Life Ways escrita por Vic Teani


Capítulo 4
Especial Um: Naruto


Notas iniciais do capítulo

Esses especiais narram o passado dos personagens



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  A lua não brilhava no céu naquela noite. Nuvens densas e escuras flutuavam calmamente, alheias ao que a pouco havia ocorrido bem abaixo delas. Poucas estrelas brilhavam, solitárias, no céu daquela trágica noite.

Numa pequena casa no meio de várias outras, dormia um garoto de nove anos.

  O garoto se mexeu na cama, e jogou o cobertor para longe por reflexo. Estava muito calor. Alguns minutos depois, ele abriu os olhos, vendo um teto que não era o que ele estava acostumado a ver.

  Estava tudo silencioso. Muito silencioso. Ele se lembrava de barulhos altos, gritos, uma forte dor no ombro direito... E depois de mais nada.

  Ele olhou em volta. Aquele quarto lhe era familiar, mas sem duvida não era um aposento de sua pequena casa. Era igualmente diminuto, mas mobiliado de um modo diferente. Uma cama, onde ele estava, uma pequena cômoda ao lado esquerdo, um armário pequeno, porem bem cuidado, e uma mesa, sobre a qual repousava uma muda de roupas.

  Notou então estar apenas com um short sujo, e se levantou para pegar as roupas, mesmo sem ter certeza se eram para ele. Sentiu uma forte dor no ombro direito, mas toda a luz do quarto era garantida apenas pela chama tremula de uma vela, então não conseguia ver o que lhe causava tamanho desconforto.

  Pelo menos a dor não era nada comparada a que ele se lembrava de ter sentido antes... antes de desmaiar, julgou ele, por não se lembrar de ter dormido.   Trocou de roupa e colocou o short velho dobrado em cima da cama. A julgar pelo tamanho, as roupas deveriam ser para ele, pois lhe couberam perfeitamente.

  Olhou novamente ao redor, absorvendo o máximo de detalhes do ambiente que a escassa iluminação o permitia observar. Uma porta simples ao lado dos armários indicava a única saída do quarto.

  Se aproximou da porta, e notou alguns arranhões na parte de baixo. Foi então que ele se lembrou onde estava. Aqueles arranhões foram feitos por Akamaru, o cachorro de Kiba, quando eles acidentalmente o prenderam no quarto do Inuzuka. Mas por que ele estava na casa de Kiba? Ele se lembrava de ouvir barulhos altos, gritos... Depois se lembrava de já estar fora de casa... Ele procurava alguma coisa... Ou alguém... Então uma forte dor no ombro direito...E depois mais nada.

  Quanto mais ele se lembrava do que a pouco – ou nem tão pouco – havia acontecido, mais nervoso ele ficava, pois tinha quase certeza que não se lembrava justamente do mais importante.

  Mas quem o havia levado para lá devia saber o que aconteceu, e foi com isso em mente que ele abriu a porta que dava para um pequeno corredor. O corredor tinha apenas uns cinco metros, e terminava na sala. Ali, ele podia ver algumas pessoas conversando, todas mulheres.    Na verdade, três mulheres. Duas de cabelo escuro, e uma terceira que ele não conseguia ver, mas sabia que estava lá por escutar uma terceira voz feminina desconhecida para ele.

  Ele também notou que nenhuma das três mulheres havia notado a sua presença. Ele foi se aproximando, para ouvir o que elas diziam.

  A principio, nada do que ouvia fazia sentido, talvez por causa do zumbido irritante que havia em seus ouvidos desde que havia acordado.

  Aos poucos o som desagradável em seus ouvidos foi sumindo, e ele começou a compreender melhor o que as mulheres falavam.

  - Não sei como uma coisa dessas pode acontecer – disse a morena mais velha – Tudo aqui sempre foi tão calmo.

  - E o ******, ele está bem? – o zumbido em seu ouvido ainda o impedia de ouvir algumas coisas.

  - Ele vai ficar bem. Retirei a **** que estava ******* em seu ombro, agora ele só sentira algumas dores desconfortáveis – disse a terceira voz.

  Ele então olhou para o ombro direito, e levantou a manga da camisa. Só então notou que haviam ataduras machadas levemente de vermelho envolvendo seu ombro.

  “O que aconteceu?” pensou ele, começando a ficar com medo.

  - E ela? – perguntou a mais nova – Não há realmente nada que possa ser feito?

  Um silencio tomou o lugar que devia ser ocupado pela voz da terceira mulher. Ele viu lágrimas saindo dos rostos das outras duas mulheres.

  - O garoto não corre nenhum risco – disse a terceira mulher, explicando – Mas já sua mãe... Foi mais grave. Não pude fazer nada. Me desculpe.

  E então as lembranças apareceram em sua mente, como se nunca tivessem saído dali. ***

  - E então Naruto – disse a mulher ao ver o filho entrando em casa – Se divertiu bastante?

  - Sim – disse ele – Quase venci o Kiba, mas ele pedala mais rápido do que eu.

  - Sempre há uma próxima chance – disse a mulher, sorrindo.

  -Eu vou vencer ele da próxima vez – disse Naruto.

  - Vai sim – disse a mulher – Mas só se comer toda a comida do jantar.

  Nesse momento, a lâmpada e a televisão de dez polegadas desligaram sozinhas, e a casa ficou completamente escura.

  - Outro apagão? – disse a mulher, indignada – Essas coisas estão ficando frequentes.

  Então, um barulho alto foi ouvido mais ao longe. A caixa de fósforos que a mulher havia pego caiu no chão.

  - Ah não – disse ela, com um olhar de pânico no rosto – Filho, onde você está?

  - Aqui mamãe – disse ele.

Ela notou que a voz vinha da direção da pequena mesa na cozinha.

  - Filho, fique em baixo da mesa e não saia de casa por nada, certo? – disse ela.

  - Por que mamãe? – perguntou ele.

  - Por que eu estou mandando! – explodiu a mulher, ciente de que esse era o único jeito de fazer o garoto a obedecer.

  Ela então correu até a janela e a abriu poucos centímetros, para confirmar o que estava havendo lá fora. Os gritos enchiam o ar misturados de forma heterogênea com o som dos tiros. Policiais de um lado, pessoas que ela conhecia, que ela via todos os dias, do outro.

  Ela notou que os policiais avançavam, e que um grupo de uns cinco deles se aproximava de sua casa.

  Ela fechou a janela quando confirmou que eles realmente estavam indo na direção de sua moradia.

  Abriu a porta da casa e saiu, decidida a impedir os homens. Depois de estarem lá dentro, nada os impediria de fazer algo, mesmo que sem querer, com seu filho.

  O garoto só conseguiu ver a porta se abrindo e sua mãe indo em direção a rua.

  Então, um barulho mais alto, por causa da proximidade, chamou sua atenção. Ele saiu correndo, abriu a porta da casa e disparou em direção a rua.

  - Mãe, onde você está? Mãe!

  Ele então viu sua mãe, caída no chão, uma poça de sangue.

  - Mãe! – gritou ele.

  Então, uma bala que não era destinada a ele o atingiu. Uma forte dor no ombro direito, e então, o impacto contra o asfalto frio. ***

  Ele desabou de joelhos. Não podia ser... Primeiro seu pai, pouco tempo depois dele nascer... E agora sua mãe...

  Um grito vinha subindo pela sua garganta, queimando tudo o que encontrava pela frente, abrindo caminho para escapar pelos lábios do garoto.

  E logo as três mulheres estavam olhando para ele, correndo em sua direção, e o garoto pode ver o rosto da terceira mulher. Mas isso não importava para ele na hora. Ele só continuou a gritar. Então, sua voz sumiu, ele se sentiu fraco, e desmaiou. ***

  Já haviam se passado duas semanas desde aquela trágica noite. A família de Kiba lhe adotara, e o clima continuava pesado. Ninguém havia superado aquela noite ainda. A mãe de Naruto era uma grande amiga da mãe de Kiba, e Naruto não saia do quarto desde aquela noite, quando acordou ali depois de desmaiar pela segunda vez.   Ele agora dormia no mesmo quarto que Kiba. Sua cama improvisada era só um colchão que estava guardado em um dos armários, até que eles pudessem comprar uma nova.

  Mas naquele dia ele estava sozinho no quarto, sentado com os braços em volta das pernas, ao lado da porta.

  O silencio reinava no interior do quarto, e fora dele também. O garoto estava perdido em seus pensamentos, e não sairia dali tão cedo.

  Fora Kiba, Naruto só deixava uma pessoa entrar no quarto. A mulher loira que estava na sala naquela noite, a mulher que lhe salvara, e que tentara salvar sua mãe.

  Aquela mulher sempre o fazia ficar mais animado, suas visitas não eram entediantes como ele achava que seriam. Ela é realmente uma boa pessoa, pensou ele, momentos antes da porta se abrir.

  Para sua surpresa, quem entrou era alguém que ele não via a algum tempo. Na verdade, havia duas semanas, desde a  noite da tragédia.

  Seu coração começou a bater mais rápido quando viu a pequena garota entrar no quarto. Seus olhos que mais pareciam duas esmeraldas pareciam enfeitiçá-lo.

  - Bom dia, Naruto-kun – disse ela, fechando a porta do quarto.

  - Sa-Sakura-chan – disse o garoto, ficando vermelho.

Sakura e Naruto se conheceram bem pequenos, e juntamente com Kiba formavam um trio inseparável. Naruto sempre nutriu um amor nem tão secreto assim por Sakura. Nem tão secreto por que todos já sabiam que ele gostava dela.

  - Você precisa sair desse quarto – disse ela, se sentando ao lado dele – Já faz duas semanas, você precisa continuar sua vida.

Naruto a olhou com uma cara de quem diz “eu sei, mas se fosse tão fácil...”. Não precisou verbalizar o que pensava para que Sakura o entendesse.

  - Não é fácil, mas é possível – disse ela – A vida continua. Temos que seguir em frente.

  Ela colocou a mão na cabeça do amigo, numa tentativa de consolo.

  Naruto olhou para ela, e teve a impressão de ver aqueles orbes verdes se aproximando... E os lábios dela tocaram rapidamente os dele. Rápido o suficiente para ele não ter entendido o que aconteceu antes dela se distanciar dele e se levantar sorrindo.

  - Esse vai ser o nosso segredinho – disse ela, sorrindo – Agora, me prometa que vai levantar e seguir em frente.

  A garota estava saindo do quarto quando Naruto a chamou.

  - Sakura, o que ouve com o seu cabelo? – disse ele, ao notar que o cabelo dela agora apresentava um tom rosado.

  - Eu prometi que pintaria se ficasse tudo bem com você – disse ela, sorrindo e saindo do quarto. ***

  Ela andava apressadamente pela rua mal asfaltada. O barulho das pedras atingidas por seus pés eram um dos poucos sons que se podiam ouvir ali. Amanhecera a pouco tempo, mas ela já estava pronta para mais um dia de trabalho.

  Apesar de acordar tão cedo, ela não estava mal humorada. Ela estava alegre, pronta para mais um dia trabalhando no que ela mais gostava de fazer.

  Tsunade tinha apenas trinta anos, era formada em medicina e psicologia, alem de ter conhecimentos em diversas áreas, como literatura, história, e falava, além do japonês, inglês, espanhol, e francês. Sabia tocar violino e piano, e sabia jogar tênis, além de saber esquiar.

  Era uma mulher culta, bonita, e simpática. Mas uma coisa ela ainda não havia conquistado: a independência financeira.

  Ela trabalhava em organizações solidárias, cuidando de pessoas de todas as idades.   Vinha de uma família que tinha um gigantesco império empresarial, e seu pai a sustentava, coisa da qual ela não se orgulhava. Mas por ter escolhido o caminho altruísta, não lhe sobrava muito tempo para um ter um trabalho remunerado, então essa era uma coisa com a qual ela teve que aprender a lidar. Recentemente ela havia conseguido um emprego de professora de alfabetização numa pequena escola publica, mas o salário não era o suficiente para cobrir os gastos com remédios usados em seu trabalho. Morava num pequeno apartamento, bancado pelo pai.

  Sua família lhe dizia que ela devia arranjar um emprego melhor, e ela sabia que eles estavam parcialmente certos, mas era aquele o caminho que ela escolhera.

  Seu cabelo loiro curto demonstrava sua determinação, e isso era uma coisa que ela realmente tinha. Do contrario, não teria conseguido enfrentar a pressão da família, e também não conseguira largar a vida no luxo para morar em um apartamento pequeno, vivendo na classe média.

  Caminhava apressadamente, porem com calma. Já andava rápido por reflexo, não conseguia andar muito devagar. Não quando no seu trabalho você tem que correr de um lado para o outro pegando remédios, atendendo doentes e feridos, sem tempo para descansar. A duas semanas atrás ela enfrentou um dos mais puxados dias de trabalho que já tivera. Por causa de um tiroteio na favela onde ela estava naquele instante, vários feridos tiveram que receber sua ajuda. Mesmo com os outros membros da organização onde trabalhava, eram poucos para atender o numero de pessoas que precisavam de ajuda.

  No momento ela se encaminhava para a casa de um dos seus pacientes, um garoto de nove anos que havia perdido a mãe naquela noite. Ele havia levado um tiro no ombro direito, mas graças ao trabalho rápido e competente de Tsunade, o garoto se recuperou e não teria seqüelas.

  Ela estava indo até a casa dele na verdade, só para acompanhar a recuperação, e também como psicóloga, já que ele ainda não tinha se recuperado emocionalmente.

  Tanta violência a deixava frustrada. É incrível como o ser humano tem a capacidade de se auto-destruir pensava ela. Mas é para tentar remediar a situação que eu estou aqui pensava, enquanto caminhava pela pequena rua.

  Se havia alguém por quem ela sentia ódio, eram as pessoas que cometiam violência, qualquer que fosse. Ela achava que as armas eram as invenções mais inúteis da humanidade.

  Sempre lhe perguntaram por que ela era médica se tinha tanta repulsa pela violência, e, trabalhando nisso, ela teria que lidar com vitimas de diversos tipos de agressões. A resposta sempre esteve na ponta da língua.

  - Do que adianta sentir repulsa por algo e não fazer nada para evitar ou remediar a situação? Aqueles que não gostam de uma coisa e não fazem nada para mudá-la são uns fracos e covardes, sem iniciativa.

  "Se você quer algo, tem que dar duro por isso. O que mostra o caráter de uma pessoa não é o quanto ela critica atitudes erradas, e sim o que ela faz para reverter isso. Reclamar não leva a lugar nenhum, não enche barriga, não traz solução. Agir sim."

  "Alem disso, minha maior recompensa é ver o sorriso daqueles que você ajuda, é saber que você ajudou-os a se reerguer, muitas vezes quando eles não tinham mais força nenhuma. Que você os faz sorrir quando isso parece impossível. Saber que eles jamais esquecerão daqueles que os ajudou no momento de necessidade, saber que existem pessoas que estão contando com você, ver o resultado de um trabalho bem feito."

  "Ver que quando você não tem mais força, o sorriso daqueles que você ajudou te motiva a seguir em frente. Ver que o seu desgaste se deve a algo que você fez para ajudar alguém, que se transformou na alegria de uma pessoa, ao invés de uma conta milionária no banco."

  Normalmente as pessoas ficavam caladas após ouvirem isso, ou a chamavam de maluca. Mas ela não se importava. Ela sabia que estava fazendo o que era certo, e o que os outros pensavam disso não tinha a menor importância. Foi com esses pensamentos em mente que ela chegou na pequena casa de seu mais novo paciente. ***

  Ele abriu a porta do quarto, motivado por sua amiga. Andou pelo pequeno corredor e se deparou com a sala lotada. Tsume, a mãe de Kiba, e Hana, a irmã do Inuzuka, estavam sentadas no sofá, enquanto Kiba e Sakura estavam sentados no chão vendo televisão.

  A alegria foi visível no rosto deles quando ele entrou na sala, mas não houve nenhuma reação exagerada. Logo, ele estava ao lado de Kiba e Sakura assistindo televisão.

  Foram ouvidas batidas na porta, e Tsume a abriu. Uma mulher loira entrou, vestindo um jaleco branco e carregando uma maleta.

  - Olha, mas o que temos aqui – disse ela, surpresa – Naruto saiu do quarto.

  - Tsunade! – disse Naruto, sorrindo e correndo até ela.

  - Então Naruto, vejo que melhorou, não é?

  - Uhum – disse o garoto.

  - Que bom – falou ela, sorrindo.

  Após isso se seguiram os exames de rotina, ela mandou Naruto fazer alguns movimentos com o braço para ter certeza que tudo estava direito, e o estado psicológico de Naruto também havia melhorado bastante.

  Ao fim dos exames, ela se levantou e olhou para o garoto.

  - Bom Naruto, acho que você não precisa mais de mim – disse ela – Você se recuperou bastante nos dois dias que eu fiquei sem vir aqui. Acho que não precisarei voltar aqui.

  Naruto ficou alegre e triste ao mesmo tempo.

  - Você não vai voltar, Tsunade-sama?

  - Você se recuperou muito bem – disse ela – E há outras pessoas que precisam de mim.   Mas quem sabe, algum dia, voltaremos a nos ver – disse ela.

  Naruto correu até ela e abraçou a abraçou. Lágrimas começaram a escorrer de seus olhos.

  - Agora, você tem que continuar seguindo em frente – disse ela.

  Naruto olhou para ela, as lágrimas pararam de correr.

  Era a segunda pessoa que lhe disse isso naquele dia.

  Ela sorriu, se despediu, e virou as costas, saindo da casa.

  Naruto observava aquela mulher indo embora, a mulher que o havia salvo, a mulher determinada, que o havia levantado quando ele não conseguia ficar de pé. E ele seguiria em frente, para mostrar que o esforço dela não havia sido em vão.

  Ele olhou para seus amigos, sua nova família, e percebeu que todos eles o ajudaram a se recuperar. Tsunade o havia posto de pé, eles o ajudariam a continuar a caminhar.

  E então ele percebeu que, apesar de tudo que havia acontecido, ele ainda tinha amigos, tinha uma família. Tinha um lar.


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