Eu tinha certeza que a fala da senhora foi inspirada em um filme de terror, mas só de olhar a casa por fora, não tinha duvidas nenhuma de que ela estava realmente falando a verdade.

–Y-yla?- perguntou Ty gaguejando, provavelmente percebeu que eu havia visto uma alma.

–A senhora, ela esta ali- apontei para o lugar, mas logo não vi mais nada. – Esquece vamos entrar- joguei as palavras, sem mesmo perceber em que eu tinha falado, eu demonstrando coragem? Não acho que não.

–O que ela disse?- ele pareceu não ouvir a ultima parte da minha fala.

–Para termos muito cuidado, muito mesmo, e que se não tivermos, vamos morrer- tentei parecer calma, Ty comprimiu os lábios e assentiu.

–Eu entro primeiro- ele disse indo em direção a porta

–Não!- tentei falar, tarde demais, ele já havia batido nela.

Não ouve se quer um sinal de vida da casa, ela parecia abandonada, Ty verificou e a porta estava aberta, olhou para mim e girou a maçaneta, entrei logo após dele. O lugar era talvez mais assustador por dentro, no hall de entrada tinha uma mesinha que aparentava ser da época em que os filmes eram pretos e brancos, mas ai eu lembrei que se a casa era do filho da senhora super maligna e adormentadora o resultado não poderia ser diferente, as paredes eram enfeitadas com papeis de paredes meio rasgados, variavam entre amarelo e marrom, que ou era suas cores, ou um dia o papel um dia fora branco, mas com os cuidados que deviriam apresentar amarelo e até mesmo marrom foram uma consequência.

–Com licença!- Gritou Ty esperando que alguém respondesse, mas nada.

Passamos pela cozinha, procuramos em banheiros, e nada, cada vez eu ficava mais assustada, até que Ty viu uma escadinha, e quando eu digo escadinha, eu digo em uma pequena e estreita escada de madeira, que mal da para passar um cachorro, bem talvez eu exagerei um pouco, é mais ou menos de metade de uma porta comum, mesmo assim continua sendo bem estreita.

–Acho que é a única alternativa- Ty disse em um suspiro me encarando –Vamos

Assim ele subiu o primeiro degrau que rangeu, e deixou tudo mais assustador, o cheiro de mofo e coisa velha predominava na casa, eu tinha quase certeza que ninguém morava ali. Mas então quando Ty chegou ao topo da escada puxou minha mão, o que indicou que achamos o que estávamos procurando.

Um senhor usando suéter cinza, uma calça social da mesma cor e com os cabelos brancos, estava de costas virado para uma escrivaninha, parecia escrever em um papel, e sussurrava baixinho. Havia papéis no chão, e todo o aparentemente quarto estava forrado de livros velhos e papeis escritos com letras minúsculas. Encarei Ty esperando que ele começasse a interagir com o senhor.

–Com licença?!- Ty disse num tom calmo, o que eu tinha certeza que ele não estava. Mas nada aconteceu, o senhor parecia ignorar, ou não ouvir.

–Com licença!!!- gritei, eu não sei por que havia gritado, mas surgiu efeito. O senhor olhou para traz e quase teve um ataque cardíaco, levantou e foi até sua cama (se apoiando em tudo que via pela frente) quando chegou à cama ele pegou um aparelho e colocou na orelha, Agora tudo faz sentido, pensei o senhor era surdo por isso não nos ouviu nós entrando e nem nada.

–Seus adolescentes idiotas! Eu não tenho nada pra vocês! Saiam da minha casa! – gritou o senhor jogando um livro em Ty.

–Calma!- retruquei quase rindo, eu esperava mais quando entrei, e a situação estava se tornando quase engraçada. Fora o fato que Ty foi acertado bem na cara.

–O que querem de mim?!- O senhor jogou outro livro só que dessa vez me acertou, nada engaçado.

–Sua mãe pediu pra vir aqui, eu sei que é difícil de acreditar, mas eu falo com almas- disse e o senhor me olhou assustado.

–Você fala com almas! Eu sabia! Sabia que tinha uma possibilidade! E-eu preciso falar com você! Você precisa me responder tudo! Sente-se querida- o senhor dizia uma palavra atrás da outra, até que ele havia aceitado bem o fato, jogou todos os livros de cima da cama no chão e fez um gesto para que eu sentasse lá. Olhei para Ty por uma que estava com o olhar fixo nos papeis do chão com se tudo aquilo lhe chamasse muita atenção.

–Eu passei anos querendo uma forma de comunicar com meus falecidos, ah, perdi tantas pessoas! Você é a solução!- os olhos do senhor brilhavam tanto, que eu quase duvidei que ele fosse realmente filho da senhora, e por falar nela... Eu tinha um dever a cumprir.

–Senhor, sua mãe me pediu para falar com você- então só de falar nela ela veio dar-nos uma visitinha- ela esta aqui... Mas você não pode enxerga-la- disse tentando manter a calma, quando a senhora me lançou um sorriso travesso.

–Eu sei! Não posso enxerga-la! A alma pode!- o senhor disse calmo- Só quem tem dons pode ver as almas, eu passei anos estudando as possibilidades, tentando falar com a minha mãe, minha esposa! Vinte anos! Vinte anos!- o senhor praticamente atirava as palavras, mas, ele parecia entender tudo.

–Sua mãe esta aqui- fui direto ao foco- ela quer falar com você então eu apenas vou repetir tudo o que ela falar ok?- olhei para a senhora que assentiu

–Oi, filho- ela disse e eu repeti.

–Onde ela esta?- ele perguntou passando o olho pelo quarto

–Ali- mostrei o lugar.

–Oi, mãe- ele tentou toca-la, mesmo nem sabendo onde ela estava.

–Filho pare com essa obsessão sobre as almas. Por isso eu vim falar com você- eu repeti o que ela disse, era um pouco estranho.

–Mãe eu só queria um jeito de falar com você novamente- respondeu Adam

–Eu sei, por isso a enviei, filho não importa o que aconteça todo dia eu te vejo há vinte anos, e você não parou mais de revirar noites e noites atrás de uma solução, pare você não pode gastar sua vida assim, agora que eu consegui contato isso é proibido, na verdade é arriscado, mas Kayla é a pessoa certa pra passar o recado- ela falou e eu repeti, mas então perguntei a ela.

–Como assim é arriscado?

–É que é proibido passar o recado de almas pra pessoas que não possuem o dom, mas como você já esta em um caso mais avançado... Era só você que podia me ajudar- ela disse pensativa

–Ahn- respondi, mesmo odiando a senhora, eu começava a entender o quanto ela queria isso, e o quão era importante para ela.

–Eu te amo- ela disse para que eu repetisse (obvio que não era pra mim)

–Eu te amo- disse ao senhor, logicamente entendeu que a mensagem era da mãe dele, mas não Ty, ele estava fissurado lendo os papéis do chão, que parecia nem ouvir o que estávamos falando, mas quando eu disse “eu te amo”, ele me olhou e franziu o cenho. Eu balancei a cabeça negativamente com o sentido de “esquece. Não é isso” e ele voltou a se concentrar nos papeis.

–Eu também te amo mamãe!- o senhor olhou para a alma como se a enxergasse.

–Escute o que eu digo, pare e vá viver a vida, você tem mais a fazer do que ficar escrevendo sobre as almas nesses papéis, novamente, eu te amo, e peço desculpas a uma coisa que você não sabe... Adeus filho- ela disse e desapareceu, eu repeti o que era um pouco constrangedor, estar falando filho para um senhor (mesmo que as palavras não sejam “minhas”)

–Ela se foi?- Adam perguntou se apoiando em uma pilha de livros, começou a chorar, eu tive pena, pesar de tudo, era como se aquela senhora, tudo o que ela cometeu fosse anulado de minha mente, e eu só tinha um sentimento a sua relação: dó.

Encostei a mão em Adam, e disse palavras confortantes.

–Tenho que ir, foi um prazer em conhecê-lo senhor. – e olhei para Ty que me esperava na porta do pequeno quarto.

–O prazer foi meu, querida. – ele falou com uma voz frágil. – Até mais- ele sorriu, com apenas três dentes na boca.

–Vamos- Disse a Ty passando na escada estreita, e ele me acompanhou atrás. Ouvir a porta do quarto e Alam se fechando, e papeis se rasgando. Quem sabe ele apostaria em uma vida nova, nem foi tão ruim assim, bem até agora.

–Eu disse que ia ser mais perigoso!- a senhora pareceu- Meus parentes falecidos moram nessa casa! Eles vão tentar mata-los, desculpa-me não queria, mas era a única chance de falar com meu filho... Sua divida comigo esta anulada, boa, sorte - Então ela desapareceu, como assim “Meus parentes falecidos moram nessa casa”? Senti um arrepio percorrer minha coluna.

–O que foi Yla?! – perguntou Ty, era impressionante como ele sabia quando tinha algo errado.

–Eu só posso esperar pra te dizer- engoli a seco

Estávamos quase saindo da casa, se não fosse por uma mulher magra, com cabelos encaracolados curtos castanhos foscos. Estava usando um avental de cozinha, e me lançou um sorriso maldoso. Corri para trás de Ty como uma criancinha.

–Ty, alma na porta- sussurrei tremendo.

–Olá, posso saber quem te deu a permissão de entrar aqui?- a alma foi se aproximando e eu me agarrei ainda mais na blusa de Ty, esses eram os parentes falecidos, previ, ela ia tentar me matar, tinha certeza disso.

–Foi, foi a... – Droga eu não sabia o nome da senhora!- a mãe de Adam

–E quem deixou você falar com Adam!?!?!?- ela gritou

–A Mãe dele!!!- gritei também

–Ela é uma vag... Ela mereceu morrer. Ela que me matou, pois não aceitava o meu namoro!!! – ela bateu forte na parede, o que fez um barulhão, sugeri que ela também era materializada, merda.

–O que foi isso Yla?!- perguntou Ty se virando pra mim

–Seu namorado?- a senhora soltou uma risada maléfica- e se ele acabasse morto, igual a mim, e você sentisse a dor de perder quem mais ama?- ela sorriu se aproximando.