Saga Sillentya: Reuniões da Meia-noite escrita por Sunshine girl


Capítulo 1
I - A Marca de um Condenado


Notas iniciais do capítulo

Trazendo o 1° capítulo da 4ª fase para vocês!

*Aidaaaaaaaaaaaaaaaaaaan!!!!*

*pigarro*

Boa leitura!!!



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Capítulo I – A Marca de um Condenado

Eu abrirei os seus olhos e farei com que veja:

Eu sou o rei do meu mundo

(Rei do meu mundo)

Eu quebrarei todas essas muralhas ao redor de você agora

Eu sou o rei do meu mundo

(Rei do meu mundo)

Eu quebrarei todas essas muralhas ao redor de você

(Saliva – King of My World)

Aos olhos de uma criança como seria a guerra?

Aos olhos de um menino como seriam os horrores, o caos, toda a destruição deixada por ela?

A resposta é simples, tão simples na realidade que chega a assustar.

Aos olhos de um menino, a guerra é o próprio inferno. Eu sei disso porque vi com meus próprios olhos o que ela é capaz de fazer, o que ela é capaz de destruir. Eu vi todos os seus horrores, presenciei-a em toda a sua plenitude, em todo o seu horror.

E sobrevivi a ela.

Não que esse fato tenha surtido algum efeito bom em minha vida. Na verdade, desejaria mil vezes ter sucumbido nas chamas daquele inferno, do que viver em meio a essa corja agora.

Eu nem sempre fui um monstro. Mas aprendi com o tempo que abrindo mão de minha humanidade, que me tornando um animal sanguinolento e inescrupuloso deixava-me mais forte, fazia meus inimigos tremerem diante de mim.

Misericórdia era algo reservado apenas aos mais fracos. Os mais fortes eram imponentes, impetuosos, desprovidos de qualquer sentimento ou emoção desnecessária.

Eu sou um caçador. Alguém que não pensa por vontade própria, alguém que não age de acordo com o que acredita ou preza. Eu ajo em nome do meu mentor. Sigo suas ordens como um cão obediente. Jamais questiono suas ordens, acato todas elas antes com uma lealdade louvável.

Antes eu pensava que uma vida repleta de violência e luxúria poderia me satisfazer. Hoje já não tenho tanta certeza. Afinal, quase um século e meio já se passou e eu ainda não possuo nada de que possa me vangloriar, nada que valha a pena lutar, nada que me faça continuar respirando, mantenha meu coração batendo em meu peito – se é que possuo algum – ou então, algo com o qual possa planejar um futuro.

Futuro...

Que futuro um animal como eu pode ter? A glória eterna? Isso não é o suficiente para mim, nunca foi.

Costumava pensar que algum dia, miraculosamente, algo bom, algo que valia a pena, despencaria sobre mim, apareceria em meu caminho amargo e violento. Mas depois das primeiras décadas mergulhado em solidão e um tormento infindável, eu perdi minhas esperanças. E simplesmente aceitei o fato de que nasci para matar, de que nunca haveria algo de bom em mim, que sentimentos dessa natureza jamais aflorariam dentro de um monstro.

Aceitei meu destino e entreguei-me às trevas. As mesmas trevas, que hoje me consomem, que corroem minha alma e tudo o que eu alimentei, esperancei, aguardei pacientemente, tudo o que eu sempre almejei para mim; uma vida longe de tanta violência, uma em que minhas mãos não estejam sujas de sangue inocente, uma na qual eu não escute as vozes daqueles que sentenciei e condenei em minha mente, na calada da noite.

Tão vãs, tolas e falsas esperanças...

Estava condenado. Amaldiçoado. Sentenciado a passar o resto de meus dias dentro desse inferno, pagando a cada dia o preço por minhas egoístas e caprichosas decisões.

Já fui muito mais vaidoso do que sou hoje. Costumava ver todas as pessoas como objetos, objetos estes, que poderiam satisfazer meus desejos, fazer-me alcançar o topo, fazer-me temido, tornar meu nome um símbolo de poder e destruição.

O fato de que era capaz de ler suas almas era um trunfo e tanto. Na maioria das vezes via a ganância, a sede pelo poder, via a inveja, o descontentamento com suas próprias vidas conjugais, profissionais e sociais. Eu as observava, como um telespectador diante de um palco, sempre as julgando como coisas fúteis e desnecessárias. Embora um dia tenha sido humano, esqueci-me desse detalhe por longos anos, tentando apagar de minhas lembranças o fato de que tempos atrás eu pertenci a essa raça mesquinha e hipócrita.

Quão tolo eu fui.

Eu costumava usar as pessoas para o meu próprio benefício. Não levava em conta seus sentimentos, quais eram os seus sonhos, seus planos e planejamentos para o futuro. Eu simplesmente as esmagava, como míseros insetos, como se não fossem absolutamente nada. Como se eu fosse um deus, era exatamente assim que me via. Um senhor soberano, dono do meu próprio mundo, manipulador de todas as forças, de tudo o que estava ao meu redor. O mestre do meu próprio destino.

Mas eu nunca tive o controle sobre minha vida, e ela provou-se ser apenas uma sucessão de decisões egoístas, vaidosas, narcisistas e animosas. E quando realmente perdi o controle sobre ela é que percebi que algo faltava em mim. Algo importante. Algo que eu não tinha.

Eu podia ter a mulher que quisesse em minha cama, seria necessário apenas um estalar de dedos e qualquer uma se curvaria ante mim. Porém, nenhuma delas satisfazia-me inteiramente, nenhuma delas supria aquele buraco em mim. Nenhuma delas era capaz de fechar aquela fenda.

Então, logo as descartei de minha vida, preferi exilar-me em meu próprio mundo, não permitindo que ninguém jamais adentrasse, que ninguém conhecesse esse meu lado volátil e incompleto.

Por fora, embora aparentasse uma máscara de frieza e impassibilidade, e ninguém pudesse jurar que por trás de tudo aquilo pudesse haver algo mais, por dentro eu estava gritando desesperadamente, enlouquecendo de solidão.

O que mais me assustava, porém, não era o fato de que poderia acabar meus dias, ainda solitário e vazio, mas o fato de que minha felicidade poderia estar em algum lugar nesse mundo, e eu não acabasse encontrando aquilo que procuro tão fervorosamente a tempo.

Antes que possam julgar-me mal, eu reconheço, possuí uma família há muito tempo atrás. Um pai severo e distante, mas que no fundo, eu sabia que me amava, uma mãe carinhosa e dedicada, e um irmão a quem eu prometi uma vez, há muito tempo, proteger de tudo e de todos, proteger dos horrores de guerra.

Claro que eu jamais consegui cumprir essa promessa, antes só consegui torná-lo um monstro ainda mais cruel e perigoso do que eu. Tudo porque o invejei, invejei sua felicidade, sua alegria, sua satisfação, seu contentamento.

Invejei aquilo que ele possuía, e eu ainda não. Um grande amor em minha vida. Um amor puro e verdadeiro. O amor de uma mulher. Eu jamais soube o que era amar verdadeiramente uma mulher, como seria poderoso esse sentimento, como eu daria céus e terra para tê-la ao meu lado, como eu enfrentaria todo o inferno apenas para estar ao lado dela. Nunca amei mulher alguma. Não que eu a quisesse para mim, afinal eu ainda não conseguia sentir nada pelas mulheres que não fosse prazer momentâneo ou tédio.

Mas a forma como ele a olhava, o modo como ele lhe dedicava toda a sua devoção, toda a sua atenção, o modo como aquela menina conseguia despertar o melhor que havia no meu irmão, revoltou-me.

Revoltou-me comigo mesmo. Por que eu não poderia possuir o mesmo que ele? Por que não poderia sentir o mesmo que ele? Por que não poderia ser feliz como ele? Essas perguntas consumiram-me por dias incontáveis e noites intermináveis.

Até que tomei a mais tola e egoísta decisão de toda a minha vida. Estava tão amargurado, tão revoltado por não possuir algo que valesse a pena em minha vida, que decidi tolamente descontar minha fúria e minha insatisfação em meu irmão.

E o traí.

Entreguei-o ao meu mentor, juntamente da mulher que ele amava, sabendo todo o tempo que eles a matariam sem misericórdia alguma. Sabendo a todo o momento que eles não poupariam meu irmão também. Mas minha consciência não cobrou meus atos naquela época, apenas anos mais tarde é que verdadeiramente percebi o que de fato havia feito ao meu irmão.

E culpei-me desgraçadamente, fui corroído pela vergonha e pela amargura.

Como conseqüência de meus atos, quase acabei por matá-lo também. Só falhando no último segundo porque vi o quanto eu já o havia prejudicado, o quanto eu já lhe havia arrancado. Poderia terminar o serviço e arrancar-lhe a vida também?

Não.

Eu nunca tive esse direito. E jamais o terei. Eu não sou um deus, não posso brincar com as pessoas dessa forma sem pagar um preço futuramente, e isso eu vejo por mim mesmo, hoje, com coração e alma atormentados.

Não há uma única noite em que não repouse minha cabeça no travesseiro sem pensar antes em todos os erros que já cometi e chegar a uma triste conclusão. Monstro. Eu fui um monstro.

E hoje percebo que minha vida luxuriosa e violenta não poderia ter me levado a outro destino que não seja esse que possuo atualmente. Sou um homem atormentado. Sou um homem que possui a marca de um condenado. Um homem amaldiçoado e repreendido por seu próprio passado negro e violento. Um homem que um dia, já foi uma fera selvagem e indomável.

Meu nome é Aidan, Aidan Satoya, e agora espero que me ouçam atentamente, ouçam a história que lhes tenho para contar. A história de minha vida atribulada, a história de um menino que teve a presença da guerra durante toda a sua miserável existência e, conseqüentemente, teve toda a sua inocência corrompida por ela. Toda a sua humanidade dissolvida por caos e destruição.

A história de um homem, que hoje luta para se livrar do fardo de seu passado. Luta para receber a dádiva do perdão por todos os seus pecados.

Observei atenciosamente a cena que se desenrolava no segundo andar daquela casa. Estava em San Diego, na quente e ensolarada Califórnia, a pouco mais de três dias e já os havia localizado; os alvos, aqueles de quem devia dar cabo o mais depressa possível.

Era um bairro de classe média alta, havia várias fileiras de casas de madeira, pintadas em tons claros, com seus jardins verdejantes e as calçadas de pedra estreitas.

Sabia pelas informações passadas por meu mentor antes que eu partisse da Itália, que o homem seria perigoso. Stefano era o filho de Frederich Wolfgang, um dos mais poderosos Elementais de toda a história, perdendo apenas para Daliel, o primogênito de Angeonoro Vallatori, e o próprio Angeonoro.

Não seria fácil.

Soube que ele rompeu o selo da fênix aos treze anos de idade, e por quinze anos recebera todas as instruções e treinamentos que seriam necessários do próprio tio, o atual líder de Ephemera, Lucius Wolfgang.

Eu sabia perfeitamente que não seria um alvo comum. As habilidades de um Elemental eram extremamente perigosas, e se provocados, eles tornavam-se verdadeiras bombas relógios.

A chuva desabava sobre toda a cidade naquela noite, haviam sido longas horas de espera até que a noite caísse, e mais horas aguardando pelo momento certo para atacar. Mesmo estando debaixo daquele temporal há horas, não conseguia sentir frio.

Eu sabia que Benjamin estaria em algum lugar, procurando por mim. As ordens de meu mentor haviam sido claras: eu não deveria atacar sozinho, deveria aguardar pela chegada de reforços, um esquadrão inteiro de lutadores e caçadores.

Assim, o homem não teria a menor chance de fuga ou vitória.

Senti algo se contorcer dentro de mim. Estivera assim o dia inteiro, desde que informei meu mentor de que havia encontrado o alvo. O que tinha de errado comigo? Já fiz isso inúmeras vezes, já levei tantos outros Elementais até meu mentor, então, por que havia algo dentro de mim que hesitava, que relutava em cumprir a missão?

Talvez minha resposta tivesse acabado de se jogar nos braços de meu alvo. A jovem humana o abraçava, repousando sua face no ombro dele, cerrando seus olhos e sorrindo abobalhada.

Mas o que de fato me preocupava era o volume saliente entre seus quadris; estava grávida, diria de seis meses. Não conseguia sentir a energia da criança inteiramente, a energia jubilosa da mãe a ofuscava, mesmo assim, havia algo... diferente naquele ventre, algo...

Apertei os olhos contra a chuva, não sabia o que era aquilo. O que estava havendo comigo?

Sacudi a cabeça, trincando os dentes, reordenando meus pensamentos e tornei a fitar a humana. Era bonita, muito bonita na verdade, isso era um fato. Possuía a pele clara como as pétalas de um lírio, os cabelos eram negros como o ébano, sedosos e macios, contrastando com o tom de sua tez, e os olhos eram negros também. Mas não era a beleza dela a atrair-me para lá, era a energia suave que emanava de seu ventre volumoso.

Uma energia tão sutil, tão delicada, agora que me concentrava mais podia lê-la perfeitamente, a criança partilhava do estado de espírito de sua mãe e remexeu-se no ventre.

A humana afastou-se, os olhos arregalados, os lábios avermelhados escancarados e então... Sorriu novamente. Pegou nas mãos do marido e levou-as até seu ventre, mostrando a ele que a criança remexia-se.

Cerrei meus punhos, moendo a corrente dourada que se enroscava em meus dedos. Ergui minha mão direta, fitando o pingente ovalado rubi, que pousava em minha palma. Andara distraído, mas agora que voltei a mim mesmo, vi que ele brilhava; o reforço já estava a caminho.

Mais uma espiada na janela do segundo andar da casa, e as luzes eram todas apagadas. A hora perfeita para atacar.

Decidi agir de uma vez por todas, não esperaria por ninguém. Tinha quase um século e meio de experiência, sabia perfeitamente com o que estava lidando, era orgulhoso demais para admitir que precisava de ajuda, principalmente para deter apenas um homem.

Escondi o Terceiro Olho no bolso de meus jeans ensopado. Sacudi a jaqueta de couro negro e atravessei a rua, caminhando tranqüilamente. Tinha a vantagem de estar acobertado pelas penumbras noturnas, um golpe certeiro e estaria tudo acabado. Poderia retornar à Itália e continuar remoendo meu passado, vivendo minha vida solitária.

Estagnei diante do pequeno jardim, a grama grudava em minhas botas. Cheguei à pequena varanda, levando minha mão até a maçaneta, forcei-a, e esta abriu, revelando um cômodo envolto em sombras. Ainda bem que meus sentidos estavam preparados para tudo.

Empurrei a porta vagarosamente, adentrando a sala, ensopando o carpete do hall da casa. Fechei a porta atrás de mim, exatamente no momento em que um clarão rasgou o céu, iluminando toda a estrutura do primeiro andar.

A lâmina achatada estava presa à parte de atrás de meu cinto, um movimento e eu poderia desembainhá-la.

Observei os porta-retratos em cima da mesa de centro, o vaso de flores coloridas e perfumadas. A mobília em tons claros, o piso de linóleo. Havia uma escadaria, subi-a lentamente, cuidando para abafar o som de meus passos.

Estaquei diante de um longo corredor, ainda me movia feito um fantasma pela casa. Não havia falhas em meu plano. Eu seria rápido e certeiro, um perfeito assassino, silencioso e cuidadoso.

Havia três portas no corredor, apenas uma delas encontrava-se escancarada. Espiei o cômodo, e no mesmo instante vi o berço de madeira, o mosquiteiro envolvendo-o e uma velha cadeira de balanço em um dos cantos; seria o quarto do bebê futuramente.

Ignorei a mobília em tons leves e continuei em meu percurso silencioso. Caminhei até a porta nos fundos do corredor, que estava apenas levemente recostada. Empurrei-a suavemente, sem produzir o menor ruído, e lá estava: o casal adormecido, dormindo tranqüilamente sobre a cama de casal, abraçados.

A mulher pousava sua cabeça sobre o peito do marido, seu estado de júbilo não era ocultado nem mesmo inconsciente; agora que ela dormia, sua energia encontrava-se mais suave, mas a energia que provinha de seu ventre brilhava ainda mais intensa e poderosa.

Tão poderosa na realidade que meus sentidos foram ofuscados, eu não conseguia captar mais nada que não fosse a criança no ventre daquela humana. Pisquei, atônito, tentando dispersar aquela confusão caótica em minha mente. Como algo tão pequeno podia irradiar tanta luz?

Esfreguei os olhos, cambaleando, era impossível concentrar-me em algo que não fosse a energia da criança. Apartei os olhos e não me deixei intimidar. Aproximei-me, determinado, embora as ondas de energia ainda me afetassem com eficiência, ofuscando meus outros sentidos.

Decidi bloquear o fluxo de energia e funcionou, porém agora eu tornava-me um alvo fácil, seria impossível ler a alma do Elemental se ele despertasse. Teria de terminar com tudo, era agora ou nunca.

Desembainhei a adaga, aproximando-me, sorrateiramente do leito do casal. Elevei a adaga acima de minha cabeça, suspendendo meus braços e mirei-a no ventre da humana. Não tinha escolha, se eu mesmo não fizesse o serviço, provavelmente Benjamin o faria com prazer, e de uma forma bem mais lenta e dolorosa.

Fitei o ventre volumoso da humana, mesmo com meu bloqueio, a energia, agora mais sutil e tênue do bebê, atingia-me e pela primeira vez em anos, desde que me tornei um caçador, desde que me tornei um monstro, eu hesitei...

Continuei ali, parado, petrificado, com a adaga mirada no ventre, mas sem conseguir movê-la um centímetro que fosse. Algo dentro de mim hesitava, algo relutava em cumprir aquela missão, algo não queria que aquela criança fosse ferida...

Besteira, eu pensei comigo mesmo. Eu era um caçador, um assassino por natureza. Era meu dever, era o meu papel. Então por que diabos eu não conseguia executá-la?

Estreitei os olhos e tentei novamente, um único golpe, um único golpe era mais do que suficiente. Mas a energia continuava a me atingir, continuava a ofuscar meus sentidos e envolver-me em algo tão... Algo tão... bom...

Baixei a adaga em um rompante, levando as mãos até os cabelos. O que era isso? O que estava havendo comigo? Parecia até mesmo um amador.

Tornei meus olhos para a origem daquela energia, que àquela altura, já dominava todo o quarto. Nunca em toda a minha experiência como caçador eu havia visto algo como isso.

Nunca algo poderia ser comparado a isso. Essa... energia intensa e poderosa. Sacudi a cabeça, se eu não fizesse o serviço...

Decidi, tentaria mais uma vez, pela humana, não gostaria de pensar no que Benjamin a submeteria se a encontrasse viva quando chegasse aqui. Mas não tive tempo nem mesmo para me aproximar novamente do leito, pois o Elemental finalmente percebera minha presença e agora me encarava com seus olhos verdes e fulminantes.

A humana despertou juntamente dele, e no instante segundo, uma forte rajada de vento rasgou todo o cômodo, atingindo-me em cheio no abdome, empurrando-me violentamente para trás.

A força da ventania era tanta, que eu choquei-me contra a parede de madeira e a estilhacei, esmigalhei-a, atravessando-a, saindo para o temporal que ainda desabava sobre a cidade.

Caí no jardim, de costas, rolando sobre a grama do quintal, nos fundos da casa. Recompus-me, colocando-me de pé no mesmo instante. O Elemental parecia estar tão disposto quanto eu a entrar naquela briga. Senti a excitação pela batalha que vinha a seguir preencher minha corrente sanguínea, aumentando meus batimentos e tornando minha respiração mais dificultosa.

Há anos não tinha uma briga à altura e estava louco para um novo desafio. O filho de Frederich Wolfgang seria um bom começo. Sorri para a figura de meu oponente, ele aproximou-se da fenda aberta na parede e saltou, pousando com graça sobre a grama encharcada.

Seus olhos verdes destacavam-se contra a escuridão da noite, fuzilando-me, seus lábios estavam crispados, enquanto ele encharcava-se no aguaceiro que desabava sobre nós.

- Não permitirei que machuque minha esposa! – sibilou entredentes, cerrando os punhos com um som audível.

Respondi com um sorriso, provocando-o, estava pagando o preço para descobrir até onde seus poderes estendiam-se. E a explosão de energia de sua parte veio no instante segundo.

Esquivei do jorro de lama e rocha que voou em minha direção, parti em sua direção, correndo contra o tempo, ainda tinha em uma das mãos a adaga de lâmina achatada, apenas um segundo de distração, era tudo o que precisava.

A adrenalina ainda fluía por todo o meu corpo, eu estava adentrando ao clima da batalha e gostava daquela sensação de poder ilimitado e de um desafio à altura de minhas habilidades.

Meu oponente notou minha aproximação perigosa e ergueu diante de si um muro sólido de lama e pedra. Circulei-o, procurando pela mínima brecha em sua proteção, meus olhos detectaram uma pequena fenda.

Não hesitei, concentrando todas as minhas forças em meus punhos, desferi um poderoso soco em seu escudo de terra úmida. Vislumbrei a proteção espatifar-se sobre minhas mãos, e sorri, satisfeito.

Porém, não havia mais nada dentro da parede de lama; notei o buraco aberto recentemente no gramado e saltei, impulsionando o peso de meu corpo todo para trás, bem a tempo de escapar de uma avalanche de terra úmida que certamente teria me soterrado.

Pousei sobre o gramado verde novamente, vendo que Stefano finalmente subia à superfície, uma grossa camada de terra ao seu redor. Eu estava certo, ele era bom. Não era como os outros, era esperto, fazia bom uso de sua manipulação.

Ele dispersou a proteção de lama movimentando os braços, espalmando as mãos, em seguida, a água da chuva pairava ao seu redor, um escudo de água vivo e dançante.

Meu corpo reagiu a tempo, bem no momento em que a água tornava-se uma arma letal em suas mãos, e uma torrente, quase como uma onda gigante vinha em minha direção. Usei minha velocidade e agilidade superior para desviar, tomando cuidado a todo instante para não abrir uma brecha em minha defesa.

Quando finalmente obtive uma segunda aproximação, uma poderosa rajada de vento empurrou-me para trás, fazendo-me recuar, um tanto cambaleante.

Stefano cessou a dança das águas e tornou a sua posição defensiva, os olhos verdes ainda me fuzilavam, furiosos e amargurados.

- Vá embora, caçador! – esbravejou ele contra o som da chuva – Não é minha intenção matá-lo, mas se insistir na ideia de machucar minha família, não terei escolha!

- Acha mesmo que eu vim tão longe para voltar de mãos abanando? – retruquei, recebendo de sua parte um olhar homicida.

Os olhos de Stefano hesitaram por alguns poucos segundos, ele devia ter o mesmo caráter de Lucius, a mesma repulsa por tirar a vida de alguém, mesmo se esse alguém estivesse disposto a matá-lo e assassinar toda a sua família.

- Ducian já tirou muito de mim, caçador, não permitirei que mate a mulher que amo, ou a criança que ela carrega em seu ventre!

- Meu mentor está fazendo um favor a vocês, Elementais, limpando a face da terra de tamanha corja! Vocês só nos causam problemas!

- Tem certeza, caçador, afinal quem começou tudo isso foram vocês, ou por acaso acha que seu mentor é um modelo de virtude? Vocês nos perseguiram desde o principio, vocês nos perseguiram por nossa singularidade! Mas pense bem, caçador, é uma vida assim que você deseja? Uma vida vazia com o sangue de pessoas inocentes em suas mãos?

- Ora, cale-se! – ordenei-lhe, os dentes trincados, como ele ousava afrontar-me daquela maneira? Quem ele pensa que é? – Tolo, farei com que retire o que disse!

- Eu? Tolo? – Stefano sacudiu a cabeça molhada – Eu não sou tolo, caçador, muito pelo contrário, você é o tolo aqui, por pensar que pode enganar a si próprio, que pode suprir sua vida com violência e morte... Eu sei disso porque já senti, sei como é ter essa fenda aberta em seu coração, esse vazio desesperador, você também sente isso, não sente? Posso ver em seus olhos, você não é feliz com o que tem, que não é sua verdadeira intenção me machucar, ou machucar a mulher que amo.

Eu ri sem humor algum, debochando de suas palavras. Não cairia em sua armadilha, não seria enganado por uma presa, pois eu era o seu predador, e a vitória naquela batalha seria inteiramente minha.

- Eu não contaria muito com isso, Stefano. Afinal, eu fui criado por Ducian, sei absolutamente tudo o que preciso saber sobre vocês, e não serei eu a cair aqui...

Interrompi-me em meu discurso, avançando em sua direção com minha velocidade superior, tentei golpeá-lo, mas Stefano foi mais rápido, esquivou-se de meu golpe, agarrando em meu braço, prendendo meu pulso. Recebi um golpe poderoso na face, um que cortou meu lábio inferior no mesmo instante, fazendo um filete de sangue escorrer pelo canto de minha boca.

Tentei acertá-lo com a outra mão, que continha a adaga, mas Henry mostrou-se mais veloz e esperto, desferiu um tapa em minha mão, atirando a arma na lama. Em seguida, ele golpeou-me com sua testa, forçando-me a me ajoelhar no gramado, transferiu seu corpo para trás do meu e passou seu braço ao redor do meu pescoço.

Tentei me libertar, mas estava atordoado outra vez, e logo descobri o porquê, a humana observava a batalha desenrolar-se, um casaco sobre os ombros, os olhos marejados, os lábios entreabertos, e aquela energia novamente, atingindo-me em cheio, tirando minha concentração.

Trinquei os dentes e tentei reagir, mas não conseguiria me libertar da chave que agora ele aplicava em mim.

- Henry! – a mulher gritou, hesitando em vir até nós dois.

Stefano baixou sua face até a minha, de modo que pudesse sussurrar em meu ouvido, para que sua esposa não nos ouvisse.

- Você realmente acredita que pode compensar esse vazio com violência, rapaz? Sou mais jovem do que você e mesmo assim vejo muito mais além... Eu também já senti isso, esse vazio, essa fenda, esse buraco, como se um pedaço de você estivesse faltando. E acredite em mim, tentar preenchê-lo com destruição e morte não será o suficiente! Eu sei porque já passei por isso, quis tanto vingar a morte de meus pais pelo seu mentor, que fui cegado pelo ódio, mas caí em mim e vi que isso não era o que eu desejava verdadeiramente, o que eu queria para mim.

- Você acha que pode me convencer com esse seu discurso barato? – indaguei, trincando os dentes novamente quando ele aumentou a pressão em meu pescoço – Terá que fazer melhor do que isso se realmente quiser continuar vivo!

Mas ao invés de reagir negativamente às minhas palavras como eu havia previsto, ele sorriu, um sorriso estranho para mim. E sussurrou suas últimas palavras em meu ouvido:

- Não, caçador, não pretendo escapar vivo daqui, mas quero fazer um acordo com você.

- Não faço acordo com pessoas como você. – retruquei, cogitando a possibilidade de usar a explosão de energia dos espíritos para me livrar de sua chave.

- Eu sei que vocês não costumam nos caçar sozinhos, eu sei que há mais como você a caminho e não pretendo confrontá-los, então se quiser salvar sua vida miserável, eu proponho que aceite a barganha.

A julgar pelo tom de sua voz, ele não estava brincando, falava sério. Quanto tempo levaria até que Benjamin estivesse aqui? Ele parecia bem disposto a cumprir sua ameaça também.

- Que barganha? – perguntei.

- Quero que me dê sua palavra antes.

- Não darei minha palavra antes de saber do que se trata. – murmurei e ele aumentou a pressão em meu pescoço novamente, mantendo-me ajoelhado no lamaçal.

- Apenas dê sua palavra, caçador! – esbravejou ele no limite de sua paciência.

Cerrei os olhos com força, irritado por estar passando por uma situação como aquela. Tudo por causa daquela energia intensa que provinha do ventre da humana!

- Tem minha palavra! – cuspi entre os dentes e Stefano soltou-me no mesmo instante, eu cambaleei e caí sobre o lamaçal, levantando-me vagarosamente, vendo seus olhos verdes triunfantes observarem-me minuciosamente.

Limpei o filete de sangue que escorria no canto de meus lábios com o punho e pus-me de pé novamente, fitando sua figura sombria e melancólica.

- Qual é o acordo? – indaguei no mesmo instante que um relâmpago rasgou o céu negro acima de nós dois.

Stefano cerrou os olhos, e eu o encarei com os olhos estreitados, o que ele estava planejando? De qualquer forma não poderia voltar atrás, dei-lhe minha palavra. Quando ele finalmente abriu os olhos novamente, falou com cautela e tristeza:

- Pode me levar até seu mentor, mas em troca, poupará minha esposa e a criança que ela carrega, prometa que os deixará partir em paz e que não os seguirá, nunca. Esse é o preço pela minha rendição.

Observei-o por alguns instantes, seus olhos eram verdadeiros, ele ia se sacrificar pela humana e pela criança que ela carregava em seu ventre. Ergui as sobrancelhas, piscando para tirar a água que se acumulava em meus cílios.

- Feito. – murmurei, e em seguida, sua esposa berrou seu nome, lançando-se em nossa direção. Senti-me zonzo e atordoado novamente pela proximidade com a energia da criança em seu ventre.

- Henry!

Ela jogou-se em seus braços, afundando o rosto em suas roupas encharcadas, debulhando-se em lágrimas, cerrando os olhos negros com força.

Ele a confortou, afagando seus cabelos molhados e pesados pela chuva, beijou-lhe a fronte e sussurrou um “eu te amo”. Segurou em sua face, fazendo-a encará-lo.

- Prometa que será forte, por mim e pelo nosso bebê – ele pousou uma das mãos no ventre volumoso, afagando o tecido que o recobria. – Não lhe conte nada, nunca, em hipótese alguma. Promete?

A mulher assentiu, ainda abalada e tornou a chorar. Ele roçou seus lábios nos dela por mais de uma vez. Beijou-a carinhosamente, o que me fez desviar os olhos, não suportava olhar para tamanha... felicidade e cumplicidade que havia entre os dois.

Ele abaixou-se a fim de beijar o ventre da humana, senti que com isso a energia que provinha do ventre alterou-se, tornou-se mais suave, como se sentisse a iminente despedida do pai.

Ele ainda teve tempo de afagar o ventre inchado, e pela primeira vez comecei a me questionar se aquele homem tinha razão. Se o que eu procurava não era violência, se ela não seria capaz de me satisfazer, então o que seria?

Ele levantou-se, pegou o rosto da esposa entre as mãos, fitando-a nos olhos marejados e chorosos. Sua voz era dura e fria:

- Fuja, meu amor, fuja para bem longe, não permita que encontrem nosso bebê, agora vá!

A mulher encarou-me com seus penetrantes olhos negros, ainda sem saber muito bem o que fazer. Olhou de meu rosto para o rosto de seu marido várias vezes e depois, virou-se na direção da casa, entrando como um furacão. Até que eu a perdi de vista, junto da energia, agora sutil, que emanava de seu ventre.

Stefano tornou seus olhos verdes para mim, o cenho franzido, os lábios crispados.

- Obrigado, caçador, por poupar a vida de minha esposa e a vida de minha filha...

Menina? Era uma menina?

Humf, por que estava me importando com isso? O destino dela já não era mais da minha conta. Não estava mais nas minhas mãos. Senti uma mão fria ser repousada no meu ombro, sobressaltando-me, mas era apenas Stefano.

- Acredito que algum dia você se dará conta de que o que procura, rapaz, é amor...

Ergui as sobrancelhas, e um dos cantos de meus lábios em um sorriso debochado.

- Não tenha tanta certeza disso, não acredito no amor. – retruquei, esquivando-me de sua mão.

Ele cerrou os olhos, abruptamente, ficando tão petrificado quanto uma estátua.

- Faça o que tem que ser feito. – sussurrou ele e eu assenti, fechei meu punho, preparando-me para nocauteá-lo.

- Tem algo a dizer antes? – indaguei e ele sorriu.

- Só uma coisa; obrigado novamente.

Movi-me em sua direção, acertando-lhe um poderoso soco, um que o derrubou no mesmo instante, tirando-lhe a consciência. Stefano desabou em meio ao gramado encharcado e eu fiquei a contemplá-lo até que senti três presenças aproximando-se de mim. A cavalaria havia chegado.

Precisava agir rápido, abaixei-me até o corpo inerte, pegando-o e empoleirando-o em meus ombros, carregando-o sobre a chuva que ainda desabava sobre a cidade. Caminhei por vários segundos, sentindo que eles já me seguiam, a energia repugnante de Benjamin dava-me náuseas.

Revirei os olhos e encaminhei-me para um beco pútrido e obscurecido. Deixei que o corpo que carregava em meus ombros repousasse no asfalto gélido e encharcado. Dez segundos depois, três silhuetas envoltas em sombras deixavam a escuridão, revelando-se na pouca incidência de luz de um poste na calçada.

Reconheci o sorriso irritante de Benjamin e sorri de canto, adoraria desfazer aquele sorrisinho em seu rosto, os olhos castanho-claros faiscaram para mim, quase um século e meio de remorso e inveja.

- Ora, Aidan, vejo que não enferrujou ainda! Afinal, capturar um Elemental sozinho não é para qualquer um.

Ignorei sua provocação, desviando meu rosto para Ellian e Bruce, que se juntavam a nossa pequena reuniãozinha. Seus olhos claramente desaprovavam minha atitude.

- Aidan, não devia ter desacatado a ordem de Lorde Ducian, você não podia ter agido sozinho.

- O que foi? – indaguei, arqueando uma de minhas sobrancelhas, um claro sinal de deboche, que eu não levava suas advertências a sério – Estão ressentidos por que perderam toda a diversão?

Apontei para o corpo inconsciente aos meus pés, sorrindo ainda, apertando os olhos contra a chuva.

- Não se preocupem, eu me diverti muito por todos vocês.

Benjamin cerrou os punhos, mas Bruce e Ellian preferiram ignorar-me, viraram-se, dando-me as costas, e estávamos prestes a partir quando Benjamin nos impediu, os olhos faiscando para mim, fuzilando-me.

- Esperem, não podemos partir ainda, Aidan, onde está a esposa dele? Pela informação que recebemos, ela estava grávida, isso significa que a criança precisa ser morta. As ordens de Ducian foram claras.

Um sorriso cruel emoldurou seus lábios, e eu fui consumido por um desejo insano de socá-lo ali mesmo. Fitei a face serena do corpo diante de mim, pensei em minha promessa a ele, pensei em sua parceira humana, ela não precisava ser envolvida em nada disso.

Por último, a lembrança nítida daquela energia que emanava de seu ventre veio a minha mente, fazendo-me cerrar os punhos e estreitar os olhos. Crispei os lábios e passei a mão nos cabelos, permitindo que meus olhos pousassem no semblante repugnante de Benjamin e um sorriso cruel emoldurou meus lábios.

- Eu a matei.

Bruce e Ellian entreolharam-se, sem nada dizer, mas Benjamin lançou-me um olhar de desconfiança e incredulidade, cruzando os braços sobre o casaco negro e longo que usava.

- Você realmente cuidou dela, Aidan? – perguntou-me ele com um tom que eu não gostei nada. Minha vontade de esmurrá-lo só crescia a cada segundo que se passava.

Ergui o queixo, elevando meu olhar, demonstrando toda a minha superioridade em relação a aqueles amadores diante de mim.

- A humana e a criança estão mortas, eu mesmo cuidei disso, sozinho. – fiz questão de dar ênfase nessa última parte, gostando do modo como Benjamin reagiu a minha provocação.

Bruce intrometeu-se, repousando a mão em meu ombro, eu o fuzilei com os olhos, não gostava quando me tocavam. Esquivei-me de seu toque, tornando a me abaixar até o corpo estirado no asfalto.

Peguei-o, colocando sobre meus ombros e parti, ignorando os três pares de olhos que me encaravam estranhamente. As palavras de Stefano ainda martelavam em minha cabeça...

O que eu procurava tão desesperadamente era... Amor?

Não, o que eu estava pensando? Deixando que as palavras dele me afetassem? Eu não precisava de amor, nunca precisei. O amor torna as pessoas fracas, vulneráveis. Apenas o ódio fortalece.

Tsc, homem tolo. Sacrificou a vida pela família? Ninguém é digno de um ato tão nobre e tolo. Mas...

Se ele estivesse certo, se o que procuro é amor, como poderia encontrá-lo? Afinal, sou um assassino frio e cruel, não há espaço para amor em meu coração.

Não há espaço...

Nunca haverá...

A escuridão penetrou meus olhos cansados. Quanto tempo já teria se passado?

Meus músculos reclamavam da posição na qual me encontrava. O ferro já havia ferido minha pele e cortado minha carne.

Ainda me recuperava dos ferimentos da batalha que travei dias atrás...

Mas, não posso dizer que há dor maior do que a que suporto nesse momento.

Em um momento, eu a vi sendo torturada, bem diante de meus olhos. Os cafajestes haviam me colocado para ver tudo de camarote.

No outro segundo, uma forte explosão abalava todo o prédio. E eu tive esperança, devo confessar...

Mas então, tudo era ameaçado novamente quando vi o homem que por quase quinze décadas eu chamei de pai elevar sua adaga, pronto para ferir aquele corpo delicado que eu tanto amava, e roubar a mulher da minha vida.

Meu desespero foi tão grande, que na hora não pensei em mais nada que não fosse protegê-la, e arrebentei as algemas, usando meu corpo como um escudo, salvando a vida dela.

E quando eu finalmente achei que tudo voltaria a ser como era antes, quando eu achei que eu a teria de volta nos meus braços, um monstro vil e cruel a tirou de mim.

Ainda me recordo dela saltando na minha frente, impedindo-me de receber o golpe final, chocando-se contra a parede como conseqüência, como preço por me salvar, cair estatelada e frágil no chão, e muitíssimo ferida.

Posso dizer que naquele momento, eu morri...

Sim, eu morri. Ao ver a mulher que eu amava – a única que já amei – se sacrificar daquela maneira por mim.

Tudo que se sucedeu depois foi negro e frio.

O perfume dela pareceu impregnar na minha pele, eu pude memorizar cada detalhe tão bem esculpido de seu rosto de deusa da beleza, cada traço delicado, cada curva suave de seu corpo, e agora, já não tenho mais nada.

Cerrei os olhos e trinquei os dentes quando as lembranças tornaram-se nítidas e fortes demais. Não queria me lembrar, não agora...

Eu queria morrer ali mesmo. Nada tinha valor mais para mim. Nada tinha importância.

O teto poderia desabar sobre a minha cabeça, e eu não me importaria.

Antes, partiria com alegria, somente pelo fato de saber que a encontraria...

Meus sentidos logo me alertaram de que alguém se aproximava.

Elevei a minha face cansada, vendo a porta de ferro batido ser destrancada, e em seguida aberta. As dobradiças enferrujadas guincharam, e eu reconheci a energia daquela pessoa.

Desviei o rosto quando ela se aproximou de mim, a fim de limpar minhas feridas com uma toalha umedecida.

- Por que está aqui? – perguntei, amargurado.

Ela passou o pano macio em meu rosto, sorrindo. Tudo o que menos queria era vê-la agora. Mas me visitar naquela masmorra era um costume para Crystal, um hábito desde que fui jogado, ferido e abatido aqui nesse buraco.

- Porque quero cuidar de você, é óbvio.

- Dispenso seus cuidados... – retruquei, tentando me afastar dela, do perfume dela, do toque dela. Porque aquele não era o perfume que eu tanto almejava sentir, aquele toque não era pelo qual meu corpo clamava.

Não. Eu só queria Agatha.

Nada e nem ninguém poderia mudar isso.

- Não fique assim – sussurrou ela, afagando meu rosto –, Lorde Ducian está vindo, ele deseja conversar com você.

- Não tenho nada para conversar com ele.

- Ele não pensa assim, e quer lhe oferecer a chance de se redimir, Aidan. Aceite-a, por favor. – suplicou, aproximando seus lábios de meu rosto.

- Prefiro morrer a voltar a servi-lo. – retruquei, e ela suspirou, levantando-se, afastando-se de mim.

Crystal encaminhou-se até a porta, abriu-a novamente, mas antes de me deixar sozinho com minha amargura novamente, virou-se, o rosto complacente:

- Não dificulte mais as coisas para você, meu querido, em breve você verá como tudo voltará a ser como era.

E então se retirou, deixando-me ali, mais uma vez. Permitindo que eu volte a remoer minhas amargas lembranças, o que mais queria naquele momento.

Baixei minha face, desgraçando-me internamente. Só uma coisa podia me confortar naquele momento, mas eu sabia exatamente o que aquilo faria comigo depois.

Cerrando os olhos, e relaxando minha respiração, eu me preparei para adentrar a dimensão dos sonhos, e lá encontrar a minha amada. Lá, onde ela me esperava...

O único lugar no qual poderia encontrá-la, ou pelo menos, a sua essência brilhante e poderosa; a sua alma.


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Notas finais do capítulo

*-* E então o que acharam???

Sem prólogo dessa vez... rsrsrsrsrs... Suspense, suspense, suspense!!!

Bom, como viram, a narração com o Aidan será um pouquinho diferente, teremos muitas lembranças do passado conturbado dele!

E o que será que aconteceu depois que a Agatha morreu??? Alguém arrisca um palpite?? Só digo uma coisa, o Christian aprontou!!! *novidade*

Mas enfim, Saliva é uma banda com um rock bem mais pesado, nada de coisa leve, as músicas são bem sombrias e mostram uma mente perturbada mesmo, e por isso são a cara do nosso galego!!!

Quanto a capa, quando eu vi ela eu parei e pensei: É perfeita! Exceto pela coisinha magricela que está nela, mas é só ignorar ele e pensar que é o Aidan ali! *-*

Enfim, estarei esperando pelas reviews!!!

Beijinhos!!!!



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