Transtorno De Boderline escrita por Liz03


Capítulo 5
Alucinação


Notas iniciais do capítulo

Comentem criaturas malignas.



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Alucinação é a percepção real de um objeto que não existe, ou seja, são percepções sem um estímulo externo.


Verde. Verde... Verde. Caindo. Um poço de água verde, parecia pequeno, mas agora eu não paro de cair. Ar.Ar.Ar. Tento respirar e não consigo, puxo o ar só que parece que ele não vem, que não faz efeito. Alguns espectros de outras cores surgem brilhando no poço verde, roxo, azul, branco. E então os espectros giram em torno de mim, cada vez mais rápidos, começo a perder meu ponto de referência e não demora até que eu perca tudo de vista, e tudo passa a ser preto. Preto.


Preto.....


Tento abrir os olhos, uma punhalada atinge minha cabeça tamanha a dor não consigo mantê-los abertos. Espero mais um pouco e então tento abri-los novamente, ainda dói, mas dessa vez eu já esperava e me precavi. Lá estão as luzes girando. Sinto frio. Olho para o lado e vejo a janela aberta, quero me levantar, quero mesmo só que meu corpo não me obedece, choro porque não consigo nem me levantar e fechar a janela. Frio. Sinto as lágrimas escorrerem pelo meu rosto e me sinto ainda mais humilhado. E quando penso que estou perdido, a vejo vir calma, como sempre, e fechar a janela. Como sempre. Sempre. Sempre. Ela me salvou mais uma vez. Vira-se e vem até mim, repousa sua mão quente em minha testa, beija meu rosto e posso ouvir sua voz dizendo que eu não preciso chorar, que bobagem! Tudo ficaria bem. Sim, tudo ficará porque ela está aqui e nada nunca vai me fazer mal perto dela. Nada nunca. Nunca. Nunca.


“Victor, eu estou aqui.”

“Victor.... Victor, não chore, tudo bem.”

“Você tem medo, Victor? Eu não tenho,meu amor, não tenha também.”

Eu vou ficar bem. Os espectros rodam furiosos. Mas eu vou ficar bem. Minha cabeça racha por dentro em vários pedaços doloridos. Mas ela está aqui, então posso aguentar.

“Victor, você pode me ouvir?”

“Victor, tudo bem, estamos aqui com você, consegue me ouvir?”

Não era a voz dela, eu saberia se fosse, mas não era. Mas não tem ninguém mais aqui. Então onde....estreito mais os olhos, como não pude ver?! Uma égua de pelagem preta brilhante com uma mancha de pelos brancos na testa, um lindo animal. Ela também está olhando, parece feliz ao ver o bicho , lembro como ela adorava os cavalos da fazenda. Mas por que ela está indo? Não, não, não. Me dá um beijo na testa e diz que já está tudo bem. Não, não... E ela coloca a mão sob meu peito, bem acima do coração e tenho a certeza instantânea de que estou bem agora, ela pode ir, acaricia meu rosto e desaparece levando os espectros furiosos consigo. O animal se aproxima de mim, chama meu nome e pergunta se posso ouvi-lo. Seus olhos me vigiam com calma e paciência, queria falar mais, porém digo apenas que sim e reparo como estou cansado, queria ficar mais um tempo observando aquela bela criatura e seus olhos ternos, mas poxa vida estou cansado. Durmo e tudo fica preto de novo.

*

Sons.

Abro os olhos preguiçosos, minha visão está um tanto embaçada, mas posso reconhecer facilmente esse teto meio branco meio azulado para o qual tenho olhado já faz vários dias. A imagem vai ficando mais clara e então ouço uma voz familiar.

– Victor? – ela espera meus olhos a encontrarem bem ao lado – Tudo está bem agora – então mais de perto ela repete para me dar confiança – Tudo bem

Tenho vontade de fazer algumas perguntas, mas ao tentar falar solto um grunhido como se estivesse enferrujada.

– Você precisa descansar – diz como se não estranhasse minha dificuldade – foi uma noite longa – sorri com uma calma familiar

Me ajeito na cama com sua ajuda. As lembranças da noite passada inundam minhas mente.

– Eu fiquei alucinado, não foi? – digo com a voz ainda rouca

– Sim, efeito do tratamento - checa os aparelhos que me monitoram – como se sente agora?

Penso um pouco. Reflito meu estado. Concluo: Cansado.

– É compreensível

– Eu falei muitas idiotices, certo?!

Então ela ri.

– Não, mas foi interessante na minha crítica cultural

Dessa vez sou eu quem riu, o que não tem sido um hábito ultimamente, ainda mais depois de uma droga de noite como a passada.

– Você é boa nisso, Dra Pan

– Nisso o que?

– Nisso que está fazendo, não sei bem o nome – procuro a palavra, mas não achando prossigo – não sei, mas você é boa nisso

Ela pondera sorridente. É um sorriso engraçado de se ver. Somente depois de reparar no sorriso engraçado começo a perceber sua fisionomia. Cabelos pretos, comportadamente colocados atrás das orelhas e descendo até um pouco além dos ombros. A pele era de um branco amplificado, muito provavelmente, pela falta de sol. Os óculos com lentes grandes faziam os olhos parecerem maiores e aquela cor era de um castanho familiar. Talvez eu tenha ficado encarando aqueles olhos familiares de modo indiscreto e ela tratou de questionar.

– Tudo bem...?

–Tudo, tudo – aproveito e olhos mais uma vez – Um pouco...confuso...

– Normal, normal . A noite foi difícil

– Sobre o que eu falei enquanto delirava?

– Bem – fez uma pausa como que para lembrar-se – você parecia estar conversando com uma mulher e, do meio para o fim, chegou um cavalo, algo assim

– Mulher....e um cavalo...- como se alguém jogasse um balde de lembranças em mim vejo as cenas alucinantes da noite passada

Lembro de minha mãe chegando e fechando a janela para me salvar do frio e de tudo, dela me dizendo com aquela sua voz aconchegante que eu ficaria bem. E então lembro daquela criatura mágica, que só percebi no fim da cena, lembro de seu pelo preto brilhando de modo realmente divino, sua voz (sim, porque falava) terna, seus olhos pacientes. Olhos pacientes! Encaro a Dra. Pan subitamente, lá estão eles, aqueles olhos.

– Dra. Pan? – digo depois de longos segundos

– Sim – diz ela ao lado da cama

– Acho que o cavalo era você

– Como?

– A égua – digo sem saber por que comecei a falar tamanha basbaquice, mas foi mais forte do que eu – era você

Acho que os efeitos da alucinação e a calma da médica fizeram com que eu não ponderasse muito bem quão ridículo era confessar a ela esse dado absolutamente desnecessário. A doutora sorriu com as faces coradas, mas não pareceu com raiva, apenas ligeiramente desconfortável. O que, para quem foi chamada de égua a pouco, não era nada mau. Ela segue fazendo as perguntas habituais depois de noites como essas. Reparo no cabelo preto, não é como o cabelo da enfermeira das 18 horas, sempre impecavelmente penteado, e não estava com maquiagem. A das 18 horas era um loira de respeito, curvas e curvas...e curvas... alta, pelo menos um metro de pernas (e que pernas!), belo decote...aaaah a das 18 horas....

Mas a Dra. Pan não era feia. Não, não. Era, digamos, simpática, não muito alta, não muitas curvas, não muitas pernas, uma blusa sem decote...simpática. O melhor dela era aquela energia boa, quase fiquei contagiado não fosse a porcaria de vida, seria capaz de rir .

E então ela diz recomendações e as coisas de sempre e sai. Enfermeiras vem depois, perguntas, mais recomendações e medicamentos. Olho para o teto, ligo a TV, pego meu caderno de anotações ao lado releio o que escrevi há algum tempo, começo a escrever novamente, sem inspiração decido parar. Olho para o teto, ligo a TV....a enfermeira entra no quarto, perguntas, recomendações, medicamentos...



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Notas finais do capítulo

Como foi esse capítulo ein? O biscoitinho da sorte continua. Um xeru :D