A Garota Que Ficou Para Trás - EM HIATUS (JULHO) escrita por Willow Oak Acanthus


Capítulo 7
Capítulo VI - Fantasmas são reais


Notas iniciais do capítulo

Nesse capítulo algo muito importante acontece: Vocês vão entender porque a Hazel sempre cobre suas mãos.

Eu me inspirei em "A maldição da casa Hill" - para o motivo da personagem fazer isso.



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Ponto de vista de Sam Winchester.

Sua mão finalmente toca a minha. Fria e molhada, e eu achei que isso era uma coisa simples. Achei que talvez ela tivesse T.O.C e por algum motivo estivesse testando seus limites, mas é só isso o que passou pela minha cabeça. Por isso nunca a pressionei para falar nada, as pessoas sentem vergonha dessas coisas e a última coisa que eu queria é constrangê-la. Quando nossas mãos se tocaram, eu sorri. 

O sorriso deixou o meu rosto assim que Hazel desmaiou e seu nariz começou a sangrar, eu não entendi o que estava acontecendo. E enquanto eu segurei o seu corpo caído na grama, nossas mãos dadas, de repente uma dor de cabeça infernal começou e foi como se minha cabeça estivesse sendo escancarada, fisicamente. Acabo caindo no chão eu mesmo, ao seu lado. Minha visão começa a ficar embaçada e confusa, enquanto vejo Hazel se debater.

Não! – Ela grita, os olhos fechados, o sangue saindo do seu nariz, tudo isso girando pela minha visão embaçada enquanto a dor aumenta – Mary!

Meu estômago se revira. Ela acabou de falar o nome da minha mãe?

—Hazel...? – Falo com dificuldade, a dor aumentando cada vez mais e a visão cada vez mais turva. Mal consigo me mexer.

Mary, não! – Ela torna a gritar, enquanto todo o seu corpo treme, e então, depois do que parece uma eternidade, tudo para.

Ela para de se mexer e até a dor na minha cabeça é como se nunca tivesse sequer acontecido. Estou todo gelado e trêmulo tentando me sentar ao lado de Hazel. Ela abre os olhos, confusa e com lágrimas e muito sangue escorrendo pelo seu rosto.

Estou hiperventilando, e quando seus olhos cruzam com os meus, ela está desesperada.

Mesmo com dificuldade, ela se senta e se afasta de mim e evita me olhar, como se eu a assustasse, e esse sentimento dói. Hazel abraça as próprias pernas, e eu não sei por onde começar:

—Hazel...você pode me explicar o que acabou de acontecer aqui? – Minha voz transmite o meu desespero, e ela se levanta, como se fosse ir embora.

—Eu preciso ir...- Ela diz com dificuldade, mas eu me levanto tão rápido quanto ela e a seguro.

—Não, você não vai ir embora assim! Hazel, olha para mim! – Suplico a ela, minhas mãos segurando os seus braços com delicadeza, os olhos nos dela. Está apavorada.

—Você não vai entender – Ela diz em um quase sussurro e aparentemente meio fora de ar pelo que acabou de acontecer – Não vai entender...

—Você disse o nome da minha mãe! E eu tive uma...uma dor de cabeça descomunal, como se alguma coisa ou...alguém estivesse entrando na minha mente... – Digo ofegante, e completamente transtornado. Hazel continua me encarando totalmente desesperançosa e fraca, parece se sentir muito drenada.

E então, de repente...as coisas começam a se encaixar na minha cabeça. Os motivos pelos quais sinto que somos ligados, conectados. A maneira como tudo parece apontar para ela, como um magnetismo.

E se...e se ela for como eu?

—Hazel...você tem visões também? – A confusão no seu olhar é enorme.

—Como assim “também”? – A encaro por mais alguns segundos, e dou um suspiro antes de dizer o que estou prestes a dizer, pois sei que tudo vai mudar a partir de agora:

—A gente...a gente precisa conversar.

XXX

Ponto de vista de Hazel Laverne.

São coisas demais para assimilar. Primeiro, resolvemos vir para a minha casa, para termos mais privacidade. Foi muita sorte ninguém ter visto o que aconteceu. Viemos em silêncio o caminho todo, e fomos os mais discretos que conseguimos. Sam me ajudou a estancar o sangue, e estamos sentados na mesa da minha cozinha enquanto eu acabo de digerir tudo o que aconteceu.

E tudo o que ele me contou.

É coisa demais.

—Então...- Começo, a voz e o corpo completamente exaustos – Então você...previu? Que eu ia...?

—E não só com você. Eu tenho premonições com outras pessoas também, com...com coisas horríveis acontecendo. Mas eu não tinha noção nenhuma de que eram...reais, até...até a noite do acidente. – Seu olhar é sombrio e triste. Não preciso de um espelho para saber que o meu deve estar bem semelhante ao dele.

Isso explica tudo. Como ele chegou a tempo, como sabia o que eu ia fazer...

—Você vê o passado, não é? Diferente de mim. – Ele continua, agora me encarando de maneira mais séria– É isso o que acontece? Quando toca nas pessoas? – Faço que sim com a cabeça, me lembrando de todas as vezes que isso afetou a minha vida.

—Foi piorando com os anos. Quando eu era menor...eram só flashes. Até que um dia as coisas foram saindo de proporção e eu precisei fazer algo sobre isso. Por isso fico com essas malditas luvas, para não correr o risco de relar em ninguém nem por acidente. Eu fui tão descuidada hoje...você faz eu sair do estado de alerta, por algum motivo... – Digo isso com muita tristeza. Não queria, de maneira alguma, que ele soubesse sobre isso.

Porque agora ele sabe que eu sou uma aberração.

—E você viu a minha mãe, não foi? Viu minha mãe morrendo. – Ele constata. O olho com dor, e com empatia. Porque eu vi...tudo.

E foi como estar em um pesadelo. O bebê no berço que eu julgo ser ele, a mulher indo em direção ao filho sem saber o que estava prestes a acontecer...

—Sim, Sam...eu vi Mary Winchester morrer. - As palavras que saem da minha boca são amargas como o aço da ponta de uma flecha. 

—Mas você não viu  ela, não é? Você também o viu... – Me arrepio só de me lembrar.

Ele sabe. Não adianta fingir. Não dá para fugir.

—Ele tinha...olhos amarelos e....- Minha voz vai morrendo, e ele se levanta da mesa, coloca uma mão na frente da boca e fecha os olhos por um momento – Sam? Aquilo...aquilo era o...

—O algo, a que me referi? É sim. – Ele diz, amargurado. Parece bravo com algo, transtornado – Agora você entende. Agora você sabe. O que você viu é só uma parte...O que aconteceu com a minha mãe...Tenho medo de que aconteça com quem se aproxima de mim. – Ele me olha, com desgosto de si mesmo – Com você, por exemplo.

—Por que você acha isso? Qual é a lógica ao qual você se baseia? – Chego mais perto dele. Ele se afasta de mim, e isso dói fisicamente e eu tento não demonstrar a ele isso.

—Está cada vez mais claro para mim. Você já tinha tido uma visão assim? Que te fizesse tão mal? Que te fizesse sangrar? – Ele diz isso como se me desafiasse, como se quisesse provar o quão está certo. Não o respondo, apenas o encaro no fundo dos olhos, sustentando seu olhar. Porque não...nunca havia acontecido algo como o que aconteceu hoje. Meu silêncio o estimula a continuar sua linha de raciocínio – Viu? É disso que eu estou falando...

—Será que dá para você parar por um segundo? Caso não tenha percebido, também tenho questões sobrenaturais nada agradáveis. E quem te garante que não é você quem corre perigo estando aqui, comigo? – Estou começando a ficar com raiva dele, e acho que ele percebe, posso ver no seu olhar – Você não pode decidir o que é melhor para as pessoas e achar que isso conta. Não pode.

—Posso sim, se eu achar que estou protegendo você de mim. – Ele diz isso de forma dura, os braços cruzados, o olhar firme – A melhor coisa que podia te acontecer é eu sumir por aquela porta, Hazel.

—Então você vai embora, não é? – O olho com muita, muita raiva. Meu peito sobe e desce de tanta ira, e minhas mãos começam a tremer. De repente, ele se desarma. Qualquer pose rígida que ele estivesse fazendo, se desfaz ao perceber que os meus olhos se enchem de lágrimas.

Não vou chorar. Não na frente dele.

—Hazel...- Ele chega mais perto de mim, mas sou eu quem dou um passo para trás agora.

—Não, não fala o meu nome assim! Não é justo comigo! Não é justo comigo que você me cause todas as coisas que você me causou só para você agir como se soubesse o que é melhor para mim! Eu sei o que é melhor para mim! – Malditas lágrimas. Malditas lágrimas que não consigo conter – Você não pode entrar dessa forma na minha vida e bagunçar tudo só para depois ir embora!

Estou descompensada, gesticulando de um lado para o outro, e tenho certeza de que não estou fazendo muito sentido. Ele dá mais um passo, e eu dou outro passo para trás para me distanciar dele, mas minhas costas tocam a parede.

—Você me deixou com tanta raiva...- Sibilo, entre dentes. O olhar de Sam começa a ficar indecifrável para mim – Eu não entendo como você pode achar que se afastar é a coisa mais segura a se fazer.

Ele reflete um pouco, e sua respiração aumenta. Parece estar em conflito, seus olhos confusos e nebulosos por tanta escuridão contida.

—Eu...- Tento formular qualquer frase que seja, mas estou esgotada.

—Hazel...respira, ok? – Ele fala isso de forma terna, mas aí eu perco a minha cabeça de vez.

—Respirar? Respirar! Você acha que você pode...- Antes que eu continue a gritar com ele, Sam tampa a minha boca com uma de suas mãos, de forma gentil.

—Você está certa. Eu fui um idiota por insinuar que posso fazer essa escolha por você. Mas...depois de saber tudo o que você sabe, e saiba que ainda há muito a se saber...me responde uma coisa por favor, e tudo vai depender disso, ok? Você é louca o suficiente? – Fico confusa, tentando entender onde ele quer chegar me chamando de louca.

Leva um tempinho mas eu finalmente entendo. Ah.

"...E então se você for louca o suficiente para ainda querer isso..."

Todo o meu corpo gela, de imediato. A luz da tardezinha entrando pela janela, tingindo o ambiente sutilmente de âmbar. Seus olhos tão fixos nos meus, seu corpo assim tão perto do meu, a expectativa em seus olhos.

Nossos destinos dependendo apenas de palavras. Por um breve momento, eu estou no controle.

—E então? – Ele diz, rendido enquanto retira sua mão da minha boca devagarzinho – A escolha é sua, El.

—Sou. Sou louca o suficiente, Winchester – Digo sem tirar os olhos dos seus. Sem nem pensar por nenhum segundo.

Não que isso seja sábio. Se há algo que pude constatar com tudo isso, é que somos perigosos um para o outro. Há algo sombrio reservado para nós. Mas...

O coração quer o que o coração quer, como diz o ditado.

Sam fixa os olhos procurando consentimento nos meus. Uma de suas mãos desliza para a minha cintura, por dentro da blusa. Seu polegar me acaricia devagar, e então ele me aperta de leve. Sua outra mão segura o meu rosto enquanto ele encara a minha boca, ainda relutante. Ele perde a própria briga interna, depois de um tempo. E então eu fecho os meus olhos quando os seus lábios roçam os meus, lentamente, mal os tocando. Minha respiração começa a falhar e a ficar mais intensa ao mesmo tempo, se é que isso é possível. Dou um suspiro mais forte quando ele finalmente cola os lábios em mim, com mais intensidade. Sua respiração está pesada, e a sua boca se move com voracidade. Ele tira a mão do meu rosto e desce ela até a minha cintura, como a outra. Seu corpo se pressiona contra o meu, minhas costas presas na parede enquanto a sua língua começa a entrar em contato com a minha, nossas respirações pesadas se mesclando. Todo o meu corpo parece arder, e eu não tenho mais controle nenhum.

É como se o meu cérebro derretesse.

Sinto que ele está se segurando, porque parece relutar enquanto me beija. Parece se segurar, sinto sua tensão física. Uma rigidez, uma limitação.

Medo. Medo do que esse beijo significa.

Ele interrompe o beijo por um momento, arfando no meu pescoço, uma expressão de relutância em seu rosto.

—Sam...? – Sai como um sussurro. Sua imensidão verde se encontra com a minha – Não se segure... – Suplico.

Ele sorri, sem tirar os olhos dos meus, e então ele cola a testa com a minha:

—Não, Hazel Laverne...não faz isso não...- Ele murmura, mas eu não vou obedecer dessa vez.

—Eu não quero que você se segure.– Repito, e isso é o suficiente para ele perder a cabeça. Volta a me beijar enquanto uma de suas mãos se entrelaça com a minha e a levanta acima da minha cabeça, a deslizando na parede. Seu corpo se pressiona mais com o meu, e eu fico entorpecida. Completamente.

Seu beijo tem dualidade, como ele todo. É agressivo e doce. É forte e gentil.

Tudo ao mesmo tempo.

Sua respiração pesa ainda mais quando ele solta a minha mão, e usa as duas mãos para percorrer as minhas costas, hora me acariciando, hora me arranhando de leve. Acabo arfando e soltando um gemido baixinho na boca dele ao sentir a eletricidade gerada na minha pele por seus arranhões sutis, e posso jurar que o sinto sorrindo por entre o beijo por ter causado isso em mim. Meus braços o envolvem, percorrendo suas costas e seu cabelo, o bagunçando. Invisto contra ele com tanta voracidade que me desencosto da parede, e cambaleamos pela cozinha enquanto nos beijamos, ele arfa enquanto bagunça o meu cabelo com as mãos. Esbarro com as costas na mesa da cozinha, e Sam me ergue pela cintura e me senta na mesa como se eu não pesasse nada. Seu corpo se coloca entre as minhas pernas fazendo o meu abdômen arder com uma sensação que eu não consigo compreender, e ele torna a me beijar, até que sua boca desce até o meu pescoço. Primeiro, seus beijos ali são suaves e fazem com que o meu corpo inteiro se arrepie. E então ele me morde levemente entre o pescoço e a clavícula e por onde suas mãos passam me acariciando sinto como se uma corrente elétrica perpassasse pela minha pele. Ele para tudo por um momento, suas mãos seguram o meu rosto e seu olhar repousa sobre o meu, enquanto arfamos em sintonia, os olhos transtornados.

 

 

—Hazel... – Meu nome sai com dificuldade de sua boca – Não posso deixar ninguém te machucar, nunca mais. E eu não posso deixar de pensar...e agora? E agora, Hazel?

Fico confusa. Seu olhar está tão preocupado e ansioso, como se antecipasse um milhão de situações em sua cabeça. Estou tão baqueada pelo beijo e pela sensação de dormência que percorre o meu corpo que tenho dificuldade em entender o que ele está tentando me dizer.

—Como assim, Sam? – Seu polegar acaricia o meu lábio inferior, minhas pernas que estavam ao seu redor agora apenas repousam ao lado do seu corpo.

—O seu pai proibiu isso aqui, e se quisermos evitar que ele descubra...precisaremos ser discretos. Como vamos fazer isso, Hazel? Você acha mesmo que eu vou conseguir manter você em segredo? – Seu tom é preocupado e ele gesticula enquanto fala – Imagine só se algum idiota na escola achar que pode te chamar para sair? Eu não sou o cara mais controlado do mundo e seria no mínimo suspeito a minha reação, você não acha? – Um de seus punhos se fecham, só de imaginar a situação.

—Você acabou de criar uma situação fictícia na sua mente e já está sofrendo por antecipação, Sam – Digo a ele, mas parece entrar por um ouvido e sair pelo outro.

—Você sabe que eu tenho razão. Quando os seus pais voltarem da casa dos amigos deles, seu pai vai ficar de olho em cada passo seu, e se eu tiver que fingir que somos só amigos...confie em mim, não vai dar certo. E o seu pai...se ele colocar as mãos em você de novo...

Sua voz sai entredentes, um olhar de raiva assola sua expressão.

—Você precisa se controlar, Sam. Eu...sei que você disse que não tem medo de enfrentar o meu pai e tudo mais, mas me escuta por favor, ok? – Olho para ele com uma expressão muito séria, desesperada para que ele entenda a verdadeira seriedade da situação – Ele é um cara que perdeu tudo que lhe importava na vida, fama e dinheiro...ele não tem nada a perder. Se ele perder a cabeça, ele pode até me bater para valer, mas você não tem ideia do que ele faria com você. Sam...ele tem uma arma. O meu pai tem uma arma!

As sobrancelhas de Sam se erguem, e o seu olhar fica frio.

—Ele não é o único. – Sua voz é firme ao dizer isso, e meu corpo todo fica frio ao ouvir suas palavras – E eu sei que você me disse que não vai me deixar fazer nada, mas eu vou deixar uma coisa bem clara, ele nunca mais vai colocar as mãos em você.

Acho que eu arregalo os olhos por um momento.

—Vamos rebobinar um m-momento... – Acabo gaguejando – Como assim ele não é o único? Sam, você...? Por que diabos você tem uma arma?

Ele coça a cabeça, meio desconfortável.

Armas, no plural – Ele me corrige. Ah, que ótimo, melhorou bastante – E eu não disse isso na intenção de usar qualquer uma delas. Só quero que você entenda que eu sei me...defender. É com você que estou preocupado.

Fico atônita por um tempinho, tentando assimilar a informação que acabo de receber. E então meu cérebro começa a fazer uma conexão.

A visão que tive, da sua mãe deslizando pelo teto e queimando enquanto o homem de olhos amarelos observa tudo. O fato de Sam sempre dar a entender que sua família e seus segredos são obscuros e perigosos além da compreensão. As armas que ele acaba de mencionar...

—Sam...o que é que o seu pai caça? É por causa dele que tem armas na sua casa? – Ele suspira, seu olhar se enegrece. Ele se afasta um pouco da mesa e me ajuda a descer dela.

—Você quer mesmo saber? – Seu olhar é como um aviso. Sua mão acaricia a minha por cima da luva. Senti seu toque apenas uma vez e já sinto falta da sensação da sua palma na minha.

—Acho que eu mereço saber – Rebato. Ele assente, concordando.

Sam Winchester vai em direção a janela da minha sala e espia sua casa do outro lado da rua.

—Dean não está em casa. Vem comigo, Hazel – Ele estende a mão para mim, e nada poderia ter me preparado para o que eu iria ouvir.

E ver.

XXX

Ponto de vista de Sam Winchester.

As vezes, eu me surpreendo em como os dias podem terminar.

A noite começa a cair lentamente pelo céu, e se alguém me dissesse que ao fim do dia eu estaria mostrando a Hazel toda a verdade, eu não acreditaria nem por um segundo. Mas nós fomos longe demais, como eu sabia que eventualmente ia acontecer. Tudo sobre ela e eu é intenso demais. E depois que descobri que Hazel tem algo paranormal dentro de si...

Se quero tê-la em minha vida, e a minha vida é essa...

É melhor que ela descubra tudo agora, veja com seus próprios olhos. Assim, pode se decidir sabendo de todas as cartas na mesa.

Primeiro, a levo ao porão. Mostro a ela algumas das armas comuns, as de fogo e então as não tão convencionais. Facões, foices, cordas, água benta, os símbolos na parede...

Observo com atenção sua reação. Ela está olhando para tudo com curiosidade, mas seu corpo está tenso. Posso ver na maneira como se move que está com medo, dos pés à cabeça.

—Na noite que a minha mãe morreu, meu pai descobriu que o homem de olhos amarelos era algo muito...mau – Engulo em seco, sem muita certeza de como devo prosseguir. Nunca achei que contaria essas coisas a ninguém – E também descobriu que outras coisas muito más existiam. Por vingança ou por proteção, decidiu virar o que chamam de um caçador.

Dou uma pausa, deixando-a absorver minhas palavras. Seus olhos verde musgo me encaram, e quase posso ver as engrenagens no seu cérebro trabalhando para entender toda essa insanidade.

—Bom...Dean e eu vivíamos por aí, com ele. Mas então eu comecei com as premonições e tive um surto na última caçada. Foi quando convenci John a me deixar terminar a escola em Lawrence. Dean concordou que ficaria por perto, cuidando de mim por um tempo...

—Seu pai e seu irmão sabem? Sobre suas visões? – Faço que não com a cabeça.

—Não sabem e nem nunca vão saber. Esperançosamente, aprendo a controlar isso um dia e vai ficar tudo bem. Você é a única pessoa que sabe... – Encaro seus olhos e continuo – Eu nunca gostei dessa vida, do negócio de família.

—Você já...caçou uma dessas coisas? – Ela está apavorada. Sei disso, embora tente disfarçar. Confirmo com a cabeça.

—Muitas. Mas enquanto meu pai e Dean parecem gostar do que fazem...eu não consigo, entende? Sei que eles ajudam muitas pessoas em suas caçadas, eu mesmo já ajudei. Mas não é o caminho que eu quero para mim – Hazel começa a andar de um lado para o outro.

—Você só tem dezessete anos! – Ela exclama, nervosamente – Seu pai enfiou vocês dois em um carro e saiu pelos Estados Unidos matando coisas?!

—Eu sei que é difícil de assimilar, El. Quanto mais de entender. Mas agora você sabe – Digo isso timidamente e me aproximo dela, com cuidado – Quem já caçou wendigos e espíritos vingativos pode lidar com um pai como o seu...

Posso jurar que vejo o queixo dela caindo.

—Eu...é muita coisa - Ela exclama com as mãos acariciando as têmporas, acho que tudo isso deu a ela uma bela dor de cabeça -  Não é como se eu não soubesse sobre um pouco de paranormalidade por conta do meu probleminha....mas isso...- Ela gesticula ao redor e suspira – Caramba.

—É, caramba é uma boa palavra para resumir... – Seguro sua mão devagarinho, meio incerto se ela ainda me quer por perto depois de tudo isso – E então? Agora que você entende...que sabe...provavelmente mudou de ideia, né?

Hazel, que antes estava olhando para as armas penduradas na parede vira seu olhar para mim. Ela dá um passo para mais perto de mim e passa seus braços ao meu redor.

—Eu sou louca o suficiente, lembra? – É um sentimento agridoce. Quero gritar de alegria por ela me aceitar com todas essas coisas, mas sinto medo do que isso pode significar em seu futuro – Você e eu...é como você tinha dito, eu acho. Que tínhamos que nos conhecer.

—Hazel laverne, você acredita em destino agora? – A provoco. Ela sorri para mim, o sorriso mais doce do mundo.

Talvez. Agora que descobri que...coisas paranormais são reais e tudo mais, acreditar em destino não me parece tão absurdo.

Dou uma risada, porque é verdade.

XXX

Subimos para o meu quarto, e enquanto ela está xeretando os meus livros, me sento na cama e observo o céu pela janela. Sinto que uma tempestade se aproxima.

—Quando acha que seus pais voltam? – Pergunto a ela, que coloca os cabelos para trás das orelhas e se senta ao meu lado.

Engulo em seco. Meu sangue parece pulsar mais forte nas veias só de saber que estamos em uma cama juntos.

—Normalmente vão a sacramento...Eles são amigos de longa data, e eles nunca ficam na casa deles menos do que três ou quatro dias – Ela suspira e se ajeita na cama.

—E você sempre fica sozinha? – Falo isso com um vinco na testa, não deve ser nada fácil para ela. Não seria fácil para ninguém, ser tão negligenciado pelos pais dessa maneira. Uma coisa é o que eu sinto, por John ser ausente. Mas ele está por aí ajudando pessoas, os pais dela estão por aí procurando novas formas de se destruir.

—Eu me acostumei. Eu acho que sempre foi assim, entende? Quando era pequena, já passei noites sozinha em trailers com estranhos me olhando enquanto os meus pais se drogavam. Com o passar do tempo é que eu fui descobrir que não era normal, sabia? Quando vi que outras famílias eram diferentes... – Seu olhar se torna distante por um momento – Está tudo bem.

Está tudo bem. Acho que ela diz isso mais para ela do que para mim, como se quisesse se convencer.

—Quando o seu pai voltar, eu vou falar com ele, Hazel. – Começo. Ela se vira para mim, com o olhar ferido, como se temesse pelo o que está por vir – Eu vou me apresentar formalmente, vou esclarecer as coisas. Afinal...ele é o seu pai e no dia do acidente ele realmente achou que eu fosse um stalker maluco, e mesmo que você tenha esclarecido a situação, ele ficou com a impressão errada de mim. Talvez na mente distorcida dele...isso seja proteção - Faço uma careta, porque nada justifica o que ele faz com a filha.

Nada no mundo justificaria.

Hazel faz que não com a cabeça.

—Não é bem isso. O meu pai é possessivo, Sam. E ele sabe que se eu...ficar com alguém, eu vou me abrir. E ele tem medo de ter problemas com a justiça por minha culpa. O dia do julgamento foi uma cortina de fumaça, Sam – Seus olhos ficam sombrios – Se a justiça soubesse o que eles fazem, seria muito ruim para eles, não é? Ele te acusou para que isso tirasse a atenção de que ele fez da minha vida um inferno e que eu quis acabar com a minha própria vida por isso. As coisas são um jogo para ele, é o jeito que ele vive. Você e eu...é um jogo para ele.

Travo o meu maxilar de tanta raiva. Eu nunca quis tanto espancar alguém para valer na minha vida como queria fazer com esse idiota.

—E o que devo fazer, El? Não vou conseguir me afastar de você...- Puxo ela para que se deite no meu peito e a abraço – Não quero fingir que não tem nada rolando entre a gente...

Só de imaginar ter que manter algo tão intenso em segredo, minhas vísceras parecem se contorcer. 

—Mas é o que eu preciso que você faça, Sam. Por favor, só por enquanto. Só até ele achar outra coisa para ficar obcecado e aí...aí pode ser que a poeira abaixe. Por hora, por favor...confia em mim? – Fico extremamente contrariado.

Extremamente.

Ponto de vista de Hazel Laverne.

O maxilar dele está travado em raiva, e juro que suas narinas até estão levemente infladas.

—Posso... – Ele diz, entre dentes – Mas só por enquanto, ok? E se eu só pensar que ele sonhou em bater em você de novo...

—Eu não vou mentir para você, Sam. Pode acontecer... - Minha boca se torna amarga, e seu olhar fica preocupado e horrorizado - Ele não precisa de muitos motivos para me bater...qualquer coisa é motivo. - Me viro de lado na cama, constrangida com o que estou prestes a mostrar a ele, mas sinto que é necessário. Ele precisa entender que diálogo não é uma opção no mundo de Harvey Talbot. Ergo a blusa e a regata, e posso sentir seu olhar queimando, mesmo de costas - Isso aqui foi por ele ter achado que eu havia jogado suas drogas fora. Ele me bateu tanto que a minha mãe teve que entrar na frente - Seus dedos passam pelas minhas costas, mal me tocando e trêmulo, como se tivesse medo de me machucar. Abaixo a blusa e me viro para ele, e seu olhar de pavor é a primeira coisa que eu vejo. Dou um suspiro e continuo - Se algo assim acontecer, eu preciso que você se controle e me deixe lidar com a situação, como eu sempre fiz até hoje. Ok?

Ponto de vista de Sam Winchester.

Roxo. Roxo e verde e amarelo em alguns lugares, quase como uma galáxia inteira. Suas costas são uma pintura pincelada por violência, e se é possível sentir dor fisicamente ao ver a dor de alguém, acabo de senti-la. Minhas mãos tremem de raiva e meu maxilar se trava, meu corpo todo se tenciona. Hazel me olha procurando entendimento nos meus olhos. 

É perturbador pensar que, para ela, isso é só mais um hematoma. Só mais um "momento ruim" de Harvey Talbot. Só mais uma de muitas violências a que ela aguentou calada durante a vida inteira. Sei que ela quer que eu entenda sua realidade, porque morre de medo do que pode acontecer se alguém enfrentar seu pai como ele merece ser enfrentado. Já li sobre isso...ela tem tanto medo do pai que o simples pensamento de alguém tomar uma providência, parece algo absurdo. Se está viva até hoje, é graças ao seu silêncio...assim ela pensa, tenho certeza. E não posso culpá-la. Me levanto, ainda tremendo por inteiro em uma raiva que me consome e quase me faz entrar em combustão, e aperto o parapeito da janela enquanto me apoio ali. Espero que a lufada de ar gelado me acalme.

Tenho problemas de raiva. Tenho problemas de controle. Queria muito socar alguma coisa agora, socaria essa parede até os nós dos dedos ficarem roxos agora se pudesse.

Mas isso não ajudaria em nada. Muito pelo contrário...pioraria as coisas. A última coisa de que Hazel precisa é que eu perca a minha cabeça. Respiro fundo por alguns minutos, em silêncio. Ela observa tudo, tentando ler minha linguagem corporal...ela quer saber se eu vou fazer o que está pedindo.

—Não - Digo, entre dentes - Não posso fazer o que está me pedindo. Me escute com atenção, El - Cruzo os braços e tento controlar a tremedeira que queima em minha pele sem cessar - Eu vou respeitar o fato de que você se sente mais segura mantendo isso em segredo, por enquanto. Mas é apenas isso o que eu prometo a você. Caso o seu pai coloque as mãos em você mais um vez, acabou. Acabou de verdade, eu não vou ver você apanhando de um cara, seja esse cara o seu próprio pai, e ficar quieto enquanto você fica cheia de hematomas e traumas. Eu sei que ninguém nunca tentou te proteger, ninguém nunca fez nada. - Fico possesso e é impossível evitar sentir raiva até mesmo de sua mãe. Como uma mãe pode deixar a filha viver nessa situação? — Mas isso acaba agora. Se Harvey Talbot bater em você de novo, eu te prometo, será a última coisa que ele fará em um bom tempo. E eu prefiro não te dizer como é que os Winchester lidam com monstros, sejam eles sobrenaturais ou humanos. 

Vejo dor em seus olhos. Ela olha para baixo e suspira, se dando por vencida. Deixei claro para ela que não há discussão, e sei que isso deve ser amargo para ela.

—Nossa história vai acabar mal, Sam. Eu sinto isso...- Ela diz de maneira pensativa, e sombria. Me sento na cama e seguro a sua mão, penetrando o seu olhar com o meu - Se você e o meu pai...

—Não se preocupe com isso, por nem mais um momento. Seu pai...fique tranquila, El. Eu vou lidar com Harvey Talbot, mesmo que ele tente me matar... - Os olhos dela não se desviam dos meus por nenhum segundo, mas nós dois nos sobressaltamos quando uma voz se faz presente. Olhamos para a porta, e Dean Winchester tem um olhar muito sério quando diz:

—Quem é que vai tentar te matar, Sammy? - Dean dá alguns passos e entra no quarto, os ombros tensos e os braços cruzados - Acho que agora é uma boa hora para você elaborar, tim-tim por tim-tim, o que está acontecendo.

O-ou. Agora sim a coisa acaba de ficar feia. Um Winchester metido nisso até o pescoço é uma coisa. Dois?

Hazel está certa sobre uma coisa...isso não vai acabar bem.

Para o inferno com tudo isso*, do fundo do meu coração. Ninguém toca nela e fim da história.

Ninguém...toca...nela.

Nunca mais.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado ♥
Comentem ok? Eu mereço depois desse beijo maravilhoso que eu descrevi para vocês !
Tomara que vocês tenham ficado com bosboletas no estômago!

XOXO



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