[Prólogo]

Sou o dono de um coração partido e um sorriso estilhaçado. Fui feito para cair e me levantar uma vez após a outra. Para disseminar o que possuo, é pra isso que eu existo. Busco abrigo no fantasma de tudo isso.

Posso ser o errado, mas não tomo partido. Às vezes até mesmo eu me assusto com tudo isso. Mas aquilo que mais me apavora é não conseguir verter lágrimas.

Enquanto estiver vivo... Nunca estarei livre.

–Só queria saber do que tenho tanto medo...

–Não posso te ajudar.

–Por quê?

–Você é meu maior medo.

–Você me odeia?

–E também te amo.

–O–

Nunca o escolhera, não fizera lista de predileções. Não era preciso, totalmente desnecessário. Todo coração tem exatamente o mesmo peso. Alguns são mais fáceis de se partir, só isso. Mas um coração ainda é um coração, as pessoas é que parecem se esquecer disso.

Pode-se dizer então que ele é uma pessoa justa. Não escolhe pela cor, pelo credo, virtudes ou defeitos. Ele apenas escolhe.

Dessa vez, entretanto, algo foi diferente. Algo que, nem mesmo toda insensibilidade do mundo deixaria passar. A visão de um ser tão belo afetou até mesmo o senhor de tanta imparcialidade. Desviando-se de seu caminho, ele o escolheu. Bastou um olhar, um olhar decidido e quase predatório. Não era necessário nada além disso.

E logo... Passou.

E seus passos tão humanos ecoaram pela rua, fazendo com que a água das poças molhasse levemente a barra da calça de corte italiano. A água da chuva da noite passada escoria com as gotas de orvalho, refletindo levemente a luz dos primeiros raios de sol.

Talvez, só talvez, todo o resto tenha sido selado nesse momento. No momento em que, desviando-se de seu caminho incerto, ele seguiu aqueles passos trôpegos, bêbados de sono e tremendo levemente no frio daquele final de inverno.

Se tivesse notado algo além da beleza absurda, veria a expressão sempre nula, mas que não escondia a falta de tato e o quanto o outro era sem jeito e quase sempre caía nos próprios pés. Talvez fosse mais por viver em um mundo próprio que por ser, de fato, descuidado.

Tudo isso fazia com que o loiro – sim, era loiro, e de mechas descoloridas batendo nos ombros – parecesse ainda mais charmoso: por não perceber que o era. E de fato por tanto ser, chamou mesmo a atenção naquele moreno de lábios fartos que há tanto tempo não se deixava abalar por nada.

O horizonte já se tornava violeta quando seu andar fez-se gêmeo ao do dono de seus olhares. Porque agora, seria dele. Como ele era seu. E assim seria até o final.

Talvez aquela fosse uma descrição cruel: lindo e condenado.

あなたを闇にも光にも目覚めさせる

Você pode acordar para luz ou para a escuridão.