Gabe é o que se pode chamar de fracasso acadêmico.Suas notas não conseguem sair da última colocação escolar,seu corpo magricela mal conseguia dar uma volta na quadra.Não sabia nadar,correr ou brigar.Quem diria alguém tão inútil seria de suma importância no futuro.

Seu físico,como já citado,não é algo surpreendente.Com seus quinze anos na cara,um corpo magro demais para a idade,cabelos negros que caiam na testa de tão grandes.Essa sua franja era um dos motivos de zoação na escola.Seus olhos castanhos escuros como os de sua mãe.

Mary Turner é a típica mãe solteira.Seu longo cabelo alaranjado era seu destaque.Suas bochechas rosadas acompanhadas de um belo sorriso deixavam qualquer homem apaixonado.

Gabe não sabe muito sobre seu pai.Sempre que perguntava,Mary dizia que ele era um homem muito importante que trabalhava em uma empresa de turismos e,em uma de suas expedições,acabou se perdendo na floresta,nunca sendo achado."Provavelmente comido por um tigre" pensava Gabe.Ele nunca admitiu a falta de seu pai,culpando-o por tudo.

Como todo adolescente,Gabe tinha suas "paixonites escolares".O nome da pretendente é Liza.

Detalhes sobre Liza

Liza é filha do diretor e a garota mais popular da escola.

Seus intensos olhos azuis conquistam qualquer um.

Ela é uma das melhores alunas da turma.

Sua sobremesa predileta é Sundae de Morango.

Isso forma todo um clichê Hollywodiano mas,diferente da maioria dos filmes,Gabe não tinha amigos.Ele não pode contar com ninguém na escola.Os considerados CDF's o evitavam por suas notas,os atletas por seu físico e o pessoal do coral não chega nem perto por seu incrível mau gosto musical.

No fim ele aprendeu a lidar com tudo isso sozinho.Sempre sozinho.Solidão sempre fez parte de sua vida,começando pela falta de um pai.Ele só podia contar com sua mãe.

Mas tudo estava para mudar.Sua vida nunca mais seria a mesma.Bem,vamos com calma,há muito o que se contar.

Tudo começou em um dia onde a palavra ensolarado não se encaixa em nenhum lugar.As nuvens densas e cinzas cobriam o céu que,com seus relâmpagos e trovões,parecia rugir para o amanhecer.

– Não esqueça de levar o guarda-chuva -Alertou Mary enquanto preparava o café da manhã.

Atrapalhado ao descer as escadas,Gabe quase tropeça em um dos degraus.

– Bom dia mãe -Disse,sentando-se.De acordo com o relógio,faltavam cinco minutos para o ônibus escolar passar.

Nada melhor que um suculento cereal para começar o dia.Enquanto Gabe comia,sua mãe via o noticiário.Uma notícia começaria a agitar o dia.

Notícia

"Prezados telespectadores,venho lembrar que o horário de verão começou hoje às 0:00.Por favor adiantem seus relógios em uma hora.Tenham um bom dia."

Ao ouvir isso,Gabe quase engasgou.Sua pele adquiriu um tom avermelhado e sua expressão demonstrava preocupação.

– Mãe,você adiantou os relógios ?

– Pensando bem...acho que esqueci -Essa resposta bastou.Em um salto,Gabe pegou sua mochila e saiu em disparada pela porta.

Correndo pelo bairro,ao virar a esquina,Gabe se esbarrou em um homem de capa.Seus pequenos olhos se escondiam por debaixo de um chapéu.Sua pele parda estava demasiada seca para um dia chuvoso,mesmo contando com a proteção da capa.

–Desculpe senhor !-Desculpou-se Gabe,seguindo seu caminho.Ao cruzar a rua movimentada,Gabe olha para trás tentando vislumbrar o homem,mas este havia desaparecido.

Quando estava perto da escola,Gabe se dera conta de que havia esquecido o guarda-chuva.O tempo não perdoava e Gabe chegou na escola todo molhado.

– Ora,se não é o pequeno Gabe !-Pigarreou Felares,o inspetor.Um espanhol velho e rabugento que vagava pelos corredores da escola punindo os alunos.- Acho que alguém esqueceu de adiantar o relógio.

–M-me desculpe-Gaguejou Gabe,seguindo de um espirro.

–O diretor vai adorar saber disso-O olho esquerdo de Felares cintilava.Adorava castigar os alunos.

Uma coisa sobre os olhos de Felares

Ninguém sabe o porque,mas Felares sempre andou com um tapa-olho no olho direito.O que era bom,pois só um de seus olhos já transbordava demasiada maldade.

Enquanto Felares  levava-o  a direção,Gabe teve uma estranha sensação de estar sendo observado."Talvez algum aluno tenha me visto e esteja rindo pelas minhas costas" pensava Gabe.

Ao chegar na sala,o inspetor,repentinamente,o jogou contra a parede.Era dificil concentrar o olhar apenas no olho esquerdo.

–Olha aqui moleque,é bom se comportar frente ao diretor-Alertou

–Sim senhor

Gabe não se surpreendeu ao entrar já que a visitava quase que constantemente,faltando apenas um cartão VIP.

Diferente de Felares,o diretor era um homem reservado,educado e autoritário.O típico cidadão correto.Sua barba sempre bem feita e seu paletó muito bem passado.Resumindo,ele sempre estava apresentável.

–Bom dia Sr.Turner.Por favor,sente-se -Disse,educadamente,bebericando sua xícara de chá. Gabe sentou-se rapidamente para tentar mostrar alguma formalidade - Qual o motivo de sua visita hoje ?Brigas ?Quebrou novamente a máquina de doces ?

–Atraso- Gabe prontificou-se,tentando evitar o constrangimento de sua "longa ficha criminal".

–Problemas com o relógio de casa ? -Adivinhou.

–Esquecemos de adiar por causa do horário de verão.

–Céus !Que desatenção !-Debochou o diretor.-Façamos assim,deixarei você ir dessa vez,mas conversarei com sua mãe -O diretor sabia como desanimar o dia.

Mary não faria nada a Gabe.Sempre foi muito liberal,desde que Gabe se esforça-se.Gabe nunca se esforçou e também sempre foi muito dependente,não sendo um problema.

O resto da aula não foi muito animadora.Liza,surpreendentemente havia faltado,desananimando o dia.Gabe dormiu na aula de inglês e se embolou na aula de matemática.Foi alvo de boladas e risadas na Educação Física.A única aula que em que Gabe realmente estava "seguro" era a de história.

O Professor Chris era,sem dúvidas,o professor mais maluco da escola.Talvez seja por isso que ele incentivava tanto o "crescimento" de Gabe.Um homem alto com olhos esverdeados.Seu cabelo castanho caido na testa fazia,de certa forma,um visual um tanto estiloso.

–Bem turma,hoje faremos um levantamento de informações da Era Meiji-Pronunciou frente a turma,abrindo um largo sorriso como de costume-Mas o trabalho deverá ser feito em dupla.

Isso surpreendeu.Gabe odiava trabalhos em dupla por passar pela humilhação de ser empurrado para algum aluno pelo professor já que ninguém quer fazer a seu lado.

–Posso fazer sozinho ?-Arriscou.

–Sr.Turner,se não fosse a "cooperação" entre seus pais você não estaria nessa sala-Pigarreou o professor como resposta.A turma toda caiu na gargalhada.Isso soaria mais ofensivo se viesse de outro professor,mas brincadeiras desse tipo eram típicas de Chris.

Como esperado,as duplas foram rapidamente formadas e Gabe ficou de fora.Chris,vendo que Gabe estava sozinho,empurrou-o para Charles Mclanton,um típico caipira que adorava passar o dedo no nariz.

Gabe fez praticamente todo o trabalho sozinho.Fez e refez,pois Charles fez o favor de espirrar no primeiro trabalho.

–Muito bem,irei recolher os trabalhos-Disse o professor ao tocar o sinal,alertando o fim das aulas por hoje.Um a um,Chris foi recolhendo o trabalho das duplas.Quando chegou no trabalho de Gabe,Chris falou bem baixo para que apenas Gabe escutasse.

–Espere todos sairem,quero falar com você-Disse,abrindo um longo sorriso.Era costume de Chris fazer Gabe esperar.Eles conversavam muito depois das aulas,quase que como de pai para filho.

–Soube que se atrasou hoje-disse,trancando a porta após a saída do último aluno,sobrando somente ele e Gabe.-Já conversei com o diretor,não precisa se preocupar.

–Obrigado-Agradeceu Gabe,sem jeito.Vem agradecendo muito ao professor Chris.Ele sempre o livrava de suas encrencas e confusões.Mas Gabe sabia que não estava ali para isso.

–Gabe,você anda me preocupando.Tem algo que queria me contar ?

–Não- Mentiu Gabe -Não Senhor.

Na verdade Gabe tinha sim.A alguns meses,as noites de Gabe vinham sendo pertubadas por um pesadelo.Nele,Gabe via-se em um enorme salão totalmente escuro.O eco de sua voz era sua única companhia...o eco e os dois grandes olhos vermelhos que o observavam.Isso apavorava Gabe,que não via necessidade de compartilhar esse sonho com ninguém.

–Muito bem então.Saiba que se precisar,sempre estarei aqui para conversar.

–Obrigado senhor.

–Acho melhor você correr.O ônibus já deve estar chegando-Disse,abrindo outro de seus grandes sorrisos.Seus dentes chegavam a cintilar ao pôr-do-sol,iluminando aquele tempo fechado.-E mande um beijo para sua mãe.

"Minha mãe" pensava Gabe.Talvez fosse esse o motivo de Chris sempre se preocupar tanto.No início,Gabe achava que o professor dava em cima de sua mãe,mas descobriu que Chris fora um grande amigo de seu pai.Talvez sua existência seja um peso a Chris,que deve se sentir responsável pelo bem estar de Gabe.

Enquanto andava pelos corredores já vazios da escola,novamente,Gabe teve a ligeira impressão de estar sendo observado."Mania de perseguição ?" perguntava-se.

Ao embarcar no ônibus escolar,Gabe pegou um acento voltado para a janela.Adorava observar a cidade.Nesse dia,em especial,o trânsito estava livre,então tudo passava bem rápido.A cidade caminhava por seus olhos.Devia estar louco,mas Gabe jurou que vira um garoto pulando por entre as casas.Outra alucinação ?

Mas o que estava por vir não era.Em meio a pista,havia um homem parado,bloqueando-a.Vestia uma longa capa negra que cobria seu rosto.O ônibus estava rápido demais.Não teria tempo de parar.

"Baam!"Em uma batida violenta,todos os alunos foram violentamente arremessados para frente.Com Gabe não foi diferente,batendo na cadeira da frente,quase quebrando uma costela.

Gabe estava fora de si.Sua visão estava embaçada,seus músculos não respondiam,mas causavam uma dor absurda ao tentar se mexer.Quando sua visão se estabilizou,viu a tragédia.A frente do ônibus estava destruída.

Nada fazia sentido.A batida deveria ter amassado o ônibus e arremessado o homem uns trinta metros a frente.Não era bem assim que as coisas estavam.

Os alunos gritavam,desesperados.Gabe viu seus colegas de classe feridos,outras desmaiados e uns até mortos,penetrados por alguma parte que se soltou.

O que havia acontecido ?Não tinha tempo para pensar.Com o estado do ônibus,certamente ouve um vazamento de gasolina que resultaria em uma grande explosão.Nem a chuva poderia evitar.

Com suas forças restantes,suportando a dor,Gabe levantou-se e tentou ir para o fundo do ônibus.Tentou...Ele viu,diante dos seus olhos,o ônibus começar a congelar.

–Mas que merda é essa ?-Guinchou Duda,um aluno do 5°ano.Seus pés e mãos haviam congelado.

Gabe tenta chegar a frente do ônibus.O motorista está esmagado e não havia mais porta de entrada.Mas não é isso que ele quer.

–Achei !-Gritou Gabe,apertando o botão para abrir a porta dos fundos.

Como animais desgovernados,os alunos sairam do ônibus atropelando uns aos outros,sobrando só Gabe e o recém-congelado Duda.

–O que diabos está acontecendo ?-Perguntou-se Gabe,observando o que um dia foi um aluno.Por um instante,pareceu que Duda estava chorando.

Quando ia descer do ônibus,Gabe deparou-se com a porta fechando.

–Mas o quê ?

A frente do ônibus,já destruída,foi brutalmente arrancada.O homem de capa preta,que causou o acidente,acabou de embarcar.

Paralisado,Gabe não conseguia correr.Não sabia o que fazer."Ele não é humano" pensou Gabe,desesperado,sucumbindo a presença do homem que se aproximava cada vez mais.A cada passo,a temperatura ficava mais e mais baixa.

–Quem é v-você ?-Perguntou Gabe,tomando coragem.O homem parou e começou a encarar Gabe.

–Chama -Disse o homem misterioso,erguendo a mão para Gabe,que fechou os olhos,apavorado,esperando o pior.

"Kabum!'Em uma fração de segundos,o que pareceu um raio acabara de cair frente a Gabe.Tomando coragem para abrir os olhos,Gabe percebeu o que seria sua salvação ou a certeza de sua morte.Alguém derrubara o homem encapuzado,que parecia não estar nada contente.