É Segredo escrita por Phallas


Capítulo 19
Capítulo 19 - Experiências




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"As três coisas mais difíceis do mundo são: guardar um segredo, perdoar uma ofensa e aproveitar o tempo."

                                Benjamin Franklin

- Boa tarde. - Ele diz, em um tom formal.

As meninas respondem, embora não consigam conter a ansiedade. Griffin ostenta o mesmo saco de bolas que Peter estava carregando quando se machucou, assim como o apito que nosso treinador sempre usa. Parece meio desconfortável com aquilo.

O time já está de pé se alongado, animado. Os treinos de vôlei estão sempre cheios, mas, dessa vez, reparo que algumas reservas que não apareciam há algum tempo estão aqui.

- O que estão fazendo? - Griffin pergunta.

- Alongando. - Helaina responde.

Ele nos olha de um jeito estranho. Em seguida, balança a cabeça de um lado para o outro, em sinal negativo.

- Tudo errado. - Fala, para si mesmo.

Me irrito com a atitude dele, embora fique evidente que as outras não compartilhem meu sentimento quando ele manda que todas nós demos as mãos, porque seguem as instruções com rapidez e curiosidade.

Estamos fazendo uma espécie de rodinha. Agora ele está nos mandando pular. E agora andar, ainda de mãos dadas em forma de círculo.

- Isso, agora cantem. - Ele ordena.

Ele está nos mandando cantar. Cantar.

Alguém puxa uma música pop conhecida e todas vão atrás. Isso está ridículo. Quando o "alongamento" acaba, ele nos divide em duplas, sem nos deixar escolher e nos manda fazer uns excercícios bobos. As outras fazem o que ele manda, mas não sigo as orientações com muita animação.

No final da aula, Griffin prepara o coletivo, misturando no mesmo time titulares, reservas e novatas. Peter teria um ataque cardíaco se soubesse disso.

Meu pulso está bem por enquanto, e eu tento fazer o melhor que posso.

O jogo começa, sob o olhar atento de Griffin. Ele se encosta na trave da rede e percebo algumas meninas comentando a barriga dele.

O garoto finalmente se lembra do apito e o coloca nos lábios. O outro time espera e saca. O jogo acontece bem, mas, durante uma tentativa de ataque do outro time, subo para o bloqueio junto com a ponteira do outro time, que acaba tropeçando e caindo em cima do próprio braço.

Todas param e se juntam em volta da menina, que choraminga de dor. Griffin se ajoelha ao lado dela e a garota parece esquecer completamente o machucado quando ele a toca.

- Não foi nada demais. - Ele avalia. - Alguém leve-a para a enfermaria, mesmo assim.

Duas novatas cuidam da garota, mas agora o outro time tem uma a menos. Ao ver Helaina, Hannah, Trishia e as reservas o implorando para jogar, Griffin diz que entrará no lugar e tira a camisa.

Um segundo de silêncio se passa. Dois segundos. Ninguém consegue ver mais nada, nem mesmo eu, tenho que admitir.

- Meu Deus. - Alguém ofega lá atrás.

- Ele é tão...

- Concordo.

Os comentários se seguem baixos, e o jogo continua, parando às vezes quando Griffin vai buscar uma bola eventualmente isolada, porque podemos reparar as costas definidas dele.

Sou obrigada a confessar que nunca imaginei que ele jogaria tão bem. Com um minuto de jogo, já deu para perceber que Griffin e o vôlei se entendem.

Percebo que Griffin faz questão de jogar todas as bolas dele em mim, o que me irrita um pouco, mas é bom poder treinar com alguém que joga como ele. Cada passe, cada manchete, cada ataque, saque e defesa é feito com elegância e eficiência.

No final do jogo, o time dele ganha por apenas dois pontos de diferença, e o vejo lançar um sorrisinho para mim, como anda fazendo toda vez que me vê. Parece que ele está passando muito tempo com a Megan...

                              ○               ○               ○

- Ele é maravilhoso!

- Eu sei! Viu a barriga dele?

- Claro que sim! Essa foi a nossa melhor aula!

- Peter pode ficar fora quanto tempo quiser!

É esse tipo baixo de comentário que ando escutando desde o fim do treino de ontem. Parece que o estilo militar de treino de Peter perdeu a popularidade para o estilo (e a barriga) de Griffin Carmichael. "Estilo" é um elogio, porque aquele garoto nos deu o que poderia facilmente ser uma aula para crianças de quatro anos.

 - Você tem que admitir que ele é bom. - Tensy me repreende.

- Não tenho que admitir nada. Não vejo a hora de ver Peter de volta.

Tensy não diz mais nada, mas sei o que está pensando. Que eu sou burra por não querer me dar bem com ele. Falando em se dar bem com ele, me pergunto como vai aquela aposta que Helaina tinha comentado semanas atrás. Creio que ninguém tenha conseguido nada, embora não seja por falta de tentar - ele está sempre rodeado de meninas que mancham os tênis Nike dele quando não conseguem segurar a baba.

- Estou atrapalhando a conversa das duas mocinhas no fundo? - Sabrinna Fintter, a professora de filosofia, pergunta.

- N-não, professora. - Tensy responde, virando-se para frente.

Sabrinna tem uns vinte e cinco anos, é alta, magra, loira de olhos cor-de-mel destacados por trás dos óculos finos de armadura vermelha. Acho que já percebeu a quantidade de pescoços virados quando ela passa, mas nunca se interessou por ninguém. Até conhecer Peter. Dizem que ela corre atrás dele até no fim do mundo, e é por isso que está aqui hoje. A verdade é que ninguém leva filosofia muito a sério (é só sentar e pensar na vida, não é?), embora gostemos da professora. No entanto, ela deve ter perdido o respeito por essa turma quando descobriu que está aqui o agressor de seu amado. Parece que alguém contou a ela isso e Sabrinna fez questão de nos dar a detenção.

 - Fiquei realmente decepcionada quando soube o que vocês fizeram. - Ela diz. - Então quis vir hoje para ensinar a vocês um pouco mais sobre os valores de respeito e paciência pregados por Gandhi.

A turma a responde com suspiros desanimados. A professora percebe e muda de postura:

- Esqueçam isso. Todos de pé, porque vou distribuir a turma em duplas.

A classe obedece, e ela vai agarrando os alunos aleatoriamente pelo braço e os juntando a outros. Meu coração praticamente para quando ela me arrasta para o lado de Griffin.

- Façam dupla, vocês dois. Não quero que fique conversando muito com Tensy, Bellie. Você é uma boa aluna.

Reviro os olhos quando ela vai embora e encaro Griffin. Ele está sorrindo.

- O que foi? - Pergunto, irritada.

Ele mostra a palma das duas mãos, em uma demonstração de inocência:

- Nada. - Responde, embora continue sorrindo.

- Quero agora que uma pessoa da dupla se coloque na frente da outra.

Sem dizer nada, me coloco na frente de Griffin.

- Muito bom. Mais perto, Bellie. - A professora me corrige.

Contrariada, dou um passo para trás, torcendo para pisar no pé dele. Não piso.

- Agora se joguem para trás e seu companheiro irá pegá-los.

A turma escuta, mas ninguém faz o que ela manda. Na verdade, vejo as pessoas se perguntando se ela enloqueceu. Eu sempre achei que ela não batia muito bem.

- Se joguem. Estou falando sério.  Sabrinna joga um olhar para mim. - Não confiam nos próprios colegas?

Não nesse, minha querida professora.

Aos poucos, as pessoas vão se jogando nos braços uma das outras.

- Não vou te deixar cair. Pode se jogar, eu não mordo. - Ouço a voz de Griffin atrás de mim.

Tento pensar em alguma coisa inteligente para responder, mas desisto e me jogo para trás. Ele me pega com facilidade. Quando a mão dele me toca, sinto como se tivesse levado um choque, e a minha pele meio que formiga onde ele tocou. Reparo, então, que essa é a primeira vez que nos tocamos depois da festa.

- Viu? - Ele diz, depois de colocar de volta de pé.

Não respondo.

- Isso, agora quero que se joguem de novo, com mais força dessa vez. - Sabrinna fala.

Eu obedeço, ainda em silêncio.

- Sabe - Griffin puxa assunto, a voz meio irônica - Espero que esteja treinando para o jogo, vai ser difícil...

 - Eu sei disso. - O interrompo. - E estou treinando, se você não viu. - Acrescento, rude.

Ele parece pensar um pouco.

- Vou te colocar no banco de reservas. - Ele diz, como se estivesse comentando a cor do céu.

Paro de me jogar na mesma hora e o encaro, a fúria crescendo dentro mim.

- Banco de reservas? Está louco?

Ele me olha como se não entendesse.

- Não. Só quero dar chance às que ainda não jogaram. E seu pulso ainda está meio machuc...

- Eu sei o jeito que meu pulso está. - Falo. Sei que fui grossa, mas não estou nem aí. - Posso lidar com isso. E dê chance às que ainda não jogaram quando o jogo não estiver valendo tanto quanto esse vale.

- Acha que falando assim com seu treinador vai melhorar suas chances? - Griffin me pergunta, com desdém. - Vai ficar no banco de reservas e acabou.

- Você não é o meu treinador. E não pode me colocar no banco, eu sou a capitã do time. - Apelo.

Ele balança a cabeça.

- Não. Você é a capitã do time do Peter.

- O jogo é no sábado. Hoje é quinta. Não espera simplesmente achar saltitando por aí uma ponteira tão boa quanto eu, espera?

O garoto dá de ombros.

- Posso treiná-las. Mas você fica no banco.

- Olha aqui - digo, apontando o dedo na cara dele, mas sou interrompida por Sabrinna, que está mandando todo mundo sentar de novo.

Volto para meu lugar fuzilando Griffin com os olhos.

A professora começa a falar sobre os valores de Gandhi que ela havia comentado, mas não escuto uma única palavra.

                                   ○               ○               ○

- Banco de reservas? Esse garoto tem o quê na cabeça? - Tensy está cuspindo para mim.

- Eu sei, ele não gosta de mim, eu te falei.

- Nós precisamos dessa vitória. Já perdemos dois jogos, e esse idiota tira você?

- Ei, fala baixo. Ele está chegando. - Advirto.

Nós nos levantamos da arquibancada para o segundo treino com Griffin. Ele chega sorridente e manda todas as garotas fazerem uma rodinha de novo.

Está todo mundo cansado por causa da detenção de ontem e das três provas que tivemos hoje. Ninguém está muito a fim de treinar, mas temos uma vista muito bonita quando estamos aqui.

Griffin nos manda cantar novamente e as meninas obedecem. Estou me sentindo em um coral muito desafinado.

Depois que toda a palhaçada da rodinha acaba, nós nos sentamos, já cansadas.

- Griffin... - A voz de Lilly Parker, uma garota da minha série, chama. - Estou com cólica, posso ir à enfermaria?

O garoto sorri com as fileiras de dentes brancos e perfeitos e olha para mim de relance.

Não. Está vindo de novo.

" - Eu amo vôlei, sabe. Mas às vezes simplesmente não estou a fim de fazer.

- E o que você faz? - Ele perguntou.

- Nós, do vôlei, temos um esquema.

- E qual é? - Ele questionou, tirando uma mecha de cabelo dos meus olhos.

- Uma de nós diz que está com cólica. Peter nunca reclama, os meninos não questionam muito essas coisas de mulher. Enfim, uma vai embora ajudada por outras duas, e ficam assistindo o futebol dos garotos. Uns quarenta minutos depois elas voltam e outras saem, já que esse problema pode acontecer no mesmo período...

- E o treinador não fala nada?

- Nada. É por isso que sempre dá certo."

- Está com o quê mesmo? - Griffin pergunta, a voz sugerindo que ele está segurando uma gargalhada.

- Cólica. - Lilly repete, a cara de dor falsa vacilando um pouco.

- Arrãm. E acha que engana quem? - Ele pergunta, soando, pela primeira vez, como Peter.

Lilly perde completamente o fingimento.

- Mas...

- Tudo bem. - O menino balança a cabeça. - Se está com cólica, pode ir. Mas não acho que precise de outras duas, não é? Se bem que deve ser mais legal ver os meninos sem camisa com as amigas...

Agora não é apenas Lilly quem congela. Todo mundo parou de falar. Ninguém se mexe, ninguém sabe o que responder.

Todas se entreolham, provavelmente procurando uma culpada.

- Quem foi a vadia que contou? - Vejo os lábios de Megan se movimentando, sem som, atrás de Griffin.

 Infelizmente, ele se vira nessa hora e entende a pergunta. Ele concentra seu olhar claramente em mim.

Então, uma a uma, as meninas também se viram para me olhar.


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