–- Mars, quero falar contigo – era Venus, a nossa líder, que interrompeu minhas meditações.

Na última reunião, ela também falou que desejava conversar comigo. Entretanto nossa pequena “discussão” foi interrompida pelo gato companheiro dela, Artemis, trazendo uma convocação direta da Deusa.

Acenei para que ela continuasse, eu estava muito cansada para falar qualquer coisa – Queria falar sobre como você agiu naquela reunião... – Será que depois de tanto tempo ela vai me repreender por ter exposto o segredinho dela? É lógico que gosto dela, ela é minha melhor amiga e tudo, mas devemos separar sentimentos de... Como se ouvisse meus pensamentos ela completa – Concordo contigo, acho que misturei os meus sentimentos pessoais com a minha obrigação – ela senta-se ao meu lado – É errado a princesa ficar com o príncipe, isso não deve ocorrer. Mas ao mesmo tempo não dá para impedir.

–- Venus, precisamos impedir... Já falamos sobre isso. -- meu desespero era palpável -- O que acontecerá com a terra se este romance prosseguir?

–- Não sei... – ela pondera um pouco e continua – Mas acredito que já passou do tempo de falarmos sobre a profecia com ela... Conversei com a Deusa hoje e ela concorda comigo.

–-A profecia somente deveria ser passada juntamente com o despertar do poder total do Cristal de Prata – apoio minha cabeça nas mãos – Vai ser tenebroso para a princesa saber sobre isso...

–- É tenebroso para nós, não?

–- Sim...

Olho para os olhos azuis claros de Venus, ela está tão preocupada quanto eu. Agora que penso bem, deve ter doído a exposição que a fiz passar – Sinto muito...

–- Pelo quê?

–- Por ter falado aquilo... – identifico algumas lágrimas se formando no rosto jovenil de minha linda amiga, mas tenho que continuar -- Você sabe, não sabe? A nós o amor foi proibido... Nascemos para servir unicamente a princesa...

–- É, eu sei... – ela me olha com olhos brilhando.

–- O que é?

–- Eu o amo, Mars... Não sei como aconteceu nem porque, mas este sentimento já invadiu meu coração... – Não sei o que falar, a dor de minha amiga é mais forte que minha convicção, terei que ser dura.

–- Este amor será sua ruina, como será da Princesa.

–- Não acredito que o amor possa ser a ruína de ninguém... Você somente fala isso por nunca ter se apaixonado...

Sim, era justo, eu a acusei do amor insano e ela me traz a lembrança que me machuca: eu nunca me apaixonei por ninguém, nunca amei realmente ninguém... só a princesa, sempre foi somente a princesa... Nem meus pais eu amei ou fui amada por eles... Eu sempre fui o tributo do reino de marte à Deusa da Lua, a princesa sacrificada para trazer bonança ao meu reino e Venus bem sabia disso...

–- Torço, realmente, para que você esteja certa... – Elevo-me – agora irei à joia azul... Mercury já deve estar me esperando... – Venus olha para mim como se oferecendo para ir, mas considero melhor não – Eu irei, há muito devo ir à joia azul, tenho uma preocupação crescente...

–- O meteoro?

–- Isso mesmo, o meteoro... – A minha grande preocupação, o meteoro de energia negra que simplesmente sumiu em uma chuva de meteoros de uma hora para outra... A Deusa já falou que pode ser algo banal, mas minha intuição me diz que tem muito mais coisas envolvidas...

–- Você acredita mesmo que a profecia se realizou?

–- Acredito... Há muito não nos relacionamos com o reino da terra, dizem que o planeta já sofreu diversas modificações e se separou em tribos... Temo que a ligação política que possuímos esteja enfraquecida... Bem como nossa influência na superfície.

–- Irei contigo, já conheço...

–- Eu sei, Venus, que você conhece perfeitamente o líder dos Shintennous e a superfície da joia azul, mas isso é perigoso demais.. – os grandes olhos da líder das guardiãs me fitaram com culpa – Não quero que se envolva mais...

–- Fale com Lord Kunzite, apesar de nós estarmos envolvidos, ele também é completamente contra o romance da Princesa com o Príncipe... – ela eleva-se e endireita a postura – Depois que pensei melhor, também o sou. Mas prefiro o planeta destruído à Serenity morta...

–- Não te entendo...

–- Alguém que nunca amou não pode me entender... – ela vira as costas – Bom, tenho que treinar os novos soldados da guarda real.

Saio do templo.

Sim, Venus está correta, mas não ligo...

Respiro o ar noturno da Lua, há uma mistura de hortelã com o aroma doce de rosas...

A cúpula de cristal me envolve e flutuo para a imensidão celeste...

Estar no espaço é tão místico, que quase me perco até minha cúpula ultrapassar a atmosfera terrestre e eu ser “golpeada” com a beleza da joia azul.

É finalzinho do inverno e o céu está vermelho intenso, o entardecer chega banhando o planeta nesta luz divina, a branca neve brilha aos vermelhos raios de sol. A imagem é tão magnífica, nunca em minhas raras viagens pelo espaço me deparei com lugar tão belo... Queria ter viajado mais, admito em meu âmago, também admito que a acusação de Venus pesou... Eu nunca existi para mim mesma... Sempre foram as minhas obrigações em primeiro lugar...

Onde será que a princesa se meteu?

Ouço risos próximos e uma voz que tenho certeza ser de Mercury, movo-me silenciosamente, O que será que está havendo? Com quem ela está?

Quando as vozes estão quase inteligíveis, sou jogada para o outro lado da trilha que seguia e me choco em um forte carvalho. Pela dor que senti tenho certeza que uma costela foi luxada, um filete de sangue escorre por minha boca enquanto estou caindo do topo. Dou uma cambalhota e minhas pernas se abrem como de um felino. Elevo-me já armando meu arco.

–- Quem se atreveu? -- Olho em volta, alerta.

O cara loiro que estava em Júpiter aparece por trás de uma árvore.

–- Vejo que possui boa resistência...

É um dos generais do príncipe, os Shitennous... Venus me falou que eles são de confiança...

Baixo minha guarda e ele se aproxima lentamente de mim, sua pele é muito clara, como de uma boneca... Fico hipnotizada pelo seu olhar penetrante, mas antes que eu consiga dizer qualquer coisa ele está próximo demais e abaixa a minha flecha completando com voz suave -- Intrusa.

–- Não compreendo – relaxo o arco, realmente não queria ferir um Shitennou e ele deve ter se confundido... Um sorriso de malícia cruza meus lábios – Você é tão intruso na superfície da joia azul quanto eu.

–- Os lunares são mais – há fúria que não compreendo em seu olhar – Vocês roubam nossa matéria-prima e agora sequestraram nosso príncipe.

Não consegui entender, ele se moveu rapidamente e me atingiu com um poder avassalador, senti minhas entranhas comprimirem, mais sangue invade minha boca e caio no chão ofegante.

–- O quê? Garoto, você é maluco? – me recupero e de onde estava atinjo-o com um soco no estômago, ele voa para o outro lado...

Vejo mais fúria em seu olhar enquanto tento me pôr de pé, o soco só agravou o ferimento em minha costela.

–- Parece que terei diversão – ele sorria enquanto voava para cima de mim e iniciamos uma batalha.

Cada golpe deferido em mim pelo loiro é intenso e gera uma dor excruciante, tento responder com igual força. Ele deve ser um louco... Tento argumentar, mas nada parece surtir efeito.

Depois de não sei quanto tempo batalhando, o gosto de ferrugem característico de sangue está mais intenso na minha boca – Por que está fazendo isso?

Rosno entre os dentes, sentindo a respiração dele próxima ao meu rosto.

Tínhamos rolado no chão, o corpo dele estava sobre o meu em uma posição que eu pouco poderia me mexer. Meu coração estava acelerado.

Era constrangedor...

–- Por que você invadiu a joia azul – senti o cheiro de seu hálito de canela próximo de meu rosto e vi um sorriso de desdém formar-se em seus lábios finos – Não poderia te perdoar, mesmo sendo tão bela...

Bela? Penso assustada.

Ele limpa com aquelas mãos suaves o sangue que havia escorrido de meu nariz e afasta um dos meus longos fios negros de meu rosto, minha respiração fica mais rápida e encaro os lábios dele.

Seus olhos estão cálidos, tão diferente da frieza de suas palavras e expressão.

Tento me desvencilhar de seu aperto, ainda observando aqueles lábios finos, mas ele aproxima-se lentamente do meu rosto e seus lábios tocam os meus em um beijo gentil. O sabor de seu beijo era doce, sua língua invadia a extensão de minha boca em movimentos leves... Este foi meu primeiro beijo, mas antes que eu me perdesse completamente, empurro-o com toda a minha força para longe de mim.

Em meio à fúria e as palpitações do meu coração, que atribui a batalha, saltei para trás.

–- Vou te matar! – meu corpo todo tremia de fúria, meu coração estava acelerado, aquele atrevido tinha que morrer.

Armei meu arco mais uma vez, iria lhe deferir a flecha de fogo em forma de águia que a deusa da lua me presenteou.

–- Bunning...

–- Mars!! – era a voz de minha princesa. Ainda com o arco armado, olhei para o lado e a vi. Serenity estava ao lado de Mercury, do Príncipe e do outro guerreiro – O que você está fazendo?

Serenity moveu-se rapidamente até mim, retirou o arco de minha mão e me abraçou – O que aconteceu? Quem te feriu?

Olhei para onde meu desafiante deveria estar e nada vi. Antes que fosse possível falar qualquer coisa, perdi-me no meu inconsciente que era banhado por sorrisos sedutores e a voz do meu desafiante loiro falando de minha beleza.