Shimmer escrita por scarlite


Capítulo 21
Capítulo 21




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Sabe quando as pessoas te olham na rua, através da janela do carro ou ônibus? Quando elas te olham diretamente, como se conhecessem nosso rosto de algum lugar. Outros apenas fixam os olhos nos nossos profundamente... E aquele escrutínio prende como um íma: não conseguimos interromper o contato. Pensando nisso, percebi que o olhar humano convida o outro, e tem um chamado de cada cor. Havia um que eu encontraria mesmo que não quisesse; mesmo que existisse um mundo inteiro entre nós. Ele é da cor da terra; firme como os troncos das árvores e quase tão agudo quando as rochas; porém, guarda todos os segredos da minha alma. E nele quero me afogar.

***

(Edward)

Aquela sensação de aperto no estômago continuava me perturbando, mesmo estando cercado pelos funcionários da construção, tendo um dia corrido como aquele.

- Aqui, senhor Cullen, entrega direta para o senhor. – O rapaz do Fedex colocou o pacote pequeno sobre a mesa do meu escritorio improvisado.

- Harry, leve o material para o segundo andar, tem um vazamento no quarto 09. – olhei para o jovem de boné vermelho e olhos pertados.

- Onde eu assino...

- Aqui, e aqui. – Apontou para as linhas com um xis mal feito. - Obrigada! – O som das botas do rapaz no chão sujo de areia me deixou incomodado; a mesma sensação de quando arrastam as unhas no quadro negro.

Abri o envelope que parecia ter vindo de longe. Havia muitos selos e carimbos postais. “o que será agora”, pensei e imaginei por um momento se tratar de alguma coisa da universidade. Mas, não havia remetente. Estava em branco.

- Edward, precisamos de mais canos e material para concreto... Johny disse mais alguma coisa que eu não consegui ouvir. Minha cabeça começou a dar voltas, e levou os sons junto com elas. Apenas um nome... Foi tudo que precisou para me deixar travado no chão.

No centro da folha, uma letra bem desenhada, uma caligrafia caprichada, no entanto, escrita sobre um papel amassado de cigarros. Lembro bem até a marca; no verso do pacote de Mahlboro estava escrito o nome Renée. No começo não compreendi. Não recebíamos nada da minha tia; ela não parecia propensa a se comunicar com a família que a deixou num sanatório. Meu cérebro começou a processar as informações, sem alcançar uma resposta coerente para o que estava em minhas mãos. Será que finalmente ela estava saindo das sombras que estava imersa? Ela sempre parecia dopada e completamente alheia à realidade todas as vezes que a vi. Porque agora e porque para mim e não para minha mãe?

- Edward! – Uma mão no meu ombro. – Há um tempão que te chamo cara, o que eu faço?

- Com... Com o que? – Johny me olhou com estranheza.

- Você tá bem? – Demorei um tempo para responder.

- Estou. – Forcei a resposta boca afora. – Que há?

- Precisamos de mais canos e concreto para o terceiro andar.

- Certo. Vá ao armazém e pegue o que precisar. Repentinamente o saguão bagunçado diminuiu de tamanho me deixando sufocado. Era o sono, a preocupação com Isabella, problemas.

Os problemas sempre parecem se acomodar muito bem Uns aos outros nos momentos de impasse. Isso torna as proporções Erradas e a impressão é de que tudo é demais.

Corri os olhos pelo pedaço de papel e percebi que tudo poderia piorar , a confusão mental eu digo.

Voltarei para pegar o que é meu de direito.

“O que é meu de direito”;

“O que é meu de direito”; A frase ficou ecoando na minha cabeça, como num disco danificado. Imaginei os olhos frios de minha tia olhando através do vidro e foi inveitável não sentir um arrepio.

- Mas, o que droga é isso?

***

O sol aquecia suavemente a superfície do concreto. Apesar do vento gelado fazer os adolescentes se aglomerarem em grupos no pátio, uma figura permanecia a parte. E seus olhos castanhos deslizavam pelo papel envelhecido, com a mesma ânsia de um forasteiro faminto. Concentrada como estava, não podia ouvir os gritos estridentes das garotas, ou o som do motor da velha pickup do vice diretor. A brisa gélida brincava com os fios ondulados, como se fosse tecido de seda. Havia certa umidade na grama, mas, não incomodava a garota que folheava um volume de Contos esxtraórdinários de Edgar Allan Poe. Se você chegasse perto o bastante poderia ver a velocidade com que os globos castanhos deslizavam devorando linha por linha. Entre uma página e outra, o farfalhar do sanduíche contra os dentes; aos ouvidos o som agradável de "Nothern Sky" de Nick Drake. Os sons das vozes pareciam um único grunhido gutural e distante, pois os pensamentos estavam concentrados e os olhos baixos. Tanto que ignorou a aproximação de uma figura esguia e tímida.

Isabella Swan foi matriculada muito cedo, tendo em vista sua precocidade nos estudos e o desejo proprio de aprender mais, era ainda abastecido pela promessa de frequentar, junto com os primos, o colegio. Enquanto puderam estar na mesma escola, os garotas e garotas Cullen formavam uma especie de tribo especial e solitária; os melhores alunos e aqueles que recebiam as atenções especiais do corpo docente. Não é necessário comentar o efeito social que tal fato trazia; inevitável ser alvo de inveja e aversão por defeitos que nem possuíam: alcunhas como “metidos” ou “queridinhos”, brotavam com facilidade. Ninguem se atrevia a atacá-los diretamente; pudera, com um grande urso como Emmett Cullen por perto... Isso não importa, para Bella, tudo era um pouco mais fácil nessa época. Protegida pela presença sempre constante dos primos. Nos ultimos temposas coisas estavam sendo ainda mais complicadas. Ninguém parecia disposto a se aproximar dela; e isso estava se tornando mais grave. Por isso, o fato de ter repentinamente companhia a deixou momentaneamente confusa.

- Oi! – A voz meio grave, mas, animada e jovial ecoou baixinho bem perto de Bella quabrando a concentração da menina, que ergueu a cabeça velozmente, e meio aturdida, deixou cair o livro na grama. Desconcertada, a outra garota tratou de emendar sua entrada tão súbita.

- Desculpa! Mas, eu fiz todo o barulho possivel antes de me aproximar. – E sorriu amigavelmente. Para Isabella aquele não era um rosto conhecido; nunca o havia visto na realidade. No entanto, o emblema da escola aparecia sobre o peito da moça, mais ou menos de sua idade.

Isabella sentiu uma substancia invisível derrapando pelos olhos da desconhecida; uma substancia agradável, boa. Eram os instintos sempre aguçados lhe prestando auxílio onde a percepção social falhava. Por isso, devolveu inconscientemente a atitude afável com um deslumbrante sorriso. Eram duas almas boas se aproximando e isto meus amigos, é muito raro.

 - Edgar Allan Poe diz “Quando um louco parece completamente lúcido é o momento de colocar-le a camisa de força.” As pessoas dizem que sou louca, prefiro continuar assim. – A garota não entendeu nada daquilo que ela dizia com um sorriso nos lábios. Mas, ao contrario do que Bella esperaria de outros colegas, ela permaneceu, um gesto que pode ser facilmente interpretado por almas puras como um ato de bondade e confiabilidade.

- Gosto muito deles.

- Dos loucos? – A menina nova caiu numa gargalhada gostosa.

- Não, dos escritores dessa linha meio gótica... Não sei! É como se fosse, sabe, meio molhadas as estorias. – Era tímida, e o rubor no rosto denunciava isto.

- Hum. – Isabella suspirou profundamente, como se estivesse analisando profundamente o que ela dizia. Revirou o livro, examinou a capa e contracapa como se procurasse algo. Um ponto de interrogação se desenhou em sua testa, mas, não disse nada.

- Eu me chamo Layla. – Mais confortável com a situação depois da pequena conversa, a morena de cabelos encaracolados sentou a pouca distancia de Bella, dobrando a saia e sentando-se sobre as pernas.

- Sabe o que eu gosto nesses contos? – Isabella demontrou o mesmo entusiasmo que aparecia quando tinha algo novo para contar a Edward.

– Sempre há descrição de sons, ou das cores dos lugares, como aqui... – Ela abriu como uma grande conhecedora, no conto da casa usher, lendo um trecho..

“Durante todo um dia pesado, escuro e mudo de outono, em que nuvens baixas amontoavam-se opressivamente no céu...”

Terminada a leitura, Bella olhou sobre o livro para a nova amiga; e Layla poderia jurar que vira aquela mesma expressão num de seus pequenos primos após a noite de natal.

- Acho que entendo o que você quer dizer. Deixa eu ver? – Estendeu as mãos pedindo o livro de capa azul. Folheou e com a mesma destreza de Bella encontrou o que queria:

“Era realmente, uma bela noite de tempestade, singular e bizarra no seu horror e na sua beleza. Um redemoinho evidentemente percorria com toda a sua força a nossa vizinhança, pois havia freqüentes e violentas alterações na direção do vento; e a excessiva densidade das nuvens.”

Ambas riram e ali no lugar e momentos mais improváveis, nasceu uma amizade mais improvável ainda.

O sinal ecoou entre os jardins, anunciando o fim do intervalo. E Isabella começou a recolher metodicamente, seus pertences espalhados e os residuos do seu lanche.

- Deixe um pouco pras formigas. – Brincou a garota nova, com ar de troça. Mas, como sempre fazia, Bella interpretou ao pé da letra; voltou-se para onde estava e deixou cair das mãos uma poção do seu sanduíche que restava. Foi o bastante para Layla cair novamente em risos. Ela definitivamente gostara daquela menina.


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