Colégio Interno escrita por Híbrida
— E se ela não gostar de mim?
Gabriel estava muito preocupado com a chegada da minha mãe, que seria dali a algumas horas. Suspirei, assentindo mais uma vez à sua dúvida boba, fazendo-o rir visivelmente afetado e sentar-se ao meu lado no sofá.
Havíamos escondido qualquer resquício de droga que havíamos adquirido de maneira ilegal – talvez pareça óbvio comentar isso, mas quero deixar bem claro como somos perigosos – com os veteranos. Uma faxina havia sido executada em partes há uma semana. Aquele quarto brilhava mais do que nunca.
— Ela vai te amar, Gabriel.
— Como você pode...
— Se você ousar questionar o amor da minha mãe por você, é bom achar outra sogra.
Ele riu e beijou minha testa. Deitou-se no meu colo e sossegou o facho enquanto assistíamos a um episódio de Padrinhos Mágicos. Os demais membros do “grupinho de baderneiros”, como diria a amável professora de Química, estava rondando a escola e escondendo-se de suas mães. No caso de Bruna e Luke, estavam só se comendo em algum cantinho escondido.
O interfone tocou e me levantei para atendê-lo. O amável porteiro disse que minha mãe estava subindo e, antes mesmo de coloca-lo no gancho, lá estava a doce senhora, olhando-me de maneira terna.
Correu e me abraçou forte, beijando minha testa e sorrindo pra mim. Afastou-me, ainda segurando meus dois braços com as mãozinhas gorduchas. O fato era que toda ela era gorducha. Uma mulherzinha pequena e atarracada, com grandes olhos castanhos e um cabelo Joãozinho encantador.
— Eu senti sua falta – exclamou alegremente, me apertando novamente e encostando a cabeça em meu peito – Muita mesmo.
— Eu nem queria vir pra cá – protestei, rolando os olhos – De qualquer forma, mãe, esse é o Gabriel.
Ela parou e o encarou por uns três segundos sem proferir uma só palavra. Caminhou por volta do garoto. Gabriel estava assustado. Eu via o temor naquela imensidão oceânica e poética, a qual eu me perdia semper que olhava muito. Mas ninguém estava mais perdido do que o próprio naquele momento. Sorriu amarelo e mordeu o lábio inferior.
— Eu.. Sou o namorado da sua filha.
— Que conversa. Amanda não namora desde.. – ela disse, e parou a frase no meio. Oh, mãe, obrigada por me lembrar do fantasma do meu ex namorado perfeito. O atual vai adorar que a senhora também fale dele, como se eu e Bernardo já não falássemos o bastante – Deixa pra lá. Você é no máximo um... Dente e rola.
— Dente e... – começou Gabriel, fitando-a ainda mais confuso
— Pente e rala, mãe – corrigi, entendendo o que aquela velha senhora com intenções de parecer a mamãe moderna queria dizer – Pente e rala. Prossiga.
— A Amanda aceitou meu pedido de namoro e eu moro no Brasil – ele disse, agora em português – Em São Paulo, também. Não precisaremos nos preocupar com a distância quando sairmos daqui.
— Ótimo – ela disse, ajeitando as vestes – Eu espero do fundo do meu coração que seja pra minha filha o que aquele outro garoto foi.
Mamãe tratava o nome de Caio como os bruxos tratam o nome de Voldemort. Não deve ser nomeado, mas vamos nos lembrar de sua figura sempre que possível, já que não podemos esquecê-lo. Ela o adorava.
— Acha mesmo que Bernardo me deixaria ficar com alguém que não cuidasse de mim?
Era um nome que podia ser dito e que faziam os olhos daquela mulher cintilarem. O herói com a cueca por dentro da calça. Este capaz de ser seus olhos e ouvidos, e cuidar de mim quando ela não pode. Um sorriso enorme rasgou sua face e praticamente fechou seus olhinhos, fazendo-me imitá-la.
— Bernardo – sussurrou – Onde está o menino Bernardo?!
— Quer que eu o chame?
Ela assentiu freneticamente e peguei o celular da mão de Gabes, sentando-me ao lado dele e encostando a cabeça em seu ombro.
Froid diz: Minha mãe tá te chamando
Bê the lissia diz: Tia drii ♥
* Fala pra ela que to aqui com a tia margô e já já vou praí
* E diz que eu a amo.
Froid diz: Vai se fuder que a mãe é minha
Eu tinha um ciúme incontrolável da minha mãe para com o Bernardo. Ela gostava muito mais dele que de mim e a ideia de perder mais alguém na minha vida – mesmo que superficialmente – me assustava muito. Levantei-me e a puxei pro sofá, sentando-a ao meu lado e agarrando seu braço.
— Comprei um celular moderno pra falar com você.
— Jura?! – perguntei, sorrindo. Ela era encantadora. Assentiu com a cabeça – E o que aprendeu a fazer com ele?
— Baixei um monte de joguinho. Quer ver?
Assenti e ela começou a me mostrar todos os jogos que havia baixado no celular. Foi então que o elevador se escancarou novamente e de lá saiu Bernardo e sua mãe, a mulher mais estonteantemente bela e madura que eu conhecia.
Tia Margô é bem alta. Tem os cabelos platinados num corte Chanel. Os olhos são muito azuis e o corpo de uma moça de 30 anos trajando roupas elegantíssimas. Não que as rugas e varizes tivessem sido alteradas por plásticas. Jamais.
Imaginem Meryl Streep em O Diabo Veste Prada. Esta é a mãe de Bernardo.
Margarete queria envelhecer com dignidade.
— Tia Margô! – gritei, correndo para abraça-la.
— Meu doce! – gritou de volta, abrindo os braços.
Estranhamente, mamãe não teve a mesma reação quando viu Bernardo. Na verdade, foi bem similar à reação de quando viu Gabriel.
E então eu lembrei: seu ódio mortal por tatuagens e piercings. Nos últimos três anos, ele havia “se furado” inteiro, como ela mesma diria.
— O que foi que fizeram com você?
— Isso se chama arte corporal – ele tentou tranquiliza-la – Vamos, não sou mais seu menino Bernardo?
Abriu os alvos – porém tatuados – e finos braços, fazendo-a encaixar-se entre eles e se aconchegar.
— Tudo bem. – exclamou, depois de muito tempo de abraço – Accho que você não tem problema.
E estava comprovado: ela gostava mais dele que de mim.
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