Reveille escrita por MayaAbud


Capítulo 34
Erros


Notas iniciais do capítulo

Eu nunca fiz um ponto de vista do Chris, mas essa música dá um a ideia:

"Deixe suas inibições irem embora
Faça com que cada toque seja elétrico
Quando você estiver se sentindo bonita
Você se lembrará de mim?

Eu quero te tocar bem no fundo
E achar os segredos que você esconde
Quando seus medos são deixados de lado
Você lembrará de mim?

Amor facilmente esquecido
Amor facilmente esquecido
Isso não é tão fácil

Eu só quero te deixar sabendo
Que minha mente se recusa a deixá-la ir
Eu quero te hipnotisar
Então você se lembra de mim

Amor facilmente esquecido
Amor facilmente esquecido
Não é tão fácil

Amor facilmente esquecido
Amor facilmente esquecido
Facilmente, o melhor que eu tive
Facilmente, o melhor que eu tive" -Easily- Muse



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Ponto de vista de Renesmee

Sua cor voltava ao rosto e Chris parecia respirar melhor.

_Você correu... Mais de 10 metros em dois segundos_ ele respirou fundo_ Lutou com um urso usando as mãos. O matou! E não há um arranhão! Esqueci de algo?

 Automaticamente me examinei, só para corar ao perceber os estragos em minha blusa, cruzei os braços firmemente no peito. Christopher desabotoou sua camisa e me estendeu, os olhos no chão. Ficou usando apenas a camiseta que usava por baixo, me vesti rapidamente.

_Obrigada_ sussurrei.

_Eu devo estar louco. Isso parece muito real_ ele esfregou os olhos_ Espere! Você sabia, não é? Por isso quis voltar_ ele tinha de ser tão atento?!_ Como sabia?_ perguntou, sua voz se elevando.

_ O ouvi_ minha voz soou constrangida.

_Ouviu... Ouviu o quê?_ ele estava muito agitado, com raiva talvez, devia ser resultado do choque. Alcancei a garrafa de água caída no chão enquanto cogitava a idéia de lhe dar um soco, apagá-lo por alguns minutos, quem sabe ele estaria mais calmo quando acordasse.

_Beba_ ordenei. Para minha surpresa ele não discutiu e obedeceu.

_Não vai me responder?_ exigiu.

_ Ouvi passos, seu coração, senti seu cheiro_ demandei contra ele.

 Eu já tinha o problema, o pior que poderia arranjar. Parecia-me menos provável que ele me causasse problemas se eu explicasse, considerando que os Volturi nunca descobririam sobre a humana que conhecia o mundo sobrenatural se não fosse o incidente que levara meus pais a Itália.

_Acalme-se, ok. Vou dizer o que precisa saber_ declarei tirando a terra e as folhas de meus cabelos e jeans.

_Como fez aquilo? O que você é?

_O que acha que sou?_ perguntei e ele sustentou meu olhar por um longo segundo.

_Um alien... Um ciborg. Ou a experiência de alguma organização secreta, criada para ser uma arma mortal_ ele deu uma risada. Demorei um pouco para perceber que ele falava sério, sua idéia, entretanto, não era original: Cailo XY

_Eu gostava dessa série de TV_ comentei.

_Essas coisas não existem_ murmurou para si_ Você ao menos é humana?

_Em parte... Veja bem, lembra de quando disse que teria de matá-lo se contasse meus segredos?_ ele assentiu_ Não estava brincando_ minha voz parecendo propositalmente fria, fazendo-o estremecer.

_A não ser_ continuei_ Que você absolutamente guarde segredo. Do contrário a sua vida e provavelmente a minha e a de minha família estará perdida.

_Não vou colocá-la em perigo_ hesitante ele tocou meu rosto_ E, acha mesmo que alguém acreditaria no que tenho a dizer?

_Precisa entender que sua vida ou morte não dependem de mim, mas de ninguém, jamais desconfiar do que vou lhe contar_ insisti. Era agora. Ele me chamaria de louca? Porque eu me importava? É claro que eu devia me importar, era perigoso, eu não queria que ele morresse.

_Sou uma vampira_  falei, ele continuou me fitando, como se eu não houvesse dito nada, e então riu.

_Isso é ridículo_ riu ele.

_Certo, tudo que aconteceu aqui, na verdade, não aconteceu, ok. É ridículo_ levantei-me irritada.

_Certo, certo_ disse ele baixinho fitando o urso morto ao meu lado_ Está sol, Renesmee, é dia. Já a vi tomando chocolate quente, comendo macarrons*. Eu sangrei na sua frente e você me fez um curativo.

_Não é bem assim e, além disso, eu sou hibrida: metade humana.

_Você fala como se estivesse falando de uma variação de raças e não de seres sobrenaturais.

_É mais por aí... Olhe, se você não souber o que procurar, e humanos não sabem, um vampiro pode perfeitamente passar despercebido. Todos os vampiros já foram humanos.

_Você bebe sangue?_ Chris tentava manter a calma, mas estava apavorado, acho que finalmente percebendo o que implicava ao vampirismo.

_Minha família não mata pessoas_ falei sentindo-me uma traidora, por não me aplicar a este quesito_ Nos alimentamos de sangue de animais. Não satisfaz realmente, mas alimenta, tornando mais fácil viver entre humanos.

Christopher pressionava as têmporas como se sua cabeça fosse explodir, devia ser isso mesmo.

_ Como assim hibrida? Não se tem que ser mordido para ser um? Quantos anos você tem? Vocês são mesmo imortais?

_Sim, somos, em parte. Outro vampiro, apenas, possui força bastante para matar um de nós, nenhuma força humana é capaz disto_exceto bombas, pensei, mais vampiros puros são rápidos demais, o que tornar difícil, ainda assim, Continuei: _vampiros são incrivelmente fortes e não morrem sob o sol. Minha mãe era humana e quando casada com meu pai engravidou, híbridos não eram conhecidos em nosso mundo até então.

_Sua mãe é humana? Como...? Ela sabia?

_Sabia... Mas eu praticamente a matei quando nasci, sendo eu mais forte que seu corpo humano, então ela foi transformada_ falei revivendo minhas tortuosas e estranhas lembranças pós-parto. Eu tenho sete anos_ sentei-me novamente no chão daquela floresta que era tão diferente da que eu amava.

_Não pode ter sete anos_ disse isso me medindo.

_Desenvolvi-me no útero de minha mãe em apenas um mês. E completei minha taxa de desenvolvimento aos seis anos e meio_ ele engoliu com dificuldade e deixou passar.

_Como sua mãe foi transformada? O que isso quer dizer?

_Com uma injeção do veneno do meu pai, direto em seu coração, e então mordidas. Vampiros possuem veneno para incapacitar a presa com a dor e se o vampiro tem controle o suficiente e não mata a vitima o veneno corre no sangue transformando tudo enquanto queima nas veias.

_Transformando...? Dando-lhe presas...

_Não temos presas, só dentes normais, quero dizer, aparentemente. Nossos dentes são capazes de quebrar granito ou qualquer coisa do tipo. O veneno muda tudo no corpo, potencializa o cérebro e as demais características.

_Como o veneno salvou sua mãe se você quase a matou?!

_ Enquanto muda, o veneno corrige imperfeições e pode reparar ferimentos, no caso dela o ventre e a coluna.

_Sua prima...?_ conjeturou ele, o cenho franzido.

_Minha tia, Alice. Vampira.

_ Se você tem sete anos... Aquele foto dos seus pais que eu vi... Eles têm quantos anos?

_Quando despertou como vampira minha mãe fazia dezenove e meu pai foi transformado em 1918. _ sua boca se abriu.

_A gente pode sair daqui?_ pediu ele, todos os seus poros arrepiados. Concordei e no caminho expliquei a razão para o segredo: os Volturi. Tenso, Chris absorvia as informações. Eu sabia que era errado, mas tinha certeza de que ele guardaria meu segredo. Expliquei também sobre minha família e de como eles se uniram ao longo do tempo.

_ Mal posso acreditar. No entanto, muito sobre você faz mais sentido agora, embora tudo esteja muito além de minha lógica_ disse Chris.

_Sinto muito por meter você nisso_ falei sinceramente.

_Pode parecer loucura, mas estou gostando de te conhecer melhor.

_Chris_ falei preocupada_ Mesmo quando o tempo passar e eu  não estiver mais aqui...

_Não estiver mais aqui?_ ele me interrompeu, a voz subindo uma oitava.

_Sim. Não posso ficar muito tempo em um só lugar e minha família me espera em casa_ ele franziu o cenho, resignado, e me abraçou, parando nossa caminhada de volta.

_Eu nunca disse que...

_Eu assumi os riscos_ disse ele em meu ouvido. Afastou-se para me olhar, nossas respirações misturando-se entre nós, e inesperadamente um pequeno sorriso ameaçava brotar em seus lábios.

_Não acredito que só tenha sete anos_ murmurou_ Isso é doentio, eu não deveria querer beijar uma criança. _ De uma forma muito estranha era lisonjeio e eu sorri acrescentando:

_Muito menos uma que sequer é humana_  e sua boca estava, macia, na minha.

Em meu apartamento, toda nossa tarde parecia muito distante, e eu podia entender como tudo era surreal para ele, que permanecia interessado em tudo sobre sua descoberta e me olhava agora com um misto de espanto e admiração assustadores.

_Se eu quisesse ser um vampiro... _ o encarei sem conseguir falar_ Você disse que tinha melhor controle que vampiros puros.

_Não!_ grunhi ao imaginar-me provando seu sangue. _Além disso, apenas híbridos machos possuem veneno ao que parece. _ ele ficou pensativo_ Você não ouviu o que eu falei a tarde toda? Não é como em filmes, dizem que é a pior dor que se pode sentir, a sede também dói, não é apenas desejo.

_Sua mãe escolheu isso, ela não seria uma vampira de qualquer forma?!

_ Claro-claro_ respondi apenas.

A certa altura dos contos eu bocejei. Não dormir, mais estresse e adrenalina me deixaram exausta.

_Vocês não dormem em caixões?_ ele riu.

_Vampiros não dormem, bem, eu durmo_ esclareci.

_Vou para casa. Se... Eu encontrar algum vampiro e os olhos estiverem vermelhos, eu tenho alguma chance?_ eu tive de rir, sem saber se ele estava agindo assim porque estava ok com tudo ou se a “ficha não caíra”.

_Depende de muitos fatores_ respondi.

_E se disser que conheço Renesmee Cullen?

_Você pode tentar.

_Nunca mais vou ter paz_ disse ele lamuriento.

_Pode ficar com o outro quarto se sentir-se melhor_ ofereci.

_Tudo bem, eu acho. É que tenho a impressão de que tudo vai evaporar. De que amanhã tudo vai ter sido só um sonho_ ele sorriu, tristonho.

_Amanhã, eu ainda vou estar aqui_ falei, arrependendo-me de imediato.

_Por enquanto_ ele fez eco, me abraçando apertado e me beijando docemente em seguida antes de sair.

Sim, por enquanto.

***

 Chronos continuava impondo suas leis ao universo, o mundo girava dividindo a humanidade entre luz e trevas enquanto os dias iam e vinham.

Eu já compartilhara a opinião de meu pai sobre uma das obras favoritas de minha mãe. Tendo, desde que nasci, visto o amor da forma mais pura e altruísta possível, não poderia concordar com Bella sobre o Morro dos Ventos Uivantes. No entanto, eu não havia sido assim tão diferente de Cathy. Minhas razões tinham sido tão infantis e fúteis quanto as dela e igualmente havia feito meu amigo partir. Tendo agora a companhia de um, e querendo outro.

 Minha família não sabia das atuais circunstâncias. De uma forma engraçada, era estranho que Chris soubesse quem eu era. Às vezes eu instintivamente me sentia invadida, era errado que ele soubesse, errado e perigoso. No entanto saber de meus segredos o fez sentir-se mais próximo a mim, meu cúmplice.

 E havia as memórias de Jacob, as de coisas que nunca aconteceram nem aconteceriam... “Sempre, sempre no meu pensamento. Não por prazer, tal como eu não sou prazer para mim própria, mas como parte de mim mesma, como eu própria”, dissera Catherine. Era assim para mim também.

Meu pesadelo havia desaparecido de minhas noites e, quem diria, era uma pena. Pois apesar de minha memória perfeita, eu tinha a sensação de perder a exatidão nas lembranças. Eu estava dormindo mais, embora não fosse o sono restaurador de que eu precisava e nunca mais tivera.

Estávamos na metade de maio... Passara-se um ano e oito meses. E tempo ainda era o que eu realmente tinha.

Às vezes a idéia de desaparecer era tentadora. Se ainda não o fizera, na verdade, era porque prometera ao meu pai. Mas imaginava que eles me perdoariam se fugisse da maldição que assombrava minhas escolhas, ainda havia dias ruins... Pela décima vez no dia encarei o quadro na parede acima do balcão.

_O que a senhorita tem contra meu quadro?_ indagou Pierre olhando para o letreiro de vidro. Suspirei.

_O segredo é fazer a escolha certa_ li e bufei_ Ninguém sabe qual escolha é a certa_ reclamei pensando em mim, em Jodelle, em tudo...

_Acontece que é um segredo. Essa é a graça da vida. Ninguém nunca sabe_ disse ele com um leve sorriso nos lábios de bigode branco.

A vida não era engraçada, então...

Na mesma noite, eu organizava copos para levar a uma mesa quando uns rapazes que eu já havia atendido me chamaram atenção.

_Cala essa boca_ ordenou um, que aparentemente era o mais velho, sua voz baixa, mas energética o bastante para chamar minha atenção.

_Tenho duas, caso algo saia errado_ afirmou ele colocando algo envolvido em um lenço espesso sobre a mesa.

_Tem certeza?_ indagou o loiro que até então estivera quieto, pegando o objeto sobre a mesa.

_Eu não acho... Não, eu não vou_ disse o que parecia ser o mais novo, o que tinha sido mandado calar-se. O cara mais velho, o puxou pelo braço, fazendo-o se aproximar.

_Ninguém vai desistir agora. Você não quer a grana? Então, é isso!_ ameaçou

_Seria mais fácil antes. Ninguém estaria lá_ reclamou o jovem.

_Rendemos eles, apenas_ falou ainda um quarto homem, um moreno e forte.

_Temos o que precisamos_ o mais velho tocou o bolso da jaqueta.

 Eu havia entendido errado ou...? Nesse momento Alex aproximou-se da mesa, onde os quatro pagaram pela bebida que consumiram, e então saíram. Eles mal cruzaram a porta e eu estava na mesa que ocuparam, pegando seus cheiros, ainda sem ter certeza do que estava fazendo.

_Sr. Pierre, preciso sair agora_ falei tão rápido que imaginei que ele não houvesse compreendido enquanto desamarrava o avental em minha cintura, ele, porém, assentiu falando algo sobre estar quase na hora de fechar, eu já alcançava a porta.

 Parei em frente ao café farejando o ar, ignorando as pessoas na rua, achei o rastro fácil. Cheguei ao metrô bem a tempo de vê-los entrando em um vagão, e fiz o mesmo, colocando o capuz do casaco para que não me reconhecessem. Em trinta minutos eles desembarcaram, os perdi de vista, porém continuei seguindo o rastro.

A expectativa e a adrenalina faziam minha garganta arder. Quando os vi novamente, eles viravam em uma esquina. Alguns minutos depois o rastro levava a uma casa de muros altos. Pulei o muro e corri pelo gramado, observando a casa grande e buscando ouvir.

Havia corações batendo, alguém chorando, murmúrios, móveis sendo arrastados em algum lugar.

Entrei pela passagem de ar do porão, que era limpo e organizado, embora cheirasse a cola e combustível. Subi e despontei em um corredor, decidindo que apenas garantiria que ninguém se ferisse. À direita e a esquerda de onde eu estava havia pessoas revirando coisas. Corri até o andar de cima, onde havia mais pessoas. O andar de cima estava escuro, uma luz baça vinda de um dos quartos iluminava o corredor. Um bebê chorou.

_Deixe-me vê-lo, por favor_ choramingou uma mulher. Girei, escondendo-me na esquina do corredor quando eles saíram do quarto. Alguém subia a escada. Tive de entrar na próxima porta que vi.

_Mamãe?_ murmurou uma menina remexendo-se no escuro. Escondi-me no armário e alguns segundos depois a luz fora acesa, eu espiava pela fresta da porta do armário. A mulher abraçou a menina. Longe do ângulo de visão da criança o homem mais velho as esperava com um revólver em punho.

_Você vai ficar com seu irmãozinho, certo? Cuida dele para mim?_ conversava a mulher com a menina ruiva, enquanto a levava para fora.

_ Mamãe_ choramingou ela ao ver o homem armado.

_Não achamos nada_ reconheci a voz como sendo do loiro.

 A porta havia ficado aberta e vi o homem com a arma trazendo a mulher, o homem loiro os seguindo pelo corredor. Ouvi a menininha chorando em outro cômodo.

_Onde está o cofre?_ gritou o chefe do bando.

_Não tenho, está vazio. Há muito não guardo nada em casa_ respondeu uma voz masculina que eu ainda não tinha ouvido.

_Estão dizendo a verdade_ disse alguém.

_Cala essa boca! Amarre-os e vende-os!_ algo então aconteceu. Alguém investiu contra alguém, houve o som de uma luta breve e um arfar... Eu estava no meio do corredor quando houve o estouro. Um tiro.

_Por favor! Jhef, Jhef!

_Sabia que isso ia acabar mal_ lamentou a voz do rapaz mais jovem, ele estava apavorado.

Tateei nos bolsos. Droga! Meu celular e tudo o mais ficara na cafeteria. Mas então... A consciência começou a dar espaço aos instintos. O cheiro do sangue chegava a mim.

_ Peguem qualquer coisa de valor_ gritou o mais velho aos outros dois, que estavam no andar de baixo. Ele vinha em direção a mim, o esperei, ali, parada no meio do corredor. Assustado, sua reação foi apontar um arma para mim, porém, depois sorriu e a abaixou.

_Não sabia que tinha alguém mais na casa_ disse ele medindo-me por inteira. Ele avançou prendendo-me contra a parede e eu deixei, o cano do revólver frio em meu queixo e a outra mão emaranhada em meus cabelos.

O homem me fitou e parecia ter esquecido tudo enquanto me olhava parecendo... Encantado. Não tinha outra palavra para descrever seu olhar.

_Vamos embora, não devia ter atirado_ disse, desesperado, o rapaz que antes quis desistir.

_Eu mando aqui!_ gritou o outro em meu rosto.

_Está fazendo a escolha errada_ avisei_ Você. _chamei o mais jovem_ Vá, ainda pode desistir_ ele não esperou mais nada, saiu correndo e desapareceu pelo corredor, o ouvi sair da casa por algum lugar. Ainda me segurando o homem engatilhou a arma.

_É uma pena_ murmurou ele para si.

Eu não tinha ciência de como caçar humanos, fazer jogos psicológicos... No entanto, instinto é instinto. Inclinei-me para ele como se fosse beijá-lo, e meus dentes romperam sua pele. O homem desmaiou no mesmo instante, sequer gritou. Ele jazia seco no chão quando os outros dois surgiram. Ergui-me do corpo ao ouvir a aproximação.

_O que...?_ tentou perguntar um deles, mas não teve tempo. Aliás, o outro também não.

 Depois, satisfeita e até empanzinada fui até o quarto onde as duas crianças choravam. Apenas um abajur iluminava o quarto onde um bebê estava no berço e a garotinha ruiva e cheia de sardas estava sentada em uma poltrona de amamentação. A menina olhou para mim, devia ter uns oito anos.

_Você é um anjo, não é? Eu estava orando_ disse-me ela em francês nato.

Eu era justo o contrário.

_Sabe seu endereço?_ perguntei em voz baixa e ela assentiu. Peguei o telefone do quarto e disquei o número de emergência_ Diga onde mora e o que aconteceu.

Saí do quarto quando ouvi outra voz do outro lado da linha. Peguei os três corpos como pude, levando-os até o porão, encontrando o necessário para incendiar o lugar.

Na rua, agora eu chorava como uma criança, e sentia raiva por isso, senti-me culpada ao lembrar de meu pai e minha mãe; Por não ser capaz de me manter íntegra nem em meu erro. Traída por mim mesma. Não houvera razão para que eu justificasse beber os outros dois, eu simplesmente os arrogara. A verdade é que talvez eu soubesse o que ia fazer desde o início.

Era apavorante estar tão sozinha. Atordoada e muito consciente  do que fiz, eu acabei no lugar onde certamente devia evitar aquela altura. Limpando as lágrimas, bati na porta. Nada. Toquei a campainha. E em segundos ouvi passos.

_O que houve?_ a voz de Chris tornando-se mais desperta a cada palavra enquanto ele me puxava para dentro. Não consegui dizer nada, querendo apenas não me sentir o monstro assassino que era. Porém ali eu estava, impondo minha presença instável ao humano que mais me magoaria machucar.

O abracei, algo que nunca acontecera por iniciativa minha. Ele, é claro, me envolveu imediatamente. As lágrimas recomeçando a cair sem que eu pudesse evitar. Sem me soltar ele começou a andar, me deixei ser conduzida, o rosto escondido em seu ombro, até que senti algo na parte de trás de minhas pernas. Christopher me empurrou delicadamente, fazendo-me sentar, e saiu, voltando logo depois com um copo de água, que mesmo desinteressada eu bebi.

_Melhor?_ perguntou colocando o copo no criado mudo. Assenti_ O que aconteceu?_ desviei os olhos dos dele, ouvindo-o suspirar_ Não tenho outro quarto, importa-se em dividir?_ perguntou ele, sem esperar resposta. Abraçou-me e deitou-se comigo nos braços, segurando minha mão em seu peito e a afagando.

Eu não queria pensar em como isso não estava certo quando era tão confortável...

Espreguicei-me enquanto meus sentidos voltavam a mim... E acordei assoberbada.

_Calma_ disse Chris do outro lado do quarto, parecendo ter acabado de sair do banho_ Dormimos demais. E você parecia tão cansada que... _ ele encolheu os ombros, desculpando-se.

_Tudo bem_ falei, relaxando.

_O que aconteceu? Porque veio aqui àquela hora? Não que eu esteja reclamando, só que...

_Foi um erro ter vindo, desculpe-me_ falei rapidamente.

_Tem idéia de quantas vezes já me disse: “foi um erro”?

_Setenta e sete, acredito_ farejei o couro de minhas botas, que estavam em baixo da cama_ E você não dá a mínima.

Ele riu e insistiu:

_Sério, agora, o que houve? Não a vi sair da cafeteria, ninguém sabia aonde foi, e então você aparece aqui de madrugada, parecendo... Arrasada!_ desviei os olhos dos seus da cor de canela.

_Não é importante. Eu estou bem agora_ eu não tinha certeza sobre nada disso. Apenas não tinha como explicar. Ele ficaria horrorizado, não era algo que um humano pudesse assimilar facilmente, ele não entendia o que era estar entre o sobrenatural e o humano, fazer parte das duas coisas...

_Certo. _ ele deixou de lado_ Café da manhã? Ou almoço, na verdade.

_Não, obrigada_ disse calçando minhas botas_ Preciso fazer uma prova ainda_ dei-lhe um beijo rápido e saí.

Quando se tem valores arraigados, por mais que os ignore, sua consciência é um juiz que certamente o condenará, não importando suas razões ou desculpas.

Além de tudo, ainda tinha que fingir ter uma vida normal. Uma prova no último horário, trabalhar. Mais que nunca eu queria desistir, desaparecer como Jacob fizera.

No trabalho, apenas fiz o que tinha de ser feito.

_Renesmee, pode vir até aqui?_ Era mais de oito da noite quando Chris me chamou na cozinha, só havia nós dois lá.

_Sim?

_Casa de engenheiro é invadida_ ele leu numa das páginas do jornal sobre a mesa, uma reportagem comum e eu entendi porque ele estivera distante o dia todo_ Três bandidos mortos e só uma criança viu a quinta pessoa que esteve presente. Uma mulher, ela diz ser um anjo. A garotinha fez um desenho de seu anjo da guarda, publicaram_ ele me estendeu o jornal, o ignorei ainda encarando-o.

_O que está querendo dizer?

_Não é difícil confundi-la com um anjo_ houve alguns instantes de silêncio_ Tenho certeza que foi você. Só quero saber...

_Você não deveria querer saber tanto_ falei irritada com ele. O que queria? Que dissesse que matei e me alimentei de três homens?!

 Então percebi algo errado. Senti como se minha cabeça estivesse sendo drenada, não, como se minha mente ou consciência estivesse se expandindo para além de mim. Conhecia esta sensação, mas fora há tanto tempo... As luzes piscaram e ouvi o arfar de muitas pessoas enquanto meu escudo atingia a rede elétrica. Como se um fator desencadeasse outro, logo depois era como se meus ouvidos fossem dez vezes mais sensíveis, era como se eu ouvisse os sons e vozes do mundo inteiro. E isso era enlouquecedoramente muito. Meus joelhos cederam e tudo se apagou.

 Acordei em casa, alguém respirava cadenciadamente, perto, em algum lugar.

_Até que enfim! Não sei o que fazer quando vampiros desmaiam. Você está bem?_ Chris se sentou na minha frente no sofá, afagando minhas pernas.

_ Sim. Como viemos para cá?

_Depois do blackout, que não durou mais que alguns segundos, você estava no chão. Não sabia o que havia acontecido, mas você mais parecia dormir, e pensei que não seria bom que um médico a examinasse, então convenci Pierre a me deixar trazê-la_ explicou-se.

_Há quanto tempo apaguei?

_Quase duas horas. Tem certeza de que está bem? O que houve?_ ele estava mesmo preocupado.

Não tinha contado sobre vampiros terem dons a mais, portanto, lancei-me numa explicação rápida.

_Você fez aquilo?

_Ao que parece, sim_ houve um instante de silencio_ Obrigada por me trazer, fez bem. Mas se importa em me deixar sozinha?

_Tudo bem. Se precisar de mim, basta ligar_ ofereceu. Beijou-me antes de sair.

Não tive tempo de organizar meus pensamentos, meu telefone tocou.

_Alice_ falei.

_Oi, Nessie. Acabo de ver na internet sobre o blackout em Paris. Sabe algo a respeito?_ perguntou ela ingenuamente. Suspirei.

_Acho que fui eu. Mas ninguém desconfia. Está tudo bem.

_Em que circunstância aconteceu?

_Não tenho certeza... Estava meio que... Discutindo com Chris. Foi como no dia do baile_ eu não diria que ouvira vozes. _ Meus pais sabem?

_Ainda não, mas não perca seu tempo, eles saberão. Você não está tão desprotegida quanto imagina.

_Não há necessidade...

_Se seus dons estão desenvolvendo, então não deveria estar só. Pode ser perigoso, para você e para quem estiver por perto. Tem de vir para casa.

_Estarei aí nas férias, e não será por muito tempo_ declarei.

_Depois veremos isto_ disse ela apaziguando_ Jazz está mandando um abraço.

_Outro. Para todos.

_Cuide-se Nessie, amamos você.


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Notas finais do capítulo

*Macarrons: doce comum na França, como biscoitos com consistência de pão de mel.
Cathy ou Catherine é o personagem principal de O morro dos ventos uivantes, pra quem não leu, ela "fez" o amigo e irmão de criação ir embora de casa porque ele era pobre a ela queria casar com um homem rico mesmo sendo loucamente apaixonada por pelo irmão.



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