The Order Of Hunters escrita por Wyvern


Capítulo 2
Uma Estranha Reunião




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            Surpresa era um eufemismo do que Bryce sentira ao ver a carta. A mesma carta que apertava no punho fechado enquanto atravessava o corredor, torcendo o rosto ao ver os mocassins perfeitamente lustrados sendo cobertos de sujeira a cada passo que dava. Porém, essa não era a preocupação que remoia sua mente, e sim o motivo para ter sido chamado até ali, o Metropolitan Museum of Art, no meio da madrugada.

            Primeiramente, pensou que se tratava de um problema financeiro, pois a família Sonmac tirava parte de sua fortuna de projetos com museus, mas seu pai era quem deveria ter sido chamado, e não ele. Em raros casos tinha que se meter em algum negócio, e em nenhum deles era realmente necessário. Mesmo assim, ele fora. Não ousara levar um guarda costas consigo, temendo chamar atenção, mas o taser[1] escondido no cós da calça e embaixo do casaco social era suficiente para protegê-lo de algum ataque repentino.

            Seguiu até o fim do corredor destinado, rumo à única porta que emanava uma tênue luz debaixo da madeira. Não precisou ler o que estava escrito no portal, sabia que era a sala do curador, de modo que não hesitou em entrar. A cena não era exatamente o que ele esperava. O escritório era pequeno, tendo apenas uma escrivaninha, um armário e cinco cadeiras. Atrás de uma mesa abarrotada de livros, um rosto cansado se ergueu, um breve sorriso se abrindo entre a barba branca e criando mais rugas em volta dos olhos. Bryce reconheceu o curador do museu, o Dr. Richard Doyle. Entretanto, as pessoas que ocupavam três das quatro cadeiras diante da mesa eram completos desconhecidos.

 

            - Senhor Sonmac! – disse o curador, gesticulando para que sentasse. – Estávamos esperando-o para começar. Deixe-me apresentar os outros... Esta é Jasmine Ridefort.

 

            Doyle apontou para uma jovem com talvez a mesma idade que Bryce, que lhe respondeu com um sorriso um pouco exagerado. Era difícil não se impressionar com seu corpo curvilíneo, ainda mais com as roupas não muito sociais de que usava. Seus cabelos negros caíam como uma cascata lisa pelas costas bronzeadas. Sua face era simétrica, com lábios fartos, um nariz levemente arrebitado e olhos azuis levemente delineados por sombras cinzentas. Parecia o tipo de moça que se via em uma revista de moda ou em filmes.

 

            - Alice Tremelay. – continuou o curador, apontando para a pessoa ao lado de Jasmine.

 

            Alice era de longe a mais nova naquela sala, parecendo que nem saíra da puberdade ainda. Suas roupas – calças jeans com rasgos, tênis comuns e um casaco coberto de detalhes – pareciam-se mais com as de um garoto das ruas, mas não fez nenhum comentário. Seus cabelos eram lisos e loiros, mas com uma mecha rósea se sobressaindo à frente. Cobertos de sombras escuras, seus olhos eram azuis claros, quase como pedras de gelo, porém não eram frios. Não se podia dizer o mesmo da última pessoa da sala.

 

            - E Luke Beaujeu.

 

            O jovem não sorriu, limitando-se a lhe lançar um olhar dos olhos escuros por entre os cachos negros como petróleo que caíam até os ombros. Usava roupas comuns, nada chamativo, mas parecia irradiar uma aura assustadora. Depois de analisá-lo de cima a baixo, Luke abriu um quase sorriso na face pálida e pousou o queixo na mão. Não fora um gesto de tédio, pois ele deixara visível o cabo de um punhal saindo da manga de seu casaco por menos de um segundo. Era um aviso.

            Bryce engoliu em seco, agradecido por sentar-se entre as duas garotas. Por alguns segundos, Doyle apenas mirou os quatro, sem falar nada, o que aumentava a impaciência dele. Finalmente deu um pesado suspiro e voltou a sentar-se na mesa. Folheou o dos livros em silêncio, e foi seguido pelos demais. A tensão era quase esmagadora. Por fim o curador deixou o livro aberto a sua frente e os mirou por trás das grossas lentes dos óculos.

 

            - Vocês devem estar se perguntando o que fazem aqui.

            - É, vai falar ainda hoje? – interrompeu Alice, mas o homem não se irritou.

            - Sim, minha filha. É um pouco difícil começar... Mas o que vocês sabem sobre os Cavaleiros Templários?

            - Era uma ordem, certo? – tentou Jasmine, pensativa.

            - Correto. – aprovou Doyle, estendendo o livro e mostrando uma ilustração de um homem. – Foi uma ordem militar fundada em 1118 por Hugo de Payens, com a ajuda de alguns cavaleiros e do rei Balduíno II de Jerusalém. No começo, eles deviam proteger os peregrinos que iam para a Terra Santa. Dez anos depois, foram aprovados e protegidos pela Igreja Católica. No auge das Cruzadas, os Templários se tornaram ricos e poderosos. Recebiam apoio de toda a Europa para sua causa para com Jerusalém.

            “Isso durou até 1307, quando o rei Filipe IV de França, juntamente com o Papa Clemente V, ordenaram a volta de todos os Cavaleiros. Quando chegaram, foram presos e torturados, acusados de heresia. Cada Templário foi torturado até admitir sua culpa, e então mortos de diversas maneiras, das quais não é importante falar. Com o fim da ordem, o rei e a Igreja dividiram os tesouros deles e cuidaram para que eles fossem esquecidos.”

 

            - Ok, foi uma ótima aula de historia, - disse Bryce, irritado. – mas o que isso tem a ver com esse chamado urgente do senhor? Ainda mais no meio da noite, com pessoas totalmente desconhecidas?

 

            Doyle sacudiu a cabeça decepcionado, mas em vez de responder, fez outra pergunta. – Se os Templários eram aliados da Igreja e do rei, por que foram executados?

            - Intimidação. – respondeu Luke calmamente, como se assassinatos e ordens antigas fosse um assunto comum. – Os Templários tinham poder demais, então resolveram se livrar deles antes que se dessem bem.

            - Exatamente. – concordou Doyle, soturno. – E o motivo de tal poder é o que os trouxe aqui hoje.

 

            Um silêncio pesado caiu na sala. Bryce sentou-se um pouco mais na borda da cadeira, ansioso. Jasmine começou a mexer em uma mecha de cabelo, impaciente, e Alice sentou-se mais ereta. Até mesmo Luke levantou um pouco os olhos. Apesar de satisfeito, o curador manteve-se sério.

 

            - E se eu lhes dissesse que a Ordo Pauperum Commilitonum Christi Templique Salominic, a Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, a Ordre du Temple, a Ordem dos Cavaleiros Templários, não foi extinta? – seu tom de voz abaixou. – Se eu lhes dissesse que sou um deles? O último deles, e que o segredo de todo o poder deles estivesse prestes a passar para vocês quatro?

 

            Muitas respostas passaram pela mente de Bryce. Eu iria rir da sua cara, eu iria mandá-lo para um hospício, eu iria te arrebentar por ter me acordado às três da madrugada e me trazer aqui pra tirar uma com a minha cara! Mas não parecia que se dissesse qualquer coisa assim, cometeria um grande erro. Respirou fundo, tentando entender onde aquilo levaria? Não podia ser possível que esses Templários ainda existissem, não é? E se existissem mesmo, não queria se envolver com algo que causara mortes e torturar sem números séculos atrás. E com esse pensamento, a resposta lampejou em sua cabeça.

 

            - Eu perguntaria por que você escolheu a nós, entre tantas pessoas.

 

            Finalmente o velho Doyle sorriu, e soube que tinha tomado a decisão certa. – Porque vocês, meus caros, são descendentes dos quatro maiores Grão-Mestres dos Templários. Bernard de Tremelay, o Corajoso; Gerard de Ridefort, o Sábio; Guillaume de Sonmac, o Poderoso, e Guillaume de Beaujeu, o Impiedoso.

            - E por que está nos contando isso? – disparou Alice, desconfiada.

            - Porque se eu morrer, o segredo dos Templários morrera também. Preciso passá-lo para uma nova geração. – abaixou a cabeça enquanto falava. – Apesar de ter vencido, nosso inimigo ainda procura nosso segredo. Pode ter ficado menos influente, mas está muito mais desesperado para conseguir.

            - E qual é esse tal segredo? – perguntou Jasmine, confusa.

            - Crianças, não haverá honra se descobrirem assim. Devem empreender a busca que os guardiões do Segredo eram submetidos e desvendar as pistas para chegar ao seu destino.

            - Uma caça ao tesouro? – Bryce estava incrédulo. – Quer que façamos uma caça ao tesouro pelo país ou...?

            - Sr. Sonmac, nenhum tesouro se compara ao poder que aguarda aquele que completar a busca. Ela testará suas capacidades, sua lealdade e sua coragem ao longo do mundo. Apenas os mais dignos conhecerão o maior segredo da humanidade.

 

            Bryce ficou completamente calado. Aquele homem não estava brincando, por mais louco que aquilo tudo parecia.

 

            - E por onde começamos? – indagou Alice, parecendo ansiosa.

            - Por isso. – Doyle tirou um pequeno pedaço de uma espécie de papel extremamente antiga. Um pergaminho muito bem conservado.

 

            O que é?

            Quando o Sol se levanta, curva-se sobre ele

            O que é?

            Onde os mortos se libertam ele reside

            O que é?

            Onde o Tempo teme ir aguardará

            O que é?

 

            - Mas o que é isso? – Bryce levantou o braço e o curador lhe entregou o pergaminho. Aquelas palavras não faziam nenhum sentido para ele, e ao que parecia, para nenhum dos outros.

            - Esta é toda a ajuda que posso dar a vocês. – Doyle levantou-se com dificuldade e rumou para a porta enquanto o papel passava para cada um dos jovens ali. – E lembrem-se: o Inimigo não hesitará em impedir sua busca. Não confiem em ninguém, só podem contar uns com os outros.

 

            Eles só se deram conta de que o curador se fora quando a porta bateu com força na parede e seus passos ecoaram pelo corredor. Bryce dobrou o papel e guardou no bolso interno do casaco, enquanto levantava-se junto com os outros e rumavam para a porta. Para um homem velho, Doyle se movia rápido, e já estava quase no hall do museu quando os jovens o avistaram. Alice, uma boa corredora, estava na frente, mas estancou apavorada ao notar um pequeno ponto negro descendo em arco na direção da cabeça do curador.

 

            - Cuidado! – gritou, chamando a atenção do velho.

 

            Doyle percebeu tarde demais o projétil que vinha em sua direção. A bomba explodiu ao se chocar contra seu corpo, transformando-o em uma confusão de sangue, carne, ossos e fumaça. O impacto foi ensurdecedor. Apesar do pavor, a garota tentou correr até o homem, mas uma mão branca a segurou. Luke a puxou para trás, olhando para as janelas, frenético. Jasmine e Bryce também estavam recuando, confusos.

 

            - Ainda não nos viram. – disse o jovem de cabelos negros, soltando Alice e tomando a frente enquanto se afastavam. – Temos que sair pelos fundos.

 

            Chamas se alastraram, mas os alarmes de incêndio logo entraram em ação. O som foi um aliado e empecilho para os quatro, pois disfarçava seus passos pelos corredores, mas podia fazer o mesmo se alguém os seguisse. Luke ia na frente, um punhal na mão esquerda, guiando e Bryce ia atrás, agarrado ao seu taser. Por fim chegaram a uma das saídas usadas pelos funcionários, pois com certeza as principais e de emergência estariam sendo vigiadas, e saíram nos fundos do museu. A bomba fora precisa, pois as poucas chamas já estavam sendo apagadas graças aos alarmes. Tudo estava dominado por um silêncio mortal, de modo que o som das rodas cantando sobre a estrada foi claro. Tensos, os quatro ficaram contra a parede, mas o furgão negro passou pela rua lateral antes de desaparecer, sem notar-lhes. Mas só relaxaram cinco minutos depois.

 

            - Ok, - disse Luke, como se aquilo fosse uma operação militar. – precisamos nos separar por um tempo e reagrupar sem que desconfiem.

            - Eu sei onde. – Jasmine pegou uma caneta do bolso e anotou o endereço na palma das mãos de cada um. – Podemos ir lá durante a tarde, vai ter muita gente e ninguém irá desconfiar.

            - Tudo bem, - disse Bryce, ainda tenso. – enquanto isso eu vou tentar descobrir o que esse poema significa.

 

            E assim decidido, cada um rumou de volta, por caminhos separados, na esperança de despistar quem quer o que atacara o museu. Não foi uma noite fácil para esses quatro jovens.

 

                                   X

 

            Não era comum para Bryce se atrasar, mas realmente não queria ser o único a esperar naquele lugar estranho pelos outros. Queria pelo menos ter certeza de que viriam. Depois do ocorrido na noite anterior, pensou seriamente em apenas esquecer aquela conversa e viver sua vida normalmente, mas a morte do curador dizia que jamais poderia fazer isso. Como Jasmine dissera, a essa hora o Starbucks estava lotado de jovens, a maioria mais nova do que ele, mas não se importou. Encontrou-os, todos os três, em uma mesa mais afastada. Alice estava como sempre estarrada na cadeira, devorando sem piedade um bolinho, enquanto Jasmine bebericava um café e Luke permanecia parado e calado, mais parecendo uma estátua esculpida na cadeira.

            A reunião dos últimos Cavaleiros Templários, pensou ironicamente, sentando-se ao lado das garotas, como sempre fazia.

 

            - E aí? – perguntou Alice entre mordidas. – A gente achou que você não vinha.

            - Desculpe pelo atraso. – se limitou a dizer. – Eu consegui descobrir de onde veio o poema que Doyle nos entregou.

            Como ninguém respondeu, Bryce continuou. – É uma passagem do Livro dos Mortos dos egípcios.

            - Já desconfiava. – disse Luke, puxando o papel que ele segurava na mão. – Deve ser uma pirâmede, pela última parte. O Homem teme o Tempo, e o tempo teme as Pirâmides; e uma grande, pois o sol se curva diante dela.

            - E sobre a parte de “Onde os mortos se libertam” e o que tem lá? – meteu-se Jasmine, pegando o papel e o examinando como se fosse aparecer uma nova linha explicando.

            - Por que tem tantos “O que é?” – perguntou Alice, tirando os farelos das roupas.

            - Não sei. – Luke deu de ombros.

            - Podemos tentar descobrir isso enquanto procuramos a pirâmide para ir. – disse Bryce. – Depois da morte de Doyle... Eu acho que não vai demorar muito para que os caras venham atrás de nós também.

            - Então a gente devia se apressar. – explicou Jasmine, entendendo.

            - Sim. – concordou. – Acho melhor nos vermos de novo em uma hora. Melhor nos prepararmos para uma viajem longa, segundo Doyle..

            - Legal. – disse Alice. – E que comece a busca dos Templários!             “Próxima parada, Egito!”

 


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Notas finais do capítulo

Taser: Uma arma de eletrochoque é uma arma capaz de liberar uma descarga elétrica a fim de imobilizar uma pessoa momentaneamente, constituindo-se assim como uma arma não-letal.



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