Notas Suicidas escrita por Pu_din


Capítulo 24
Anotação n°23




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Com certa dificuldade, arrastei-me em direção à porta e procurei a chave nos bolsos, e certamente ela estava em meu moletom roubado, pois não a achei em buraco algum. Droga, meu blusão era tão caro! E ao me lembrar disso, choraminguei um pouco, e apoiei-me na maçaneta da porta, que se abriu rapidamente com o peso de meu corpo.
- Arthur! Onde você estava?! – Joseph gritou ao me ouvir entrar. Ele estava sentado em sua poltrona, afundado em um jornal qualquer.
- Andando – murmurei, dolorido.
- Como andando?! Nem me avisou?! – Joseph largou o jornal e se virou, exaltado com minha irresponsabilidade, mas logo seus olhos furiosos tomaram um aspecto assustado, porém não dei muita importância.
Cambaleei até o sofá, e joguei meu corpo moído e açoitado nas almofadas, gemendo no final. As pontadas de dor no estômago me torturavam, sem brincadeira.
- Deus! O que aconteceu, Gerard?? – ele aproximou-se de mim e passou seus dedos em minha bochecha, ainda com uma cara de assombro.
- Um cara roubou meu moletom preto. Lembra dele? Aquele caro que demorei um século pra comprar... – contei com um amargor na voz. Meu querido moletom...
- Seu rosto está péssimo! – seus olhos corriam por todo o meu corpo, de modo aterrorizado. Isso não ajudava muito. – Foi à polícia?
- É lógico que não! – exclamei. – Não consigo nem falar direito, muito menos andar.
- Claro...
Essa foi uma das poucas vezes que vi meu pai confuso. É estranho vê-lo desse ângulo, desconfortante demais.
Mas logo sua voz passou de confusa para perplexa, me censurando:
- Mas o que você queria?? Andar a essa hora da noite por aí e não ser assaltado?! Com certeza não pensou nisso.
Meus nervos ferveram com essa observação. Chegou a doer, mas tive que berrar:
- Por mim eu estaria em casa, vendo a merda da TV e agüentando sua conversa fiada durante vinte horas seguidas! A última coisa que eu queria é ter saído de casa hoje à tarde! – suspirei, sentindo seus olhos pesarem sobre mim, e virei a cara.
Seu olhar se tornou ríspido e sagaz, e sua voz reavivou as dores dormentes em meu cérebro, de modo que nem eu sei explicar muito bem.
- Você é louco, Gerard. Inconseqüente e louco.
O amargor com que Joseph disse essa última frase me fez lacrimejar. Estava claro que meu pai achava que eu tinha algum distúrbio, mas eu não estava bem o bastante para agüentar sua opinião sobre meu psicológico. E para completar, as desventuras daquele dia pareciam ter se transformado em água, e todo esse líquido parecia querer jorrar de minhas pálpebras. E o pior foi que eu não conseguia me conter, e iniciei minha crise histérica.
- Vá lavar o rosto. A dor dos machucados vai diminuir...
Idiota! Os machucados pro inferno!
Não era ali que doía. Era interno.
- Calma, não está doendo tanto! – exclamou com ignorância.
E transtornado com a calma de Joseph, levantei-me bruscamente, sentindo as ridículas lágrimas rasgarem minha pele, e gritei:
- A Hayley, pai! A Hayley, caramba!!! – eu o destroçava ao fitá-lo, e percebi que o outro ainda estava indiferente. Eu juro que quis pegar o sofá e tacar na cabeça dele, por mais impossível que isso soe. Eu era o louco, mesmo. Essa poderia ser minha primeira insanidade da madrugada.
Observei-o por mais alguns segundos, e pude sentir o sal do suor que brotava de minha testa machucar-me mais. E meu pai continuava imóvel, sem entender nenhum momento de meu surto.
Contudo não seria eu quem iria explicar.
- AH! DANE-SE!... – gritei.
Saí bufando da sala e me tranquei em meu quarto, notando o sangue fluir mais rápido embaixo da pele. Apaguei a luz, raivoso, e deitei. Juro que fiz o possível para manter o controle, mas meus nervos corroíam-me de forma sobrenatural.
Morte. Hayley. Sangue.
Frank.
Tudo isso tumultuava minha cabeça e me deixava em um estado insano. Eu ri disso, afinal, não era eu o louco?
Que me internem, então!


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