Orgulho e Preconceito - Perdida no século XVIII escrita por Aline Lupin


Capítulo 6
Capítulo 6




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Hyde Park era um parque mais movimentado nas temporadas. Havia muitos turistas, no século de Lizzy. Mas, ela não esperava encontrar o mesmo movimento de pessoas naquela tarde, ao caminhar de braços dados ao lado de Georgiana Darcy. Havia cavalheiros e damas de todas as classes sociais. Carruagens e cavalheiros montados em cavalos passavam por um trecho apenas designado para veículos. Pessoas ao lado caminhavam, tranquilamente. Devia ser o clima agradável do verão. Afinal, um dia ensolarado era uma benção para os londrinos.

Lizzy cantarolava a melodia que ouvira Alexander assoviar perto da residência dos Darcy. Ela queria se lembrar da música, mas não conseguia se recordar.

— O que esta cantando, senhorita Elizabeth? – Georgiana perguntou, ao lado dela.

E lhe deu um sorriso adorável, que fazia covinhas em suas bochechas. Foi então que Lizzy notou que estava cantando a melodia da música e ficou ruborizada.

— Me desculpe – ela disse, sem graça – Eu não me lembro. Mas, gostaria de me recordar.

— Alguma composição de Mozart? – ela incentivou – Ou Bach?

— Não, não – Lizzy negou, achando engraçado o fato de que habitantes daquele tempo somente escutariam música clássica, ou música popular que deveria existir entre as classes baixas – Não é tão sofisticada assim.

— Parece uma melodia triste – Georgiana comentou – Se a senhorita canta-la para mim, eu posso tentar toca-la no piano.

— Ó, isso seria maravilhoso – De fato, Lizzy queria ter mais contato com o seu tempo. E adoraria ver um piano de perto, apesar de já ter tido contato com o instrumento. Mas, nunca teve tempo para apreciar – Então, a senhorita sabe tocar?

— Sim, eu sei tocar, dançar, bordar e pintar – ela enumerou seus talentos com orgulho. Lizzy riu internamente pensando que ela seria um fracasso como uma dama. Pois, a única coisa que sabia fazer era trabalhar com o proletariado e escrever. E ela sabia que a palavra proletariado, além do seu conceito viria muito mais tarde – E a senhorita? Com certeza já deve saber dessas coisas.

— Bom, minha educação não foi como a sua, senhorita Georgiana – ela respondeu, sendo o mais sincera possível.

— Ó, não mesmo? A senhorita sabe falar e se articular. Parece vir da nobreza – ela disse, de forma sincera.

Lizzy queria rir daquele comentário.

— Não, não mesmo, senhorita. Sou apenas Elizabeth Bennet. Meus pais eram pessoas comuns. Meu querido pai era advogado e minha mãe era...- Era dentista, mas aquela profissão não seria executada por mulheres. E foi então que ela se perguntou se existiam esses profissionais. Ela esperava muito que sim. E que não fossem bárbaros – Era dona de casa.

— Dona de casa? – Georgiana repetiu, confusa – Acredito que todas as mães ficam em casa, cuidando dela para seus maridos.

— Sim, sim – Lizzy percebeu que havia cometido um erro ao falar daquele modo. Afinal, as mulheres não fariam mais nada a não ser ter filhos e cuidar da casa – Mas, há mulheres que trabalham como costureiras ou lavam roupa para famílias, não há? Ou aquelas que são governantas, criadas. Entre outras profissões.

— Ah, sim, mas isso é para famílias pobres. E sabia que meu irmão ajuda essas famílias? Além de é claro, emprega-los em Pemberley.

Então o senhor Darcy era filantropo? Lizzy pensou consigo mesma. Ao menos, ele não era um dândi que não se preocupava com a situação social das pessoas.

— Isso é muito bom, senhorita. Sabe que nem todos nascem com as mesmas condições que nós – ela disse.

— Infelizmente, não. Mas, seria um castigo divino, senhorita Elizabeth? Sempre vou a igreja, escuto isso do reverendo diz isso.

Lizzy se controlou para não revirar os olhos.

— Ele diz o que, exatamente? – ela perguntou.

— Ele diz que as pessoas pobres, que passam necessidade, estão recebendo um castigo divino por seus pecados. Que de fato, todos nós devemos orar e vigiar pelas ideias vãs desse mundo. E que só os que são batizados vão para o céu.

Era um pensamento limitado, o qual Lizzy não poderia julgar, afinal, naquele tempo ainda existiam pessoas que tinham aquela mentalidade. E infelizmente, não era algo que mudara conforme os anos passavam. Existiam aqueles que ainda acreditavam em castigos divinos. Faltava pensamento critico e pensar que o fato de as pessoas serem pobres e miseráveis era pela desigualdade social e falta de incentivo do parlamento para fazer leis que ajudassem essas pessoas. É claro que no tempo de Lizzy, os problemas eram inúmeros, tanto de ordem social, quanto econômica.

— Não acredito nessa questão do pecado, se me permite ser franca – Lizzy disse, em voz baixa, pois não queria que ninguém a escutasse.

E começou a sair da trilha de pedestres, indo direto para um banco que havia avistado perto do lago Serpentine. Georgiana a acompanhou.

— A senhorita pensa diferente da maioria das pessoas, então – Georgiana disse, enquanto andava ao lado de Lizzy.

— Eu a ofendi? – Lizzy perguntou, preocupada.

As duas sentaram no banco. Lizzy observou que havia um garoto atirando uma pedra no lago, enquanto uma dama o observava a alguns passos. Pelas vestes marrons, ela devia ser sua governanta.

— De modo algum, senhorita – Georgiana respondeu, sem transparecer estar envergonhada com o pensamento de Lizzy – Na verdade, eu estou surpresa apenas pelo seu pensamento. E confesso que não acredito no pecado. Acredito que as pessoas possam fazer o certo e o errado. E isso é ensinado desde o principio. Mas, o pecado em si nos coloca como pessoas terríveis e pode nos levar ao inferno. Contudo, se Deus é toda bondade, não deveríamos ter uma segunda chance.

Lizzy assentiu, entusiasmada por ouvir a lógica de Georgiana. De fato, ela não poderia explicar melhor a situação. Lizzy também não era religiosa e não seguia religião protestante. Seus pais não eram devotos a nenhuma igreja e eram agnósticos. Assim como ela. Então, a noção de pecado não passava por sua mente.

— Sábias palavras, senhorita Georgiana – ela elogiou a jovem, que baixou a cabeça, corando – E devo acrescentar que de fato não há pecado, mas apenas um ser humano que precisa se responsabilizar pelos seus atos. Se for perante a lei dos homens, ele deve se responsabilizar. Se for diante de uma lei divina, bom, isso só se saberá quando morrermos – E então Lizzy pensou que estava sendo muito avançada para o tempo de Georgiana. E se Darcy escutasse sua irmã falando heresias como aquelas, ela teria sérios problemas e Lizzy também. Por isso, acrescentou – Bom, mas vamos manter isso entre nós, afinal, é uma conversa controversa, não acha?

— Concordo – Georgiana assentiu a olhando de forma perspicaz – Nem sempre posso expor meus pensamentos, senhorita Elizabeth. E é bom encontrar uma aliada.

Lizzy deu uma risadinha. Pensava se as sufragistas já estavam em Londres, pedindo por seus direitos. Talvez, Mary Wollstonecraft, pelo período em que ela viveu, já devia ter publicado seu livro sobre o direito das mulheres. E talvez, ela procurasse em uma livraria. Queria a edição encontrar as primeiras publicações.

— Então, minha mais nova aliada, gostaria de ir à livraria e encontrar um livro controverso? – Lizzy perguntou.

Georgiana assentiu, animada.

— Sim, por favor. Que livro seria esse? – ela perguntou.

— Acredito que seja Uma Reivindicação pelos Direitos da Mulher, de Mary Wollstonecraft – Lizzy respondeu.

Os olhos de Lizzy brilharam.

— Meu irmão nunca me deixaria ler esse livro. As damas da sociedade disseram que é impróprio – ela disse, mas deu um sorrisinho e inclinou a cabeça para Lizzy, como se quisesse confidenciar um segredo – Mas, eu adoraria lê-lo, em segredo, é claro.

— Considere seu pedido aceito – Lizzy disse, em um tom conspiratório.

As duas jovens decidiram rumar para a livraria mais próxima a Hyde Park, mas chegando próximo ao local, Lizzy percebeu que não tinha dinheiro, não dinheiro daquele tempo. Dentro da sua jaqueta de malha, ela tinha cartão de crédito, debito e algumas libras, que datavam de pelo menos 221 anos à frente. E com certeza, eles não iriam aceitar aquele dinheiro.

— Senhorita Georgiana, infelizmente esqueci-me de trazer dinheiro – Lizzy disse, segurando a jovem, para que elas parassem na calçada.

— Ora, mas não há problema. Eu trouxe o suficiente para nós duas. Ah, olhe – ela indicou com a cabeça – É Caroline Bingley a senhora Hurst. Senhorita Caroline – Georgiana acenou para a dama de cabelos ruivos, que passeava do outro lado da rua.

Caroline Bingley parecia ter percebido Georgiana ali parada. E fez um comentário à senhora Hurst, que deu uma risadinha. Lizzy apostava que fosse algo maldoso, pois se ela tivesse o mesmo caráter que a da personagem de Jane Austen, com certeza ela deveria ser maldosa e manipuladora. Afinal, era seria culpada por afastar o senhor Bingley e a senhorita Jane Bennet.

— Senhorita Darcy – Caroline cumprimentou, fazendo uma reverência, imitada por Georgiana. Lizzy fez o mesmo, assim como a senhora Hurst. Caroline olhava para Georgiana de forma bajuladora – Que prazer encontra-la nessa tarde esplendida. Apresente-nos sua amiga.

— Essa é a senhorita Elizabeth Bennet, senhorita Caroline. Senhorita Elizabeth, essa é a senhorita Caroline Bingley. Irmã do senhor Charles Bingley. E essa é a senhora Hurst, irmã do senhor Bingley. Eles são amigos da nossa família – Georgiana apresentou as damas, de forma cordial.

Caroline a fitou com os olhos treinados, medindo-a de cima a abaixo, o que irritou Lizzy.

— A senhorita é parente dos Bennet, senhorita Elizabeth? – ela perguntou, arqueando sua sobrancelha ruiva.

Lizzy tentou conter o impulso de revidar.

— Sou parente de uma família Bennet. Mas, a qual se refere?

— De Meryton, condado de Hertfordshire – ela respondeu com um risinho de escarnio para a senhora Hurst – Quantos Bennets existem na Inglaterra? Eu nunca vi tantos em minha vida.

— Realmente, são numerosos. Uma família grande – a senhora Hurst complementou.

E elas sorriam de forma amável, mas era visível o quanto estavam sendo sarcásticas e Lizzy não deixaria por menos.

— Não sou dessa família, senhoritas. Não os conheço. Mas, não me parece ruim ter uma família grande, afinal, são mais irmãos e irmãs para fazer companhia uns aos outros, desde que a companhia seja agradável é claro – Ela queria deixar implícito que a companhia de Caroline e da senhora Hurst não o era.

Mas, elas nem ao menos se deram conta.

— É claro – Caroline disse, desviando seu olhar para Georgiana – Senhorita Georgiana, acredito que ira no baile dos Harris no sábado. Espero que tenha recebido o convite. Se não, eu mesma a convidarei e claro, seu irmão, o senhor Darcy.

Ela estava com as faces coradas ao terminar a frase. Com certeza, era pelo fato de gostar de Darcy. E Lizzy pensou que com certeza, Elizabeth Bennet tomaria o lugar dela e somente seria questão de tempo. Somente seria estranho outra “Elizabeth Bennet” estar na casa dos Darcy. Lizzy precisava urgente sair daquela realidade paralela e não atrapalhar o que fosse acontecer no futuro.

— É claro, nós iremos, senhorita Caroline – Georgiana confirmou – E meu irmão vai estar presente. Com certeza não deixará de acompanha-la, eu presumo, afinal, estão noivos.

Lizzy engasgou, de repente. Ela escutara direito? Darcy e Caroline estavam noivos? Seria possível?

— É claro. Acredito que ele vira me buscar – Caroline disse, com a voz mais aguda e piscando os cílios. Estava com a face ainda mais ruborizada.

E Lizzy perdeu toda a vontade de continuar aquela conversa. Não sabia o motivo, mas seu coração ficou dolorido ao ouvir aquela informação.

— Bom, devemos ir senhorita Georgiana. Espero vê-la no sábado. Até breve, senhorita Elizabeth – ela fez uma reverência, imitada por sua irmã, a senhora Hurst e as duas se afastaram, indo na direção oposta.

Lizzy ainda estava absorta, pensando na informação que recebera e tentando compreender o motivo para estar tão chateada. Ela nem conhecia o senhor Darcy. Por que deveria se preocupar com aquele assunto?

— Senhorita? – Georgiana disse, tocando o braço de Lizzy, que se sobressaltou – Me perdoe. Não queria assusta-la.

— Ah, não me assustou, eu estava apenas distraída – Lizzy disse, olhando para a rua de pedra – É verdade que o senhor Darcy vai se casar?

— Ah, não sei, de fato. Meu irmão não anunciou o noivado. E já faz meses que ele manifestou a intenção de desposar a senhorita Caroline, mas isso foi o que ela alegou. Meu irmão nunca me disse nada sobre isso. Mas, espero o dia que ela ira confirmar.

Foi então que a “ficha” de Lizzy caiu. O que queria dizer que ela entendeu as intenções escusas da senhorita Bingley mais nova. Ela queria de alguma forma entrar para a família Darcy e não sabia como fazer isso. Deveria estar tentando fazer Darcy pedir a mão dela e ao mesmo tempo, conquistar o afeto de Georgiana. Lizzy sentiu raiva, de repente. Como Caroline poderia ser tão manipuladora?

— Bom, vamos até a livraria? – Georgiana tomou a palavra – Ainda quero ler o livro sobre os direitos das mulheres. Parece ser interessante.

— É claro, vamos – Lizzy concordou, mas ainda envolvida nos pensamentos sobre o casamento de Darcy e Caroline.

Elas entraram na livraria e Lizzy pediu um tempo para observar os livros que tinham nas estantes altas, que iam até o teto. Havia tantos exemplares. Alguns eram de Shakespeare, William Blake, entre outros autores. Lizzy procurou por Orgulho e Preconceito, publicados por By a Lady, mas não havia nada. Foi quando se lembrou de que o livro não seria publicado naquele século, mas no próximo, em 1813. E enquanto ela procurava o livro, encontrou um de Ann Radcliffe, Udolfo. Ela fez questão de comprar e levou o de Mary Wollstonecraft.

Ao sair da livraria, estava mais leve, pois a companhia de Georgiana era revigorante. E ela não se sentia sozinha, como se sentia em seu próprio tempo. Apesar de ter sua irmã e seus dois amigos, ela não dispunha de tempo para vê-los, assim como eles para com ela. Meredith somente era possível ver no trabalho, mas elas só almoçavam juntas e saiam aos finais de semanas, mas não em todos. E Georgiana se mostrou tão atenciosa, que Lizzy acabou se agarrando a jovem, de forma que percebeu o quanto sentia a solidão em seu peito.

Quando desceram da carruagem, já passava das cinco da tarde. E encontraram Darcy na sala de estar, o local que elas leriam seu livro. Apesar do calor que fazia do lado de fora, a lareira estava acesa e ele estava lendo um jornal, sentado uma poltrona de couro marrom, com as pernas cruzadas. Suas botas hessian o deixavam mais elegante e ele não usava chapéu. Lizzy pela primeira vez pode ver seus cabelos negros e suas costeletas, que o deixavam charmoso.  

— Ah, ai estão vocês duas – ele disse, baixando o jornal e se levantando, fazendo uma leve reverência a elas, que foi imitada pelas duas – Gostaria de informar que essa noite teremos mais convidados para o jantar. Então, Georgiana – ele olhou para a irmã – Preciso que encontre o vestido adequado para a senhorita Elizabeth. E preciso falar com a senhorita – ele voltou seu olhar para Lizzy, de forma séria.

Lizzy sentia-se desconfortável pela forma que ele a olhava. Era tão sério e carrancudo.

— A sós – ele completou, esperando que algo fosse feito.

— É claro, irmão – Georgiana disse, soltando do braço de Lizzy – Preciso encontrar um vestido para a senhorita – ela disse para Lizzy e sorriu.

Fez uma reverência e saiu da sala, fechando as portas atrás de si.

O silêncio que se seguiu foi algo estranho. Lizzy não sabia se dizia algo para preencher o silêncio aterrador que o cômodo que se instaurou no ambiente. Ou se perguntava a Darcy o que ele queria falar a sós com ela.

— O tempo está realmente agradável essa tarde, senhor Darcy – ela testou a frase, tentando se passar por um habitante daquele século. E afinal, assuntos como o tempo eram mais seguros entre estranhos.

Ela estava com as mãos para frente e as segurava com certa força, devido à ansiedade que sentia ao estar no mesmo ambiente que Darcy. Ele parecia uma figura autoritária, com o reitor da sua faculdade de Literatura. Ou até mesmo o professor que avaliou sua monografia. E por mais que Lizzy fosse comunicativa e inteligente, ela estava nervosa, com as mãos suando diante da presença de Darcy.

— De fato, devo concordar com a senhorita – Darcy disse, com as mãos cruzadas nas costas – Permita acrescentar que a senhorita está adorável nesse vestido. A cor branca lhe cai muito bem.

— Obrigada, senhor Darcy – ela respondeu.

E o silêncio tomou conta da sala novamente. Lizzy olhou para as janelas no estilo francês, atrás de Darcy e pode ver as carruagens passando. E ela se concentrou em olhar para fora e voltou seu olhar para Darcy, quando não podia mais ficar em silêncio. Aguardara tempo demais sem dizer nada. E as normas da etiqueta pediam que se preenchesse o silêncio.

— O senhor passou bem à tarde? –ela perguntou.

— Sim, de fato passei muitíssimo bem, obrigado – ele respondeu.

E mais uma vez, ele não disse nada.

— O senhor devia me perguntar como passei à tarde – ela incentivou.

— Como passou à tarde, senhorita? – ele perguntou e dessa vez, ruborizou.

Ela queria rir. Ele era um papagaio?

— Muito bem senhor. Agora, se eu puder perguntar o que o senhor queria falar comigo?

Ele respirou fundo e fitou os olhos dela de forma desconsertada.

— Eu não sei como começar o assunto, mas vejo que é necessário – ele disse, parecendo incomodado – Veja, senhorita, eu não a conheço. Não sei suas origens. Eu devo me preocupar com isso? Não quero ofende-la, mas me preocupo por Georgiana. E também, por outros motivos.

Lizzy sabia muito bem do que ele falava. E era lógico que um irmão se preocuparia com o bem estar de sua irmã. Lizzy realmente tentou não se ofender com as palavras dele, pois ele tinha seus motivos para desconfiar, mas mesmo assim, estava magoada.

— Não há motivos para se preocupar senhor. E se for esse o caso, eu me retirarei da sua casa – ela disse, tentando controlar sua irritação aparente, mas sua voz estava aguda demais.

Ele comprimiu os lábios, tenso.

— Eu não quero ofende-la, senhorita. E não precisa ir embora. A não ser que tenha para onde ir - ele disse, evitando seu olhar – Eu apenas quero que esse jantar seja tranquilo. Apenas meus amigos virão. Charles Bingley, a senhorita Bingley e o senhor e a senhora Hurst. São amigos da família e gostaria que se alguém perguntasse sobre sua origem, que a senhorita antes me conte. De onde veio e o que fazia perto daqueles apartamentos?

Como ela responderia àquela pergunta? Seria difícil de explicar, por isso disse uma meia verdade:

— Nasci em Yorkshire senhor. Meu pai era advogado. Contudo, ele já faleceu, assim como minha mãe.

— Eu sinto muito – ele disse, talvez, apenas por educação.

— Obrigada – ela agradeceu, de forma seca – E respondendo sua pergunta sobre o que eu fazia naqueles apartamentos, eu moro lá. Eu não sei como explicar isso ao senhor, mas eu resido lá, ou irei residir – Ele franziu o cenho parecendo confuso – Enfim, não há como explicar isso para o senhor. E eu não tenho para onde ir. Por isso, apenas peço sua ajuda, senhor Darcy. Enquanto eu não encontrar um modo de ir para casa, por favor, me ajude a encontrar uma posição como governanta. No momento, o senhor é a única pessoa que pode me ajudar. Outras pessoas não entenderiam meu dilema e me interpretariam mal.

Ele passou a mão no queixo, pensativo. Parecia relutante e responder ao pedido dela. E Lizzy estava desistindo de pedir ajuda a ele, afinal, era óbvio que Darcy desconfiaria dela. Quem naquele tempo não desconfiaria?

— Não há necessidade de a senhorita trabalhar. Pode ficar aqui. Na verdade, pode me ajudar com Georgiana? Ela acabou de debutar na sociedade e não a quero sozinha.  Eu poderia contratar uma acompanhante, mas a senhorita poderia me ajudar com isso. Podemos dizer que a senhorita é filha de uma amiga da minha falecida mãe e que eu prometi ajuda-la. Que tal?

— E por que não podemos dizer a verdade? Que minha família é de Yorkshire? – ela perguntou um pouco irritada por ele ignorar as origens dela e inventar uma mentira. Mas, afinal, ela mesma não contava de onde veio. Mas, isso era omitir, não mentir, é claro.

Ele prontamente respondeu:

— Eu acredito que podemos sim dizer de onde a senhorita veio. Mas, iremos acrescentar esse fato sobre sua mãe ser amiga da minha para que não gerem boatos sobre eu estar a abrigando sob meu teto. A senhorita poderia se passar por acompanhante, mas eu não quero que a senhorita trabalhe para mim. É minha hospede. E acredito que a senhorita seja uma dama, não uma jovem que trabalhe. Talvez, seja uma dama que tenha dado um mau passo...

Naquela altura, Lizzy ficou enfurecida.

— Não sei pelo o que o senhor me toma, mas eu não dei um mau passo, nenhum! – ela negou veemente. Ele se sobressaltou, parecendo assustado com o tom de voz dela – E eu não tenho que ouvir isso. Sinceramente, muito obrigada pela sua hospitalidade, mas eu irei embora imediatamente.

Ela se virou para sair da sala e faria isso, se não fosse Darcy a segurar pelo cotovelo. Ele estava próximo demais dela. Lizzy perdeu o ar e sentiu o corpo respondeu ao toque dele.

— Não há necessidade de ir embora – ele disse em um tom exasperado – Me perdoe.

Ela engoliu a seco. Por que ele estava se preocupando com ela?

— Eu não sei se posso perdoa-lo, senhor – ela disse, se virando para ele, pois não desejava qualquer contato físico com Darcy. Era estranho e desconcertante – É melhor que eu parta. Eu disse que não tinha feito nada de errado e eu jamais faria qualquer mal a sua irmã, mas o senhor não confia em mim.

Darcy parecia abalado com as palavras dela. Parecia arrependido.

— Eu sinto muito, senhorita. Prometo não duvidar da sua índole. É que Georgiana é tudo que tenho agora que...- ele se calou, com um olhar atordoado – Espero que possa me entender, senhorita. Ela é tudo que tenho. É minha família. Mas, eu não deveria ter insultado a senhorita. Por favor, não vá embora.

Lizzy piscou algumas vezes, incrédula. Ele estava pedindo para que ela ficasse? Era um fato curioso ele pedir algo assim, pois eles mal se conheciam.

— Pois bem, eu não irei. Mas, me recuso a ficar sem fazer nada para pagar o senhor. Então, irei me considerar a acompanhante de Georgiana. E não precisa me pagar nada por isso – ela deixou claro, pois não queria que ele pagasse, pelo fato de já esta sob o teto dele, sem pagar por nada.

— De acordo, senhorita – ele assentiu e lhe deu um sorriso caloroso – Então, podemos ao menos manter a descrição, quanto a nos conhecermos? Assim, não haverá nada de errado. E ninguém pensara mal da senhorita. Eu até mesmo vou contratar uma acompanhante para a senhorita, apenas para sua reputação. E a senhorita, é claro, cuidara de Georgiana. Poderia fazer isso por mim? Não confio mais ninguém a ela. E temo...- ele se calou de repente, ficando sério.

— Sim, é claro que irei cuidar de Georgiana, mas senhor, eu devo salientar que nunca debutei na vida – ela apontou.

Ele fez uma careta.

— Nunca? Nem ao menos sabe dançar ou...por todos os santos!

Ele andou de um lado ao outro, pensativo e parou.

— O que a senhorita sabe sobre as etiquetas sociais?

O que Lizzy sabia de fato? Era uma boa pergunta.

— Eu sei ler, escrever, hum...é...eu sei dançar – se dançar como nas boates e shows que ela frequentava contasse, ela saberia dançar. Ao menos, ela sabia dançar a quadrilha e valsa. O que já era um alívio, mas a valsa não devia ser permitida ainda nos salões de bailes de Londres – Eu sei ter uma boa conversa – Ela queria rir de si mesma. Ter uma boa conversa era seu fim. Teria que ser coquete o tempo todo e polida. Era como estar em uma reunião de trabalho ou até mesmo, em um evento social. O que não permitia falar o que se pensava. E Lizzy já estava acostumada.

— Bom, terá que servir. Mas, irei avaliar essa situação, afinal, iremos a muitos bailes nessa temporada e pretendendo que Georgiana se case um dia. E essa temporada ira mostrar o êxito dela.

Lizzy não gostou daquilo. Não parecia algo que Darcy faria com Georgiana, mas afinal, Jane Austen não disse exatamente como era a educação de Georgiana, apenas que ela era uma dama. Então, uma dama teria que pensar em casamento e ter uma família.

— O senhor não obrigara a casar, não é mesmo? – ela perguntou, preocupada com o futuro de Georgiana.

— Eu não vejo por que eu a obrigaria. Mas, um dia ela terá de se casar. Faz parte da vida o casamento e os filhos – ele respondeu, sem a menor emoção.

— E o amor, senhor Darcy? – ela perguntou, pois em nenhuma vez ele havia mencionado. E ele não parecia inclinado a pensar nisso.

— O amor pode vir conforme o casal se conhece. O importante é o respeito mutuo que os dois devem ter um pelo outro - ele respondeu.

Ela não pode fazer uma replica quanto ao comentário dele, pois Georgiana entrou na sala, mostrando o vestido que carregava, junto com uma criada de cabelos castanhos. Lizzy precisou acompanha-la, para provar o vestido para o jantar, mas não parava de pensar nas palavras de Darcy. Ele era tão sem sentimentos que não considerava o amor algo fundamental em uma relação? Ela mesma desistiu de ter relações com qualquer homem pelo fato de não sentir amor. Seria ele alguém que somente se importava com a fortuna e o bom nome? Bom, era óbvio que sim. Mas, mesmo Lizzy sabendo que era algo da mentalidade da época, ela não conseguia não ficar chateada. E isso somente provava que Darcy poderia sim desposar Caroline Bingley. O que deixou Lizzy em pânico e ela não sabia o motivo.  


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