–Eu me ofereço como tributo!

Essa simples frase teve o poder de mudar a minha vida, o meu cotidiano. Essa frase fez com que as coisas se invertessem. Essa frase, dita por Katniss Everdeen, minha melhor amiga, teve um efeito em minha vida que eu nunca poderia imaginar.

Meu nome é Gale Hawthorne. Já me inscrevi 42 vezes nos Jogos Vorazes. Para poder ter comida para minha família. Para mantê-la viva.

Digamos que, por essas e outras, tenho vários motivos para considerar a vida um tanto quanto injusta, é. Eu, que me inscrevi tantas vezes, não fui sorteado para os Jogos desse ano. E Primrode Everdeen, que só colocou o nome no sorteio apenas uma vez, foi a Tributo feminina sorteada. Considerando que, com isso, Prim teria que ir para a arena, a reação de Katniss foi a esperada: se ofereceu para ir no lugar da irmã. E é isso que me deixa preocupado. Katniss na arena.

Apesar de ela ser bastante esperta e, devo dizer, uma excelente arqueira, não consigo evitar minha preocupação. Na arena há carreiristas, tributos treinados por anos a fio para entrar nos Jogos e vencer. E é por isso que quase sempre são carreiristas que ganham os Jogos. E é por isso que eu tenho medo, pela Katniss.

Claro que Katniss passou uma ótima impressão para os cidadãos da Capital, o que gera patrocinadores, mas não é o suficiente para mantê-la viva. Mesmo com toda aquela história de garota em chamas, ou até mesmo aquele suposto romance entre Katniss e Peeta. Não com 23 tributos para matar. Na arena, toda ajuda é pouca.

No momento estou sentado na floresta, consciente de que daqui a alguns minutos a septuagésima quarta edição dos Jogos Vorazes vai começar. Na verdade, já deve estar na contagem regressiva para liberar os tributos na arena, mas por algum motivo que desconheço, não quis assistir o início. Talvez eu queira apenas ficar aqui, pensando, torcendo para que Katniss volte viva para nosso distrito. E só na floresta me sinto confortável o suficiente para ficar horas divagando. É por isso que estou aqui agora. Pensando.

Fico imaginando o que Katniss está fazendo na arena agora. Será que ela foi para a Cornucópia, em direção ao banho de sangue, e foi morta? Pensar nessa possibilidade me dá uma dor no peito. Pensando nisso, mudo

meua planos e me levanto, saindo correndo para fora da floresta, para fora da campina, pois me dou conta de que preciso imediatamente ver como Katniss está.

Não que haja realmente um romance entre nós. Claro, depois de tantos anos caçando e conversando na floresta com ela, acabamos criando um vínculo. Eu a amo, mas é difícil saber em que sentido. Porque é fácil confundir sentimentos.

Interrompo meus pensamentos ao chegar na praça onde, em um telão, estão passando os Jogos Vorazes. E paro de correr imediatamente ao perceber que o rosto que ocupa a tela é aquele que conheço tão bem. É o rosto de Katniss, e sinto um alívio absurdo ao constatar que ela está bem. Mas mantenho minha postura séria, porque não sou o tipo de cara que gosta de mostrar o que sente. Ainda mais em uma praça cheia de pessoas.

Ela está andando pela densa floresta da arena e posso perceber que ela já se distanciou bastante dos outros tributos, o que é ótimo. Katniss foi bem esperta em ter conseguido uma mochila, mas esse pensamento me faz estremecer. Se ela está com uma mochila é sinal de que foi em direção ao banho de sangue. Ela poderia ter perdido a vida com esse simples ato.

Fico até altas horas da noite assistindo aos Jogos, então posso dizer com tranquilidade que o resto dos Jogos naquele dia foi quase entediante. Não houve muita ação depois das mortes na Cornucópia. Mas mesmo assim, fiquei lá, assistindo.

Com o tempo, a multidão na praça se dispersa. O que é o esperado, afinal, ninguém fica até altas horas da noite assistindo aos Jogos, com excessão dos familiares e grandes amigos dos Tributos. Mas então a mãe e a irmã de Katniss também saem, se despedindo de mim com um aceno de cabeça. Imagino que Prim esteja com sono.

Acho que a praça está vazia, com excessão de mim. Mas percebo que estou errado, pois quando olho para os lados, percebo a presença de uma bela garota ao meu lado. Ela ostenta um olhar preocupado, seus lindos cabelos loiros caem em cascata até a metade de suas costas, e ela está usando um vestido simples, mas que destaca seus corpo perfeito. Posso jurar que a reconheço de algum lugar. Ao perceber meu ohar, ela se vira e, com um sorriso tímido, estende a mão e diz:

–Prazer, Madge Undersee. Você deve ser o Gale, estou certa?