Utopia escrita por dastysama


Capítulo 16
Capítulo 16 - Raízes Profundas




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Bill simplesmente não conseguia escrever. Mesmo que tudo parecia estar propício para que sua criatividade fluísse, ele tinha muitas coisas a pensar. Os sonhos ficavam cada vez mais reais e ele não os esquecia facilmente como sempre acontecia com sonhos “normais”.

E o pior era que o rosto de Johanna não saía de sua cabeça, como se segundos atrás ela estivesse na sua frente e sua memória continuasse tão viva. Mas ele havia dito a si mesmo que era melhor esquecer tudo, afinal todos dos sonhos não passavam de pessoas que não existem mais. Ele não precisava ficar revivendo aquele passado que não era dele.

Com um suspiro, deixou todas as preocupações de lado e pôs a escrever no caderno algumas letras possíveis para músicas. A maioria ele rabiscava, percebendo que ficava sem nexo ou pior ainda, sem vida. Então ele pensou por que não colocar um pouco do que está acontecendo nelas? Afinal era algo surreal, ótimo para uma letra de música.

– Você anda estranho – Tom disse aparecendo do nada na varanda, fazendo Bill se sobressaltar – O que foi?

– Quê? – Bill disse pegando o caderno antes que caísse no chão – Não há nada demais. Estou só tentando escrever alguma música e aqui na varanda é um ótimo lugar.

– Eu sei, mas você anda diferente, está falando menos e todo mundo percebeu isso já que geralmente você não cala a boca – Tom disse se encostando a um dos pilares da varanda, mas olhando cauteloso, com medo que estivesse podre e caísse.

– Bem... acho que aqui é um lugar mais para pensar do que falar – Bill disse suspirando, temeroso se contava algo a Tom, afinal ele era seu irmão gêmeo e sabia que ele estava agindo de forma estranha não por que o estava observando, mas por que sentia. Ambos tinham uma ligação forte – Você não se sente estranho de estar aqui?

– Como assim? – Tom perguntou confuso – Sei que é diferente do que estamos acostumados, mas não é ruim.

– Não o lugar em si, mas como se houvesse algo mais... é que eu ando sonhando com coisas estranhas. Como se eu já tivesse vivido nessa casa antes, em alguma época antiga.

– Deve ser a Biene influenciando você com esses assuntos dela. Cada vez que vejo tem mais livros velhos em cima da mesa – ele disse rindo.

– Mas os sonhos são muito reais, eu me lembro de muita coisa deles e eles parecem nunca ficar vagos. Você não tem sonhado com algo relacionado a isso? Afinal, várias vezes já sonhamos com as mesmas coisas.

– Não – Tom disse dando de ombros pensativo – Não tenho sonhado com nada estranho ou real demais. Normalmente eu apago e nem me lembro se sonhei alguma coisa que valha a pena lembrar. A não ser aquela vez que eu sonhei que estava em uma praia com a Jessica Alba... foi bem real, se você quer saber.

– Tom, não estou falando desse tipo de sonho – Bill disse olhando carrancudo para o irmão.

– Então, conte para o seu irmão o que anda sonhando – Tom disse rindo e se sentando em uma cadeira, perto de Bill – Quem sabe é normal e você não precisa ficar se preocupando tanto.

– É... eu costumo sonhar que sou um tal de William Baumgärtner e ele viveu nessa mansão antigamente. Ele na maior parte do tempo é arrogante e pretensioso, trata todos a sua volta como se não fossem dignos de respeito. Ele trabalha em uma contabilidade e é chefe de Gustaf Schmidt, ou seja, o nosso Gustav Schäfer, que também é tratado mal nas mãos dele. Você na história é meu melhor amigo Thomas Gietzen e me leva para um Cabaré na cidade que eu achava ordinário. Com a ajuda de Jörg ou no caso Georg, vocês acham uma virgem para eu passar a noite já que não aceito ir com uma mulher já “usada” para cama. O problema é que eu passei a noite com ela, mas não a toquei por ser muito jovem.

– Se está arrependido de não ter feito nada com ela, da próxima vez que a ver nos seus sonhos, faça – Tom disse parecendo não dar a mínima.

– Eu não escolho o que faço no sonho, tudo vai acontecendo como se fosse um filme. Como se realmente já tivesse acontecido de verdade, por isso que estou pedindo a ajuda da Biene para descobrir sobre o passado do lugar, quero saber se é verdade tudo que está acontecendo.

– E por que quer saber? Se for verdade ou mentira, não vai fazer diferença, não é mesmo? Bill, esqueça isso, é apenas um sonho.

– Mas e se tiver um por quê?  Nunca sonhei isso antes e queria realmente saber o que vai acontecer com as pessoas que sonho. E aquela garota, a do Cabaré que se chama Johanna, ela não sai da minha cabeça!

– Igual à Jessica Alba no meu sonho, você tinha que ver... – Tom disse suspirando – Você nunca viu essa garota, não é? Dizem que as pessoas desconhecidas com quem você sonha, geralmente são pessoas que viu em algum dia, mas não deu atenção.

Bill sabia que não adiantava falar, ninguém iria acreditar no que ele estava passando. Nem ele mesmo acreditava. Talvez fosse bobagem mesmo, quem sabe seu inconsciente havia gravado tudo que Biene falava e transformou tudo em uma série de sonhos confusos e sem nexo? Essa era a teoria mais aceita por ele. Hoje mesmo iria devolver todos aqueles livros para Biene, ele não precisava descobrir o passado de nada, mas ela sim adoraria.

– Tom? – perguntou Gustav aparecendo na porta de repente – Acabou papel higiênico e não tem mais pão nem coca-cola.

– E é minha culpa que vocês comem e cagam demais? – ele disse rindo – Vão comprar ou chamem sua prima.

– Também não precisamos ficar dependendo dela o tempo todo – Bill disse se levantando e deixando o caderno e a caneta de lado – Eu vou comprar, o mercado não é tão longe daqui e logo ele vai fechar se não se apressarmos.

Ninguém falou nada contra, além de que Bill precisava fazer algo, ele não conseguia escrever e queria passar o tempo fazendo algo melhor do que pensar naqueles malditos sonhos. Ele caminhou até o carro e partiu para o mercado que ficava na esquina, é lá onde Biene geralmente fazia compras. Era um lugar grande, com telhado em V inverso e todo branco com detalhes em madeira e uma placa escrita: “Gietzen, desde 1852 proporcionando os melhores produtos”.

O coração de Bill afundou dentro do seu peito ao ler o nome que se destacava na madeira bem talhada da placa. Parecia que quanto mais tentava fugir, lá estava mais provas de que tudo que andava vivendo em seus sonhos existia de verdade, ou melhor, existiu. Bobagem, devia ser apenas uma coincidência, vai ver esse sobrenome era comum. Ele se recuperou rapidamente, ao ver que o dono do mercado já estava fechando o local.

– Senhor, me desculpe – ele disse correndo até a loja – Tenho que comprar algumas coisas, são poucas. Vou ser rápido.

– Ah, tudo bem – o cara disse um pouco de má vontade, mas permitindo que Bill entrasse e comprasse o que quisesse.

Ele atravessou as prateleiras cheias de produtos, notando que o lugar não era tão grande assim, na verdade não passava daqueles mercadinhos que vendem só as coisas mais necessárias. Mas ele não ia reclamar, afinal fazia séculos que não saía para fazer uma compra normal e calma, por que sempre tinha fãs correndo atrás dele. Aqui ninguém parecia reconhecê-lo e era um grande alívio.

– É só isso – Bill disse colocando em cima do balcão o papel higiênico, os pães e as duas caixas de coca-cola. Então deu uma boa olhada no balconista, vendo se ele lembrava um pouco de Thomas, mas nada fez efeito – Você é um Gietzen, não é?

– Não, eu só trabalho aqui. Mas o dono do lugar é o descendente da família mesmo. Tem até uma árvore genealógica lá na parede. Aqui as pessoas levam muito em conta esse tipo de coisa, eu não dou a mínima para os meus ancestrais – ele disse calmamente, empacotando as coisas e digitando os valores no caixa.

Bill se distanciou um pouco e foi até a um quadro que tinha no canto do balcão, era uma espécie de tapeçaria enorme, não era antiga, na verdade parecia ter sido feita há apenas alguns anos. Havia a imagem de uma árvore, ricamente bordada, com raízes longas por onde se lia vários nomes. Engolindo seco, ele passou os olhos por todos os nomes, tentando achar um mais que conhecido. Ele não sabia o que fazer, quando deu de cara com um nome mais do que evidente: Thomas Gietzen.

– Senhor? Aqui estão as suas compras, já vamos fechar – o balconista disse estendendo as sacolas para que Bill as visse.

– Você sabe algo sobre Thomas Gietzen? – Bill perguntou com uma voz tremida, indo até o balcão – É um dos nomes que estão na árvore genealógica.

– Não, já disse que não ligo para o passado das famílias daqui... mas conheço alguém que pode saber. É uma garota chamada Biene, ela é professora de história na escola local daqui! E como ela é bonita! Só não entendo nada do que ela fala, quando vem comprar coisas aqui e...

Bill pagou as compras e saiu dali rapidamente, deixando o rapaz falando sozinho e estupefato.


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