Orgulho e Preconceito - Perdida no século XVIII escrita por Aline Lupin


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Ah, só lembrando que a ideia do celular transportar pessoas é do livro da Carina Rissi. Essa ideia não é minha, ok?



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A carruagem percorreu um pequeno trecho, trepidando sobre a rua de pedra. Contudo, Lizzy estava alheia a tudo ao seu redor. Introspectiva, ela pensava em como sair daquele sonho e se não fosse um sonho, ela pensava em como voltaria para seu tempo. Era quase impossível acreditar que tudo aquilo fosse real, pois ali, diante de si, no banco a sua frente estava o famoso senhor Darcy. Ou seria mera coincidência? Seria possível, talvez, Jane Austen ter baseado sua história em fatos reais? Lizzy quis rir do próprio pensamento. Estava realmente cogitando que havia voltado no tempo.

— Senhorita? – a voz dele chamou sua atenção.

Lizzy levantou o queixo e mirou os olhos azuis do cavalheiro. Ele parecia genuinamente preocupado com ela. Era estranho que o senhor Darcy estivesse realmente preocupado com uma estranha, afinal, ele antes de conhecer sua amada, sua eleita, era um homem frio e soberbo. Orgulhoso de suas origens. Realmente estaria envolvido com uma mulher como ela? Afinal, Lizzy era uma jovem do século XXI e ele um homem do século XVIII. E devia estar escandalizado com sua forma de se vestir. Mas, ele apenas a encarava com pena e preocupação. Isso a fez confiar nele. Ao mesmo tempo em que se questionava se Darcy era real.

— Sim, senhor Darcy? – ela tentou falar de modo educado. E reproduzir tudo que virá nos filmes de época. Afinal, se estava ali, precisava agir de acordo com os costumes. Ela apenas se consolava que não seria por tanto tempo assim.

— O que a senhorita fazia perto daqueles apartamentos para cavalheiros solteiros? – ele inquiriu e seu maxilar havia se retesado.

Ela não compreendeu a pergunta dele.

— Senhor, eu moro lá – Ela se corrigiu mentalmente: Morava lá, dois séculos à frente. Que ironia, não é mesmo? Contudo, como ela conseguiria explicar isso, se ela não conseguia nem explicar para si mesma o que aconteceu?

Ele a fitou com descrença. Ela não poderia culpa-lo, afinal, se aqueles apartamentos eram locados por jovens solteiros, então uma dama do século de Darcy não estaria lá.

— A senhorita está envolvida com algo impróprio? É por isso que está com essas...hum...- ele fez uma careta desgostosa – Roupas? – ele gesticulou com a mão enluvada.

Ela suspirou. Deveria se lembrar de que ele questionaria tudo sobre sua vestimenta que não era comum para a época.

— Senhor, eu não fiz nada de impróprio e espero que acredite em mim – A carruagem trepidou mais uma vez e ela pulou no banco, assim como seu cachorro Boris que acordou do seu sono desorientado – Ó, como essas ruas são terríveis!

De repente, o senhor Darcy sorriu. Seria possível que ele tivesse se divertido com ela ter pulado no banco, devido à trepidação do veículo? Ora essa, ela era motivo de piada?

— O senhor está zombando de mim, não está? – ela indagou, contrariada, cruzando os braços.

Com esse movimento, seu casaco de malha ficou mais afastando, revelando top. Infelizmente, sua pele ficou a vista e Darcy desviou o olhar, constrangido.

— Senhorita, juro que não estou zombando. E peço, por favor, feche seu casaco.

Sua voz continha exasperação. O que divertiu Lizzy. Se ele fosse para seu século, com toda a certeza ficaria horrorizado com as maneiras dos habitantes daquele tempo, inclusive com a vestimenta.

— Peço seu perdão – ela disse, fechando a jaqueta pelo zíper.

O som que o zíper fazia chamou a atenção de Darcy que olhou atentamente para a peça de roupa que ela vestia. Parecia estar curioso.

— Não tem botões? – ele perguntou.

— Não. Só zíper – ela se perguntou se naquele tempo já existia a fabricação de zíper, mas pelo espanto dele, não – Comprei em Paris – ela deu a desculpa perfeita, pois ele relaxou os ombros, se recostando no banco.

Lizzy notou que ele era elegante, até no modo de sentar-se. Contudo, apesar da sua elegância, ele era alto e de ombros largos. Não era tão esguio quanto ela havia imaginado que seria. Ele realmente era um homem em todos os sentidos. Do seu maxilar quadrado, até as costelas escuras. Ela respirou fundo, percebendo o quanto ele tinha uma beleza exuberante para os padrões da época. Ela acreditava que homens do século XVIII seriam muito feios devido à má alimentação, aos vícios e a falta de saneamento básico. Lembrar-se disso deixou-a com medo do que o futuro lhe reservava. Sem banheiro, sem chuveiro, sem água encanada. Sem escovas de dente! Como ela faria para escovar os dentes?

— Há algo errado comigo, senhorita? Parece estar me fitando tempo demais – Ele parecia desconsertado e um pouco ultrajado.

Ela sabia que era falta de educação encarar outra pessoa por muito tempo e isso valia também para seu tempo. Então, desviou o olhar para a janela. Londres estava irreconhecível. Não era a mesma cidade moderna, mas também com arquitetura antiga. Era simplesmente outra cidade diante de si. Aquela que só poderia ser vista em fragmentos, por todo lugar que ela fosse.

— Não há nada de errado, senhor. Eu estava distraída – ela respondeu.

— Sim, eu vejo – ele disse, com um tom sarcástico.

E ali estava algo que ela não esperava. Ouvi-lo falar daquela maneira. Ela não sabia se deveria ficar brava ou rir disso. Foi então que se lembrou do fato de que Darcy estava em frente ao prédio onde ela supostamente deveria morar. O que ele fazia ali? E foi isso que perguntou.

— O que o senhor fazia naquela rua, quando me encontrou?

— Assuntos particulares, com certo cavalheiro, que não quero ter mais o desprazer de encontrar – ele respondeu, com o semblante zangado.

Ela percebeu que não deveria ter perguntado aquilo, pois o silêncio desconfortável instaurou no interior da carruagem. Se ele demonstrou simpatia por ela no inicio, no momento parecia não ter mais. E estava taciturno. Ela por várias vezes abriu e fechou a boca para falar alguma coisa que preenchesse o silêncio no ambiente, mas se não era interesse de Darcy conversar, ela não iria se esforçar para isso. E ali ele mostrava sua atitude arrogante tão conhecida no romance de Jane Austen. Lizzy tinha certeza que deveria estar sonhando, pois não era possível um personagem fictício ser real, muito menos viajar no tempo para conhecer um personagem que nem ao menos existe.  

Depois de mais dez minutos, a carruagem parou em frente a uma residência elegante, com a fachada creme e um portão de ferro separando a entrada. Havia um jardim privado, com flores na parte de dentro. Aquela deveria ser a residência dos Bingley. E foi então que Lizzy lembrou-se de que se realmente estivesse na história Orgulho e Preconceito, haveria uma dama chamada Caroline Bingley, que não era nada agradável e que ficaria horrorizada por vê-la vestindo aquelas roupas. Ela queria um modo de escapar daquele confronto e tentou falar com Darcy sobre isso, mas ele disse, abrindo a porta dele:

— Fique aqui, senhorita. Eu voltarei em breve – ele pediu.

— Ah, sim – ela concordou, sem entender o que ele pretendia.

Ele saiu da carruagem, fechando a porta atrás de si e Lizzy esperou instantes agoniantes pela volta de Darcy. Ele era a única pessoa que ela poderia confiar naquele tempo. De tão nervosa com seu destino, ela pegou Boris do outro assento, que dormia profundamente e colocou em seu colo, acariciando os pelos encaracolados do cachorro.

— Boris, o que faremos? – ela perguntou, com uma voz sofrida – E se quiserem me deixar em um manicômio?

Ela pensou nos tratamentos terríveis que uma pessoa recebia naqueles lugares, onde havia pessoas saudáveis e pessoas realmente com problemas. E ninguém era tratado de forma humana, não para os padrões do seu tempo. Era um tratamento desumano. Ela sentiu arrepios somente de pensar nisso.

Logo Darcy entrou na carruagem e em seguida, uma jovem de cabelos loiros, com um coque elegante e um vestido de musselina branca entraram com ele. Ela parecia jovem. Com talvez dezesseis ou dezessete anos. Tinha os mesmos olhos de Darcy. Só poderia ser a senhorita Darcy, Lizzy pensou consigo mesma.

— Senhorita, essa é minha irmã, Georgina Darcy. Georgina, essa é a senhorita...er... – ele parecia ter constatado que não havia perguntado o nome dela.

— Sou a senhorita Elizabeth Bennet – ela respondeu por ele, com um sorriso, mesmo sentindo por dentro o estomago revolto.

A jovem senhorita Darcy encarava ela com o olhar assustado. Com certeza era devido às roupas.

— Ela foi roubada, Georgina – ele disse rapidamente.

Lizzy fez uma careta diante daquilo. Ele recorreu a uma mentira? Logo a senhorita Darcy transformou seu semblante assustado para pena.

— Eu sinto muito, senhorita Bennet – ela disse sincera – Com certeza meu irmão irá ajuda-la a encontrar sua casa. E irmão – ela tocou do braço dele, olhando-o – Nós devemos encontrar algo para ela vestir. Devemos ir imediatamente para casa.

— Concordo – Darcy assentiu.

Ele deu um soquinho no teto da carruagem, que começou a andar e Lizzy ficou ainda mais desconfortável com a adição de mais uma pessoa no interior da carruagem e que tinha o nome de Georgina Darcy. Ela havia realmente batido a cabeça com força, ao tropeçar no parque. Pois, só poderia ter tropeçado, realmente.

— A senhorita tem um cachorrinho adorável – Georgina preencheu o silêncio, com um comentário e um sorriso doce.

Lizzy se sentiu mais a vontade. Quanto que Darcy estava com um semblante fechado, olhando para a janela. Ela se perguntava o motivo para ele ser tão insistente em ajudar uma estranha. E também se perguntava se estava sendo um incomodo para ele, pois Darcy parecia mais sério do que antes.

— Ah, sim. Boris é muito amável. Gostaria de toca-lo? – ela ofereceu.

Nesse momento, Darcy virou a cabeça e olhou em advertência para a irmã. Seria possível que ele achasse que seu cão era sarnento? Ele tomou várias vacinas. E tinha tomado banho, ora essa. Não era um cão sarnento.

Georgina se aquiesceu no banco, olhando para as mãos com luvas de renda, sobre o colo.

— Em outra oportunidade – ela disse, com educação.

— É claro – Lizzy mirou Darcy, que desviou o olhar dela para janela – Mas, com certeza que a senhorita terá o prazer de conhecer Boris. Ele é limpo e muito dócil. Com certeza, ele não ira morde-la.

— Tenho a certeza de que vou gostar muito – Georgina disse, com certa animação, parecendo alheia a provocação de Lizzy para Darcy, que fez questão de ignora-la – Eu adoro cães. Nós temos dois spaniels em Pemberley. Não é mesmo, irmão? – ela olhou de forma significativa para Darcy.

Ele desviou o olhar da janela e assentiu para ela.

— Ah, sim, temos – ele respondeu e ficou em silêncio.

O olhar de Darcy repousou no rosto de Lizzy. Ele estava sério, dessa vez. Ela engoliu a seco, incomodada. Depois, ele virou seu rosto mais uma vez para janela.

— Eu adoraria conhecer seus dois cachorros – Lizzy disse a Georgina, de forma que o assunto continuasse – Eu amo cachorros. Seus cachorros são para a caça? – Afinal, o spaniel era usado para caçadas que os cavalheiros abastados promoviam em suas propriedades.

— Sim – Georgina assentiu - Mas, Darcy aprecia mais a pesca.

— De fato, tenho uma preferência por um esporte que não seja brutal. E preferiu a calma que a pescaria possa trazer – ele disse.

Lizzy sentiu de repente uma forte simpatia por Darcy. Ele não era frívolo como os cavalheiros daquele tempo. Um homem que gostava de caçar muitas vezes caçava apenas pela diversão de abater um animal. E Lizzy não suportava crueldade aos animais. Ela até mesmo considerou ser vegetariana, mas falhou miseravelmente. Mas, pelo menos havia tentado.

A conversa dissipou, no momento em que a carruagem parou em frente a uma casa no mesmo estilo que as dos Bingley.

— Ah, chegamos – Georgina disse – Vamos senhorita Elizabeth – ela convidou. E dessa vez falou com mais proximidade a Lizzy – Quero ajuda-la a encontrar um vestido.

Lizzy saiu da carruagem e sentiu o medo inunda-la. Segurou Boris em seu colo, sentindo que aquele sonho estava demorando tempo demais em acabar. Estava diante de uma casa de dois andares com pelo menos seis janelas. Havia até mesmo uma sacada. Na entrada havia uma varanda. E havia um jardim privado com uma árvore. Seria possível que tudo aquilo fosse real? Ela olhou por cima do ombro, no momento em que a carruagem se afastava. Realmente, não havia duvidas. Havia sido transportada ao século XVIII, sem bilhete de volta.


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