BELLA

A madrugada só não pareceu mais lenta porque eu me ocupei dos sonhos de Renesme.

Com sua mão seguramente presa em meu rosto, eu observava sua respiração pesada e lenta, seu corpinho imóvel aconchegado no meu colo, enquanto viajava com ela em suas ilusões.      

Renesme desejava sua família restituída.

Sim. Ela parecia entender o fato de seus pais não estarem juntos. E expressava em seus sonhos toda essa compreensão, e o desejo de reaver o que nunca teve.

Suas fantasias pairavam ao redor do meu rosto e do rosto de Edward. Nós dois como um casal, ela entre nós, sorrisos felizes.

Não pude evitar a compressão no peito. Aquilo era tudo que eu desejava também. E depois de ter ouvido as palavras de Jasper, não me impedi de ter esperança.

Eu estava decidida a por as cartas na mesa. Iria conversar com Edward e contar-lhe tudo que sentia. Tentar obter seu perdão. O medo de ser rejeitada era grande, mas eu não poderia mais me deter. Se era verdade que ele ainda me amava, mesmo ressentido ele me ouviria e consideraria minhas palavras. Eu sentia que tinha chance.

Então, abrigando minha decisão em meu coração paralisado, deitei minha filha em seu berço e desci as escadas, me dirigindo para a varanda.

Esperei ainda até pouco antes do amanhecer, quando visualizei ao longe Carlisle, Rosalie e Emmet, correndo em direção à casa.

Meu coração se comprimiu desagradavelmente sob a percepção daqueles que faltavam.

Respirei fundo.

Em meio segundo todos estavam ao meu lado.

- Bom dia Bellinha – Emmet me cumprimentou com seu sorriso debochado, arrastando uma alegre Rosalie pelo braço.

- Bom dia Emm, bom dia Rose...

Ela simplesmente correspondeu ao meu sorriso e seguiu com seu marido para dentro da casa.

- Sua feição está tensa. – Carlisle falou, pousando a mão em meu ombro – Aconteceu alguma coisa com Renesme?

- Não... – Respondi num murmúrio.

Carlisle analisou meu rosto por um momento fugaz e sorriu.

- Ele estava logo atrás de nós... Já deve estar chegando. – Falou simplesmente.

Eu sorri com sua perspicácia. E logo ele já não estava presente.

Quando minha atenção se voltou para o caminho por onde eles surgiram, senti meus pés pesados como chumbo. Eu estava paralisada. Literalmente.

Minha mente mandou o comando “medo” para meu peito, comprimindo-o, em uma reação puramente reflexa do que eu via. A visão que arruinaria meus planos.

As nuvens se afastaram um pouco no céu, produzindo um halo de luz pálida que refletiu-se nos rostos contentes que caminhavam em minha direção. Meus olhos deslizaram, seu meu comando consciente, até suas mãos entrelaçadas.

Reaja! Se mova! Faça alguma coisa! Me ordenei.

Mas minha forma imóvel não obedeceu, e eu fiquei ali, assistindo incrédula ao evidente começo de um novo romance.

Eles caminharam até mim despreocupados, sem nenhuma pressa, e parecendo não notar a minha presença até estarem próximos o suficiente.

- Bom dia, Bella. – Edward falou, o olhar entre surpreso e confuso.

- Bom dia, Bella. – Zaniala repetiu a saudação de seu companheiro, claramente constrangida.

Eu demorei mais que o realmente necessário para responder ao cumprimento, e vi nos olhos de Edward que ele percebeu minha hesitação.

- Bom dia... – Minha voz falhou ridiculamente.

Zaniala deu dois passos para frente, ainda segurando a mão de Edward. Mas ele não se moveu, olhando meus olhos com intensidade, como que perscrutando meus pensamentos.

Estreitou o olhar e meneou a cabeça para o lado, parecendo tentar ler minha expressão que deveria ser de puro choque. Mas quando Zaniala voltou-se para ver o motivo da súbita paralisia dele, sua feição tornou-se imediatamente tranquila enquanto retomava o passo.

Eu continuei ali, congelada, e não fui capaz de disfarçar minha decepção quando ele voltou seu rosto para me dar uma última olhada, seus olhos trazendo patente confusão no brilho dourado.

Quando eles sumiram escada acima, senti todo meu corpo estremecer violentamente, e corri o mais rápido e para mais longe possível, fugindo da dor.

Então era tarde demais?

Ele tinha o direito de seguir com sua vida, afinal eu tinha abandonado ele.

Mas se ele ainda me amava...

Recordei as palavras de Jasper e estaquei.

“Edward acredita que você não o ama. Que ele a ama sem ser correspondido.”

“Edward acredita que você não o ama.”

Ele acreditava que eu não o amava mais...

Provavelmente por isso ele estava tentando viver sem mim.

Óbvio!

Se eu falar a ele... Se ele souber da verdade... Talvez esse pesadelo acabe e nós dois possamos nos entender finalmente.

Como eu fui estúpida.

Corri de volta no limite de minha capacidade. E não me detive ao chegar na casa. Subi direto para o quarto dele e entrei como uma lufada de vento, me chocando contra sua forma de pedra.

Edward me segurou nos braços firmemente, surpreso pela minha atitude.

Eu tentei articular alguma palavra, mas me perdi em seus olhos por tempo suficiente para perder minha determinação.

Me soltei dele relutante.

- Bella? – Ele sussurrou.

Seus olhos traziam milhões de perguntas que eu desejava responder.

Respirei fundo, sentindo meus joelhos protestarem ao nervosismo, e abri a boca para falar.

EDWARD

Quando chegamos à mansão, o estupor ainda tomava conta de mim.

Era como se eu fosse incapaz de reagir a qualquer coisa externa. Como se o centro de minha existência agora fosse Zaniala.

Era uma sensação perturbadora, mas que eu era incapaz de impedir.

E enquanto meu coração latejava um alerta de perigo, minha mente anuviava qualquer reação, me acorrentando àquela sensação de comprometimento.

Eu estava absolutamente ciente da presença de Bella à varanda da casa. Mas a sensação de pertencer à mulher a quem eu atrelava minha mão naquele momento era tão esmagadora, que todo o resto se tornou pequeno demais para valer algum ato adverso.

Caminhamos juntos até ela.

Desejei intimamente ser capaz de ignorar a emoção que senti ao ver Bella parada nos fitando com evidente surpresa. Mas eu estava muito orgulhoso de mim mesmo por causar-lhe essa confusão. Espantei-me com o sentimento mesquinho. Lutei contra ele por um milésimo de segundo, mas perdi a batalha.

- Bom dia, Bella. – Saudei-a, contendo minha vontade de questionar seus pensamentos.

- Bom dia, Bella. – Zaniala espelhou minha fala, o tom contido.

Bella demorou muito mais que o imprescindível para responder à nossa saudação, certificando-me de que ela hesitava.

Qual seria o motivo?

- Bom dia... – Sua voz falhou, aumentando minha curiosidade.

Zaniala deu dois passos para frente, ainda segurando minha mão. Mas eu não consegui me mover, olhando os olhos rubis de Bella com intensidade, tentando descobrir o que se passava em sua mente.

Porque ela parecia contrariada? Estaria com ciúmes?

Meu coração se aqueceu com a remota possibilidade apenas para esfriar-se bruscamente com minha repreensão intima.

Não! Ela não me ama! É com Zaniala que eu devo me envolver.

Estreitei o olhar e meneei a cabeça para o lado, na tentativa de ler a motivação de sua expressão de choque. Mas Zaniala voltou-se a mim, me dando apenas o tempo necessário para relaxar minha feição e retomar o passo.

Não pude evitar uma última olhada para Bella antes de subir as escadas.

Seu rosto estava sombrio, e trazia um ar de decepção que eu não compreendi.

No momento em que Zaniala se afastou de mim meia hora depois, a realidade pareceu explodir à minha volta como uma bomba.

Várias sensações me dominaram. Como se eu tivesse estado em uma bolha, protegido de tudo que eu sentia por Bella, e de repente ela tivesse estourado.

O amor, o desespero, o desejo, a adoração, a necessidade de tê-la, me alcançaram agonizantes.

Senti meus pulmões vazios, a falta de oxigênio a me sufocar como se respirar me fosse vital.

Tudo que eu podia desejar naquele instante era que Zaniala estivesse perto de mim novamente para me abrigar naquela bolha, suprimindo toda a minha angústia pelo amor de Bella.

O que estava acontecendo?

Ao lado de Zaniala eu me sentia confortável, seguro, pacífico. Como se existisse um mundo utópico e alternativo, onde meu sentimento por Bella não existisse. Toda a dor e sofrimento eram encobertos pela satisfação de ter a espanhola em meus braços.

Como uma amnésia ou... Uma lavagem cerebral.

Neste momento eu estaquei.

Por que eu me sentia em uma névoa, esquecia de meus sentimentos e focava apenas naquela mulher quando a tinha em meus braços?

Não consegui terminar o raciocínio.

Um baque violento me fez perder toda a concentração.

Bella havia entrado em meu quarto com a impetuosidade de um furacão, se chocando contra mim.

A segurei firmemente nos braços, aturdido por sua atitude.

Notei-a novamente hesitante, e permiti que se soltasse de mim.

- Bella? – Sussurrei confuso.

Ela pareceu remoer seus pensamentos em algum dilema intimo.

Esperei.

Bella respirou fundo e abriu a boca para falar, enquanto eu mal me continha em minha posição.

- Você não precisa seguir em frente... – Falou ofegante – Não existem motivos para que desista.

Eu ainda tentava ordenar suas palavras numa sequência compreensiva em minha mente, quando ela despejou, impiedosa, as palavras que eu tanto desejei ouvir.

- Eu ainda te amo, Edward! – Ela praticamente gritou, talvez para me fazer reagir, porque eu estava completamente paralisado em minha estupefação.

- Eu ainda amo você, você está me ouvindo? – Ela perguntou entrando em desespero – Fala alguma coisa!

Eu queria, mas não conseguia responder.

Estranhamente o estupor voltou, me envolvendo numa calmaria densa. Inevitável.

Senti meus olhos se fecharem, pesados. Como se eu fosse novamente humano, capaz de dormir ou, desmaiar.

Um silêncio obscuro me tragou, e apesar de me manter terrivelmente consciente, eu não encontrei minha voz para falar, minhas pernas para me mover, ou meus olhos para enxergar o que houve depois. Apenas a negritude me era visível. Uma escuridão desesperadora que me afastava do momento mais desejado de minha existência.