Jessie ficou desmaiada pela noite toda. Quiron disse que provavelmente tinha ganhado uma benção de seu pai durante o caça a bandeira, o que deve ter feito que ela utilizasse muito esforço e desmaiasse. Ele não disse mais nada, mas olhava para nós com um olhar estranho, como se já soubesse de algo. E eu sei que ele sabe. Ele sabe que Jessie estava escondida no Mundo Inferior e deve suspeitar da história de que os deuses queriam matá-la. Parece que nem no Acampamento estamos totalmente seguros. Fui para meu chalé e tentei dormir. Tentei. Não consegui. Passei a noite acordado e assim que pude, voltei para a enfermaria de manha, onde Jessie ainda estava. Mas tinha um garoto com ela.

–O que você está fazendo aqui? – eu perguntei, mas minha voz saiu com um pouco de raiva.

–Não posso ver se minha amiga está bem? – Leo disse rindo.

–Ela não é sua amiga! A conheceu ontem!

–O suficiente para gostar dela – Leo deu uma piscadela para mim e senti minha raiva ir subindo.

–Saia daqui – eu disse bravo.

–Calma aí, garoto dos mortos!- ele disse rindo e saiu de lá, rindo mais ainda.

Alguns segundos depois Jessie começou a se remexer na cama e aos poucos abriu os olhos.

–Oi – eu disse me sentando ao seu lado.

–Oi – ela disse sonolenta – Onde estou?

–Na enfermaria. Está se sentindo bem?

–Nunca dormi tão bem... Não precisava ter expulsado o garoto daquela forma.

Senti meu rosto esquentar.

–Você ouviu? – eu perguntei.

–Sim – ela disse sorrindo.- Mas tudo bem.

Ficamos nos encarando por um tempo. Até que ouvi uns passos e vi quem vinha até nós. Rachel.

–Aconteceu algo Rachel? – eu perguntei.

–Sim – seus olhos mostravam desespero – Uma profecia. Para ela.

Ela olhava para Jessie.

–Profecia? – Jessie disse se levantando.

–“A escrava da morte deve voltar para seu lugar

Acompanhada de dois deve algo entregar

Por muitos desafios terá que enfrentar

Para assim, a flora retornar

Só que para isso, terá que se sacrificar”

Quando me dei conta, Quiron já estava perto de nós, observando cada palavra que Rachel falava. Eu estava da mesma maneira que ele: paralisado, aterrorizado.

–O que está acontecendo? – Jessie perguntou, assustada.

Olhei para Quiron. Rachel percebeu que não devia estar lá e saiu do local, confusa.

–É muita informação de uma vez só – Quiron disse confuso – Mas tudo está fazendo sentindo. Jessie, nesses dias que se passaram, parece que Hades trancafiou Perséfone no mundo inferior.

–Ela já não estava presa? – Jessie perguntou.

–Sim, mas ela voltava ao Olimpo em algumas partes do ano. Parece que algo irritou muito Hades esses dias – olhei para Jessie, ela também entendeu – E, por conta disso, ele decidiu trancar Perséfone para sempre.

Perséfone nos ajudou a sair do Mundo Inferior. Hades deve ter descoberto e castigado a mesma.

–Com isso – Quiron continuou – Deméter ficou muito brava e fez com que as estações acabassem.

–E eu com isso? – Jessie estava brava.

–Muitas flores estão morrendo e, com isso, a cadeia também. Os animais que se alimentam dessas plantas, estão morrendo. Nós, seres humanos, com o tempo, irão morrer... Com certeza, uma catástrofe pode acontecer! – Quiron disse.

–É sobre isso que a profecia quer dizer? – eu pergunto.

–Tudo indica que sim – Quiron disse – “Para a flora retornar”. Você, minha jovem, terá que ir atrás disso.

–Mas não atrás de Deméter – eu disse.

Quiron nos olhou torto.

–Teremos que ir atrás de Hades – Jessie diz.

–Como vocês têm tanta certeza disso?

–“A escrava da morte deve voltar a seu lugar” – Jessie disse olhando para baixo, com uma carinha triste – Terei que voltar ao Mundo Inferior. E fazer a cabeça de Hades.

Quiron nos olhou por um tempo. Tinha acabado de dar certeza para ele de algo que, eu tenho certeza, que ele já estava desconfiando há algum tempo.

–Você estava morta? – Quiron perguntou.

Jessie balançou a cabeça de um lado para o outro, negando.

–Você é a filha perdida de Ares, não é? – Quiron disse.

–Eu sou o que? – Jessie perguntou olhando para mim.

Respirei fundo e contei aos dois tudo que meu pai tinha me dito. Toda a história de que ele tinha mantido Jessie no Mundo Inferior apenas como trato com Ares. Jessie escutava tudo atenta e com um pouco de medo em seu olhar. Quiron ouvia tudo como se já soubesse ou desconfiasse.

–Por que não me contou? – Jessie estava um pouco triste.

–Foi muito rápido. Achei melhor guardar segredo por um tempo. – eu disse.

–É por isso que Hades queria me matar? – ela estava estranha.

–Sim – eu sussurrei.

–Quer dizer que além de Hades, todos os deuses querem me matar? – Jessie começou a rir de desespero – E vocês querem que eu saia daqui, para ir ajudar uma dessas deusas e ir até Hades? Ir ao encontro da morte?

–Não é bem assim – Quiron disse – Nenhum Deus poderá interferir na missão de vocês. É uma regra!

–E depois? – ela estava em desespero – E quando acabar? Ou melhor: SE acabar? Vão me matar.

–Talvez não – Quiron disse – Isso pode ser uma prova de que você é boa e não merece ser morta.

–Não é o que parece na parte de que eu vou me sacrificar! – ela gritou.

–Não pode levar as profecias ao pé da letra, menina.

Jessie olhou para Quiron com medo. Era uma mistura de sentimentos em seus olhos. Raiva, medo, tristeza, duvida e muito mais.

–Vamos precisar decidir isso depois. Tentar entender alguma coisa sobre a profecia – Quiron disse com calma – Vou dar um tempo para você associar tudo. Terá uns dias de treinamento e partirá nessa missão o mais rápido possível. Enquanto isso, pense em sua companhia nessa missão.

Jessie afirmou com a cabeça.

–Se bem que eu acho que a senhorita e o senhor Di Angelo tem uma boa química juntos.- ele disse com um sorrisinho nos lábios.

Senti minhas bochechas esquentarem, mas nem isso fez com que Jessie relaxasse. Ela estava perdida em seus pensamentos.

–Nos falamos amanhã, as 20h, na Casa Grande – Quiron disse e saiu andando.

Jessie sentou na cama que tinha atrás de você e balançou os pés. Sentei ao seu lado.

–Você devia ter me contado – Jessie disse triste , olhando para o chão,

–Desculpa – eu falei – Fiquei com medo de os deuses descobrirem que te tirei do Mundo Inferior e tentarem te matar...

–Eu sonho em saber algo sobre mim desde que me entendo por gente -ela disse suspirando – E quando alguém descobre algo, esconde de mim.

–Já pedi desculpas. Prometo que daqui para frente não irei esconder nada. – eu disse suplicando por seu perdão. Odiava ver ela daquele modo.

–Jura? – ela olhou para mim.

–Pelo rio Estige – eu disse retribuindo o olhar.

Ficamos assim por um tempo e, quando me dei conta, já estava me aproximando mais e mais dela, como se fosse um imã. Eu não tinha controle. Quando estávamos mais próximos, algo, ou melhor, alguém, nos interrompeu.

–Adivinha quem vai querer acompanhar vocês nessa missão? – uma voz muito irritando disse rindo. Parecia gostar de atrapalhar os outros nesses momentos.

Olhei para o lado com a pior cara que alguém podia ter. Estava pronto a mandar alguém para o tártaro.

–Valdez – murmurei entre os dentes, com toda a raiva possível.