As Crônicas de Kanto escrita por WriterM


Capítulo 3
A primeira batalha


Notas iniciais do capítulo

E aí pessoal, beleza? Aproveitando bem o sábado? Eu espero que sim.

Aqui está o terceiro capítulo. Fazia três anos que eu não escrevia uma batalha Pokémon, mas fiquei muito satisfeito com o resultado dessa e espero de verdade que vocês também gostem.

Desejo a todos uma excelente leitura!



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Green encarava Red com uma expressão de desafio. Ele apontava a pokébola de Squirtle, a esférica superfície vermelha refletindo fracamente a surpresa no rosto do garoto.

Red fitou a pokébola por algum tempo, então levantou os olhos para Green, perguntando:

— Você quer batalhar comigo?

— Sim. – Green confirmou de imediato. – Na escola, eu frequentemente ouvia rumores sobre um garoto de outra turma que era considerado um batalhador imbatível. Alguns o chamavam de talentoso. Outros, de gênio. Mas eu nunca dei muita bola para isso, até o dia em que ouvi o meu próprio avô elogiá-lo. – Green estreitou os olhos, espiando o avô de soslaio. Ele abaixou o braço, a pokébola ainda maximizada. –  Isso sim chamou a minha atenção. Você era esse garoto, Red. Nós nunca tivemos a chance de nos enfrentarmos antes, mas agora que temos os nossos próprios Pokémon, eu quero descobrir se você é mesmo tudo isso o que falam.

Red tentou processar a informação. Sentia-se principalmente surpreso, mas também estava um pouco constrangido e, tinha de admitir, um pouco cheio de si. Red, é claro, possuía uma vaga ciência de sua antiga reputação na Escola de Viridian, no entanto, jamais imaginou que ela era tamanha ao ponto de até mesmo Green Carvalho conhecê-la. Por toda a região de Kanto, todas as escolas de treinadores começavam a aplicar uma nova e fundamental disciplina na grade curricular do sexto ano em diante: batalhas Pokémon. O nome era autoexplicativo; a matéria era responsável por ensinar aos alunos todos os fundamentos e conceitos que constituíam uma batalha, indo desde as regras mais básicas até assuntos mais complexos, como a relação entre as dezoito tipagens, as naturezas e habilidades dos Pokémon, dentre outros tópicos. Tal disciplina representava grande parte do foco das aulas durante os últimos anos letivos, e, geralmente, era a favorita da maioria dos estudantes. Red estava incluso nessa maioria. Ele simplesmente amava batalhar. Não apenas isso: Red era um excelente lutador. Ele se considerava um aluno razoável nos demais conteúdos, mas destacava-se por uma milha quando o assunto era batalhar.

Passou a ponta dos dedos na pokébola de Charmander. Queria aceitar a batalha. O desafio, pensou Red, era sempre irresistivelmente sedutor. E assim como Green conhecia a sua fama, ele também sabia da dele; o neto de Samuel Carvalho, prodígio que se sobressaía sem esforço em qualquer disciplina, um garoto que, segundo diziam, irradiava um potencial que excedia o de qualquer outro aluno do mesmo ano. Ele também desejava saber se isso era mesmo verdade.

— E então? – Indagou Green, impaciente.

— Ah, desculpe. Eu me distraí. – Disse Red. – Isso parece interessante. Eu aceito o desafio.

Green assentiu suavemente. Seu semblante era neutro – Red percebeu que ele não era muito expressivo –, mas no fundo de suas íris verdes cintilava um brilho fraco, uma animação contida. Ele pareceu-lhe satisfeito. Disse, virando-se para o avô:

— Tudo bem se usarmos o seu campo de batalha?

— Sem problemas. – Ele olhou de Red para Green, enfiou as mãos nos bolsos do jaleco e sorriu. – Batalhar é uma das melhores formas de treinador e Pokémon se conhecerem e estreitarem os seus vínculos. Para vocês dois, que são novatos, essa será uma experiência valiosa. E vocês vão precisar de um juiz – Samuel recolheu Bulbasaur de volta para a pokébola, passou pelos dois garotos e saiu do escritório. – Vamos?

Eles o seguiram. Desceram as escadas para o andar térreo e atravessaram o corredor que levava até os fundos do laboratório, passando em frente à biblioteca do Professor Carvalho, suas austeras portas duplas de mogno firmemente fechadas. O velho homem destrancou e empurrou uma porta de vidro no fim do caminho, levando-os para fora. A luz matutina incidiu sobre eles, e Red deleitou-se com o toque quente do sol em sua pele. Ele pegou o Pokégear e viu que ainda não eram nem 8:20. Acontecera tanta coisa e ainda estavam no começo da manhã.

O campo de batalha diante deles era um grande espaço retangular de terra batida, seu contorno delimitado por linhas brancas que pareciam ser feitas de giz. Bem no centro havia um círculo imitando uma pokébola. À esquerda, o imenso moinho assomava sobre eles, as hélices girando lentamente com um zumbido baixo, projetando sombras oscilantes que misturavam-se com as das árvores mais baixas que o circundavam. Uma fileira cuidadosamente podada de arbustos de hortênsias brancas seguia pela lateral do campo. Uma brisa soprava, fazendo as folhas farfalharem. Red e Green andaram em direções opostas; Red se posicionou no lado esquerdo e Green no direito. O Professor Carvalho ficou bem no meio deles, rente à linha no chão.

Samuel olhou de um para o outro. Ele preparou-se para anunciar o combate, mas deteve-se quando ouviu passos apressados atrás dele. Virou-se bem a tempo de ver uma menina irromper da porta aberta e correr até ele, parando abruptamente a seu lado.

— Vovô! – Ela gritou. Sua voz era fina e saía entrecortada pela respiração ofegante. – Bom dia! Você por acaso viu o… Ah!

A menina notou Green e apontou para ele, primeiro expressando surpresa, depois incredulidade. O garoto suspirou, também parecendo perplexo. Red observou-os, confuso, então percebeu que eles eram surpreendentemente parecidos. Ele olhou a menina com mais atenção, percebendo que ela era familiar… Aparentava ter uns onze anos, baixa, caucasiana, de olhos castanhos claros e compridos cabelos castanhos…

Era a menina da foto!

— Daisy, o que você está fazendo aqui? – Perguntou Green.

Ela franziu o cenho. Parecia zangada.

— Eu estava te procurando! Como você pôde sair sem me avisar? Ia mesmo ir embora sem nem se despedir da sua irmãzinha?!

— Você ainda estava dormindo quando eu saí – explicou Green. – E eu ainda tentei te acordar, mas o seu sono é pesado demais.

Daisy enrubesceu. Red notou que o seu cabelo estava todo despenteado e ela ainda vestia um pijama branco meio amassado. Ela provavelmente havia pulado da cama e saído de casa às pressas para encontrar o irmão mais velho.

Daisy agora olhava para o chão, subitamente envergonhada.

— B-bem… mesmo assim… hum…

— Olha – disse Green. – Você não precisava ter se preocupado. Eu teria te ligado, ou então passaria em casa antes de pegar estrada. Que coisa, Daisy. – Então ele sorriu ternamente para ela, um sorriso afetuoso e genuíno. – Eu nunca te deixaria para trás desse jeito.

Os olhos dela brilharam e ela esboçou um meio sorriso. Red estava atônito com a mudança de atitude de ambos os irmãos. O Professor Carvalho pôs a mão na cabeça da neta, afagando os cabelos.

— Bom, Daisy, já que você está aqui, por que não assiste o seu irmão batalhar? Nós já estávamos prestes a começar.

— É claro! – Só então ela pareceu notar que Red também estava ali. Acenou para ele em cumprimento, depois, voltou a atenção para Green. – Boa sorte mano!

— Muito bem – anunciou Samuel Carvalho em alto e bom som. – Essa batalha será de um contra um, sem limite de tempo, e só terminará quando um dos lados estiver incapaz de continuar. Lembrem-se que, se perderem, terão de pagar uma certa quantia de PBs – pontos de batalha – para o vencedor. Seus perfis na Pokédex têm 3000 PBs atualmente. Prontos? – Red e Green anuíram simultaneamente. – Comecem!

Red imediatamente sacou a pokébola de Charmander e arremessou-a, dizendo:

— Charmander, eu escolho você!

O lagarto de fogo materializou-se sobre o campo de batalha a menos de dois metros de seu treinador. Ele analisou os arredores, farejou o ar e então olhou para frente, atento. Green tinha acabado de chamar Squirtle, e a tartaruga aquática surgiu diante de Charmander. Os dois Pokémon se encararam e assumiram uma postura de batalha. Antes de começar, porém, Red tornou a apontar a Pokédex para o seu monstrinho. Ela escaneou-o e logo em seguida soou uma voz robótica:

CHARMANDER, POKÉMON LAGARTO, TIPO FOGO

NÍVEL 05

GÊNERO: MACHO

NATUREZA: *MODESTA

HABILIDADE: *CHAMA

ATAQUES: ARRANHÃO, ROSNADO, BRASA

Do outro lado do campo, Green estava fazendo a mesma coisa, mas tudo o que Red podia ouvir daquele distância era uma voz baixa e disforme saindo da Pokédex dele. Ele guardou o aparelho e estudou os dois monstrinhos, pensativo. A natureza de Charmander o deixava ofensivamente mais forte pelo lado especial e menos pelo físico, e ele tinha um ataque de cada. Estava em desvantagem de tipo, visto que Squirtle era do tipo Água, mas Red achava que podia contornar isso.

Ele sempre podia.

***

Green Carvalho guardou a Pokédex e focou na batalha prestes a explodir diante dele. Squirtle esperava imóvel, sem tirar os olhos de Charmander. Ele também estava de olho em Red, tentando prever o que ele faria primeiro. Começaria com um ataque? Ou tentaria abrir a guarda de Squirtle com algum golpe de status? Finalmente, como se em resposta aos seus pensamentos, o garoto ordenou o Pokémon de fogo:

— Charmander, comece com o Arranhão!

Ótimo. Um ataque, então.

O lagarto respondeu com um grunhido e avançou, os braços esticados, as garras no ar. Ele era rápido – mais do que Squirtle, como já sabia – e cobriu a distância entres eles em poucos segundos. Quando ele se preparou para golpear, Green ordenou:

— Dê as costas para ele.

Com um giro ágil, Squirtle ficou de costas para Charmander. O arranhão raspou no casco, inofensivo, e ele recuou desconcertado. Red não pareceu se abalar muito. Green ouviu-o dizer:

— Vai ficar na defensiva, huh? Charmander, continue com o Arranhão. Tente achar uma brecha.

— Squirtle, concentre-se na defesa – disse Green calmamente.

Os iniciais digladiaram. Charmander era feroz, desferindo uma sequência selvagem de arranhões em seu oponente, mas Squirtle revelou-se inesperadamente ágil. A cada golpe de Charmander, ele girava o corpo, apontando o seu casco duro para ele, fazendo as garras rasparem inutilmente na carapaça. Tinha uma velocidade de reação incrível. Eles continuaram nesta dança por quase um minuto sob os olhares dos treinadores. Green Carvalho estava apenas esperando. Ele viu Charmander arfar, começando a se cansar dos ataques ininterruptos. Quando ele atingiu a defesa formidável de Squirtle mais uma vez e retrocedeu, Green soube que era hora de agir.

— Squirtle, Chicote de Cauda.

No momento em que Charmander levantou o braço para voltar a atacar, Squirtle abaixou-se de costas para ele e passou a cauda encaracolada subitamente por cima de sua cabeça. Charmander assustou-se e deu um passo para trás, e Green bradou:

— Investida.

Squirtle deu um giro, ficou de frente para Charmander e arremeteu, gritando. Ele acertou-o com força diretamente no estômago e o jogou para trás. O lagarto rolou sobre a terra, levantando poeira, e parou a poucos metros do seu treinador. Charmander levantou-se com dificuldade, arquejando, o rosto contorcendo de dor. Red estava boquiaberto e fitava o Pokémon com olhos espantados.  

Green constatou que tinha tomado a decisão certa, como sempre. Squirtle era, naturalmente, mais resistente que Charmander, e o seu ainda era de natureza *Relaxada, o que favorecia a sua defesa física a custo de um pouco de velocidade. Ele já contava com a vantagem de tipo e agora tinha certeza de também ter total controle em uma batalha de resiliência, mas Green achava que aquela não ia demorar muito para chegar ao fim. Na verdade, ele tinha certeza disso.

Isso vai ser fácil demais, ele pensou.

***

Aconteceu tão depressa.

Em um instante, Squirtle havia aberto a guarda de Charmander, reduzido a sua defesa e atacado com um golpe certeiro. Red não vira aquilo chegando. Ele nem teve tempo de reagir, e ver seu Pokémon resfolegar daquele jeito o deixara preocupado. Tenho que contra-atacar, pensou, mas Green já estava um passo à frente.

— Investida mais uma vez.

Squirtle avançou. Com Charmander ferido e fisicamente vulnerável, Green parecia ter ficado mais confiante para se aproximar por conta própria.

— Evasiva! – Gritou Red.

Charmander saltou para o lado bem a tempo de evitar o ataque. Ele ainda se movia mais depressa que a tartaruga. Red pensou em usar isso a seu favor.

— Corra ao redor dele e ataque com Brasa!

Chaar – Charmander gritou, e Red teve a impressão de que ele parecia irritado com Squirtle. A primeira chama projetou-se de sua boca e cortou o ar, estalando.

— Vire-se – ordenou Green, e Squirtle deu as costas mais uma vez. As brasas dissiparam-se pelo casco.

Mas Charmander continuou atacando, e correndo. Ele bombardeou Squirtle com fogo; circundando-o freneticamente. Squirtle reagia rápido, defendendo-se habilmente das chamas ao virar as costas, mas Red viu que aquilo também o estava desgastando. Charmander atirava mais depressa do que arranhava, e mesmo com o casco dispersando os ataques, Squirtle devia estar acumulando algum dano, mesmo que mínimo.

Squirtle vacilou e uma das brasas acertou a sua bochecha de raspão. Segundos depois o mesmo voltou a acontecer, desta vez atingindo o Pokémon em um dos braços. Red arriscou:

— Salte e use Brasa por cima!

Charmander aproveitou a velocidade da corrida e pulou, erguendo-se mais de meio metro acima do solo, e disparou outro projétil flamejante diretamente no rosto de Squirtle. Red confiava que ele o acertaria em cheio…

— Contra-ataque com o Jato d’água! – Bradou Green.

Squirtle mal teve um segundo para levantar a cabeça e esguichar a água pela boca. Os dois ataques colidiram no ar e se dissiparam, seus poderes equivalentes. Charmander aterrissou com um baque.

— Investida.

— Rosnado! – Foi tudo o que Red teve tempo de gritar. O lagarto de fogo estava perto demais para esquivar a tempo.

Charmander gritou o mais alto que conseguiu, o som reptiliano reverberando por todo o campo de batalha. Squirtle franziu o cenho, visivelmente incomodado com o barulho tão próximo de seus ouvidos, mas ainda assim atingiu o outro novamente. Entretanto, Charmander não caiu desta vez. Ele arfava pesadamente, mas mantinha-se de pé. Red sentiu o suor acumular na testa. Tinha dado certo, afinal. Se não tivesse reduzido o ataque de Squirtle a tempo, Charmander provavelmente não teria resistido ao golpe.

Ele tinha que fazer alguma coisa, e rápido. Raciocinou depressa e teve uma ideia que podia funcionar.

— Charmander, jogue Brasa nos pés dele.

O Pokémon olhou para ele, a exaustão estampada em sua face. Red viu uma fagulha de dúvida em seus olhos e ele assentiu, tentando dizer: Confie em mim. Charmander então atacou. Ele estufou o peito, mirou para baixo e cuspiu as brasas que acertaram o chão logo abaixo de Squirtle. A tartaruga saltitou para trás. Exatamente o que Red queria que ela fizesse.

— Continue, Charmander. Aproxime-se dele.

As brasas tornaram a atingir o campo de batalha, e novamente Squirtle pulou, voltando para mais perto de seu treinador que assistia a cena em silêncio, os olhos verdes estudando a luta com uma frieza quase assustadora. Agora você não vai mais se defender, pensou Red, eu vou te fazer recuar.

Charmander se aproximava com rapidez a cada disparo. Squirtle podia ser ágil, mas não era tão rápido, pelo menos não em terra firme. Enquanto desviava dos ataques de Charmander, a tartaruga era forçada a desandar lentamente, perdendo um espaço valioso a cada evasiva. Em segundos, os dois Pokémon ficaram a centímetros um do outro. Green Carvalho foi o primeiro a reagir a essa aproximação repentina.

— Não dê espaço para ele Squirtle, finalize com outra Investida.

— Charmander, se abaixe e balance a cauda! – Disse Red.

Foi rápido. Assim que a última brasa fumegou na terra, Squirtle lançou-se para a frente, todavia, Charmander se jogou no chão bem a tempo de evitar o impacto ao mesmo tempo em que levantava a cauda bem diante do rosto do Pokémon de água. Quase da mesma forma que Squirtle fizera um minuto antes. Squirtle passou direto e cambaleou, desnorteado, girou de volta para Charmander…

— Derrube-o com a cauda!

Charmander rodopiou e golpeou os calcanhares de Squirtle com o rabo, uma rasteira precisamente executada. A pancada foi tão rápida e forte que fê-lo cair de costas. Squirtle guinchou, tentando desesperadamente se levantar e, pela primeira vez na batalha, Green ficou alerta. Red abriu um sorriso largo, sentindo uma descarga súbita de adrenalina. Era daquilo que ele gostava.

— Agora, Charmander! – Vociferou. – Pule em cima dele e arranhe com toda a sua força!

Charmander prontamente obedeceu. Squirtle ainda tentava debilmente se reerguer quando as patas traseiras do lagarto pisaram em seu ventre, o peso do Pokémon pressionando-o contra o chão, e ele gemeu quando o primeiro arranhão atingiu-o na bochecha. Um segundo arranhão veio logo em seguida, açoitando agora a bochecha oposta. Um terceiro deixou marcas bem na frente de seu rosto. Squirtle se debateu em desespero, mas Charmander equilibrou-se bem e continuou atacando.

Ele desferiu arranhões por todos os lados, com voracidade e rapidez espantosas. Red cerrou os punhos, se pudesse continuar com aquilo por mais alguns segundos, a batalha estaria vencida.

***

Green forçou-se a ficar calmo e pensar friamente. Ele não podia se descontrolar, mas não tinha como negar que a investida de Red realmente o havia pego desprevenido.

Squeerdaw – Squirtle gritou ao ser atingido outra vez. Ele se debatia compulsivamente, tentando a todo custo derrubar Charmander, sem sucesso.

Green observou o Pokémon de fogo. Ele estava conseguindo se manter firme sobre o corpo de Squirtle, mas oscilava constantemente conforme ele lutava para ficar de pé. Tinha de ser rápido. Squirtle era resistente, mas naquele ritmo ele não iria resistir àquilo por muito tempo. Se apenas conseguisse derrubá-lo…

É isso.

— Squirtle, entre no casco!

Charmander conseguiu arranhá-lo mais duas vezes antes dele gritar, e com um impulso desesperado, desaparecer. Em um segundo, Squirtle simplesmente sumiu. Sua cabeça, cauda e membros foram abruptamente recolhidos para dentro do casco. Com o sumiço de seu alvo, Charmander golpeou o ar e desequilibrou-se, caindo para frente. Levantou-se com um sobressalto, chacoalhando a cabeça, confuso.

— Jato d’água!

— Charmander, cuidado! – Red gritou em aflição.

Não havia nada que ele pudesse fazer – Charmander estava bem na linha de tiro de Squirtle. Ainda escondido, o Pokémon aquático disparou um potente jato d’água que atingiu o lagarto nas costas, empurrando-o para longe com uma força tremenda. Green não pôde evitar de ficar impressionado. Squirtle havia mirado e atirado perfeitamente de cabeça para baixo.

Charmander foi arrastado violentamente pelo chão por vários metros, até que o jato se dissipou, deixando um rastro de respingos para trás. A chama na cauda dele tremulava fracamente. Estirado de bruços, ele ainda tentou vãmente levantar a cabeça, mas cedeu ao próprio esforço; desabou e não se mexeu mais.

— Charmander está fora de combate, Squirtle é o vencedor. Isso significa que a vitória é do Green! – Exclamou o Professor. Havia orgulho em sua voz. Ao lado dele, Daisy estava eufórica, os olhos cintilando. – Daisy, pode por favor ir pegar uma poção para mim? Tenho quase certeza que tenho uma no meu escritório lá em cima, em uma das gavetas. Se não estiver lá, procure na enfermaria.

— Pode deixar vovô! – Ela se virou e correu para dentro.

Squirtle finalmente reapareceu. Ele se remexeu, e após algumas tentativas conseguiu se pôr de pé. Seu rosto estava inteiramente marcado por arranhões. Sua respiração vinha na forma de arfadas pesadas. O efeito do cansaço era nítido; aquela fora uma batalha árdua. Green Carvalho tragou-o de volta para a pokébola. Ele fitou a cápsula, pensativo, em seguida murmurou um “bom trabalho” e guardou-a dentro da pochete.

Do outro lado, Red estava incrédulo. Como era possível? Green tinha desmantelado a sua estratégia em poucos segundos e virado o jogo com maestria. Ele não perdera a calma em momento algum, e raciocinou com tamanha frieza e precisão que chegava a ser chocante. De repente, Red percebeu que tudo aquilo que falavam a respeito do Carvalho era verdade. Ele, de fato, era alguma coisa.

Red nunca havia batalhado com alguém tão habilidoso antes.

Quando o choque inicial passou, ele correu até Charmander. Ajoelhou-se diante dele, notando com amargura que ele jazia bastante machucado. Red pegou-o cuidadosamente nos braços e o aninhou contra o seu corpo, dando-lhe um cafuné. Charmander gemeu e abriu os olhos. Encarou o treinador com um olhar abatido.

— Você batalhou muito bem Charmander. – Disse Red. – Eu estou orgulhoso de você. Agora, descanse.

Red sentiu a frustração cair sobre ele como se pesasse uma tonelada. Mergulhado no próprio aborrecimento, demorou a atentar-se na sombra que avultava sobre sua cabeça. Era Green. Ele o olhava com um olhar indecifrável.

— Por um momento, você me surpreendeu – disse Green, monocórdio. – Eu não esperava que Squirtle fosse derrubado daquele jeito. Mas isso é tudo. Eu estou decepcionado, Red. Estava esperando coisa melhor.

Green deu-lhe as costas, indo na direção do avô. Daisy acabava de retornar, trazendo um frasco roxo consigo. Ele parou, olhou-o por cima dos ombros e disse:

— No fim das contas, você não é tudo isso.

Aquelas palavras acertaram Red como um soco no estômago. Ele emudeceu. Tentou responder, mas nenhum som saiu de sua boca. Sentiu-se frustrado, com raiva, e tristemente impotente. Era como se o chão tivesse sumido sob os seus pés.

— Green – censurou o Professor Carvalho. – Não seja arrogante.

— Eu não disse nenhuma mentira. – Deu de ombros. Ele se agachou na frente de Daisy e bagunçou os cabelos dela. – Enfim, maninha, eu já estou indo. Tente não dar muito trabalho para o nosso avô enquanto eu estiver fora, ok?

— Pode deixar – disse Daisy com uma voz tristonha. – Se cuida, tá bom?

— Eu vou sim.

— Não quer tratar o Squirtle antes de sair? – Indagou o Professor.

— Tenho uma poção comigo. Vou cuidar dele assim que sair de Pallet. – Ele fungou. Fez uma pausa. – Eu mando notícias minhas de vez em quando.

— Eu ficarei no aguardo. Mais uma vez, Green, te desejo sorte em sua jornada. Seja cuidadoso. E tente ser mais humilde, por favor.

— Certo, certo.

E com um aceno de mãos final, ele foi embora. Red viu-o se afastar enquanto se levantava ainda segurando Charmander no colo. Green, pensou, desgostoso. O Professor Carvalho e Daisy se aproximaram dele. O velho deu um tapinha em seu ombro, sorrindo gentilmente.

— Foi uma ótima batalha, Red. Você lutou com tudo o que tinha, como sempre.

—  É… mas eu perdi de qualquer jeito. Seu neto é forte demais.

— Green é muito talentoso, sim – ele fez uma pausa, escolhendo as palavras. – Mas você também é. Você e Charmander ainda vão crescer muito e se tornarão mais fortes juntos, tenha certeza disso. E eu peço perdão pelo comportamento do meu neto. Green às vezes é… difícil.

Daisy estendeu a poção para Red.

— Tenta não ficar com muita raiva do meu irmão, tá moço? Ele é meio idiota, mas também sabe ser legal. Um dia eu ainda vou colocar juízo na cabeça dele.

Red sorriu, divertido. Ele aceitou a poção e espirrou um pouco em Charmander. O Pokémon estremeceu, mas pareceu se sentir melhor logo em seguida. Recolheu-o para a pokébola e a pôs no cinto. Tentou devolver o restante da poção, mas Samuel disse:

— Pode ficar com essa.

— Obrigado, Professor. Eu já vou indo, então. Quero tentar chegar em Viridian até a tarde.

— Tudo bem, Red. Boa viagem.

Assim, eles se despediram.

Red deu a volta no laboratório, caminhando sob a sombra das árvores até a cerca. Ele encontrou o portãozinho aberto, passou por ele e pôs-se a descer a colina lentamente, cabisbaixo. As palavras de Green ressoavam em sua cabeça e ele fechou a cara, sentindo-se consternado.

— Mas que droga – resmungou baixinho. – Não era assim que eu queria começar.

— Red.

Ele parou, atento à voz que não esperava ouvir ali. Tinha acabado de chegar na base da colina e encontrou a sua mãe parada bem ali, escorada em um poste. Growly, o Growlithe de estimação deles, estava sentado ao seu lado, abanando o rabo, e latiu animosamente para Red ao vê-lo. 

O nome dela era Naomi Scarlat. 

Ela estava vestida com o uniforme da cafeteria; uma camisa branca e marrom com um bordado do rosto de um Growlithe na altura do peito e calças também marrons. O cabelo curto e liso era de um preto profundo, contrastando com a pele alva, e cuidadosamente penteado de modo a permitir que uma única mecha caísse pelo lado direito do rosto. Seus olhos eram escarlates, tal como os de Red, e o esquerdo tinha uma pinta bem abaixo dele.

Red aproximou-se.

— Mãe…

— Eu estava esperando por você, meu filho. – Ela sorriu carinhosamente para ele. – É claro que eu precisava vir me despedir.

Naomi pôs as mãos nos ombros do filho e deixou escapar um suspiro pesado e saudoso enquanto o olhava de um jeito maternal e afetuoso. Sentia-se tão orgulhosa daquele garoto. Ela dera seu corpo e alma para dar-lhe uma criação decente. Naomi havia, com muito esmero, oferecido à Red toda a educação, amor e carinho que ela tinha para dar, e mesmo assim sabia que ele merecia mil vezes mais. Por vezes, se questionava se não podia ter feito mais por ele. Se podia ter sido uma mãe melhor. Red era um bom garoto; sempre fora compreensivo e nunca deu trabalho, e ele fazia questão de demonstrar, de seu próprio jeito, o quanto amava e era grato a ela e ao pai. Apesar disso, a semente da dúvida nunca abandonava os seus pensamentos: tinha feito um bom trabalho? Será que seu filho era, de fato, feliz?

No entanto, naquele momento, vendo-o diante dela, tais questionamentos se dissiparam. Red já estava com quinze anos, tinha se formado com êxito e, dentro de alguns instantes, estaria partindo em sua própria jornada. Se por um lado Naomi sentia orgulho dele, por outro, ela sofria com o aperto no peito, a angústia por deixá-lo partir. Ela sentiu os olhos lacrimejarem. Pensou que poderia chorar a qualquer momento, mas conteve-se.

— Então, chegou o grande dia, não é? – Ela perguntou roucamente.

— É.

— Como está se sentindo? Ansioso?

— Um pouco – admitiu Red. – Quero dizer, está finalmente acontecendo. Tudo o que acontecer de agora em diante é responsabilidade minha. Está nas minhas mãos, e isso é meio assustador. Mas também é empolgante – disse com um sorriso. – Eu quero explorar todo esse novo mundo que se abriu para mim agora. Quero conhecer novos lugares, pessoas e Pokémon. Quero crescer, ficar mais forte. E, acima de tudo, quero realizar o meu sonho.

Red olhou para ela com aquele olhar sonhador que Naomi tanto admirava nele.

— Eu vou me tornar o melhor dos treinadores, mãe. Eu prometo.

— Eu sei que vai, filho. Tenho total confiança em você. E você tem todo o meu apoio. 

— Obrigado, mãe.

— Já pegou o seu primeiro Pokémon com o Professor Carvalho?

— Sim. Eu escolhi o Charmander. Eu queria poder mostrá-lo para vocês dois, mas… ele precisa muito descansar agora. Nós acabamos de batalhar. E, hum, eu perdi.

— Oh, eu sinto muito. É por isso que você estava com aquela carinha triste há pouco?

Red enrubesceu.

— Sim… Acho que esse não foi um bom começo.

— Não deixe isso te abalar. Você é forte, Red. Lembre-se que o começo não define o resto da história.

— É… acho que você tem razão. – Disse Red. Em seguida, ele deu uma risadinha, e Naomi acabou rindo também.

Ela o abraçou. Red retribuiu, enlaçando-a fortemente com os braços. O carinho de sua mãe, sem a menor sombra de dúvidas, seria a coisa de que Red mais sentiria falta quando estivesse fora. O abraço perdurou por um longo tempo antes deles se separarem. Naomi Scarlat passou delicadamente a mão na bochecha do filho uma última vez, então disse:

— Eu te amo, filho. – Sua voz era chorosa. – Vou sentir muito a sua falta, mas você precisa ser livre para correr atrás do que quer. Boa sorte em sua jornada, e tome cuidado lá fora. Eu vou ficar torcendo por você.

— Também te amo, mãe. – A emoção povoava a voz de Red. Aquela era de longe a mais difícil das despedidas. – Eu ligo de vez em quando – e após uma pausa final, disse: – Até mais.

Growly latiu, Red agachou-se e afagou a cabeça dele em despedida e depois deu as costas para ambos, acenando com a mão enquanto se afastava lentamente em direção a saída de Pallet. Naomi gesticulou de volta, e conforme a silhueta de seu filho tornava-se cada vez mais distante, ela enfim relaxou. A primeira lágrima desceu, seguida por uma segunda e uma terceira, rolando por sua face enquanto ela sentia uma mistura inexplicável de felicidade e tristeza.


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Notas finais do capítulo

*Modesta - Modest (+Sp.Attack, -Attack)
*Chama - Blaze
*Relaxada - Relaxed (+Defense, -Speed)

O feedback de vocês faz o dia desse humilde escritor mais feliz, então não deixem de comentar, se puderem :)

Espero que tenham gostado. Por hoje é só, nós nos vemos no próximo capítulo. Tchau! xD



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