Atroz escrita por Mellark


Capítulo 1
Capítulo 1




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Os olhos esmeralda da garota de cabelos negros pairavam sobre Cato, um robusto e notável garoto de seu distrito cuja habilidade com espadas lhe soava fatal o bastante para liquidar qualquer um. Sempre sentira o impulso de chamá-lo, mas, entre todos, ele jamais a notaria – exceto se, de alguma forma, ela o impressionasse e mostrasse o quanto merecia a sua atenção.

Passando os dedos urgentemente pela lâmina da faca, Clove resolveu arremessá-la na parede que o rodeava. A princípio, viu Cato desviar do golpe. Depois, notou o quão perturbado ele havia ficado. Seu rosto estava um tanto alvo, e as bochechas lutavam para retomar a antiga cor. Ele retirou a faca da parede amadeirada sem grande esforço, olhando por cima do ombro direito para verificar quem o atacara.

Passou os dedos nos diminutos desenhos no cabo da faca – pássaros, árvores e flores espinhosas. Na ponta, leu a representação da inicial do nome a quem a arma pertencia, dando um leve e indecifrável sorriso. Ele a conhecia, afinal. Jamais havia trocado uma palavra sequer, porém sabia o quanto ela se destacava entre os Carreiristas. Tinha aptidão com instrumentos de porte pequeno, e quase sempre acertava os alvos que lhe eram dados. Sem contar a peculiar beleza e personalidade – cabelos escuros, pele clara, olhos verdes. Explosiva, sagaz e completamente ácida.

— Se queria minha atenção, poderia ter começado com uma simples saudação — murmurou ele, aproximando-se.

— E o que te faz pensar que esse era o meu objetivo? — indagou Clove, enquanto estendia a mão para receber sua faca. — Você foi só um alvo.

Cato sorriu outra vez, fazendo com que ela se perguntasse até que ponto seu sorriso precedia um bom sinal. Recolheu a faca no bolso espesso da calça, voltando os olhos para observá-lo. Seus cabelos louros estavam úmidos, sinal de que ele estava a muito mais tempo no campo de treinamento do que ela imaginava.

— Fui? Engraçado... — disse, mantendo o mesmo sorriso estampado no rosto. — Você ainda está tremendo. Provavelmente continuo sendo só um alvo, certo?

As palavras desencadearam uma gargalhada antes presa à garganta de Clove. Seus lábios tornaram-se ainda mais vermelhos, já que seus dentes se prendiam ali com toda a força na falha tentativa de cessar o riso. Suas mãos pairavam no ar, como se uma força invisível as segurasse. Cato resolveu tomá-las, imobilizando Clove.

— O que está fazendo, estúpido? — ela perguntou, ao passo que tentava se livrar daqueles enormes braços.

— Treinando.

A respiração da garota falhou, fazendo-a arfar na procura de ar. Seu braço ficava dormente aos poucos, e suas pernas lutavam bravamente para fazer com que Cato se desequilibrasse. Sentiu a cabeça girar, como se a falta de oxigenação no cérebro estivesse prestes a nocauteá-la.

— Pare! — gritou uma mulher ao fundo, separando os braços de Cato do corpo de Clove. — Não é justo que um rapaz como você procure render alguém como ela. — comentou, menosprezando a capacidade da garota. Esnobaria era responsável por recrutar novos tributos e futuros Pacificadores, ficando com a tarefa de treiná-los e incutir em suas cabeças o quanto deviam à Capital.

— Eu posso competir com ele! — esbravejou Clove, espumando de raiva como um bestante. — Tire por você mesma, Esnobaria. Quantos tributos tiveram suas gargantas dilaceradas por você? E não me diga que eram menores que Cato!

Lampejos de lembrança invadiram a mente de Esnobaria. Quantos tributos tiveram suas gargantas dilaceradas por você? A frase persistia em ecoar em sua cabeça. O sangue que brotava da carne, o gosto indesejado em sua boca. Pigarreou, cuspindo no chão ao seu lado.

— Está dispensada, Clove.

A garota limpou os lábios com o dorso da mão, deixando o campo de treinamento para trás. Ao alcançar o pequeno comércio do vilarejo em que vivia, sentiu as mãos serem atadas outra vez. Virou-se instintivamente e soltou uma delas, que rapidamente alcançou a faca no bolso da calça. Cerrou um dos punhos enquanto atacava aquele que lhe segurava, cortando o tecido de sua camisa na altura do antebraço. Seu corpo todo inibiu a continuidade da ação assim que ela realizou quem a prendia: Cato. Descansou a arma no ar, soltando um longo suspiro.

 — O que foi agora? Veio acabar comigo? — bradou sarcasticamente, sentindo a pressão diminuir em seus punhos.

— Vim perguntar o seu nome — respondeu, alisando o estrago feito na camisa. — Você deveria tomar mais cuidado com isso. — apontou com a cabeça para o instrumento, esperando que ela contestasse suas palavras.

 — Está machucado? — o tom preocupado lhe soou incomum, mas também sincero. Suas mãos nem mesmo hesitaram, tocando o braço de Cato na altura do tecido cortado. Não havia nenhum rastro de sangue, nem mesmo de rupturas. Distanciou-se ao notar que os olhos dele observavam-na. — A propósito, meu nome é Clove.

— Clove — Cato repetiu, armazenando cada letra em seu subconsciente. Um belo nome, ele diria, se não estivesse impressionado demais para elogiá-la. Ela era incrível. Bela e fatal.

— Eu preciso ir — anunciou ela, agarrando os dedos a ponta do casaco. Cumprimentou-o com a cabeça, pronta para caminhar na direção contrária. Seu estômago doía de aflição ou de fome. Não sabia. E nem mesmo procurou saber, já que estava certa de que se o fizesse, certamente olharia por cima dos ombros e deixaria um grande suspiro ausentar a boca.


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Notas finais do capítulo

Espero de coração que gostem, e por favor, comentem aqui ou mandem me mandem uma ask: http://me-lla-rk.tumblr.com/