Meu Vampiro De Estimação escrita por Eica


Capítulo 9
Palavras não ditas


Notas iniciais do capítulo

Foto de Sylvian:
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Foto de Thibaut:
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Caio atendeu seu celular quando este tocou.

- Caio, aqui é o Cléber.

- Ah, oi.

- O Eric ia te buscar no colégio. Você o viu?

- Ah, sabe, aconteceu um pequeno imprevisto e ele terá de passar a noite em casa.

- Ele está com você?

- Sim, sim. Estamos em casa.

- O que aconteceu? Ele passou mal?

- Não, não. Ele está bem. Só vai ter que... Depois ele liga pra você e explica. Boa noite.

A situação não poderia ter sido mais estranha. Por isso, Cléber saiu de casa e foi direto à mansão. Parou o carro ao lado da calçada e achou mais confuso ainda ver o carro de Eric em frente ao portão. Apertou o interfone três vezes. Pensou em ligar para Caio, mas o portão finalmente se abriu.

- O Eric. - disse, quando a figura de Sébastien apareceu.

- Sabe que horas são? Muito tarde para incomodar. Volte outra hora.

- Espere. Conversei com Caio há poucos minutos. Disse que o Eric ia passar a noite aqui. Queria ver se está bem.

- Sim, está muito bem. Volte outra hora.

- Posso entrar e vê-lo?

- Já disse que é muito tarde. Eric está dormindo.

O vampiro bateu o portão na cara do rapaz. Este ficou uns minutos sem saber o que fazer. Mesmo preocupado, teve que voltar para casa, cheio de perguntas na cabeça. Eric acordou pela manhã. Foi ao banheiro e andou pelo quarto, muito entediado e preocupado. Quando Sébastien ia soltá-lo? Por falar no vampiro, este apareceu um tempo depois quando Eric sentou na cama para aguardar. O rapaz imaginou que fosse Caio, e até sentiu grandes esperanças, mas quando viu Sébastien, desanimou totalmente.

- Sébastien, isso é ridículo. - disse, quando viu o vampiro trancar a porta. - Quanto tempo me deixará preso aqui?

- Precisamos ter uma conversinha.

O outro sentou-se ao seu lado.

- Por que me trancou aqui?

- Foi a única forma que encontrei para te fazer compreender que você não deve sair. Esta é sua única casa. Não tem que ir a nenhuma outra.

- Eu disse a você que só passaria a semana com o Cléber. Não ia ficar lá para sempre.

- Não me interessa. Dessa casa você não sai.

Eric levantou-se depois que Sébastien levantou.

- Espera! Posso sair?

- Vai me obedecer?

- Vou.

- Não me convenceu.

- Espera! Tudo bem, eu obedeço, mas vou ter que voltar à casa do Cléber para buscar minhas coisas.

Sébastien ponderou por alguns segundos. Em seguida, aproximou-se o máximo que pôde do garoto e, fitando-o intensamente nos olhos, disse:

- Se você ir até lá e ficar... Não perdoarei você.

Uma frase nunca soou tão ameaçadora. Eric não teve escolha. Se quisesse sair daquele quarto, era melhor obedecer. Desceu para a cozinha quando o vampiro revelou que o seu irmão estava lá. Assim que os meninos se reencontraram, abraçaram-se forte.

- Tudo bem?

- Tudo. Foi muito chato ficar lá dentro. Você viu meu celular? Não sei onde deixei.

- Estava no carro. Peguei pra você.

- Ah, obrigado!

- Preciso ligar pro Cléber. Vou pedir que traga minhas coisas. Onde está o celular?

- Na sala.

O jovem foi até lá. Recolheu o celular de cima da mesa de centro e discou para Cléber.

- Eric, meu amor! O que aconteceu? Mal dormi essa noite pensando em você. Fiquei preocupado.

- Não aconteceu nada. Fica calmo. Eu estou bem... Liguei porque preciso das minhas malas. Não tem como você trazer pra mim?

- Por que?

- Não quero falar sobre isso agora. Por favor, pode me trazer?

- … Está bem. Precisa agora?

- Quando você puder.

- Eu te levo na hora do almoço. Tudo bem?

- Pode ser. Obrigado.

Cléber apareceu no horário prometido. Eric atendeu-o no portão. Cléber passou-lhe suas malas.

- E então? O que aconteceu?

- Nada demais.

- Por que desistiu de ficar comigo? A experiência não foi boa?

- Não tem nada a ver com você.

Eric recebeu afagos e beijos no rosto. Depois, um abraço. No momento em que estava nos braços de Cléber e sentia seus lábios molharem seu pescoço, notou uma das mãos do moço esconder-se sob sua camiseta e tocar-lhe nas costas. Sua mão correu por sua pele e de maneira súbita, afastou-se. O momento seguinte foi rápido e impossível de evitar. Cléber viu suas feridas.

- Meu Deus! Meu Deus! O que é isso?

- Um acidente.

- Como? Que acidente foi esse?

- Eu caí. Da escada.

Cléber ficou surpreso.

- Não sou idiota, Eric. Uma queda da escada não faria isso. Parece que alguém... Bateu em você.

De repente, a expressão de Cléber mudou violentamente.

- Foi seu primo!

Eric riu.

- Ah, não foi nada disso. Agora você é quem está me chamando de idiota. Acha que ficaria na mesma casa de alguém que me bate?

- Que outra explicação pode haver? Ele é estranho. Ontem mesmo não me deixou vê-lo. Quem mais poderia ter feito algo assim?

- Ele não me bateu. - assegurou, com firmeza.

- Não acredito em você.

- Azar o seu. Não estou mentindo.

- Eric... Por que não me fala? Fale pra mim. Se estiver com problemas, posso ajudar.

- Não preciso de ajuda. Estou bem.

- Meu Deus... Não confia em mim?

- Não te conto a verdade... Porque quero proteger a nós três. Especialmente Sébastien.

- Protegê-lo? Por quê? Cada vez que olho pra ele, torna-se mais desprezível para mim.

A conversa com Cléber enervou Eric de uma maneira impressionante. Até precisou ser grosseiro com o rapaz para que se acalmasse e fosse embora sem ter os mesmos pensamentos errados. Eric foi para o quarto e começou a tirar as roupas das malas. Caio entrou em seu aposento e sentou na cama.

- Acho que Sébastien gosta de você. - disse o garoto, abruptamente.

- Que? Por que acha isso?

- Pela forma como agiu. Te trancando aqui em casa e tudo mais... Não quer te ver com o Cléber. Não quer ficar longe de você.

- Ele faz isso porque adora controlar os outros. É do tipo que odeia quando as coisas não saem como ele quer. Você o conhece bem. Sabe que ele é assim.

- Não, pra mim ele gosta de você. Desculpe, mas não consigo enxergar as coisas de outro modo.

- Vamos esquecer, tudo bem?

Neste mesmo dia, Cléber fez muitas ligações ao namorado para saber se estava tudo bem. Disse ainda que desejava que Eric saísse da casa e mais uma vez, o rapaz precisou ser grosseiro para convencer o outro de que não havia nada errado. O convívio entre os três, após estes eventos, não sofreu mudanças. Sébastien também não beijou Caio e não tocou em Eric. Mas entrava no quarto de ambos para vê-los dormir. Abria as portas dos aposentos com cuidado e espiava-os da soleira. Muitos dias passaram desde a última vez em que relacionou-se intimamente com Eric, por isso sofria por conta da ânsia em contato físico. Para um homem como ele que habituou-se em ter relações mais de cinco vezes por dia, ficar tanto tempo sem tocar e ser tocado era penoso ao extremo.

Sentia o aroma dos garotos, via-os dormir só de shorts, vislumbrava cada detalhe de seus corpos rijos e juvenis e lamentava em silêncio não poder tocar, não poder atacá-los com toda força de seu anseio. Era preciso segurar-se. Segurar-se.

Talvez...

No dia seguinte, Sébastien ligou para o telefone de Thibaut e no dia posterior, o vampiro fez-lhe uma visita durante a noite. Foram para o escritório onde não seriam incomodados.

- Você falou de uma forma muito urgente. Fiquei curioso. O que foi?

- Preciso de dois favores.

- O que quiser.

- A primeira coisa que preciso é que descubra se há mais vampiros na cidade.

- Por que?

Sébastien falou a respeito do ataque.

- Que estranho, não? - comentou Thibaut, após ouvir o final do relato. - Por que viriam atacá-los?

- Isso não é o mais estranho. Segundo os meninos, apenas Eric foi atacado. Se aquele vampiro quisesse machucar Caio, teria machucado. Mas não o machucou.

- Espere... Talvez quisessem se vingar. Você não disse que Eric machucou um deles naquela noite? Não acha que possam ter vindo atrás dele por isso?

- Também pensei nisso, mas...

- De qualquer modo, verei o que posso fazer. Não sabe o meu poder de persuasão.

Sébastien observou o sorriso de Thibaut.

- E qual a outra coisa que quer pedir?

- Quero que me arranje alguém.

- Como assim?

- Sabe o que quero dizer.

Thibaut sorriu depois de compreender.

- Não tem diversão em casa?

O vampiro fez cara feia e Thibaut não conseguiu segurar o riso.

- Sébastien... Onde está seu poder de sedução? Acabou quando foi trancado na urna? É curioso que me peça companhia quando tem duas adoráveis em casa.

- Não posso tocar em nenhum deles.

- Por que não? Aliás, é bom que não possa tocar em Caio, ou eu ficaria enciumado. Eles resistem a você? É este o problema? Não se interessam? Você, um homem tão atraente... Que estranho...

- Pode me fazer este favor?

- Devo admitir que é o mais fácil deles. Claro que posso te ajudar. Agora... É muito urgente?

- Quanto mais cedo arranjar-me companhia, melhor.

- Ah, meu querido... Que pena que sinto de você...

Thibaut tornou a rir.

- Não me trate como uma piada.

- Mas é o que você é neste momento. - riu o vampiro. - Há quanto tempo não se diverte com alguém? Não me diga que está sem fazer sexo desde que saiu da urna! Se este for o caso, então é urgentíssimo! Hm... Vejamos... Acho que tenho a pessoa certa para você. Conversarei com ele e verei se ele se interessa. Confie em mim.

Sébastien olhou para a estante e Thibaut aproveitou a ocasião para fitá-lo com mais atenção.

- Sua força de vontade é extremamente notável. - observou Thibaut.

Sébastien fitou-o.

- Por que diz isso?

- Eu já teria amarrado o garoto na cama. Não falo de Caio, é claro, não quero que você toque nele. Falo do mais velho. Ele tem personalidade forte. Deve reservar algumas surpresas, compreende?

- Não me diga essas coisas. Minha situação não é fácil.

O vampiro riu outra vez.

- Sim, claro. E é por isto mesmo que digo que sua força de vontade é notável. Eu não teria misericórdia e acho que você também não deveria ter.

Thibaut e Sébastien conversaram por mais alguns minutos até despedirem-se. Thibaut deu boa noite a Eric, que estava na sala, com seu notebook sobre o colo. Depois da despedida, Sébastien trancou-se em seu quarto e não saiu.

No outro dia, após o horário de almoço, Sébastien recebeu uma ligação de Thibaut. O vampiro avisou-o que um rapaz se interessara por ele.

- Ele é um de meus empregados. Um rapaz muito bonito. Tenho certeza de que vai agradá-lo. Para que tenham mais liberdade, poderei buscá-lo esta noite. Poderão passar a noite em minha casa.

- Mas e Sylvian? Não mora com você?

- Sylvian e eu já planejamos um passeio. Não se preocupe. A casa ficará vazia. Estaria interessado?

- Pois bem. Pode vir me buscar.

Quando Sébastien avisou aos meninos que faria uma visita a Thibaut, Eric estranhou.

- Você não disse que seu amigo não é confiável? E agora vai na casa dele? Não te entendo.

- Ao contrário de vocês dois, tenho como enfrentá-lo.

O vampiro não voltou a conversar com os meninos. Acomodou-se em seu caixão e permaneceu por lá até o início da noite. Um pouco depois de Eric levar Caio à escola, Thibaut apareceu. Sébastien, levando consigo um maço de cópias das chaves de casa, entrou na limousine do vampiro e teve uma surpresa: Sylvian estava lá.

- Boa noite. - disse o de olhos verdes.

- Boa noite.

Sébastien sentou-se no banco ao lado de Thibaut, fechou a porta e o automóvel começou a andar.

- É bom vê-lo novamente, Sébastien. Por mais que possa soar como uma mentira, queria muito reencontrá-lo. Embora não gostasse de você, nunca desejei-lhe o mal.

- Lamento não poder dizer o mesmo. Desculpe, mas é a verdade.

- Claro.

Thibaut olhou de um para o outro.

- Sylvian sempre foi uma excelente companhia. Nos separamos algumas vezes quando queríamos viajar para lugares diferentes. Mas nunca deixamos de nos comunicar. Sylvian já é uma companhia indispensável para mim. É certo dizer que as amizades são para sempre, não é mesmo? No nosso caso, é a mais pura verdade.

Sylvian deu um leve sorriso.

- Se me permite perguntar... - começou o vampiro. - Como permaneceu preso, e vivo, na urna?

- Colocaram um lacre nela. Lacre que não me matou, mas que também não me permitiu sair.

- Quem diria, não? - disse Thibaut, olhando para Sylvian.

Foi uma surpresa para Thibaut ver Sébastien e Sylvian conversarem civilizadamente sem trocarem olhares mortíferos durante o trajeto até sua casa. A casa, por sinal, não era uma casa, mas uma mansão, que nas palavras do vampiro, era “modesta”. Ficava num terreno quase que saindo da cidade, na zona sul, longe de outras casas e comércios. Uma propriedade um pouco maior que a de Sébastien, ou melhor, de Eric e Caio.

A limousine foi estacionada em frente do grandioso portão. Não dava para ver nada do terreno por causa do muro alto circundado por pinheiros.

- Dentre todas as casas que tive, esta é uma das mais pequenas. - comentou Thibaut, assim que a limousine parou. - Não tive tempo de encontrar uma maior. Se bem que, tenho certeza de que não encontraria por aqui. Acompanhe-me.

Thibaut saiu do carro, sendo seguido por Sébastien. O vampiro abriu o portão e caminhou com Sébastien pelo enorme jardim. A casa tinha um design bastante moderno e, na opinião de Thibaut, feio. Entraram pela porta frontal e chegaram ao hall da escadaria.

- Eu o invejo. Mora numa casa mais bonita que a minha. Pois bem. William o espera na sala. Isto se não foi para outro lugar enquanto nos esperava. Fique à vontade. Sylvian e eu voltaremos mais tarde. William mostrará o quarto que reservei aos dois. Até mais tarde, querido.

Thibaut beijou a mão de Sébastien e saiu. O vampiro andou pela casa à procura do jovem. Entrou em muitos aposentos até, por fim, achar o rapaz numa sala, sentado num espaçoso sofá. Tinha cabelos castanhos claros e olhos verdes. Uma figura bastante singular e atraente. Vestia uma camiseta branca e jeans. Os pés estavam descalços. Quando William viu o recém-chegado, dirigiu-lhe um lindo sorriso.

- Boa noite.

- Boa noite.

- Sébastien?

- Naturalmente.

- Thibaut já foi?

- Sim, já.

Sébastien aproximou-se vagarosamente.

- É empregado dele há muito tempo?

- Não.

- O que faz?

- De tudo um pouco.

Era mesmo uma presa maravilhosa.

- Não conte isso a ele... Mas dou-me melhor com Sylvian.

- Em qual aspecto?

- Você vai me morder?

- Não pretendo.

- Por que não?

- Deseja que eu lhe morda?

- Nenhum deles quer me transformar em vampiro.

- Talvez queiram privá-lo de uma vida de martírios.

- Ao contrário. Sei pelo que os dois passam. Sei o que é ser vampiro. Por isso gostaria de ser um.

- Vamos ver.

Enquanto isso, a limousine deixara Thibaut e Sylvian num restaurante do bairro Campolim. Entraram, sentaram numa mesa e pediram vinho.

- Interessaria conhecer os garotos?

- Claro. Falou-me tanto deles que fiquei curioso.

- São uns amores. Especialmente Caio.

- Você gostou dele de verdade, não é?

- Sim, eu gostei. Não há momento do dia em que não pense nele. Faz tempo que não me apaixonava desta maneira. É o único peso no coração que não dói.

- Achei Sébastien muito deprimido. Digo, não tem aquela personalidade alegre que tinha quando o conheci. Era bastante impulsivo.

- Sim. Não sei o que houve com ele. Talvez acordar num mundo diferente daquele que estava habituado tenha mudado seus ânimos. Além disso, ele é dependente de dois garotos. Não toma a quantidade de sangue necessária para recompor as energias. O que o garoto lhe dá não é suficiente. Se comesse adequadamente, não se sentiria mal.

- Vai ajudá-lo?

- Até poderia. Por que não?

O garçom trouxe o vinho. Serviu-os. Sylvian observou a taça cheia do líquido.

- Mon cher... - disse Thibaut, olhando carinhosamente para o outro.

Sylvian sorriu-lhe.

- Comment Je t'aime, mon cher.

Thibaut pegou a mão esquerda de Sylvian e acariciou-a.

- Il ya des choses que vous seul pouvez me faire. Há duas coisas que mais temo neste mundo. Você conhece uma delas. Sabe qual é a outra?

- Não. Qual seria?

- Declarei-me tantas vezes a você... Isto não lhe dá uma dica? Você tem um lugar especial em meu coração. Sabe disso.

Thibaut beijou-lhe a mão repetidas vezes. Como o restaurante não estava vazio, as pessoas das mesas mais próximas viram o gesto de carinho.

- Não sei o que faria sem você. E ainda preciso muito de seu apoio e de sua ajuda. Ainda viveremos muito para vermos o mundo mudar outra vez mais.

- Como ainda nos aturamos depois de tanto tempo? - brincou Sylvian.

- Deveriam nos perguntar qual o segredo para um casamento feliz.

Sylvian soltou um riso discreto. Thibaut soltou-lhe a mão.

- Não tem medo de deixar Sébastien sozinho na casa?

- Não. Aparentemente está tão necessitado que não prestará atenção em mais nada a não ser na companhia que lhe deixei.

Duas horas mais tarde, a limousine voltou a parar em frente da casa. Desta vez, ambos os vampiros saíram do automóvel. Encontraram Sébastien sentado no sofá da sala. Sozinho.

- Vou levá-lo para casa. - disse Thibaut. - Pode me esperar acordado, Sylvian? Ainda quero conversar com você.

- Claro.

Antes de sair da sala, Sylvian desejou boa noite a Sébastien. Os dois vampiros foram para a limousine. O motorista fez o caminho para a casa de Sébastien.

- Foi satisfatório? - indagou Thibaut, não suportando a curiosidade.

- Tenho certeza de que teria sido. Era um rapaz perfeito.

- Como assim? Você não fez?

- Não.

- Sébastien! Por que não? Oh! Só pode estar brincando!

- Não estou. Não fizemos nada.

- Por que?

- Não consegui.

- Por que não?

- Meus pensamentos não permitiram. Durante esta noite eu percebi... Que não era a companhia dele que queria.

- Do que fala? Ah, sim, claro, como poderia ser diferente? Você não conhece tantas pessoas nesta vida, não é mesmo?

Sébastien não respondeu. Foi deixado em casa. Thibaut despediu-se prometendo voltar. Ao entrar na propriedade, o vampiro notou que as luzes da primeira sala estavam ligadas. Sinal de que alguém estava acordado. Entrando lá, deu-se com os dois irmãos deitados nos sofás.

- Enfim voltou. - disse Eric.

- Esperavam por mim?

- Lógico. Temos que zelar por nossa propriedade.

Sébastien sorriu de lado.

- Continua a achar que pertenço aos dois como se fosse um objeto?

- Lembre-se que herdamos a casa e tudo o que há dentro dela. Você estava dentro dela, não estava?

O vampiro riu levemente.

- Vamos supor que eu pertença aos dois. Nenhum de vocês têm me usado ultimamente.

- Como assim? - indagou Caio.

- Tudo tem um prazo de validade, não tem? Neste caso, o meu prazo é minha paciência. Se querem me usar, estarei em meu quarto a inteira disposição. Usem-me como quiserem. Não quero ser descartado como muitos objetos desta casa já foram. Boa noite.

Quando os irmãos ficaram sozinhos, Caio soltou:

- Ele sugeriu o que acho que sugeriu?

- Acho que sim.

Caio levantou-se de um pulo.

- Aí está a prova, Eric. Ele não escolheu ninguém. Do jeito que falou, tem intenção de fazer “aquilo” com qualquer um dos dois.

- “Aquilo”? Ainda não consegue dizer “sexo”?

- Não, dá vergonha.

Eric silenciou. Refletiu a respeito.

- Eu não entendo... O que ele quer da vida? Venha, Caio.

Eric desligou a televisão. Desligaram a luz da sala e ligaram a luz da escada. Subiram-na e chegaram ao corredor do primeiro piso. Caminharam em direção a porta do quarto do vampiro. Atravessaram-na e pararam em frente da porta. Pelo visto, Sébastien já estava dentro do caixão. O rapaz mais velho abriu a tampa. O vampiro, deitado, abriu os olhos.

- Por que não me surpreendo? - sorriu.

No momento em que sentou, porém, viu a figura de Caio em frente da porta.

- Que surpresa! Os dois ao mesmo tempo? Nunca estive tão feliz.

- Não é nada disso que está pensando, seu tarado. - replicou Eric. - Já chega disso, Sébastien. Não sei do Caio, mas eu não aguento mais. Você demonstra que gosta dele...

- E demonstra que gosta do Eric. - acrescentou Caio, rapidamente.

- Mas ainda tem vontade de... Qual é o seu problema?

- O meu problema são os dois. - respondeu o vampiro, ficando sério. - Os dois me tocaram de uma maneira muito profunda. Interesso-me pelos dois. Isto eu deixei muito claro. Não sei por que não ficam comigo. É algo muito simples.

- Porque há sentimentos envolvidos. - respondeu Caio.

Eric olhou-o com admiração. Caio aproximou-se. Parou ao lado do irmão e disse, olhando para o vampiro:

- Nós dois gostamos de você.

- Sim, e isto me deixa muito feliz. - sorriu o vampiro. - Tentaremos desta forma. Eu me darei inteiramente ao dois. Ficaremos juntos. Isto não os agrada?

Os irmãos entreolharam-se.

- Não haverá perdedor. - disse o vampiro, saindo do caixão.

Foi até a porta e fechou-a à chave. Em seguida, fez os meninos sentarem na cama.

- Durmam comigo. Não é bom?

O vampiro deitou-se na cama e puxou os meninos para mais perto dele. Caio deitou-se ao seu lado direito e Eric, ao seu lado esquerdo. Para Sébastien, era uma vitória. Para os meninos, era estranho, mas muito tentador. O vampiro enlaçou os braços nos garotos e acariciou-lhes.

- Estão sentindo? - disse, olhando para o teto. - Meu coração está em polvorosa.

Os meninos deixaram-se levar. Acabaram dormindo nos braços do vampiro. Sébastien foi o primeiro a levantar e apreciou muito a sensação de triunfo. Quando os meninos acordaram, Caio foi arrumar seus livros da escola e Eric separou as contas que precisava pagar. Como o sol estava escondido no céu cinzento, Sébastien pôde caminhar pelo jardim. A equipe da empresa de piscinas viera bem cedinho para continuar com a construção da piscina de azulejo. O vampiro espiou-os por um tempo.

Na hora em que Eric estava na cozinha, Caio apareceu esboçando nervosismo na face e nos gestos. Segurava o celular.

- Thibaut ligou pra mim. Nos convidou para ir ao shopping. Você e eu. Eu ainda não respondi. Falei que ia conversar com você antes de tudo.

- Aos dois?

- É. Ele falou que o amigo dele quer nos conhecer. O que a gente faz?

- Não sei...

Eric continuou lavando o prato que sujara há poucos minutos atrás.

- Acho que mal não vai fazer.

- É, muito provável. Quem não vai gostar da ideia é Sébastien... Bom, se é só para conhecer o amigo dele, não tem problema.

- Então eu digo sim?

- De minha parte tudo bem.

- Está certo.

O encontro deu-se no sábado. Para despistar o vampiro, os meninos precisaram contar uma pequena mentira a Sébastien, dizendo que iam encontrar-se com amigos para algo muito importante. Ele não importou-se com a saída dos meninos porque a atitude insinuante de ambos lhe agradou bastante. Eric e Caio deixaram o carro no estacionamento do shopping e depararam-se com Thibaut em frente a uma das entradas, em companhia de um homem mais ou menos de sua altura. Ambos usavam calças sociais, sobretudos e sapatos muito finos, evidenciando seus status sociais. A aparência fina e bonita dos vampiros chamou a atenção de muitas jovens mulheres que passaram por eles.

Como de costume, Thibaut cumprimentou os meninos com beijos nas costas de suas mãos. Já Sylvian, apenas cumprimentou-os com um aperto de mão.

- Muito prazer. - disse o vampiro.

Os irmãos responderam com um “igualmente”.

- Vamos entrar? Este shopping não é de todo mal. - disse Thibaut.

Caio ficou ao lado de Eric. Já Thibaut, ficou ao lado do rapazinho que tanto lhe encantava.

- Estão gostando da cidade? - indagou Eric, quando caminhavam pelo primeiro corredor.

Muitos grupos de pessoas passeavam pelo seu interior, olhando vitrines e explorando lojas.

- É bastante agradável. - respondeu Sylvian.

- Digo o mesmo.

- Os dois nasceram em Paris?

- Sim, mas em regiões diferentes. - disse Thibaut. - Sylvian nasceu no arrondissement de Luxemburg e eu, em Hôtel de ville.

- Há quanto tempo sabem da existência de vampiros? - disse Eric, de modo desajeitado.

- Pelo que me informaram, os primeiros vampiros surgiram no final do século XIV.

- Século XIV? Tão antigo assim?

Thibaut sorriu.

- Ainda existem vampiros desta época?

- Se os boatos são verdadeiros, conheço um que ainda está vivo e que até recentemente estava vivendo na Alemanha. Não sei o seu nome, mas dizem que é alguém muito importante.

Chegaram na praça de alimentação e sentaram numa mesa.

- Como é viver com Sébastien? - indagou Thibaut.

- Difícil.

Caio concordou com o irmão dando um sorriso.

- Ah, ele é mesmo. Muito difícil. Eu os admiro por conseguirem viver sob o mesmo teto que ele.

- O que pensam sobre as ideias de hoje a respeito dos vampiros?

- Eu apenas dou risada. - respondeu Thibaut. - As pessoas sabem das coisas, mas não sabem a gravidade destas coisas. É engraçado saber que não levam tudo com a seriedade que deveriam levar.

Thibaut desistiu de acrescentar: “Os vampiros são mais perigosos do que pensam”.

- Conhecemos o shopping antes de nos encontrarmos. - comentou Thibaut. - Vi algo interessante numa loja. Poderia me acompanhar, Caio?

- Hm?

Thibaut levantou-se da cadeira. Caio levantou em seguida. O rapazinho foi vencido pela insistência do vampiro e afastou-se do irmão. Acompanhou Thibaut ao primeiro piso do shopping. Quando Eric olhou para Sylvian de esguelha, notou que era observado sem pudor.

- Não quero ser indiscreto, mas... Qual sua relação com Sébastien?

- Nunca fomos íntimos. Com toda certeza fui o responsável pela antipatia que ele passou a sentir por mim porque não ocultava minha aversão por ele. Aprendi que os vampiros são muito possessivos. Quando Thibaut e eu estávamos juntos, Sébastien e ele se conheceram. Deixei evidente meu repúdio pelo interesse mútuo entre eles e não suportei a ideia de ser trocado. Thibaut trocou-me por Sébastien, por isso odiei-o a partir deste dia.

- Ah, eu não sabia.

- Sébastien não comentou sobre seu envolvimento com Thibaut?

- Não... Thibaut fala sobre meu irmão?

- Muito. Está interessado nele.

- Mesmo?

- Sim, está.

Fizeram silêncio. Sylvian continuou olhando fixamente para Eric.

- Você também não tem sotaque. - observou o rapaz.

Sylvian sorriu.

Naquele instante, um pensamento passou pela cabeça de Eric: “Meu Deus! Que homem lindo!”. Como não dar vexame na frente daquele homem cheiroso e perfeito? Sylvian estava com a postura ereta, as pernas cruzadas e as mãos sobre a coxa. O sobretudo cinza com cinto e botões frontais ficara esplêndido nele. Combinara perfeitamente com sua calça preta e sua camisa branca.

- Você quer me dizer algo?

- Hm?

- Parece que quer dizer alguma coisa. Já o vi abrir a boca três vezes e não falar nada.

- Não, é que.. É só uma curiosidade.

- Qual?

- Não é delicado perguntar.

- Algo a meu respeito, certamente?

- Sua... Idade.

- Nasci em 1712. Para as pessoas desta época, nasci em 1987. Sou cinquenta anos mais novo que Thibaut.

- Você é tão novo... Digo, na aparência.

Sylvian tornou a sorrir.

- Obrigado.

Eric abaixou os olhos. Fitou as próprias mãos, enquanto Sylvian mantinha o olhar sobre ele.

- A família Beaumont é muito antiga.

- Mas vai acabar por aqui. - riu o rapaz. - Como Caio e eu não teremos filhos... Quando morrermos, acabou.

- Mas ainda restará um.

- Ah, é... O Sébastien... É difícil esquecer que ele vai viver para sempre.

- A morte é necessária. Até para nós. A imortalidade não é natural... Quando sentir-me muito cansado, preparar-me-ei para morrer.

- Você quer morrer?

- É uma de minhas certezas. Não temo a morte.

- Não acho que deveria fazer isso.

Sylvian fitou-o com interesse.

- Não?

- Não.

Após um tempo, Thibaut e Caio voltaram. O garoto trazia uma sacola. Eric ficou curioso a respeito dela e Thibaut não demorou a explicar que comprara um lindo casaco para Caio. Um que, segundo ele, lhe coubera com precisão. Os quatro passearam mais um pouco pelo shopping até despedirem-se no estacionamento.

- Tenham uma boa noite de sono.

- Boa noite.

Os meninos entraram no carro. Eric xeretou a sacola de Caio e encantou-se pelo casaco.

- Ele tem bom gosto. Que lindo!

- É, também gostei. Só fiquei sem jeito por ele ter me dado. Foi muito gentil comigo. Tentei convencê-lo a não comprar, mas não teve jeito. Ele teria me dado a loja toda se eu tivesse pedido.

- É mesmo?

Eric ligou o carro. Saíram do estacionamento.

- E o Sébastien? O que fazemos?

- Não sei. - respondeu o mais velho.

Assim que deixaram o carro no jardim da casa, Sébastien apareceu. Deu um beijo no rosto de cada um deles. Esta noite, dormiram no quarto do vampiro, só que desta vez, Sébastien dormiu em seu caixão. Dois dias mais tarde, Thibaut ligou para o amigo dizendo que não tinha nenhuma informação sobre outros vampiros na cidade, e ainda convidou os três para um jantar em sua casa. Sébastien ficou surpreso quando soube que Sylvian conhecera os meninos e, felizmente para os garotos, não fez escândalo quando soube que os quatro passearam pelo shopping.

O jantar aconteceu no domingo, na mansão de Thibaut. Os cinco reuniram-se na sala de jantar. Os meninos foram os únicos a comerem a comida. Para os vampiros, foi servido sangue. Terminada a refeição, acomodaram-se nos sofás da sala de música, onde Sylvian tocou piano. A elegância do vampiro não era deste mundo. Era muito delicado nos gestos e disciplinado. Mesmo assim, não parecia soar forçado. Aparentemente agia de maneira muito natural. Tocou uma melodia forte e alegre. Os garotos apreciaram bastante. Não só a música, mas ao músico também...


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