Omma.

Seis meses antes...

Ela olhou o grupo de meninas do outro lado da rua. Estavam usando o mesmo uniforme de sua escola, mas raramente as via nos corredores da mesma. Pelo que sabia elas faltavam para atividades que era visto por muitos como algo errado e assustador, mas Moon Nan Ne as achava corajosas e verdadeiras fãs.

Ela queria ser como elas.

Ela suspirou e seguiu seu caminho, ainda lhe faltava coragem para chegar até aquele grupo, além disso tinha sua mãe que sempre estava lhe controlando... ‘Tudo seria mais fácil sem ela’ esse pensamento lhe assaltou, como normalmente vinha acontecendo, caso fosse analisá-la, qualquer pessoa diria que era um pensamento perverso e errado, mas para ela, quem era controlada... Presa na prisão chamada ‘lar’, era o pensamento mais correto e acolhedor que poderia ter. Mas lhe faltava qualquer coragem para fazer alguma coisa em relação a isso.

Chegou em sua casa minutos depois, sua mãe, como de costume, a esperava no portão, assim que passou por este a mulher a seguiu para dentro de casa, lhe ditando o que fazer naquele dia. Seus afazeres do dia, variava da limpeza de casa á atividade extra curricular, como por exemplo estudar idiomas, no caso desse dia, japonês.

As coisas seguiam dessa forma na vida de Nan Ne desde que seus pais se separavam, sua mãe extravasava todos seus problemas e energias sobre ela, a sufocando na sua rígida proteção. Nan Ne via que a qualquer momento não agüentaria mais... Sentia isso em sua alma, algo que parecia percorrer pelo seu corpo, buscando controlá-la... Ela deveria ceder?

Ela levantou o seu olhar de cima do livro e mirou sua mãe. Ela estava naquele instante arrumando a mesa para o jantar, enquanto Nan Ne estudava japonês na mesa de centro da sala de estar; como normalmente fazia, uma vez que sua mãe não gostava que ela ficasse muito tempo em seu quarto, trancada fazendo sabe lá o que.

Para Nan Ne sua mãe naquele momento era a bruxa do João e Maria, preparando as guloseimas afim de engordá-la... Para depois matá-la. ‘Devo ceder?’ a pergunta lhe veio a mente, enquanto sua imaginação brincava com ela.

Ela levantou o livro de estudo, cobrindo parcialmente seu rosto e, continuou a mirar a mãe dessa forma, vendo-a indo da cozinha para a mesa e dessa novamente para cozinha, uma frenética e chata movimentação, rotineira demais.

Nan Ne se viu se levantar, sorrindo, o sorriso em sua mente era lívido e bondoso; que guardava nele suas reais intenções. Caminhou em passos mansos em direção à cozinha, sua mãe estava pegando uma nova tigela, essa com a sopa que Nan Ne mais gostava, ela deixou sua mãe sair e continuou a seguir pela cozinha, tinha em mente o lugar que queria chegar... O sorriso ainda brincava em seus lábios, curvando-se aos poucos em algo mais perverso, mais real.

Ela abriu a primeira gaveta do armário esquerdo, a luz que banhou o lugar reluziu na lâmina afiada do objeto que buscava. Corajosa ela a pegou e virou-se. Sua mãe voltava para cozinha. Quatro exatos passos separavam as duas, quem dariam eles?

Nan Ne levantou a faca, devagar. Sua mãe deu dois passos e parou, espantada.

-Nan... – a voz autoritária da mulher pronunciou com falha.

-Sim. – Nan Ne deu mais um passo.

-O que você irá...

Um grito engasgou-se em sua garganta devido a surpresa, o olhar frio mirava-lhe com certa satisfação, a lâmina continuava a adentrar na pele, rasgando-a junto com o tecido claro do vestido que usava. O sangue esvaia sem cerimônias manchando por onde passava, a mão de Nan Ne, a roupa de sua mãe... A lâmina da faca.

-Porque? – as palavras saíram num fio de voz, junto com sangue que agora saia da boca daquela mulher que sempre se mostrou superior.

-Por que eu estava cansada. – as palavras foram pronunciadas com ardor. – Omma.

O baque do corpo de sua mãe caindo sobre o chão da cozinha foi alto a surpreendendo. Isso a fez despertar-se, seu olhar fitou a mesa de centro, o livro que outrora segurava estava caído sobre a mesa, fechado. Sua mente havia lhe pregado uma peça, novamente tudo não passava de sua imaginação, o que a deixou aliviada.

-Já terminou de estudar?

-Sim.

Assim que respondeu a mãe ela se levantou, estava feliz, no fim das contas, em vê-la ali e melhor, por saber que ela não tinha idéia de seus pensamentos, o que a deixava ainda mais tranqüila... Contudo, ainda sim, era inquietante tudo aquilo, ter se deixado levar por aqueles pensamentos... E caso aquilo não tivesse sido sua imaginação, como ela seguiria sua vida? Como poderia ser feliz e em paz depois de fazer algo assim?

Ela afastou esses pensamentos e se sentou à mesa, como sua mãe pedira. Antes de começar a comer sorriu para mãe, imaginando que precisaria de outra tática para conseguir o que queria... Ser uma verdadeira fã. Uma sasaeng.