– Por que você me acordou tão cedo hoje? - perguntei ainda preguiçosa. Mesmo depois do café ainda me sentia sonolenta.

– O despertador foi pra mim, você acordou porque quis. - eu o encarei incrédula.

– Dividimos o mesmo quarto, seu cavalo. A menos que eu fosse surda, seria impossível não acordar com aquele barulho insuportável. Afinal de contas, que ser humano coloca o som de um galo se esgoelando como toque de despertador? - perguntei franzindo as sobrancelhas.

– Gosto dos sons da natureza. - ele deu de ombros enquanto pegava as louças sujas da mesa e depositava na lava-louças.

– Você é um caso a ser estudado.

Levantei-me do banquinho que normalmente ficava embaixo do balcão da cozinha e fui em direção à sala. Joguei-me no sofá fofinho e encarei as falhas do meu pijama de ursinhos laranja que começava a desbotar. Alguns ursinhos já tinham perdido alguns membros, e o puro osso da minha pantufa já perdera um dos olhos. Talvez eu precisasse comprar pijamas e pantufas novos.

Encarei o teto do flat, era liso com alguns detalhes em gesso. Era bonito, mas comecei a sentir falta das minhas estrelinhas em neon que brilhavam no escuro. Respirei fundo e fechei os olhos. Só agora eu começara a realmente perceber que não iria voltar para casa durante bons meses. Ia ser estranho chegar em casa e não dar de cara com os experimentos culinários mal sucedidos de Friedesh Schwert para no final das contas comermos ovos mexidos ou um congelado qualquer que tivéssemos na geladeira.

Pensei em ligar para o meu pai, mas logo senti um peso em meu quadril e abri os olhos. Matthew estava sentando em cima de mim com uma feição preocupada. Era impressionante como ele sempre se comportava de um jeito estranho.

– Você tá bem? - perguntou com as sobrancelhas arqueadas.

– Estaria melhor se não tivesse uma tonelada em cima de mim. - ele riu.

– Pois saiba que é um privilégio ter esse corpo gostoso em cima de você. - eu gargalhei, mas confesso que estava um pouco sem graça. A fala de Matthew me fez lembrar que ele continuava sem camisa, descalço, com sua calça de moletom surrada e cabelos desarrumados. Instintivamente meu olhar percorreu seu corpo, e eu me amaldiçoei por isso, pois notei que ele percebeu. Suas bochechas ficaram levemente rosadas e eu queria muito rir disso, mas estava mais concentrada em tentar não ficar mais vermelha que um pimentão. Que merda era aquela?

– Há certos privilégios que a gente dispensa. - disse com um meio riso tentando amenizar aquela situação estranha. Matthew riu sem graça, levantou-se e voltou a se sentar, mas agora, ele estava no tapete, próximo ao sofá.

– Você já tá com saudades de casa? - ele perguntou enquanto pegava uma de minhas mãos e começava uma guerra de dedões.

– Acho que só agora eu percebi que estou há doze horas de distância das maluquices da dupla dinâmica Schwert e Knowels. - disse em um meio sorriso enquanto me via perder a guerra de dedões que nem sabia o por quê de ter começado.

– De certa forma, a dupla ainda continua. - ele disse calmo, dando de ombros. Só então nos olhamos e dei um sorriso tímido. Ao que tudo indicava éramos a versão 2.0 da dupla Schwert e Knowels, e, de certa forma, aquilo não me parecia mais tão absurdo quanto parecia antes.

– É… Talvez.

Matthew sorriu, ganhou o último round da guerra de dedões e se levantou do tapete.

– Vou dar uma volta pra conhecer a cidade. Vem comigo? - assenti e me levantei do sofá, indo em direção ao quarto com ele. Seria melhor procurar uma distração, ficar olhando para o teto impecavelmente branco e liso do flat provavelmente me enlouqueceria.