Por enquanto escrita por annaoneannatwo


Capítulo 4
Amigos




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Shouto abre sua caixa de bentô e pega os hashis para começar a comer enquanto ouve a Yaoyorozu e o Iida conversarem sobre as provas. Os dois discutem com tanta seriedade que poderiam fazer alguém pensar que eles correm algum risco de serem reprovados ou algo do tipo, não fosse pelo fato de que são a 2ª e o 3º colocados no ranking das últimas provas. Ou talvez ele que não esteja se preocupando o bastante, ser o 1º colocado não foi algo que Shouto ativamente buscou, então não faz muita diferença pra ele se cair algumas posições nas próximas provas.

— Podemos revisar o conteúdo esse fim de semana. — a Yaoyorozu sugere — Vocês querem vir até minha casa no sábado?

— Claro. Seria ótimo. — o Iida assente.

— Não posso. — Shouto se serve de uma porção de omelete — Tenho um torneio.

— Oh, é mesmo! — ela se lembra.

— Podemos ir torcer por você, se você quiser.

— Tudo bem, não se preocupem. Podem manter seus planos de estudar, se preferirem.

Já faz algumas semanas que ele ouviu alguns burburinhos sobre um possível clima de romance entre a Yaoyorozu e o Iida. Shouto nunca percebeu nada, mesmo estando com eles na maior parte do tempo durante a escola e até fora dela. Eles claramente se entendem bem, são o presidente e a vice-presidente do grêmio estudantil, têm visões parecidas e, mesmo que não admitam, estão competindo academicamente, mas em sua opinião, eles namorarem parece mais um desejo de alguns colegas de sala do que eles próprios. Se é verdade que eles estão namorando ou não, Shouto prefere não importuná-los, é melhor que estudem juntos, só os dois.

Algumas pessoas são verdadeiramente investidas nesse tipo de coisa. Shouto não entende muito bem, mas há quem realmente tenha vontade de ver certos casais se formando, o que é bem curioso considerando o quanto a Yaoyorozu é popular não só entre os meninos, mas as meninas também. E ainda assim, ele ouve algumas delas dizerem o quanto acham que o presidente e a vice são um casal lindo e elegante. 

É difícil entender porque alguém que sente atração por uma pessoa iria preferir vê-la com outra ao invés de pensar em como conquistá-la, o que seria teoricamente o mais natural. Talvez essas pessoas só achem que não têm chance com a Yaoyorozu — provavelmente não têm mesmo, Shouto a conhece desde criança e nunca a viu preocupada com qualquer outra coisa que não fosse excelência acadêmica e doces — ou talvez só queiram ver um romance que consideram ideal se desenrolar bem em sua frente.

Se for esse o caso, Shouto consegue entender melhor, já que está fazendo algo parecido pela Uraraka. Ele se dá conta disso assim que a vê passar em frente à porta de sua sala.

— Já volto. — ele informa os dois antes de se levantar e sair da sala, rumo ao corredor, avistando a garota de cabelos castanhos indo em direção à sua sala, acompanhada das duas amigas que ele viu no outro dia — Uraraka.

Ela se vira e o olha com surpresa.

— Oi! Olá, Todoroki-kun! — ela sorri amistosamente, e Shouto vê que elas têm em mãos caixas de suco e pãezinhos da cantina.

— Querem almoçar com a gente? — ele pergunta, apontando para a sala atrás de si.

As três se entreolham, como se não tivessem entendido o que ele perguntou.

— Hã… “com a gente”? — Uraraka franze o cenho.

— Sim, tô almoçando com o Iida e a Yaoyorozu, eles s-

— Yaoyorozu?! — a de cabelo rosa pergunta em tom mais alto e abre um enorme sorriso — Ai, sim! Vamos, meninas! — ela puxa as duas animadamente.

— Mina, calma- — a de cabelos mais compridos pede.

— Não é todo dia que a gente pode almoçar com a diva da escola! Vem logo! Muito obrigada pelo convite, Todoroki-kun! — ela se aproxima e entra na sala sem nem esperá-lo — Ai, se eu soubesse, tinha trazido um bentô hoje! Mas vocês não se importam se a gente comer esses pãezinhos, né, gente? Inclusive, se vocês quiserem, fiquem à vontade! 

— Hã… obrigado. — o Iida ajusta os óculos — Mas… perdão, nós nos conhecemos?

— Eu te conheço! Você é o Iida Tenya, presidente do grêmio estudantil, e você! — ela aponta energicamente para a Yaoyorozu.

— Eu?

— Eu lembro da sua apresentação de quando você tava no clube de tradições japonesas no primeiro ano! Eu votei em você pra presidente! Meu nome é Ashido Mina, é um prazer! — ela se abaixa para olhar a Yaoyorozu nos olhos

— Oh… obrigada. É um prazer também. — ela abre um sorriso plácido — E vocês são amigas do Todoroki…?

— Ah, eu não! Mas a Ochako é! — ela aponta energicamente para a Uraraka, que parece envergonhada.

— Ah… você é a Uraraka Ochako. — o Iida a reconhece.

— Oi. Você me conhece?

— Apenas de nome. O Todoroki-kun veio me pedir informações sobre você há alguns dias atrás.

— E você sabia alguma coisa? Vocês do conselho estudantil têm fichas com informações de todo mundo da escola? — a Ashido pergunta, rasgando o plástico que envolve o pãozinho.

— Não, foi exatamente o que eu expliquei a ele depois de ele ter me perguntado isso. — ele informa de maneira séria — Mas pelo visto, tudo se resolveu e você a encontrou.

— Não sei porque a Mina é tão fascinada com a ideia de um lugar cheio de informações sobre os alunos da escola quando o próprio cérebro dela já é esse lugar. — a garota de cabelos compridos aponta, o que faz a Uraraka rir — Sou Asui Tsuyu, por sinal. É um prazer.

Todos se cumprimentam apropriadamente e, depois de certa relutância, Uraraka e Asui se juntam a eles nas carteiras ao lado para comerem. E o que se segue é um almoço que passa surpreendentemente rápido enquanto eles conversam, a Ashido é a mais empolgada e faz um monte de perguntas, o que a princípio deixa a Yaoyorozu e o Iida desconfortáveis, mas depois de um tempo, ambos estão envolvidos na conversa, o assunto pouco interessante sobre as provas finalmente deixado de lado.

Não era bem o que Shouto planejava quando convidou as três garotas. O que ele queria era conversar com a Uraraka sobre o que vem pensando para ajudá-la a se aproximar de seu irmão. Já faz uma semana que ela começou a trabalhar no restaurante de seu pai, uma semana desde que eles combinaram que ele seria seu cupido, mas… desde então, mais nada sobre isso foi discutido. Ele não tem a visto com frequência na escola, e ela não mandou nenhuma mensagem perguntando sobre os próximos passos, então ele se sentiu na necessidade de tomar a iniciativa. Mas desde que ela e suas amigas se sentaram para comer, tudo o que fazem é conversarem sobre os mais diversos assuntos, a Yaoyorozu e o Iida fazendo várias perguntas que a distraem e não permitem que Shouto entre no assunto que precisa tratar com ela.

— Bom, foi bem divertido, gente. Mas o sinal tá pra bater, precisamos ir. — a Asui anuncia.

— É verdade! — Uraraka se levanta — Obrigada por almoçarem com a gente. E… obrigada pelo pedaço de peixe, Yaoyorozu-san, tava delicioso!

— Fico feliz que tenha gostado! Minha chef vai ficar contente também. — ela sorri animadamente.

— Ah, já? — a Ashido lamenta — Vamos ficar só mais um pouquinho!

— Atrasar-se para a aula é passível de advertência. —  o Iida informa rapidamente — Eu não gostaria de vê-las em problemas.

— Nossa, você é tão certinho quanto eu imaginei que fosse! — a Ashido faz uma careta — Tá bom, a gente já vai. Vamos fazer isso de novo qualquer dia, ok?

As três vão em direção à porta, e Shouto se levanta para ir até elas.

— Uraraka, espera. — ele a segura pelo ombro levemente — Precisamos conversar.

Ela fica rígida como uma tábua, e então se vira para olhá-lo.

— Eu… eu te mando mensagem depois, Todoroki-kun. Pode ser?

— Bom, por mim tudo bem, só gostaria de conversar sobre o que acho que você deveria fazer para se aproximar do meu i- — ela arregala os olhos e, num movimento rápido, desvencilhar-se dele e o puxa pelo braço, conduzindo-o para fora da sala —  O que-

— Você contou pra eles?

— Como?

— Você contou para o Iida-san e para a Yaoyorozu-san sobre mim e… sobre aquilo… com seu irmão?

— Ah… não, ainda não.

— Ok… — ela suspira aliviada, e então o olha com seriedade — Por favor, não conta pra eles.

— Tá bom.

— Jura?

— Sim. — ele para e pensa — Mas por quê?

— Por que o quê?

— Por que não posso contar para eles?

— Ué, porque… — ela parece perplexa, como se ele fosse incapaz de entender algo óbvio — Porque isso é… vergonhoso demais.

— O que é vergonhoso demais? — ele a encara incisivamente, o que só a faz ruborizar — Eu te ajudar a conquistar meu irmão é vergonhoso? Ou gostar dele é vergonhoso?

— Não, não é isso, mas é só… é algo muito pessoal, ok? Não dá pra ficar falando disso pra todo mundo.

— Você não contou pra Ashido e pra Asui?

— Só que eu gosto dele e que você me arrumou um emprego no restaurante do seu pai. Isso de… você me ajudar, eu não contei.

— Porque é muito pessoal. — ele afirma para tentar entender de vez.

— Isso. Então… até onde elas sabem, eu e você ficamos amigos depois de tudo aquilo.

— E nós não ficamos?

— Não sei… ficamos? — agora é ela que parece confusa — Você me considera sua amiga?

— É, não exatamente… mas eu não sei como definir nossa relação.

— Eu também não. Então… por agora, vamos dizer que somos amigos, ok?

— Ok, sem problemas.

— Ótimo. — ela dá um breve sorriso, e os dois dão um pulinho de susto quando o sinal toca — Preciso ir, obrigada por convidar a gente pro almoço.

— Eu queria convidar só você, mas achei que seria falta de educação não chamar suas amigas.

— É, seria mesmo.

— Pois é. O que eu queria mesmo era falar sobre o que podemos fazer daqui pra frente, mas… você não quer falar disso na frente de outras pessoas, certo?

— Sim. É bem melhor, você não acha?

— Eu não vejo diferença, não sei porque ter vergonha de gostar de alguém,

— Eu… eu já disse, não é vergonha, é só-

— Bora, Ochako! A gente vai se atrasar! — a Ashido passa correndo por eles e a puxa pelo braço. Uraraka segue olhando-o até se afastar de vez.

— Eu te mando uma mensagem mais tarde. — ele diz um pouco mais alto, voltando para a sala, onde o Iida e a Yaoyorozu já estão com as carteiras devidamente arranjadas nos lugares.

— Está tudo bem? — o Iida pergunta, observando-o atentamente,

— Tá sim, por quê?

— Ela te puxou tão de repente para fora da sala. Achei que vocês estivessem discutindo.

— A gente tava, mas acho que está tudo bem.

— Oh… foi algo que nós fizemos? — a Yaoyorozu questiona com leve preocupação.

— Não, não se preocupe.

— Eu não sabia que você havia feito amizade com a garota que estava procurando aquele dia. — o Iida comenta — Aliás, por que você estava a procurando mesmo?

— Só para algo pessoal… — ele pensa mais um pouco — e talvez vergonhoso.

— V-vergonhoso? — a Yaoyorozu se surpreende — Vocês… você e ela são…

— Somos amigos porque não temos um termo melhor, por enquanto.

— Oh! — ela ruboriza — Entendi… ela é bem simpática! As amigas dela também. Fico feliz por você, Todoroki.

— Eu também! — o Iida abre um sorriso que estranhamente o lembra do Natsuo.

— Obrigado? — Shouto agradece sem saber pelo quê, exatamente.

— Certo, agora vá para seu lugar, a aula está para começar.

 

***

 

Ochako termina de jogar o lixo fora, carregando o último saco até a lixeira que fica nos fundos do restaurante. Assim que volta para dentro, ela limpa o suor com a luva de borracha e a destaca, girando o pescoço para aliviar a leve pressão que a incomoda.

Desde que começou no novo trabalho, que termina um pouco mais cedo nos dias de semana, ela voltou a se dedicar com mais afinco ao judô no centro comunitário, mas não deixa de ser só uma vez por semana, bem longe do bastante para se sentir em plena forma. 

Talvez seja mesmo hora de voltar para o clube de judô. Ela não tem certeza se eles ainda recebem inscrições nessa época do ano, mas irá procurar se informar. A ideia de voltar lhe deixa genuinamente empolgada, é quase como se ela tivesse se esquecido o quanto amava fazer judô e o quão frustrante foi ter que deixar o time. Ochako tentou não pensar nisso para não se sentir triste, sabendo que estava fazendo isso pelo bem maior, mas… é, seria muito bom voltar. Ela ficaria extremamente feliz!

De volta à cozinha para verificar se há algo para ela organizar, Ochako se aproxima ainda com certa cautela. Já faz pouco mais de uma semana que ela começou e o trabalho é bem simples apesar de ter mais esforço braçal do que ela imaginava, mas ainda se sente meio estranha e deslocada em vários momentos. Ela é a mais nova daqui, e é também uma das poucas mulheres. Há apenas uma recepcionista, que logicamente não trabalha na cozinha, duas garçonetes e duas cozinheiras, com quem ela nunca trocou muitas palavras além de “sim” e “entendido” quando recebeu alguma ordem de recolher lixo ou lavar panelas. Só há um garoto que tem por volta de sua idade e também trabalha como ajudante geral, mas é dois anos mais velho e já está na faculdade, e ele nunca conversa com ela, mesmo que ela seja o mais amistosa possível.

Vai ver ele tem namorada e acha que ela está com segundas intenções, alguns homens são desse jeito. Ochako é naturalmente extrovertida e gosta de se enturmar, então é sempre o mais simpática que consegue, mas tem quem veja malícia nisso. Ela está se policiando e tentando ser mais fria, o que é bem difícil, mas é o necessário. Seria horrível arrumar confusão em um emprego que conseguiu praticamente como um favor, ela nunca mais conseguiria olhar na cara do Todoroki caso fosse demitida por algo assim!

Não que esteja sendo fácil olhar na cara dele ultimamente… Ochako não deveria ter concordado em tê-lo como… cupido. Que ideia absurda!

Ela sabe que não tem a menor chance com o irmão dele, e mesmo se tivesse, talvez fosse melhor não levar isso tão a sério. É só uma paixonite, ela não quer se casar com o Todoroki Natsuo nem nada do tipo! Esses sentimentos iriam passar com o tempo… não iriam?

Então porque ela concordou com essa maluquice é algo que nem ela mesma sabe. Foi algo no jeito que o Todoroki falou sobre como o irmão dele gostou dela. “Gostar” é uma palavra com um sentido bem amplo, ele pode ter gostado dela como uma pessoa gosta de ver vídeos de gatinhos no celular pra matar o tempo, não quer dizer que essa pessoa adotaria um gato. Basicamente, ele gostar dela pode não significar nada.

Mas também pode significar algo, e é esse “algo” minúsculo e turvo que a fez concordar com a ideia absurda do Todoroki, um garoto que não só parece entender de romance menos ainda que ela, é um completo… lunático! Ele queria falar sobre esse acordo deles na frente de outras pessoas! Como pode ter tão pouca noção sobre questões pessoais e sociais desse jeito?

Quando o conheceu pela primeira vez, Ochako ficou intimidada. Não só ele é lindo, como pareceu alguém sério e estrito, mas depois de algumas conversas, agora ela só o acha meio maluco mesmo. 

É meio reconfortante ver que alguém com aquela pose toda é tão atrapalhado quanto ela, mas é também alarmante, porque isso o torna imprevisível! Ochako não sabe o que esperar dele e se sente um tanto tensa de imaginar o que ele estaria pensando para ajudá-la a se aproximar de seu irmão.

— Tá dispensada por hoje, viu, Uraraka-chan? — o Takami lhe informa ao passar por ela. 

Ele é basicamente a única pessoa com quem ela tem o mínimo de interações que não sejam estritamente relacionadas ao trabalho. Quando ele a levou em um tour pelo restaurante em seu primeiro dia, Ochako sabia que ele tinha alguma posição importante, mas nem imaginava que ele era o sous-chef. O Takami é jovem, não deve nem ter 30 anos, e tem um jeito simpático e informal que não combina com a sua posição, mas faz com que ela se sinta acolhida. É bem diferente do chef Todoroki Enji, com quem ela nunca trocou uma única palavra, mas sempre se sente em alerta quando o vê por perto, como se ele emanasse uma energia que o faz parecer estar sempre em chamas. 

Os irmãos Todoroki não tinham muitas coisas boas para falar sobre o pai, e Ochako até tem curiosidade a respeito, mas sabe que é melhor não tentar se aprofundar nisso. O Todoroki talvez contasse sem grandes rodeios caso ela perguntasse, mas não, isso não importa. Esse é o chefe dela, e pelo que ela consegue observar, todos nessa cozinha não só o respeitam, como o admiram. E dá pra entender o porquê, por mais intimidador que ele pareça, é extremamente profissional e correto, alguém bem diferente do gerente da lojinha de conveniência onde ela trabalhava.

— Muito obrigada, Takami-san. — ela se curva e se prepara para se retirar.

— Ah, antes que eu me esqueça, na sexta o Takeshi não vai vir, você pode vir mais cedo e limpar a grelha?

— Claro! — ela assente.

— Ótimo! Você ainda não lavou a grelha, né? Não é difícil, mas tem que tomar cuidado com algumas coisinhas.

— Entendo.— ela sorri, pensando que não vai ter jeito, seu colega que a evita vai ter que superar qualquer problema que tenha com ela para que o trabalho seja bem feito.

— Pode deixar que eu peço pra ele te ensinar, tá? Uma hora ele vai ter que perder o medo de falar com você, mas eu ajudo como posso por agora.

— Medo? — ela fica surpresa, imaginando se ele leu seus pensamentos, mesmo que isso seja impossível.

— É, tem gente aqui que tá com medo de falar com você por causa do Shouto-kun, mas pode ficar tranquila, logo eles superam isso.

— O… o Sho- o Todoroki-kun?

— É, a gente sabe que foi ele que conseguiu esse emprego pra você, e o chefinho trata aquele moleque como se ele fosse de ouro, então por consequência, você também é intocável, mas logo o pessoal supera isso, tá? Você trabalha bem e é esforçada pra se entrosar, ninguém aqui é burro de ficar se deixando levar por coisas assim.

Ela está… um tanto chocada com o que acaba de ouvir.

As pessoas estão evitando-a por causa do Todoroki? Mas… por qual motivo? Elas acham que… ela só está aqui por um mero favor? Quer dizer, até está, mas… isso não é motivo para evitá-la. 

— Até porque… eu sou só a menina do lixo. — ela dá uma risadinha seca — Takami-san?

— Hum?

— Perdão, mas… você deveria mesmo ter me falado isso? 

— Hum… acho que não, né? É bem inapropriado. — é o que ele diz, mas sua expressão não apresenta o mínimo de remorso — Bom… não conto se você não contar. — ele abre um sorriso brincalhão e bagunça seu cabelo ao passar por ela — Até amanhã!

Ochako troca de roupa e se retira alguns minutos depois, fazendo questão de dizer um tchau bem alto e enérgico. Não faz o menor sentido que as pessoas a evitem por causa do filho do chefe, o Todoroki pode ter dado um enorme empurrão para que ela conseguisse esse trabalho, mas considerando como o chefe parece exigente e atento a cada detalhe do trabalho, ela já teria sido demitida se não fosse minimamente competente,

Além disso, o que quer que as pessoas pensem que é a relação dela com o Todoroki está bem longe da verdade. Ele é… bom, Ochako pediu para que ele dissesse por aí que eles são amigos para não levantar suspeitas sobre a real natureza dessa ligação, mas eles não estão nem perto disso. Já fazia alguns dias que ela nem conversava com ele, ainda muito envergonhada por ter aceitado o papel dele de cupido em sua vida, e quanto mais ela pensa nisso, mais percebe que não consegue mesmo entendê-lo. Por mais honesto e direto que ele seja, o Todoroki é só… alheio demais às emoções dos outros, e Ochako não sabe se seria capaz de ser amiga de alguém assim.

— Boa noite! — ela ouve uma amistosa voz masculina cumprimentá-la quando está virando a esquina para ir à estação, e só não pula de susto por escutar um homem cumprimentando-a assim pois já conhece essa voz, mesmo que eles nem tenham conversado tanto assim.

Encostado em sua moto, usando uma jaqueta jeans clara e um sorriso encantador, está ninguém mais ninguém menos que Todoroki Natsuo.

— T-Todoroki-san! Oi! — Ochako sente seu rosto esquentar imediatamente.

— Te assustei? Desculpa, você parecia tão perdida nos pensamentos.

— Não… não, imagina! — ela balança a cabeça energicamente — Eu só… tava pensando na escola.

— Ah sim, que bom! Já tá indo embora? 

— Sim, o Takami-san me liberou um pouquinho mais cedo. Ah, o Takami-san é o…

— Eu sei quem ele é. — ele sorri — Então, por mais que eu não consiga imaginar como, tá gostando do trabalho?

— Sim! O restaurante é tão bonito, é tudo tão chique! Eu sinto que até eu tenho que tirar o lixo de um jeito chique.

— Hahaha, e tá conseguindo?

— Ainda não, mas vou descobrir o jeito ainda. — ele ri com gosto, e Ochako sente seu coração flutuando. Ele é lindo demais… — Você… vai entrar?

— Não, não. Já tô indo embora, na verdade. Vim aqui porque o Shouto disse que tinha passado aqui mais cedo e esquecido um livro da escola, ele pediu pra eu pegar pra ele. — ele balança o livro antes de guardá-lo na mochila — Ele é meio avoado, você já deve ter percebido.

Oh, o Todoroki esteve no restaurante hoje? Ela não o viu. Será que ele não quis ser visto mesmo? Ele…deixou o livro de propósito pra pedir pro irmão buscá-lo? É essa a estratégia dele? Ochako estava esperando que ele a avisasse qual seria seu próximo passo, mas… é, talvez ser uma surpresa para ela também talvez fosse melhor.

— Mas ele também é bem dedicado aos estudos, né? Pra pedir pra você buscar o livro e tal.

— Bom, isso é. — ele admite — Ele sempre foi assim, até hoje eu não sei se ele estuda muito porque gosta ou porque sente que é o que tem que fazer, mas ele é bem disciplinado.

— Ah, pode ser um pouco das duas coisas. — ela analisa — Ele me parece ser… alguém muito curioso, alguém que quer entender as coisas ao máximo, e só dá pra fazer isso estudando, mesmo que não seja lá a coisa mais empolgante do mundo. Pra mim não é, pelo menos.

— Bom, não fica bem eu falar isso estando na faculdade e tendo que dar um bom exemplo pra alguém mais nova, mas… também não acho muito empolgante. — ele diz, meio sem jeito, e sabe-se lá o porquê, Ochako se sente meio incomodada com o jeito que ele diz “mais nova”, quase soa como se ele quisesse dizer “criança” — É um jeito bem gentil de ver o Shouto o seu.

— Ah, eu só… não o entendo direito, mas é a impressão que eu tenho pelo pouco que a gente conversou. — por mais que não o compreenda, Ochako tem certeza que nisso ela tem razão. Todoroki Shouto é curioso, e faz o possível para dar forma às coisas que não entende. Ela só pôde conhecer o rapaz que gosta graças à essa curiosidade dele.

— Fico feliz que esteja virando amiga dele, Uraraka-san. — ele dá um sorriso sereno — O Shouto é… ele não teve muitas chances de fazer amigos quando era criança, até hoje ainda é meio difícil, então ter alguém como você como amiga pode ser muito bom pra ele.

Ochako sente um aperto no coração, o olhar dele é distante, como se tivesse se perdido em memórias antigas. Ela não sabe de detalhe nenhum sobre as questões familiares deles, que parecem ser bem complicadas e terem afetado os irmãos de maneira profunda, mas consegue entender em partes o que ele diz sobre a dificuldade do Todoroki em fazer amigos.

Hoje no almoço, ela conheceu a Yayorozu e o Iida. Ochako já os conhecia de nome por serem do conselho estudantil, e assim que viu os três juntos, imaginou que eles seriam amigos por serem os mais inteligentes de sua sala e também os mais ricos, segundo o que a Mina lhe contou. Mas durante o almoço, ela ficou com a sensação de que eles não são exatamente amigos, no máximo companheiros. É uma relação bem diferente da que ela tem com a Mina e a Tsuyu, e claro que nem toda amizade precisa ser como a delas, mas Ochako percebeu que entre eles não existe a mesma proximidade e calor.

Então, se o único amigo que ele tinha era o Deku, e ele saiu da escola… talvez o Todoroki não tenha amigos lá, o que é bem triste.

— Eu… não sei se somos bem amigos. — ela assume, mas depois pensa um pouco melhor. — Mas eu gostaria de ser.

— Já é um bom começo. — seu coração falha uma batida ao ouvi-lo com um tom de voz tão doce — Aliás, se você quiser mesmo, eu sei de um bom jeito pra começar!

— Sabe?

— Uhum! Sábado ele tem torneio de arco e flecha. Vai lá assistir e torcer por ele.

— Oh… sábado? Eu… eu gostaria, mas-

— É de manhã. Você só trabalha mais à tarde, né?

— S-sim. — ela cora com o jeito que ele inclina a cabeça. Seus olhos cor de chumbo parecendo ainda mais escuros.

— Legal. Se quiser ir mesmo, eu te pego na sua casa e a gente vai junto, pode ser?

Ochako sente seu corpo formigar. Isso é… o Todoroki pediu para ele convidá-la? É esse o plano dele? É bastante… direto. Ela nem sabe se tem coragem o suficiente para algo assim. Mas a ideia é um tanto empolgante, é preciso admitir.

— Tudo bem. Eu aceito.

— Ótimo! Me passa seu número pra eu pegar seu endereço e a gente combinar o horário certinho! — ele estende o celular em sua direção.

Tentando não tremer de empolgação, ela acena e pega o celular dele, arrepiando-se com o breve contato entre as pontas de seus dedos.

— Pronto. — ela devolve o celular, desviando o olhar por não querer que ele a veja corando até a raiz do cabelo — Eu… preciso ir, Todoroki-san.

— Ah, ok. Eu te daria uma carona, mas não trouxe outro capacete hoje, desculpa.

— Sem problemas. — ela nem sabe se teria condições de sentar na garupa da moto dele, seria demais para seu coração!

— Mas toma cuidado, viu? — ele adverte — Bom, vou te mandar um “oi” e aí você vai ter meu número também. Se tiver algum problema, só me ligar, ok?

— Muito… muito obrigada. Mas acho que vai ficar tudo bem, a rua é bem iluminada, e nem tá tão tarde, eu vou ficar bem.

— E você também pode derrubar qualquer um que tentar alguma gracinha, né? — ele ri, e Ochako sente seu coração saltitar ainda mais — Bom… até mais, Uraraka-san.

— Até!

Ela acena antes de dar as costas pra ele, fechando os olhos e respirando bem fundo quando o faz. Ochako não tava preparada para vê-lo, pode ser que nunca esteja. Ele é… lindo quando ri, mas é ainda mais lindo quando fica sério. Quando estava falando do Todoroki e como está feliz pela amizade deles, Ochako quase acreditou estar em um sonho!

E isso a faz pensar na conversa que teve com ele, o Todoroki… com certeza tem um jeito complicado, mas não dá pra dizer que ele não é eficiente, proporcionando um encontro que pareceu obra do acaso e fazendo com que ela pudesse combinar mais um. Ochako não entende nada de arco e flecha, mas está bem empolgada para assistir ao torneio no sábado! E nem é só porque isso quase parece um encontro, ela quer mesmo apoiar o Todoroki, é o mínimo a se fazer depois do que ele fez por ela.

Por isso, quando chega em casa, a garota manda uma mensagem com um “Obrigada por tudo, Todoroki-kun!”  

Ela não mentiu para o irmão dele. Ochako não sabe se seria capaz de ser amiga de alguém como o Todoroki, mas não dá pra ter certeza se ela não tentar.


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Notas finais do capítulo

Oioi! Chegando com att no feriado!

Eu tava meio enrolando pra escrever esse capítulo porque não sabia bem que rumo eu queria tomar, mas a inspiração me atacou do nada e consegui escrever huhauhsus

Espero que esteja curtindo! Obrigada por ler!



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