Emily Sanders

Minha cabeça estava latejando, o desanimo corria por minhas veias e eu perdi a conta das vezes que pensei em desmarcar o maldito encontro. Já tinha cinco chamadas perdidas de Julia quando bati na porta da casa dela e ela abriu me fuzilando com o olhar. A morena, apesar de estar descalça e sem maquiagem, já estava com seu vestido preto de renda.

– Eles vão estar aqui em poucos minutos e você ainda está assim. – Ela me puxou e fechou a porta.

– Eu não tenho culpa, estou passando mal – Reclamei. – Tem certeza que não dá para desmarcar? – Ela olhou para mim incrédula. A minha cara devia estar péssima porque sua expressão se alterou para preocupada.

– Eu vou te deixar para trás se eles chegarem. – Ela resmungou subindo as escadas.

– Eu quero água – Gritei – Volta aqui e vai pegar água para mim.

– Pega você, sua vaca! – Ela gritou de volta e eu ri. Quanto amor.

Ouvi Julia comentar alguma coisa com Ricardo lá em cima e assim que eu percebi que ele ia descer me enfiei na cozinha. Eles desceram as escadas juntos.

– Você tem noção do quanto essa ideia de encontro a quatro é ridícula, certo? – Ele implicou com ela que o mandou calar a boca. O moreno desceu as escadas e olhou ligeiramente para mim antes de ir para a sala. Eu não tive muito tempo para observa-lo, mas o cretino estava sem camisa.

– Julia, será que você pode me explicar como vai subir naquela moto com esse vestido sem mostrar sua roupa interior para toda a cidade?

– Droga! – A morena xingou ruborizando levemente, provavelmente estava pensando o mesmo que eu: Como ela conseguiu não lembrar desse detalhe tão importante?

Ela virou para subir as escadas novamente, mas parou antes de colocar o pé no primeiro degrau e olhou para mim com uma cara assustadora. Eu estava encostada na bancada da cozinha bebendo um mililitro de água a cada cinco segundos. – O que você esta fazendo parada aí? – Ela gritou.

– Bebendo água? – Perguntei com um sorriso cínico e a cara dela ficou bem mais ameaçadora – Relaxa, eu já mandei uma mensagem ao Jason dizendo que vou me atrasar alguns minutos. Ele disse que não tinha problema porque também teve um imprevisto e vai chegar mais tarde.

– E só agora que você resolve falar isso? – Ela quase rosnou.

– Oh não, é só o Jason, Felipe já deve estar aí fora – Ela arregalou os olhos e subiu as escadas correndo.

– Ei, espera! Você acha que faz mal se eu tomar outro remédio para dor de cabeça? Está demorando muito para fazer efeito. – Eu reclamei apertando a testa com o dedo indicador num ponto latejante.

– Lógico que faz mal, você vai ter uma overdose se enfiar mais um comprimido na boca hoje. – Eu ia comentar o exagero, mas entretanto a campainha tocou e Julia tropeçou no degrau onde estava. – Atente e diz que eu já estou descendo. – Ela continuou subindo enquanto eu ria da quase queda dela.

Por alguns segundos a imaginei rolando escada abaixo e tendo que explicar a Felipe que caiu tentando não se atrasar quando eu abrisse a porta para ele já chorando de tanto rir. Eu sou uma péssima amiga. A campainha tocou novamente e eu fui abrir com um sorriso no rosto que emurcheceu assim que concretizei a ação.

– Quem é você? – A garota do lado de fora perguntou, me analisando de cima a baixo.

– É, – Levantei as sobrancelhas ligeiramente – essa é a pergunta que eu deveria te fazer, já que é você quem está batendo na porta.

– Sara... – Ricardo proferiu atrás de mim e eu virei o corpo ligeiramente na direção dele.

– Você disse que estava sozinho – Ela cuspiu as palavras enquanto variava o olhar entre mim e o moreno. Acho que ele errou o horário, ainda faltavam cinco minutos para o que combinamos com os garotos. Eu tentei ignorar a pontada no meu estomago causada pela presença daquela garota, não é muito difícil de prever o que eles pretendiam fazer na nossa ausência. O rosto bonito e muito maquiado e o decote tão grande, que até eu estava com dificuldades para fingir que não chamava atenção, estavam me dando ainda mais náuseas do que as que eu já tinha.

– Não, ela não é… – Ele deixou a frase suspensa e só então eu entendi que ela estava falando de outro tipo de sozinho. Eu olhei para Ricardo novamente, ele ainda estava sem camisa e com os cabelos úmidos e bagunçados, como quem tinha acabado de sair do banho. Ele ficava extremamente sexy assim, mas sexy do que meu corpo era capaz de suportar para se manter indiferente. Era fácil para a garota do lado de fora confundir as coisas considerando que fui eu quem abriu a porta da casa dele e o estado em que ele está. Estranhamente eu estava feliz com toda a confusão, sem contar que já está na hora de voltar a perturbar o moreno, a nostalgia pós-beijo-roubado já tinha ido embora.

– Eu não sou o que querido? – Olhei para ele com uma falsa incredulidade. Ele arqueou as sobrancelhas como se perguntasse o que eu estava fazendo. Eu juro que no final pretendia dizer que era só uma amiga da irmã dele, mas quando me virei a garota já estava passando pelo portão com passos firmes. Eu não consegui segurar o riso. – Ah, nem deu para atuar direito. – Reclamei divertida.

– Obrigada – Ricardo disse irônico antes de voltar para a sala e se jogar no sofá pela segunda vez. O moreno não parecia nem um pouco decepcionado com aquilo, o que me deu uma sensação estranha de alivio. – Agora vou passar o resto da noite sem fazer nada graças a você.

– Não é ele Julia! Não precisa correr. – Eu gritei para que minha amiga me ouvisse lá de cima.

– Me avisa se você notar o carro estacionando. – Ela gritou de volta e eu me virei para Ricardo.

– A culpa não é minha se ela entendeu tudo errado. – Ergui os ombros em sinal de indiferença. – Compra sorvete e vê um filme enquanto come e engorda, é o que pessoas fracassadas na vida sentimental costumam fazer. – Eu zombei.

– É o que você costuma fazer. – Ele devolveu com um de seus sorrisos de canto.

– Eu não sei se você reparou, mas eu estou esperando alguém. – Eu disse orgulhosa e ele começou a rir, a gargalhar na verdade, o que me deixou muito irritada.

– Não é minha intenção ofender, mas ou você é mesmo burra ou só está se fazendo de sonsa. Jason é um dos garotos mais sem graça daquela faculdade, ele mal sabe manter uma conversa.

– Como se você soubesse manter uma conversa. – Eu disse impaciente. – Você só sabe irritar as pessoas, é tão idiota quanto ele.

– Então por que você está saindo com ele e não comigo? – Ele disse sem desviar os olhos da televisão. O que? Aquilo nem sequer fazia sentido.

– Por – Porque... ele me convidou – Eu gaguejei.

– Então se eu tivesse te convidado você teria saído comigo? – Ele se virou para mim com um olhar que eu não sabia exatamente como descrever, mas rondava o deboche com um resquício de provocação.

– Lógico que não – Eu bufei e dei as costas para subir as escadas.
– É só porque isso soa como alguém desesperada para não parecer uma fracassada na vida sentimental. – Ele disse em tom de troça fazendo uma espécie de aspas com os dedos nas ultimas quatro palavras.

– Essa conclusão vem do fato de ter aceitado sair com alguém que não tenho certeza se consegue ser legal e ter uma boa conversa? – Eu parei antes do primeiro degrau e me virei para ele – É esse o motivo pelo qual saímos com as pessoas, para conhecer e saber se gostamos ou não de estar com elas. Além disso, aquela garota não parecia grande coisa e você estava bem empolgado em se divertir com ela. – Minha voz soou ríspida – Sua critica é ridícula. – Ele riu.

– Pode ter certeza que ela me manteria bem ocupado. – Ele fez questão de olhar para mim quando frisou o “bem”, se deliciando com a minha expressão de nojo.

– E depois você ainda pergunta porque eu estou saindo com o Jason ao invés de você. – Ele estreitou os olhos de maneira desgostosa, mas ignorei e subi as escadas.