Ressurreição escrita por Jaque de Marco


Capítulo 8
Capítulo 7 - Casarão




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Capítulo 7 - Casarão

 

Eu sentia como se estivesse no meio de um sonho. As imagens chegavam desfocadas, eu não conseguia visualizar os rostos das inúmeras pessoas presentes, as paredes ao meu redor passavam rapidamente por mim como se eu estivesse correndo ou sendo jogada com pressa... o pior é que apesar de parecer um sonho, eu tinha plena consciência de que não era.

A minha cabeça latejava como se a lateral do meu rosto palpitasse por conta própria. O cheiro de carniça entupia as minhas narinas e me dava náuseas. Eu queria abrir meus olhos e por diversas vezes eu tentei, mas as minhas pálpebras pesavam muito, como se eu estivesse tentando lutar contra um sono muito forte.

Os sons ao meu redor variavam desde grunidos, gritos, até algo que me parecia conversas em uma língua totalmente diferente de tudo que eu jamais ouvira. Em alguns momentos, eu captava algumas palavras, algumas pequenas frases que não faziam o menor sentido para mim.

Eu tinha consciência de que agora estava deitada em algo plano. Era como uma cama, mas sem a maceis do colchão. Tentei me mexer, virando um pouco meu corpo. Senti uma forte dor nas costas assim que me coloquei de lado. Minhas pálpebras não estavam mais pesadas e então, lentamente, eu pisquei.

Minha visão estava sem foco. Olhei para o teto, tentando buscar nitidez. Estava sob um forro de madeira antigo, quebrado em algumas partes, que formavam desenhos geométricos perfeitos com suas cores distintas. Conforme abaixei meus olhos, mesmo na penumbra, eu conseguia ver que estava em um quarto com poucos móveis. A minha esquerda, havia uma grande janela de madeira adornada no trinco sob uma cortina transparente que um dia deveria ter sido muito luxuosa, mas que hoje não passava de um trapo sujo e rasgado.

Eu me remexi um pouco e só então pude ver que estava deitada sobre os estrados de uma cama de casal. Mesmo sentindo dores nas costas, levantei meu pescoço numa tentativa frustrada de me erguer.

- Você não deveria se levantar.

Ouvi uma voz feminina com um forte sotaque latino me alertar. Parei na posição em que estava. Um medo irracional me tomou. As lembranças voltaram a minha mente tão rápido que novamente senti vontade de gritar. Estava sendo atacada por vampiros! Olhei para os lados rapidamente, mas não consegui enxergar muito além na penumbra. Então, apesar da dor que sentia por diversas partes do meu corpo, eu me levantei. Precisava sair dali de algum jeito.

Corri na direção de uma velha porta dupla em frente à cama. Mesmo sem conseguir ver, por algo que me pareceu menos de um segundo, senti a aproximação de alguém. E antes que pudesse alcançar a maçaneta, ela estava na minha frente.

Era uma das mulheres mais bonitas que já vira. Se antes, naquele ônibus de excursão, ela tinha uma beleza assustadoramente estonteante, agora, a centímetros do meu rosto, ela era perfeita... numa perfeição vampiresca.

- Por favor, não sangre. – ela falou antes de me empurrar com ambas as mãos.

Eu literalmente voei enquanto era lançada sobre a cama sem colchão. Senti o impacto nas minhas costas, a dor era imensa, e fechei os olhos. Assim que os abri novamente, lá estava ela em pé a minha frente.

- Eu falei que você não deveria levantar.

- Quem é você? – perguntei tentando não alterar o tom de voz.

Ela inclinou a cabeça e apertou os olhos. Era como se ela me avaliasse de alguma forma. A vampira abaixou-se lentamente, medindo com os olhos vermelhos cada movimento que eu fazia, e sentou-se na beira da cama. Inconscientemente eu dobrei as pernas, afastando-me o máximo possível dela.

- Você é diferente.

Achei irônica a frase, afinal, ela era uma vampira. Como poderia ser mais diferente do que isso? Ela ainda me encarava imóvel quando voltou a falar.

- Ontem, no ônibus, você não ficou atraída pelos meus encantos. Era como se você, não sei, já soubesse o que sou.

As imagens dos acontecimentos no ônibus voltaram a minha mente. Todos aqueles turistas sendo atacados. Tanto sangue.

- Você os matou. Você matou aquela mulher.

Com uma velocidade sobre-humana, a vampira correu para se sentar numa cadeira velha num dos cantos do quarto. Ela estava distante de mim e a escuridão quase tomava todo o local, mesmo assim eu vi algo novo em seu rosto. Arrependimento talvez.

- Não era minha intenção.

- Ah, sim, sua intenção era somente atraí-los para que seus amigos fizessem o serviço sujo.

Ela novamente me lançou um olhar arrependido e logo depois abaixou a cabeça. Cheguei a me perguntar se deveria falar algo, ou talvez correr em direção a porta novamente, mas então ela levantou a cabeça, e desta vez seu olhar era impassivo.

- Sou Carmem Viquez. – ela continuou a me encarar de longe enquanto eu analisava o que estava acontecendo – E você é...?

- Você costuma perguntar o nome da sua comida?

Sem intenção, eu falara mais grosseiramente do que pretendia.

- Isso não é o que eu desejei ser.

- O que eu estou fazendo aqui? – perguntei.

- Viquez te trouxe para cá. Acho que tem algo a ver com alguém que ele está de olho há uns dias.

As palavras dela não faziam o menor sentido para mim.

- Quem é Viquez?

- Conto o que quer saber, mas será que podemos começar novamente? – apesar dos olhos aterrorizantemente vermelhos, ela sorriu quase de um jeito carinhoso – Sou Carmem Viquez. E você é...?

- Bella.

Ela ficou alguns instantes em silencio, talvez esperando mais do que um apelido, antes de continuar.

- Certo, Bella. Viquez é o que podemos chamar de líder do nosso grupo.

- E por que ele não me matou?

- Há dois dias, um dos nossos, Huca, teve um encontro com dois forasteiros e nos trouxe alguns objetos pessoais deles. – ao perceber meu olhar confuso, ela continuou – Sabe o meu dom de sedução que você viu durante a excursão? Pois bem, Huca também tem, mas de uma maneira mais profunda. Ele consegue ver, sentir, toda emoção depositava em algum material que teve um mínimo de contato com alguém. Dentre os objetos trazidos, estava a sua foto.

Era Edward. Sim, agora tinha certeza. Edward era o forasteiro de quem Carmem estava falando.

- E onde ele está? O forasteiro, onde está?

- Eu não tenho certeza, mas acho que ele virá hoje a noite. Pelo menos foi o que ouvi Viquez dizer.

Eu estava completamente confusa. Não via motivos para um vampiro com hábitos alimentares extremamente selvagens manter uma humana viva. A vampira deve ter reparado na minha expressão, pois logo voltou a falar.

- Viquez me prometeu que você ficaria bem.

- E por que você se importaria?

Carmem se levantou da cadeira, mas não se aproximou, manteve-se a distancia, como se lutasse contra algo invisível. Eu sabia exatamente o efeito que o meu sangue fazia sobre os vampiros. Tinha consciência na enorme luta que ela estava vencendo.

- Acredite ou não você é a primeira pessoa em décadas com quem converso. Diga-me, por que você é imune aos meus poderes?

-Você está tentando usá-los agora? – me senti meio boba fazendo essa pergunta, mas era completamente estranho pensar que eu era alvo de algo que nem ao menos podia sentir.

- Na verdade nem que eu quisesse. Viquez consegue inibir qualquer poder que se manifeste perto dele. E ele nunca deixa o casarão.

Eu podia sentir a dormência das minhas pernas devido a minha posição. Estiquei meu corpo, ficando ligeiramente mais confortável, embora a dor muscular ainda continuasse.

- Desculpa estar fazendo você passar por tudo isso. Prometo que logo você vai embora...

- E você diz isso por que o seu líder te prometeu? Por que eu deveria acreditar em vampiros?

- Sobrevivemos de sangue, você nunca entenderia a necessidade disso. Mesmo assim, escolhemos nossas vítimas. Nunca faríamos mal a um nativo. Não precisa ter medo, você ficará bem. Viquez não quer matá-la. Posso me aproximar? – ela esperou alguns instantes por uma resposta que não veio. Ainda não tinha certeza se confiava na vampira que há algumas horas vira matar a guia turística de forma tão selvagem. Sem demonstrar ter muita certeza do que estava fazendo, Carmem deu dois passos a frente, ficando mais visível sob a penumbra – Seu cheiro é bom. Dói resistir a ele. Como seu namorado consegue?

- O que te faz pensar que ele é meu namorado? – perguntei sentindo um frio na barriga após ter Edward finalmente citado por ela.

- Huca me falou que sentiu uma ligação muito forte entre vocês, algo que ele disse só ter sentido uma vez. – ela abaixou ligeiramente o tom de voz ao terminar a frase. Imaginei se o casal que demonstrara tamanho sentimento tinha sido ela com Viquez, ou quem sabe com outra pessoa. Mas jamais perguntaria.

- Nos amamos, essa é a única resposta que posso te dar. Seria prefeito se me tornasse vampira ou ambos humanos.

- Eu garanto, se houvesse uma segunda chance para nós, jamais seriamos monstros para quem amamos. Ele deve pensar da mesma maneira.

Eu somente meneei minha cabeça. Sem intenção, senti certa frustração com a frase dela. Vampiros da região seriam, com certeza, a primeira fonte de informação para Edward em sua busca pela lenda de ressurreição. Se nem eles conheciam nada a respeito, quem mais ajudaria? Até o momento não tinha sequer noção da real importância que eu estava dando para aquela história. Nunca fora minha prioridade, ou se quer uma possibilidade, ter Edward humano ao meu lado. Mas se houvesse a chance, por que não tornar as coisas da maneira mais natural possível?

Ouvi um som estridente e ambas olhamos na direção da porta. As madeiras velhas que formavam a porta dupla eram presas por dobradiças enferrujadas que denunciariam com sons de gemido a entrada de qualquer pessoa. Desta vez, um homem jovem, com o mesmo tom oliva pálido de pele que Carmem, entrou no quarto. Ele lançou um olhar sedento em minha direção poucos segundos antes de cobrir as narinas com a palma da mão.

O vampiro voltou-se para a vampira a minha frente e conversou alguns minutos com ela numa língua que eu não conhecia. Ela mal o encarava, respondendo a poucas coisas que ele dizia. De repente ele voltou-se novamente para mim e saiu tão rápido quanto entrou no quarto.

- Preciso resolver algumas coisas agora, Bella. – ela disse se encaminhando para a porta – Você logo deve estar com seu namorado. Aproveite agora para descansar um pouco.

Pensei em como faria isso enquanto assistia ela sair. Primeiro, a cama não tinha colchão. Segundo, e totalmente relevante, eu tinha completa noção do perigo que estava correndo em estar num casarão repleto de vampiros. Ainda pior, Edward supostamente estava vindo para cá. Eu tinha certeza que se ele soubesse que eu estava aqui, ele faria de tudo para me resgatar... o que mais me preocupava no momento. Edward era um bom lutador, mas jamais venceria uma dezena de vampiros sanguinários. Não queria sequer pensar na possibilidade.

Precisava tentar sair daquele lugar. Eu tinha a sensação de que os outros vampiros não seriam tão amigáveis comigo como Carmem. E se eu saísse daquele lugar, talvez Edward jamais precisasse entrar ali e confrontá-los sozinho.

Eu me levantei com cuidado da cama e caminhei devagar até a porta. Eu colei os ouvidos na madeira, mas não consegui ouvi nenhum som. Pensei em diversas maneiras para tentar abrir aquela porta enquanto forçava a maçaneta. Fiquei completamente surpresa ao perceber que apesar do peso da porta eu a abri facilmente, não estava tranca. O som das dobradiças enferrujadas fez meu coração parar por um segundo. Esperei para ver se alguém apareceria e me pegaria no início da minha fuga, mas nada aconteceu. Então encostei a porta novamente e segui por um corredor escuro.

Soube que estava no segundo andar quando alcancei uma larga escada que dava para uma entrada grande e adornada. Tudo tinha um estilo colonial, mas velho e sujo. A luz do dia e com uma boa reforma aquele lugar deveria ficar muito bonito, mas naquele momento, era um dos lugares mais assustadores que jamais vira.

Desci devagar as escadas, torcendo a cada degrau que alcançava que não tropeçasse e caísse. Ao fundo eu conseguia ouvir conversas exaltadas na mesma língua que ouvira há pouco Carmem usar com o outro vampiro. Assim que terminei de descer, ouvi passos muito baixos vindo ao meu encontro. Corri em direção a grande porta principal, mas, ao mexer na maçaneta, vi que estava trancada.

Tropecei, apoiando-me no corrimão, e segui contornando as escadas. Havia um vão embaixo dela e foi lá que me abaixei, torcendo para que a escuridão fosse o suficiente para me esconder. Alguns segundos depois, os passos que ouvira se aproximaram ainda mais até que vi dois vampiros passarem na minha frente. Um deles desacelerou um pouco assim que se colocou a um passo de mim, o que me fez prender a respiração por um momento, mas logo seguiu seu caminho. Ainda esperei alguns segundos até que pudesse respirar normalmente.

Senti nas minhas costas algo frio e quando me virei para olhar, percebi que estava agachada em frente a uma porta. Desta vez constatei que não estava trancada. Desci para o que parecia ser um porão. Provavelmente, esse porão devia ter alguma janela ou portinhola que serviria de saída para a minha fuga. Eu passava minhas mãos pela parede de pedra, tentando localizar meu caminho.

Eu notei que a umidade do ar era maior no porão e sentia as gotas que corriam pelo teto, também de pedra, e pingavam em mim. Segui por mais algum tempo, sem encontrar nenhuma janela... sem encontrar nada além de mais paredes e mais caminho a seguir. Voltei-me em direção ao início do meu caminho, mas na escuridão estava completamente perdida. Senti o desespero começar a tomar meu corpo, pouco antes de notar uma leve claridade vinda a distância. Havia uma janela em algum canto daquele lugar.

Caminhei quase me escorando nas paredes frias, seguindo aquela fresta de luz como se dependesse daquilo para viver. Cheguei num ponto mais claro, iluminado pela luz de uma gigantesca lua branca. Senti uma leve onda de alívio assim que vi que a pequena janela de vidro não parecia estar trancada. Eu só precisava achar naquele lugar algo em que pudesse subir para que pudesse alcançá-la.

Ainda encarando a janela, eu ouvi o som de uma respiração forte às minhas costas. Por um segundo, eu simplesmente gelei. Não consegui sequer soltar o ar que prendia em meus pulmões. Todo o meu sangue circulou pelo meu corpo antes que eu voltasse a me mover. Eu me virei e vi em meio a penumbra algo que de início achei ser um grande bicho com olhos brilhantes. Ele olhava para mim sem sequer piscar.

Sem mover qualquer outra parte do meu corpo, eu dei um passo para trás. O que antes achei ser um bicho, se ergueu, ficando poucos centímetros mais alto que eu. Seu rosto era coberto de pêlos claros sujos de terra e algo pegajoso, que se misturavam com fios que saiam do topo de sua cabeça. Sem que eu esperasse, ele gruniu um som que me fez lembrar de um felino prestes a atacar sua presa. Foi nesse momento que eu vi que seus dentes fortes eram sua arma. Eu dei mais um passo discreto para trás, mas ele avançou para cima de mim.

_________

 

O vento batia forte no meu rosto. Estava correndo. A essa velocidade, não demoraria muito para chegar ao meu destino, mas sem perceber aproveitei este momento para pensar em tudo o que estava acontecendo. Era a primeira vez que estava completamente sozinho. Garrett ficara no hotel, como eu pedira. Eu precisava conversar com Viquez a sós, ouvir seus pensamentos. De uma coisa eu tinha certeza, ele não mandara um dos seus pegar meus objetos pessoais à toa. Ele já me esperava... e eu tinha que saber o que faria.

Eu não saberia mensurar a saudade que sentia de Bella. Era algo quase físico. Sempre ouvi falar sobre cara metades e hoje, tendo Bella na minha vida, eu sabia que isso existia. Ela era a minha metade que ficara longe de mim e sem essa metade eu estava fraco, às vezes quase sem forças para continuar. Não saberia dizer quantas vezes nestes dias eu pensara em desistir, em abandonar essa idéia ridícula e voltar para casa. Mas, tantas outras vezes, o meu desejo de saber a verdade era mais forte.

Eu precisava provar para mim mesmo que eu tentara todas as maneiras antes de recorrer a mais cruel: transformar Bella em vampira. Ela não merecia. Era quase profano pensar que eu estaria condenando um anjo, que nasceu somente para me salvar, ao inferno. Mas sabia que eu não era bom, sou egoísta. Não consigo existir sem ela.

Cheguei a uma área plana, após um bom tempo de corrida morro acima. Ainda estava em meio às árvores e vegetação que ladeavam a estrada principal quando diminui meus passos caminhando a velocidade humana. Segui até a estrada e mesmo há muitos metros enxerguei o casarão velho, exatamente como Armando Velásquez disse que estaria.

Eu devia estar há uns dez metros de distância de onde o bando de Viquez morava. Eu podia começar a ouvir seus pensamentos, sussurros baixos, que no geral aumentavam para claras conversas conforme eu me aproximava. Pelos sons, os dez vampiros deviam estar em casa. Alguns no andar de cima, mas a maioria no primeiro andar.

De repente, eu dei mais um passo e o som parou. As vozes e conversas que eu ouvia nos pensamentos dos vampiros se cessaram bruscamente. Esta era a primeira vez em toda a minha existência que eu simplesmente deixava de ouvir pensamentos. Diferentemente do que aconteceu comigo quando conheci Bella, desta vez eu sabia que conseguia ouvi-los, pois há segundos o tinha feito, mas por alguma razão não podia mais fazer isso.

Caminhei mais alguns passos e constatei que os únicos sons que ouvia eram os realmente emitidos, como conversas e risadas. Algo ou alguém estava bloqueando o meu poder.

Senti uma dor aguda na garganta quando cheguei ao casarão. A vegetação rasteira que rodeava o lugar tinha um cheiro forte de sangue. Há poucas horas tivera um massacre naquele local. A simples imagem daquela idéia foi o suficiente para sentir desgosto da minha raça.

- Você deve ser Edward Cullen.

Rápido como somente vampiros podem ser, sete vampiros estavam na varanda da casa, inclusive o vampiro que há uns dias havia roubado minha bagagem.

- E você deve ser o famoso Javier Viquez. – falei cordialmente.

- Famoso? Com quem andou conversando? - ele deu um leve sorriso antes de voltar a falar – Não se engane pelo o que falam por aí. Eu só tento manter o equilíbrio das coisas por aqui. Mas venha, entre. Eu já imaginava que viria.

Caminhei com firmeza pelos poucos degraus que levavam até a entrada da casa. Ao contrário de Viquez, os outros de seu bando me encaravam de maneira hostil, como se esperassem qualquer movimento agressivo de minha parte.

Segui Viquez, passando pela grande porta principal até chegarmos numa sala de estar empoeirada. O vampiro indicou um sofá rasgado e, mesmo não sentindo necessidade de descansar, sentei ficando de frente para Viquez. Ele era pouco mais alto que eu e mais forte. Ele se vestia como um típico peruano com as roupas pesadas e levemente coloridas. Se não fosse pelo tom pálido de sua pele marrom oliva e seus olhos intensamente vermelhos, ele até poderia se passar por um humano qualquer.

Ele fez um gesto com as mãos e os demais saíram da sala, deixando-nos a sós.

- Peço desculpas pelos acontecimentos recentes. Huca tem uma maneira, digamos, diferente de conhecer as pessoas. Longe de mim, é tentador demais usar algum poder.

- Você bloqueia poderes? – perguntei entendendo o motivo de não estar ouvindo pensamentos na casa.

- Desculpa, é incontrolável. Garanto que qualquer poder que tenha, voltará a funcionar há dez metros de distância de mim. – ele continuava a falar amigavelmente. Não parecia o vampiro perigoso que tanto ouvira falar – Sinto informar que sei mais de você do que imagina.

- Então deve saber por que estou aqui.

- Receio que sim. Você acredita na lenda de Atahualpa. – ele mudou o tom de voz, ficando mais sério, mas ainda amigável – Achei que os poucos vampiros de fora do Peru que conheciam a lenda a tinham esquecido, mas vejo que não.

- O que você sabe sobre o assunto?

- O que sei é que já vi muitos vampiros enlouquecerem por ela. Muitos chegaram aqui, assim como você, cheios de esperanças de que houvesse uma segunda chance para a nossa raça. Como se o que tivéssemos fosse uma doença e essa lenda a cura. Mas lhe garanto, Cullen, nos meus quase quinhentos anos eu nunca vi ninguém voltando a forma humana.

- Você foi um Inca.

Viquez riu com a minha afirmação.

- Vejo que é um bom observador. Presumiu pela minha idade?

- Isso e alguns outros detalhes.

- Receio não atender as suas expectativas. Nasci depois da chegada dos Espanhóis. Todos aqui temos descendência Inca, mas não chegamos a conhecer quase nada da civilização.

- Você conheceu o padre Vicente de Valverde?

Ao ouvir a minha pergunta, ele se remexeu por um segundo, nada que olhos humanos notariam.

- Que batizou Atahualpa um dia antes dele morrer? O vi poucas vezes quando menino, mas não tenho a imagem dele muito fixa em minha mente. Soube que voltou para a Espanha pouco antes de morrer. Nunca me preocupei muito com ele, sinto muito.

- Entendo. – disse me levantando do sofá – Agradeceria se não houvesse problemas de eu continuar pela região mais alguns dias antes de voltar para casa.

- Claro, sem problemas. – ele voltou a sorrir – Imagino que deva ter ouvido coisas horríveis sobre mim, mas lhe garanto que não sou tudo isso que dizem. Somos vampiros, claro, mas não quer dizer que não sejamos seletivos ou receptivos com as visitas.

Ele, que também já estava de pé a minha frente, falou algo na língua quíchua pouco antes de um vampiro aparecer na sala. Viquez, ainda em quíchua, ordenou algo e o vampiro ao ouvir saiu da sala novamente.

- Para provar que sou confiável, pedi para trouxessem algo que acredito que te pertença.

Até o momento havia esquecido a minha mala que havia sido roubada. Prometera a Garrett que levaria a dele também. Estava completamente certo de Viquez se referia a minha bagagem até que comecei a ouvir um som diferente de todos os outros daquele casarão. Era um som compassado de um coração humano. Pedi aos céus que aquela pessoa não fosse quem eu mais queria que fosse.

- Edward! – Bella disse pouco antes de correr aos meus braços.

Eu abracei tão fortemente que por um instante esqueci que poderia esmagá-la com qualquer deslize. O cheiro dela, o ardor que sentia por resistir ao seu sangue, o seu cabelo emaranhado na nuca, sua pele macia... tudo o que jamais, nem por um instante, esquecera estava ali novamente nos meus braços. Eu me separei do abraço e ergui o seu rosto com minhas mãos. Ela não parecia machucada, somente suja e assustada. Eu a beijei de leve e, inconscientemente, me pus a sua frente, em posição de defesa.

- O que ela faz aqui, Viquez? – perguntei com mais hostilidade do que pretendia.

- A encontramos num ônibus turístico que interceptamos ontem. Huca já havia visto a humana nos seus pertences e a relação que vocês tinham. Não permiti que fizessem nada a ela. Não machucamos amigos... nem namorada de amigos, se assim podemos dizer.

Eu tinha consciência do quanto deveria ter sido difícil para todos aqueles vampiros terem resistido a tentação do sangue de Bella. Mesmo vampiros com hábitos alimentares não tradicionais como o de minha família já sofriam para agüentar a tentação, o que diria vampiros sanguinários como Viquez e seu bando.

- Obrigado.

- Não tem pelo que agradecer. Agora podem ir. Espero que voltem em paz para seu país.

Eu o cumprimentei novamente com um aceno de cabeça antes de sair do casarão segurando fortemente a mão de Bella. Assim que botamos os pés para fora daquele lugar, eu a segurei nos meus braços e corri. Eu não queria usar a velocidade tradicional, eu precisava deixar Bella o mais longe possível de tudo isso. Por alguns instantes eu criei diversas imagens aterrorizantes em minha mente onde Bella não tinha a sorte que teve. Senti um aperto onde deveria estar funcionando meu estomago só de pensar que por minha culpa, Bella poderia estar morta agora.

Em alguns minutos, estávamos em Pisac novamente, há poucos metros do chalé onde estava hospedado com Garrett. Eu diminui os passos até parar completamente. Sem conseguir mais controlar meu desespero, coloquei Bella no chão e voltei a procurar por qualquer coisa que indicasse que ela havia sido machucada.

- Bella, você está bem?

- Estou, estou bem. – ela passou os braços ao redor do meu pescoço e me beijou novamente – E você? Você está bem?

- Não seja absurda. Você que estava em poder de diversos vampiros sanguinários.

Ela ainda me abraçava forte. Eu ouvia nitidamente os batimentos rápidos do coração dela. Eu sentia uma mescla de culpa e alívio.

- O que você veio fazer no Peru?

- Eu vim atrás de você. Carlisle me contou sobre a lenda.

Eu senti uma onda de arrependimento me invadir. Eu devia ter imaginado que ela acabaria descobrindo a verdade, que ela convenceria Carlisle a mandá-la para o Peru, que ela atrairia perigos para si. Eu devia ter imaginado.

- Por minha culpa você quase morreu – eu beijava o topo da sua cabeça, enquanto a apertava mais fortemente em meus braços – Acabou. Isso tudo acabou. Vamos para casa, vamos esquecer tudo isso. Prometo nunca mais te fazer correr esse risco novamente. Nunca!

Nesse instante ela se soltou do abraço bruscamente. Eu me mantive na mesma posição, encarando-a.

- Vamos embora?

- Sim, Bella, vamos embora. Isso tudo não passava de uma bobagem, uma lenda estúpida. Ninguém sabe se Atahualpa era um vampiro e Viquez não sabe sequer o paradeiro do padre que o batizou. Acabou!

- Viquez disse que não sabe de nada? – ela falava lentamente.

- O que você está querendo dizer, Bella?

- Edward, eu vi o padre Valverde pessoalmente. Não sei o Viquez te disse exatamente, mas ele está mentindo.

___________

 

N.A.: E aí, o que acharam??? Peço mil desculpas novamente pelo atraso do capítulo, mas estou numa correria só.

 

Mariom – Obrigada pelo comentário, amore! ;) Espero que também tenha gostado desse capítulo!

 

 

Quero aproveitar para fazer uma propagandazinha básica da minha nova fanfic. Ela se chama A Vida É Uma Rede. É uma comédia sobre fatos do cotidiano da família Cullen, pós Breaking Dawn. Quem quiser ler, por favor, dá uma olhadinha no meu perfil.

 

 

Bom, é isso. Não vou prometer não demorar com o próximo capítulo, mas prometo tentar ser rápida. ;)

Fiquem com Deus!!! E deixem reviews!!!

 

Até o próximo capítulo.

Jaqueline de Marco


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