Falling For You - CIP escrita por Casais ImPossíveis


Capítulo 3
Capítulo 3 - Como Você é Marrento




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 Sábado, 23 de Dezembro de 1978

Já era o quarto sábado desde o jogo de beisebol e Vance estava na loja de conveniência jogando pinball. Não havia ninguém além dele e do próprio dono da loja ali, afinal faltava apenas dois dias para o natal e a garotada que costumava passar as tardes ali estava viajando, ajudando a arrumar a casa para as festas ou simplesmente passando tempo com a família.

A única família que Vance tinha era sua mãe e ela não tinha muito dinheiro para fazer a decoração de natal mesmo trabalhando tanto que não tinha tempo para ficar com o filho nessa época festiva, então lá estava ele jogando pinball sozinho em 23 de Dezembro com uma camisa do Deep Purple desbotada, coturnos de segunda mão, uma calça de couro falso e uma jaqueta de couro legítimo irada com detalhes de metal e alguns logos de banda bordados nas costas. Era seu presente de natal, o qual sua mãe havia economizado o ano todo para comprar, mas como sua jaqueta antiga estava quase se desintegrando de tão velha, ela precisou adiantar o presente. Vance ficou feliz mesmo assim.

Enfim...

Ali estava ele, concentrado e meio entediado.

Nas duas primeiras semanas Vance se dedicou como nunca naquele jogo, mantendo o foco como se sua vida dependesse disso, deixando o placar bem alto, porém ao chegar à loja de conveniência em ambos os sábados a primeira coisa que viu foi Bruce saindo com um sorrisinho convencido e lhe dando uma piscadela antes de caminhar para sua bicicleta. Aquela carinha feliz e estúpida era o que acendia o fogo da determinação no coração de Vance pelo resto da semana.

Na terceira semana porém, quando Vance chegou lá e viu Bruce, a expressão no rosto dele estava diferente. O sorriso era suave, não convencido, e ao invés da piscadela de costume, Bruce fechou a mão em punho e bateu duas vezes no peito como sinal de respeito. Pela primeira vez desde que começara a jogar ali ele não havia conseguido bater os recordes de Vance e estava parabenizando-o por isso.

Mesmo que aquele não fosse a cara que o loiro esperava ver Bruce fazendo, tirar aquele sorriso convencido da boca dele teve um sabor delicioso. Por uns dois dias.

Depois disso ele percebeu que sem o recorde do asiático para quebrar, jogar não estava sendo tão divertido quanto nas últimas semanas. Não havia mais a adrenalina que vinha com o senso de que “realmente” havia algo a perder.

Antes que ele se perdesse demais nesses pensamentos o sininho preso a porta tocou, o que foi uma verdadeira surpresa, então os olhos azuis desviaram da máquina de pinball por um único segundo, que foi o bastante para notar que quem passou por ali era Bruce.

Bruce teve mais tempo para olhar e, por mais que ele tentasse, não conseguia evitar que seus olhos ficassem voltando para o loiro conforme andava pela loja, pegava um salgadinho e ia para o caixa. Os ombros dele pareciam ficar cada vez mais tensos e uma ou duas vezes Vance deu uma espiadinha de canto de olho, mesmo tentando se focar no jogo.

Imaginando que se ficasse acabaria entrando em confusão, o asiático decidiu ir embora dali, mas quando estava quase chegando à porta ouviu a voz firme e autoritária vibrar em seus ouvidos.

— Sai não, moleque.

— Só vim porque achei que você não estaria aqui hoje. Se acha que eu vou gastar o meu tempo brigando com você, espera sentado que cansa menos. — por mais que tivesse vontade, Bruce não olhou para o loiro enquanto continuava andando até passar pela porta.

— Espera. Eu mandei esperar! Ai, merda! — Bruce ainda conseguiu ouvir do lado de fora da loja, em seguida os barulhos da máquina de pinball pararam e logo o sininho da porta soou de novo. — Desce da porra da bicicleta.

Bruce respirou fundo antes de olhar para o bad-boy, saindo calmamente da bicicleta. —Não sei se você percebeu, mas eu não tenho medo de você, Hopper. Não é porque eu não gosto de começar brigas que eu não sei muito bem como acabar com elas.

— Relaxa, nervosinho. Não foi pra isso que eu te mandei esperar. — Vance respondeu, revirando os olhos.

— Pera, você chamou... A mim de “nervosinho”? — o asiático não aguentou e começou a rir, o que só fez o loiro revirar os olhos mais uma vez. — Beleza. Se você não quer brigar, o que você quer então?

— Só conversar. — ele admitiu com um ar relutante, não queria parecer de guarda baixa para aquele garoto. — Será que a gente pode entrar? Tá a porra de um gelo aqui fora.

Bruce levantou uma sobrancelha e ficou encarando o bad-boy um instante, tentando lê-lo e decifrar se podia acreditar naquilo, até que finalmente suspirou e voltou para dentro da loja, ouvindo os passos de Vance atrás de si.

— Certo... Sou todo ouvidos. — disse, cruzando os braços e erguendo o queixo, também não queria parecer de guarda baixa.

Vance bufou e enfiou as mãos nos bolsos da calça de couro falso, desviando o olhar com uma leve careta no rosto, como se a palavra que estava prestes a dizer estivesse amargando em sua boca.

— Obrigado. — se forçou a finalmente dizer.

Bruce já era um garoto muito expressivo, porém nunca seu rosto expressou tão bem um sentimento quanto sua surpresa naquele momento.

— Desculpa, mas acho que eu ouvi errado. — ele murmurou logo que se recuperou do choque. — Você disse...

— Obrigado, é. Foi isso o que eu disse. — Vance respondeu, bufando de novo e voltando a olhar para o asiático. — Eu adoro jogar pinball, sempre foi o meu lance, mas... Competir contra você deixou o jogo mais intenso. Como era quando comecei a jogar. Eu não sabia que podia ser assim de novo, então é, obrigado por bater de frente comigo. Mesmo sendo uma ideia de merda.

— Você... Acabou de me surpreender, Vance Hopper. — Bruce confessou, abrindo um sorriso sincero. — E isso não é fácil.

— Ah, cala a boca, seu... Merdinha. — o loiro resmungou fechando a cara e cruzando os braços sobre o peito estufado.

Essa atitude não me surpreende. — o moreno, por outro lado, continuava com o bom humor intacto.

Vance revirou os olhos, mas sorriu de canto. Aquele garoto não tinha mesmo medo da morte. Nem um pouquinho.

— Se quiser você pode ficar e jogar, eu não vou puxar uma briga. Não acho que você vai conseguir me passar dessa vez, mas... Vai ser interessante te ver tentar. — provocou, erguendo o queixo e deixando a presunção preencher seu sorriso.

— Você é autoconfiante demais pra um cara que já perdeu tantas vezes pra alguém que só joga uma vez por semana. — um brilho de impertinência faiscou nos olhos de Bruce ao dizer isso, ainda que sua expressão continuasse suave e pacífica.

— Nem fodendo que você joga só uma vez por semana. — Vance desdenhou, mas logo percebeu pelo olhar de Bruce que ele falava sério. — Puta merda! Achei que você jogava, sei lá, quando eu to na escola.

— A gente tem a mesma idade, se eu jogasse quando você tá na escola, quando eu iria pra escola? Não. Com a escola, os meus treinos e tudo mais, eu só tenho algumas horas pra jogar aos sábado. Isso se não tiver uma partida de beisebol. — o asiático explicou, tirando uma moeda do bolso e começando uma partida de pinball.

— Cara, como que você consegue manter suas pontuações tão altas jogando só uma vez por semana? — Vance perguntou em tom indignado, observando com atenção o garoto jogar.

— Como no beisebol: eu mantenho os olhos na bola. Sempre, sem pausas. A maioria das pessoas tem o instinto de dar uma olhadinha no placar quando acha que tá indo bem. — Bruce começou a explicar sem olhar para ele.

— Não te dá nos nervos não saber com quantos pontos tá? — questionou com a voz um pouco mais vaga, sua atenção estava no jogo tanto quanto a de Bruce.

— De um jeito ou de outro eu vou saber do placar no final. E pode ser um placar recorde ou não independente de eu espiar vez ou outra. — constatou ele, dando de ombros sem desviar o olhar da bolinha prateada um segundo sequer. — E esse segundo em que você olha pro placar pode ser o bastante pra te tirar mais uns minutinhos de jogo.

— Cara, se eu quiser usar essa técnica vou ter que treinar. — Vance comentou, cruzando os braços e indo se recostar na parede ao lado da máquina de pinball.

— Não se cobre demais, seja lá a técnica que você usa, é boa. Não é melhor que a minha, mas é boa. — Bruce disse com um ar presunçoso, se permitindo espiar a reação do loiro apenas por um segundo, tinha que admitir para si mesmo que tê-lo ali era realmente distrativo.

Vance bufou e revirou os olhos. — Cala a boca e joga, moleque.

Por alguns minutos os dois permaneceram em silêncio e o único som que ecoava na loja era o da máquina de pinball e vez ou outra um bocejo entediado do dono. E então Bruce perdeu e Vance puxou uma moeda do bolso para trocar de lugar com ele.

O asiático finalmente abriu o salgadinho que havia comprado enquanto observava seu rival jogando com uma expressão concentrada que deixava aquele rosto irritantemente perfeito ainda mais bonito.

— Aí, acabei de me tocar de uma parada. — Vance murmurou, tentando não desviar seu olhar da máquina, mas acabou por mirar Bruce por um segundo. — O que você tá fazendo aqui hoje? Tipo, é véspera da véspera de natal. A molecada tá toda em casa.

— A minha família gosta de manter as tradições pra lembrar as nossas raízes. E na nossa cultura o natal é... Tipo assim, um feriado mais de casal, entende? — ele explicou com um sorriso de canto. — Eu ganho presente, mas o dia é meio que deles, então eu não fico tão empolgado.

— Nossa, que estranho. — Vance respondeu sem pensar que poderia soar ofensivo.

— Estranho não, diferente. — Bruce corrigiu calmamente. — Pros meus pais o estranho foi descobrir como é o natal aqui quando chegaram. Eu já nasci aqui. To acostumado a ver tanto a cultura dos meus pais quanto a dos meus amigos. Então pra mim as duas são só diferentes.

— Entendi. — murmurou sem saber o que mais dizer.

— E você, americano padrão? O que tá fazendo em uma loja de conveniência na véspera da véspera de natal? — o asiático perguntou, realmente curioso.

— Não é da sua conta! — Vance respondeu ríspido enquanto seus ombros enrijeciam.

Bruce, porém, reagiu com uma risada despreocupada e negou com a cabeça. — Nossa, como você é marrento. Mas beleza, eu sou paciente. A gente vai no seu tempo.

Vance chegou até a tomar ar para responder, no entanto aquelas palavras deixaram-no tão desconcertado que ele não soube o que dizer, então apenas balançou a cabeça e tentou se manter focado no jogo.


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