- Sam, deixa o laptop aí quietinho e vamos. Amanhã a gente trata disso. Eu quero ver gente viva. Dois banhos e parece que ainda estou cheirando a túmulo.

Sam olha para um pequeno despertador na mesa de cabeceira entre as duas camas de solteiro do quarto de motel. Exatamente 21:03.

Benjamin olha para um pequeno despertador na mesa de cabeceira entre as duas camas de solteiro do quarto de motel. Exatamente 21:03.

Um pequeno sismo se faz sentir. Nenhuma surpresa. Afinal, estavam no Oregon.

- Pai, o senhor me chamou novamente de Sam. Sabe o quanto isso me incomoda. Tio Samuel morreu antes mesmo de eu ter nascido.

Dean olha ao redor. O mesmo quarto de motel. Mas, é um adolescente quem está usando as roupas e o laptop do Sam. Bem, não literalmente as mesmas roupas, já que o garoto não chegava nem perto de ter a altura e o corpo trabalhado do irmão. Um garoto baixo e magrelo. Que usa óculos e tem espinhas. O tipo que costuma ser zoado pelos colegas do colégio. O típico nerd. E o pior, chamou-o de PAI.

- Filho? Benjamin?

- Claro, pai. Quem mais? Ou é verdade o que a mãe fala? Que o senhor tem um monte de filhos pelo país inteiro?

- Não, que eu sempre fui cuidadoso. E espero que você também seja cuidadoso quando sair com as garotas. Mantenha sempre duas ou três camisinhas na carteira.

- Não é preciso, pai. Eu nunca saio mesmo com nenhuma garota.

Dean olha para o garoto demoradamente e não fica surpreso com o que escutou.

- Não. Não é meu filho. Não pode ser.

- Que foi, pai?

- Nada. .. Filho. .. .. Filho, o que você falou do seu tio Sam?

- Nada. Só que ele morreu.

- E .. , quando foi que isso aconteceu?

- Ué. O que eu sei é o que o senhor mesmo me contou. O tio Sam morreu no dia do aniversário dele de 14 anos, quando houve uma explosão nas instalações de gás da casa do vô John. Morreram a vó Mary e o tio Sam. O senhor também disse que foi por isso que o vô John começou a beber.

Dean ia dizer alguma coisa, mas perde totalmente o fio da meada quando toma consciência do que acontecera com seu próprio corpo.

Ao olhar para baixo, Dean estremece, com muito medo do vai ver em seguida no espelho. Estava .. gordo .. muito gordo .. e flácido. O espelho mostra um quadro ainda mais desolador. Seu rosto. Os traços eram os mesmos, mas estava envelhecido. A idade do filho, alguma coisa entre 16 e 17, o fizera temer que estivesse com 36-37 anos, mas ele parecia ainda mais velho. A linha dos cabelos recuara. Apresentava uma calvície acentuada. Como pode acontecer? Seu pai, John, tinha cabelo farto. Ah! Claro. O pai de Mary, Samuel, era complemente calvo.

- Filho, você lembra de quando seu pai estava com o corpo em forma?

- Não lembro não, pai. Lembro de você já assim. Também, comendo bacon cheeseburger e, pelo menos, uma cerveja todo dia; e mais as muitas cervejinhas do fim de semana. A única surpresa é que não esteja enorme de gordo.

- E sua mãe? Nem para me forçar a ter uma alimentação mais saudável e a fazer mais exercício físico.

- Acho que ela desistiu. Acho que foi por isso também que ela trocou o senhor pelo Logan.

- A Lisa me deixou?

- O senhor está bem, pai? O senhor está pálido. Tomou seu remédio para pressão alta? Vou pegar um copo d’água.

Dean disfarçava mal o quanto era vaidoso. Ele também sempre fora muito orgulhoso de sua beleza. Tinha perfeita consciência do quanto essa beleza facilitava suas conquistas. Nunca precisara realmente se esforçar. Às vezes o mais difícil era manter as mulheres afastadas. Fora assim toda a sua vida. Não estava preparado para o que o espelho lhe mostrava. Decadência física.

Já estava em dúvida se a pior coisa que o Trickster poderia aprontar era tê-lo transformado em gay.

- Aqui, pai. Toma esse remédio.

- Filho, o que viemos fazer aqui nesta cidade?

- O senhor veio notificar um cliente que a seguradora onde o senhor trabalha concluiu que existem indícios de fraudes no processo e que o pagamento do prêmio está suspenso.

- E porque mesmo eu trouxe você?

- Você está mesmo estranho hoje, pai. Eu estou de férias e esse é o fim de semana que eu passo com você. Além disso, a mãe e o Logan foram comemorar os dois anos que estão juntos, em Barcelona.

- Barcelona? Então, eu sou um vendedor de apólices de seguro e o seu padrasto passa os fins de semana em Barcelona com sua mãe?

- É um bom resumo, pai.

- Ele é um bom padrasto para você?

- Pai, você vive perguntando isso e depois fecha a cara quando eu digo que sim. Parece que você preferia que ele me tratasse como um cachorro. Ele acabou de comprar um home theater para instalar no meu quarto. Me deu esse laptop novo. Fez ..

- Tá bom. Já entendi que ele tenta COMPRAR você com essa parafernália eletrônica toda. Mas o que eu perguntei é se ele dá ATENÇÃO, se dá AMOR para você.

- Pelo menos ele TENTA. Não é como você, que nem isso faz. Ele sempre me chama para sair com ele e a mãe. Não é culpa dele se eu é que não gosto de atividades ao ar livre. Não gosto de esportes. Não gosto de correr. Não gosto de suar. Eu gosto de ficar na minha. No meu quarto. Conectado. Teclando com gente que tem os mesmos interesses que eu.

Dean começa a achar que o tal padrasto é que não merece ter que agüentar o MALA que é seu filho nerd. Se é que é mesmo seu filho. 

O que está vendo neste laptop?

- Um site muito legal. Ghostfacers. São dois sujeitos INCRÍVEIS, pai. Eles sabem tudo sobre fantasmas e manifestações sobrenaturais. São os melhores. Queria muito conhecer os dois.

Dean olha para o filho como quem olha para um caso perdido e pensa: ‘Não. Decididamente não pode ser meu filho. Eu devia ter exigido que a Lisa fizesse um exame de DNA.’

Benjamin fecha os programas e na tela do laptop surge um wallpaper que mostra Lisa, Ben e .. o Trickster?

- Benjamin, quem é esse sujeito com você e sua mãe?

- Pai! Tá cansado de saber que esse o Logan.