinho – Eu não posso te deixar assim, Lia. Eu já te deixei sofrendo sozinha mais de uma vez e me prometi não voltar a cometer esse erro.

Lia queria expulsá-lo a gritos, mas não encontrou voz. Paulina, comovida com a cena, foi lentamente se afastando e voltando para a sala, onde encontrou a família Menezes, Ju, seu filho e sua outra neta.

–Que sorriso é esse, dona Paulina? – Marta questionou.

–Eles estão se entendendo? – Ju perguntou em seguida.

–Não sei... A Lia é imprevisível. – Paulina respondeu, ainda pensando na cena no quarto.

–Eu não gosto nada da idéia de deixá-los sozinhos naquele quarto!

–Lorenzo, a Lia está cansada, apavorada, traumatizada... O que você acha que pode acontecer? – Raquel respondeu, surpresa pelo nível de ciúme do ex-marido.

–E com todos esses problemas a gente deixa ela sozinha com aquele moleque inconseqüente do Dinho?

–Eu tô com o Lorenzo! O Dinho é a pior companhia que a Lia poderia ter agora!

–O Dinho não vai fazer nada, se ele voltou é porque se importa com ela! – Ju protestou.

–Mas esse não é aquele garoto que fez vocês brigarem e que depois abandonou a Lia, Juliana? – Olavo questionou.

– O Dinho sempre soube que tinha errado. A gente se falou antes da partida e ele parecia bem arrependido. E a família está toda em Miami, por que outra razão ele voltaria ao Brasil? Tá na cara que ele voltou pela Lia! Eu conheço o Dinho, ele é assim mesmo, apaixonado ao extremo.

–E inconseqüente... – Lorenzo complementou a fala de Ju.

–Também. E se ele voltou por ela, não vai querer fazer nada que deixe a Lia triste. Se tem uma coisa que eu aprendi com os meus erros é que o amor desses dois é forte demais, mais do que a gente imagina, e que a Lia sabe como ninguém fingir que não quer nada com o Dinho quando, na verdade, segue apaixonada.

Marta escutava a filha atentamente. Era incrível como Juliana havia crescido! À época em que as amigas fizeram as pazes, Ju havia narrado a história que as fizera brigar. Não estava alheia à divertida implicância de Lia e Dinho, lembrava-se dos dois fazendo guerra de areia na pracinha do bairro e de como Ju se irritava quando ambos engatavam em uma briga e esqueciam a presença da it-girl. Estava surpresa com a evolução da história dos dois, ainda que sempre tivesse desconfiado. Apenas não esperava que a história mexeria tanto com o casal, nem que se amariam com tanta intensidade quanto Ju  narrava. Também a impressionava como Ju falava tão bem e tão sinceramente de ambos, mesmo tendo sofrido pelo namoro dos dois. Preocupava-se à toa em Brasília. Não estivera presente para secar as lágrimas da filha e ela as secara sozinha, amadurecera sozinha.