Winter In London escrita por Luh Moon


Capítulo 8
Capítulo 8 - Abstinência


Notas iniciais do capítulo

Apesar de estar lidando o tempo todo com sentimentos Sherlock Holmes não parece disposto a mudar sua maneira de lidar com esse tipo de sensações...
Mas será mesmo que esse homem frio e metódico é imune a qualquer tipo de sentimento amoroso?



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Outro dia frio despontava e John deixou o quarto um pouco depois de o sol nascer. Ainda na cama, enquanto se espreguiçava e acordava os músculos, procurou lembrar sua mente dos acontecimentos do dia anterior. Tinha passado o dia no apartamento de Mildred Arnet, irmã de criação de Mycroft e Sherlock Holmes, por que ela abrigava seu amigo, supostamente morto e queria "devolvê-lo". Ela usara exatamente aquela expressão: devolver. Então, Sherlock não havia cometido suicídio e havia passado seu tempo desconectando a rede de Moriarty. Mycroft sabia. Molly sabia. Mildred, não. E agora Sherlock estava de volta a Baker Street.

Quase se permitiu pensar que tudo havia voltado ao normal, finalmente, mas assim que pôs os pés na sala do apartamento, percebeu que aquilo estava muito distante da normalidade. Já era dia e a porta do quarto do seu amigo permanecia trancada e tudo estava mergulhado num atordoante silêncio. Ele tinha dormido? Tinha dormido a noite inteira? Aquilo não estava certo. Ia preparar algum café da manhã, quando percebeu que a Sra. Hudson já o tinha feito. Mais que isso, havia uma dúzia de caixas de papelão espalhadas pela cozinha.

– Bom dia, Sra. Hudson. – cumprimentou-a. – O que são essas caixas?

– São as coisas dele... – murmurou emocionada. – Achei que ele iria querê-las...

– Então a senhora as guardou? Todo esse tempo?

– Ora, não se jogam fora essas coisas importantes, não é? – a mulher afagou-lhe o ombro.

A caixa de madeira voltou a sua memória com força. Então aquelas coisas deviam ser de alguma importância. Mas, para aquele homem? Não fazia sentido algum! Não ia embarcar outra vez naqueles pensamentos sem sentido! Tudo aquilo parecia um labirinto e por mais que pensasse voltava sempre para o ponto de partida. Suspirou enquanto a senhoria lhe servia o chá.

– Está tudo bem? – ela perguntou com gentileza.

– Ah! Sim... Tudo bem!

Mentira! Nada estava bem! Sherlock estava dormindo! Aquilo era tão improvável quanto o pensamento que martelava em sua mente. Sou a coisa mais intima na vida daquela máquina pensante fria e sem sentimentos! De onde aquela garota tinha saído afinal? Ela parecia tão cheia de si quanto o próprio Sherlock, mas havia qualquer coisa mais tensa nela, uma coisa que só vira da primeira vez que se encontraram. Foi o que o levara a primeira conclusão lógica. O problema agora é que a segunda parte daquela equação simplesmente não encaixava!

Se ao menos pudesse por as mãos na tal carta misteriosa. Com certeza haveria alguma resposta ou alguma pista. Eu acabava de incorrer no meu pior erro. O que diabos Sherlock quisera dizer com aquilo? A curiosidade o corroía. Se ao menos ele estivesse mais disposto a falar do assunto naquela manhã... Se ao menos ele estivesse acordado naquela manhã... Foi interrompido em seus pensamentos pelo som de uma fechadura que se abria.

– Oh! Bom dia! – disparou a senhoria animada assim que viu o outro sair do quarto.

John não conseguiu compartilhar da mesma animação. Ele estava completamente vestido e não parecia cansado. Não havia nenhuma marca em seu rosto, nem de uma noite muito bem dormida, nem de uma noite totalmente em claro. Olhou para o bolso do casaco onde vira o outro guardar a carta. Adoraria por as mãos nela...

– Bom dia... – respondeu o moreno, caminhando devagar até onde estava o violino. – Isso ficou aqui o tempo todo?

– Sim... – respondeu John.

– E ela o tocou quando esteve aqui, certo? – apanhando o instrumento. John levantou-se e aproximou-se de onde ele estava com uma ruga na testa. – Oh! – resmungou parecendo enfastiado. – Há um fio de cabelo escuro, traços de esmalte de unha, uma mancha de maquiagem alaranjada... Especialmente pela maquiagem eu posso supor que ela o tocou ontem quando esteve aqui para apanhá-lo. – caminhando até a poltrona com o violino nas mãos.

– Eu quase me esqueci do que você era capaz. – devolveu John com um sorriso sinceramente satisfeito.

O outro não disse coisa alguma, apenas sentou-se e ficou admirando o violino. Por um instante John achou que ele se poria a limpá-lo, como sempre fazia, e por que estava com a flanela na outra mão. Mas ele não o fez. Apenas ficou observando o instrumento e a vara com cuidado, como se fizessem parte do rol de evidências de algum caso de extrema importância. O que ele estava procurando ali?

Os dias seguintes se tornaram ainda mais bizarros. O silêncio chegava a ser torturante. O outro respondia as perguntas quando perguntado, mas nada além daquilo. Às vezes, como no caso do violino, disparava a descrever alguma coisa, mas assim que terminava, mergulhava outra vez naquele silêncio aterrador. Todas as noites ele se despedia e se trancava no seu quarto saindo de lá somente no meio da manhã. John começou a sentir algum receio com o rumo que as coisas estavam tomando. Ele estava fazendo todas as refeições e até mesmo sorriu quando Lestrade apareceu para uma visita. Mas durante todo o tempo em que conversaram não esboçou qualquer entusiasmo. Estava tudo ao contrário!

No quarto dia o silêncio era quase uma presença física entre eles, no meio da sala. Apesar de fingir estar lendo os jornais, John estava prestando atenção. E o outro estava imóvel há mais de duas horas, fazendo parecer que respirar era um esforço demasiado e inútil. Tentou fazer algum comentário que ao menos provocasse a habitual resposta: "Chato!". Mas nem isso aconteceu e ele percebeu que embora parecesse profundamente entediando, Sherlock não tinha reclamado uma única vez do tédio desde que voltara... Aliás, ele não tinha feito qualquer reclamação desde que se reencontraram.

– Ok! – disparou John largando o jornal e encarando o outro. – Diga-me o que está errado. – Sherlock pareceu surpreso com a abordagem.

– Não há nada errado. – disse simplesmente.

– Mas é claro que há! – devolveu o médico. – O que houve com a sua mente inquieta como um trem desgovernado e sem controle? – Sherlock revirou os olhos. – O que houve com o tédio? E os adesivos de nicotina? – Sherlock apontou para o cinzeiro ao seu lado, transbordando de guimbas e cinzas. – Apenas me diga: está tudo bem?

– Abstinência... – resmungou, desviando o olhar para a janela.

– Hã? – sem compreender.

– Síndrome de Abstinência. – suspirando. – Ocorre na ausência do composto viciante entre 3 a 10 dias do último uso... – explicou sem se mover. – Pode causar convulsões, hiperatividade, tremores, insônia, alucinações, descontrole psicomotor e ansiedade. Suponho que funcione ao contrário comigo... Sei como é. – estendendo a mão.

– Está tremendo! – espantou-se o médico.

– Sim! Já passei por isso antes... – suspirando outra vez.

– E... Qual seria exatamente o composto viciante neste caso? – olhando fixamente para o cinzeiro. Com certeza ele não estava se referindo a nicotina.

– Algo que eu pensava ter conseguido tirar do meu sistema... – levantando e andando até a janela. – Mycroft... – resmungou voltando para a poltrona.

John sentiu-se frustrado. Ao menos ele realmente estava respondendo quando era perguntado. Gostaria que não tivessem sido interrompidos... Apertou os olhos enquanto tentava juntar as peças. Lembrou-se da falsa batida no apartamento em busca de drogas. Será que ele estava mesmo falando sério? Mas como é que Sherlock seria viciado em qualquer coisa sem que ele soubesse? Era médico! Tinha que saber! Não havia tempo para aquilo agora, Mycroft acabava de entrar.

– Olá doutor! – acenou, retirando o chapéu. – Sherlock! Vejo que está de volta ao lar! – sorrindo.

– O que quer?

– Ora, nada! Vim apenas ver como estava... – dando um meio sorriso malicioso. – Pensei que talvez estivesse tendo alguns dias... difíceis.

– Nem tanto...

– Ora! Não minta! Eu sei que é um sofrimento excessivo quando é arrancando do seu vicio com tanta violência. Eu posso?

– Claro! – disparou John. Sherlock apenas olhou-o seriamente. John olhou repetidas vezes de um para o outro. Do que é que Mycroft estava falando?

– Não pode me culpar de não tê-lo prevenido. – apoiando ambas as mãos em seu guarda-chuva.

– Sim, você me preveniu.

– Deve concordar que sendo algo com tamanho potencial destrutivo, é natural que eu me preocupe. – Sherlock apertou os olhos e John sentiu que ele estava pronto a uma resposta, mas algo o deteve. O alerta de mensagem do celular sobre a mesa de centro. – Parece que ainda não acabou... Efeito residual? – Mycroft tinha qualquer coisa de sádico naquele sorriso.

"Hematoma passando do púrpura ao amarelo. Logo desaparecerá."

Era o que dizia a mensagem de texto que colocou o primeiro sorriso sincero no rosto de Sherlock desde que John o reencontrara. Não havia assinatura. Sherlock não fez nenhuma questão de esconder o que acabara de ler. Ao contrário, oferecera o telefone a Mycroft e John ficou confuso quando leu aquelas duas frases, em pé, atrás da poltrona no irmão mais velho.

– Oh! Santo Deus! Eu não preciso saber disso! – devolvendo o telefone.

– Parecia interessado um minuto atrás...

– Você realmente não percebe o quanto isso é perigoso, não é mesmo?

– Está se referindo a minha saúde ainda? – retrucou o outro.

– Bem... Fiz o que devia fazer! – levantando-se. – Por favor, seja discreto. – resmungou, colocando o chapéu e andando até a porta.

John hesitou por um instante, mas antes que tivesse chegado a qualquer conclusão, percebeu que descia as escadas depressa no encalço de Mycroft. Que conversa tinha sido aquela? Do que os dois estavam falando afinal? E o que significava aquela mensagem? Estava sem fôlego quando alcançou o mais velho, já a porta do carro.

– Mycroft!

– Sim, doutor?

– Apenas John... – recuperando o ritmo da respiração. – O que foi aquilo? – apontando na direção do apartamento.

– Está bem embaixo do seu nariz John! Não consegue enxergar? – riu quando percebeu que John não entendera coisa alguma. – Seu amigo é um viciado, meu caro doutor, em plena síndrome de abstinência!

– Abstinência? – isso, de novo?

– Sim. O problema é que esse vício é muito mais forte que ele! – entrando no carro. – Por favor, mantenha-se atento e faça contato. – fechando a porta e partindo em seguida.

– Mas... – tarde demais. Voltou a subir as escadas com a frustração pesando sobre os ombros.

Lá estava aquela criatura com um aspecto doentio e sombrio. O que de todo o modo não era o mais estranho. Já tinha visto coisa semelhante, não tinha? Exceto talvez pela visível perturbação física que percebia agora, aquela reação era muito parecida com a que ele tinha tido quando aquela mulher... Um flash cruzou a mente de repente.

"Está bem embaixo do seu nariz John!". "Sherlock era o meu preferido!"

As duas vozes ecoavam com força em sua memória e de repente a imagem que se formou em sua mente deixou muito claro do que se tratava. Mesmo assim, custava um pouco a crer naquilo. Respirou fundo. Era a única pista que tinha a seguir.

– Abstinência, você disse... – iniciou vacilante.

– Sim... – confirmou Sherlock envolto em fumaça.

– E do que exatamente você tem se privado? – a resposta foi um olhar que tinha alguma coisa de fulminante e um suspiro longo e profundo. – Não estamos falando de uma substância, estamos? – engolindo em seco.

– Só percebeu isso agora? – com um arremedo de riso.

– Mildred? – sabia que a interrogação tinha soado quase mais alta que o nome.

– Assim como toda substância de alta toxicidade, tem efeito intenso, porém curto, um rebote assustador... Dependência física, psicológica e uma abstinência feroz... – murmurou juntando as mãos diante do rosto.

– Não consigo... – do que ele estava falando afinal?

– Nunca encontrei nenhuma substância capaz disso. Minha mente é capaz de alcançar uma clareza e agudez impensáveis em estado natural. – quase como se estivesse refletindo consigo mesmo.

– Está dizendo que ela deixa você "ligado"?

– Na melhor acepção da palavra! – com um sorriso amargo. – É a combinação perfeita! Mas como toda toxina tem um efeito colateral devastador...

– Algo como... A mulher? Adler? – arriscou, embora achasse a comparação absurda.

– Errado. São níveis de conexão absolutamente distintos. – parecia ter sentido qualquer coisa de ressentimento naquela resposta.

– Ah! – aliviado. – Eu imaginei. Realmente, aquilo com Adler foi muito mais intenso e...

– Errado de novo, meu caro! – John silenciou e sentiu a respiração congelar. – Isso foi um passeio de montanha-russa comparado ao que acontece quando...

– Espere! – John interrompeu-o. – Está me fazendo pensar que você e ela... – assustado com os próprios pensamentos.

– Não pense que eu tenho algum orgulho disso... – levantando-se e saindo.

John sentiu uma tontura repentina. Ele não podia jogar aquele monte de coisas sobre a mesa e simplesmente ir se trancar no quarto outra vez! O click da fechadura informou a John que ele fizera exatamente isso. O que era tudo aquilo afinal? Era a isso que Mycroft tinha se referido? Mesmo que todo o tempo fosse assim que tivesse parecido, não podia entender como era possível! Algumas coisas sem sentido se juntaram em sua mente. A cena que presenciara depois do seu desmaio e a despedida no apartamento da garota. Não tinha imaginado! Aquelas coisas de fato tinham acontecido exatamente como ele achara que vira! Mesmo assim, não fazia o menor sentido!



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Notas finais do capítulo

Honestamente me sinto perdida quando não recebo nenhum retorno. Então mesmo que seja para dizer que o caminho por onde a história está indo não é o melhor, por favor, deixe um comentário... Ç_Ç



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