Orgulho e Preconceito - Perdida no século XVIII escrita por Aline Lupin


Capítulo 23
Capítulo 23




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Lizzy, deitada em sua cama olhava para o teto, tentando entender o que havia acontecido entre ela e Darcy. Tudo parecia tão certo dentro da biblioteca. O beijo, seu toque. As palavras trocadas. A forma como ele implorara a ela seu amor. Ela sentiu a garganta apertar, ao sentir que de fato, eles não teriam uma chance para viverem o que sentiam. Não podia mentir para si mesma, ela não desejava permanecer os restos de seus dias naquele tempo que encaravam as mulheres como objetos e não como seres que tinham os mesmos direitos do que os homens.

Não poderia culpar Darcy por isso. Ele se mostrava tão gentil, até mesmo mais compreensivo do que ela poderia imaginar de um do século XVIII. Poderia ter dito que a mulher deveria obedecer seu marido, mas logo reconsiderou e reconheceu a força dela, quanto a não se deixar ser submissa a vontade de um homem. Então, talvez, ela poderia ser livre ao lado dele. Contudo, haviam tantas implicações em ficar. Ela tinha medo das doenças, além de saber que ali não teria as mesmas facilidades do mundo moderno. Não havia médicos, não havia eletricidade, água encanada. Eram tantas coisas para enumerar, que ela não conseguia pensar direito. Também havia o fato de que assim que ela soubesse como cumprir sua missão ali, ela voltaria para casa. Talvez, pudesse pedir para Alexander deixa-la no século XVIII. Mas, a que preço? Ela não sabia se valia a pena.

Estava agoniada, de repente. Ela seria tão fraca assim, para não enfrentar as adversidades daquele tempo, para estar com Darcy? Seria tão fraca assim, para não lutar pelo homem que amava? Se assustou com seus próprios pensamentos e a profundidade deles. O amor que sentia dentro do peito parecia preenche-la por inteira. De corpo e alma. E se Darcy havia dito que ele estava tão envolvido por ela, que a amava tanto, Lizzy também sentia o mesmo. Apesar de tentar negar e dizer a si mesma que era apenas uma paixão passageira, que passaria rapidamente. Era apenas uma forma de se manter longe daquele sentimento que a assustava. Sentimento esse que a faria renunciar todo o mundo seguro que conhecia, para ficar ao lado de Darcy.

Ela tentou dormir, pois não tinha ainda a resposta que precisava. Se ficaria ou não naquele século e se tornaria uma dama, para viver uma vida com Darcy. Não conseguia pensar na possibilidade de se apagar, ser alguém diferente, apenas para agrada-lo, para ser uma mulher mais condizente com aquele século.

*

No dia seguinte, Lizzy acordou cedo, antes mesmo de ser despertada por uma criada. Ela fez sua toalete e vestiu seu vestido simples, de cor cinza. Amarrou os cabelos em coque simples e colocou suas botas inseparáveis e saiu do quarto. Havia visto que do lado de fora o céu estava claro, sem nuvens. Seria bom dar uma caminhada pela propriedade, ela pensou, antes de tomar o café da manhã. Queria observar todo o esplendor daquele lugar. A natureza era algo de que ela mais gostava de apreciar. Lizzy ainda sentia falta de Boris. Pensava no seu cão, que era seu companheiro inseparável. Será que ele estaria bem? Alguém estava cuidando dele? E o alimentado apenas com ração? Estava enviando Boris regularmente para ser tosado? Ela estava tão distraída em seus próprios questionamentos que se perdeu nos corredores daquela mansão.

Sabia que havia descido três lances de escada, mas não encontrava a saída a porta que dava entrada a mansão. Devia ter passado por ela, sem ao menos perceber. E agora, estava em uma sala cheias de esculturas e quadros. Parou para observar o local e viu esculturas gregas, mas também, da família Darcy. Uma que chamou sua atenção era de Georgiana, apenas seu busto, sob um pedestal. Suas feições eram ainda infantis, mas Lizzy sabia que era ela, pelos traços. O artista capitou o olhar calmo e plácido da jovem com perfeição. Além de capitar com maestria os traços delicados do seu rosto.

Lizzy desviou o olhar em seguida para outro busto. Aquele a fez sentir algo muito diferente. Seu coração acelerou dentro do peito. Ela estava vendo a escultura de Darcy. Era tão perfeita, até mesmo havia o olhar solene daquele homem. Sua beleza havia sido preservada na escultura, parecendo que ela estava vendo uma réplica de Darcy, contudo em mármore. Ela levantou a mão, para tocar a estatua, sentindo a superfície lisa e gelada nas pontas dos dedos. Podia até mesmo dizer que ele estava olhando diretamente para ela, com seu olhar característico, quando ele entrava em algum ambiente. Todos admiravam aquele homem pelo ar aristocrático e sério que ele exalava. Lizzy já havia percebido isso. Ela mesmo não conseguia se render e o admirava de longe, mesmo acreditando que ele parecia um pouquinho esnobe.

— Vejo que apreciou minha estatua, senhorita Elizabeth – a voz de Darcy, atrás de si, a surpreendeu.

Ela quase dera um pulo, se fosse sincera. Virou-se para ele, imediatamente e cruzou os braços atrás das costas. Seu coração batia tão rápido, que ela temia que ele pudesse perceber o quanto ela estava constrangida por ter sido pega em flagra, admirando seu busto.

— Sr...Sr. Darcy – ela balbuciou, com as faces afogueadas.

— Bom dia, Elizabeth – ele disse com a voz baixa e tenra. Parecia uma caricia aos seus ouvidos.

Dessa vez suas pernas ficaram bambas, ainda mais pelo pequeno sorriso que se formava nos lábios dele. Seus olhos reluziam satisfação. De fato, ele era um convencido de sua beleza. Ela sabia que ele devia estar se deliciando por vê-la admira-lo, mesmo que fosse apenas a estátua. Mas, não confessaria nem morta que ficou realmente impressionada com o rosto dele. Contudo, a aparição do Darcy real era muito mais deslumbrante que replica. E seu sorriso, aquele sorriso...por todos os santos! Ela iria se render a ele em segundos, apenas por aquele sorriso.

— Bom dia – ela sussurrou, envergonhada – Eu me perdi nessa mansão, Sr. Darcy. Estava procurando a saída.

Ele anuiu levemente com a cabeça.

— Posso mostrar a saída para a senhorita, mas me diga primeiro, gostou da minha estatua?

Ora, mas que pergunta era aquela? E aquele sorriso que ele exibia? Era tão convencido. Mas, ao mesmo tempo, ele não mostrava prepotência. Ele parecia apenas curioso pela resposta de Lizzy.

— Bom...acredito que o escultor é um excelente artista. Conseguiu pegar sua essência – ela respondeu, sem se comprometer.

— Pegar minha essência? – Ele repetiu, com as sobrancelhas arqueadas – Interessante. Então, ele capitou aquilo que realmente sou, acredita?

— Exatamente. Capitou seu espirito. Não é apenas o trabalho de deixar a escultura semelhante ao senhor, mas é a forma como ele capitou seu olhar, deixando a estatua viva. Parece que estou vendo realmente o senhor nela. Veja – ela se virou, para apontar para o trabalho de escultura – Veja como a estatua demonstra vivacidade. Até mesmo sua inteligência. Seu olhar sério e aristocrático. Até mesmo sua beleza está contida aqui...

— Minha beleza, senhorita? – Ele perguntou, ao lado dela, em um tom jocoso. Foi então que Lizzy percebeu que havia falado demais.

— Eu...é...bem...o senhor sabe que é um cavalheiro bem apessoado. Todos devem lhe dizer isso. Não é um segredo – ela tentou justificar, com as bochechas quentes. Nem tentou olhar, pois sabia que ele notaria o seu desconforto.

— Ah, sim. Devo ter algum tipo de beleza, eu presumo, mas isso não é o mais importante para mim – ele disse, mais próximo dela, dessa vez. Ela se virou no exato momento em que ele a fitava com um olhar diferente. Aquela mesma paixão que ela vira durante a viagem até Derbyshire – O que me importa, devo confessar, é se uma dama em especial me aprecia de fato. Mas, não pela minha beleza, ou fortuna, mas por aquilo que sou.

Ela engoliu a seco. Ah, se ele soubesse que Lizzy o apreciava em todos os sentidos.

— Tenho certeza de que o senhor é bem apreciado pelo que é – ela disse, em voz baixa, ainda sem desviar o olhar dele.

Ele ficou mais perto dessa vez, há centímetros dela. Lizzy prendeu a respiração, de repente. A presença dele a deixava nervosa ainda. E ao mesmo tempo, ansiando por estar bem perto dele. Sentir mais uma vez seu toque. Principalmente, seus lábios.

— Isso é bom – ele sussurrou – Se for realmente assim, espero conquistar o afeto dela. E seu amor também. Será que um dia terei o amor dela, senhorita? Acredita que sou digno dela?

Lizzy sentiu todo seu corpo queimar ao ouvir aquelas perguntas. Será que ele estava falando sobre os dois? Ou ele estava apenas flertando? Ah, ela estava tão confusa.

— Eu acredito que...acredito que ela já venha sentindo exatamente o que o senhor está perguntando – ela respondeu.

— É mesmo? – ele perguntou, parecendo contente com a resposta e sorriu de forma ampla, deixando Lizzy ainda mais admirada com ele. O rosto de Darcy sempre mergulhado em seriedade, suavizava e era visível o quanto sua beleza se acentuava – Eu acredito que serei o homem mais feliz do mundo quando ela disser diretamente a mim que me ama e aceita se casar comigo. Acha que um dia ela dirá?

Lizzy sentiu o coração galopar dentro do peito. Será que um dia ela diria que o amava e aceitaria se casar com ele? Ela estava realmente cogitando tudo isso? Aceitando que nunca mais voltaria para sua casa?

Então, para ironia do destino, Georgiana apareceu no salão de esculturas.

— Lizzie, Darcy, ai estão vocês! Vamos fazer um piquenique hoje?

Darcy se virou e Lizzy pode soltar o ar que prendia. Não sabia como responder as perguntas de Darcy. Não estava preparada para aquilo. E não havia entendido o motivo para ele perguntar dela, como se ela não estivesse ali. Porque de fato, só poderia ser ela a dama de quem ele estava se referindo na conversa, ou não era?

— Bom dia Georgiana – Darcy disse, com a voz ofegante – É uma ideia excelente. O que acha, senhorita Elizabeth? – Ele a olhou de canto. Seu olhar ainda demonstrava todo o carinho que ele parecia querer dar a ela. E isso aqueceu o coração de Lizzy.

— Sim, uma ótima ideia – ela respondeu, sincera.

*

Eles caminharam até um bosque que tinha na propriedade e Georgiana estendeu a toalha para forrar o chão. Colocou a cesta de piquenique e pediu para que todos se sentassem. Elizabeth ficou ao lado de Georgiana e Richard, que havia sido convidado também, ficou ao lado de Darcy.

Lizzy ainda tentava assimilar toda a conversa que teve com Darcy na mansão e tentava ainda encontrar uma resposta. Contudo, Georgiana a distraiu com uma conversa. Ela ainda estava terminando de planejar o baile e pedia a opinião de Lizzy quanto a decoração.

— Não sei, talvez, flores roxas e brancas? – Lizzy sugeriu como decoração para as flores que Georgiana queria colocar no salão de baile.

Ela pegou dentro da cesta queijo cortado em cubinhos e colocou um na boca. Tinha um gosto maravilhoso. Depois pegou torradas e passou geleia de framboesa, gemendo em prazer. Tudo era tão bom naquele lugar. Até mesmo o céu que estava azul e o clima estava tão agradável. Então, seu olhar foi para frente e ela pode notar que Darcy a fitava fixamente, enquanto Richard falava com ele. Darcy não parecia prestar a devida atenção ao primo. Lizzy deu um sorriso para ele, achando divertido o fato de que ele estava absorto, a fitando. Ele fez o mesmo de volta, a deixando com coração aquecido. Por Deus, como ela amava aquele homem!

—  Lizzie? – Georgiana chamou.

— Ah, disse alguma coisa? – Lizzy perguntou, piscando os olhos, atônita. Depois, desviou o olhar de Darcy para Georgiana, que a encarava com um sorriso malicioso – O que foi? Perdi algo?

— Nada não – Georgiana respondeu, parecendo muito alegre. Será que ela tinha notado algo? Será que sabia que Lizzy estava olhando para Darcy de forma indecorosa? Será que ficaria chateada com isso? – Eu apenas estou percebendo que você e Darcy estão bem distraídos essa manhã. Não acha primo Richard.

Richard assentiu, com um olhar igual ao da prima. E Lizzy começou a se sentir nervosa. Não queria que ninguém soubesse o que os dois fizeram na biblioteca. Nem que ela estava gostando de Darcy. Não estava preparada ainda para admitir para todos que ela o amava. Nem havia dito isso a ele ainda.

— Eu acredito que Darcy nem me ouviu a metade do tempo e só ficava balançado a cabeça em concordância – Richard zombou – Quer compartilhar conosco o motivo da sua felicidade, Darcy?

— Eu...- ele parecia envergonhado dessa vez – Apenas estou feliz por uma coisa. Mas, em breve vocês irão saber. No baile, na verdade?

— No baile? – Lizzy perguntou, surpresa. O que aconteceria no baile?

— Sim, no baile, senhorita – Darcy respondeu, com um olhar intenso para ela – É o motivo para promovê-lo. Tenho um anuncio a fazer nesse dia.

— Anuncio? – Ela balbuciou a pergunta, atônita. Fosse o que ela estava pensando, ela ainda não estava preparada para isso.

— Que maravilha, irmão! – Georgiana disse, entusiasmada – Mal posso esperar para o baile!

— O que? Diga agora que anuncio vai ser esse? – Lizzy exigiu.

— Deixe que Darcy nos surpreenda, senhorita Elizabeth – Richard disse, pegando um pedaço de pão e levando a boca.

— Tenho certeza de que vai gostar, senhorita – Darcy garantiu.

— Vou? Eu deveria...deveria gostar? – Ela perguntou, nervosa.

De repente, a expressão de Darcy se transformou. Ele parecia um pouco inseguro. Lizzy não sabia como lidar com aquilo. Ela sabia o que iria acontecer no baile. Sabia que ele a pediria em casamento. Não era isso que acontecia normalmente naquele tempo? E Lizzy não estava preparada para isso. Não ainda. Então, como ela não conseguia ficar ali parada, pois estava prestes a ter um ataque de pânico, se levantou para caminhar e espairecer. Os presentes a fitaram em surpresa.

— Eu...eu preciso de ar. Já volto. Não esperem por mim

Ela deu as costas ao grupo e caminhou para longe, adentrando no bosque. Podia ouvir Georgiana pedir que ela esperasse, mas Lizzy não fez isso. Ela começou a correr por entre as arvores, sentindo que precisava manter distância deles.

— Não...não estou pronta – ela sussurrou – Não pode ser isso o anuncio...não pode...

Lizzy correu até chegar em um campo aberto. Sabia que se continuasse, iria parar em um lugar que desconhecia e não sabia como voltar. Então, ela desabou no chão. Apenas permaneceu sentada, abraçando as pernas contra o joelho, sentindo o medo consumi-la. Ela não estava pronta ainda para casar. Já estava confusa demais com o fato de amar aquele homem. Mas, casar não era o que estava nos seus planos. Não ainda. E como faria isso, não sabendo quanto tempo ainda tinha naquele século?

Ela escutou o som de algo vibrar dentro do bolso da sua saia. Estava carregando o celular, desde que saiu de Londres. O celular que Alexander havia dado a ela. Pegou o objeto retangular do bolso e tocou a tela com o dedo indicador. Havia uma mensagem de um número desconhecido. Ela abriu e leu:

 

“Elizabeth, meus parabéns. Você já concluiu metade da sua missão. Em breve, você voltara para casa.”

 

— Eu vou voltar para casa em breve? – Ela sussurrou, feliz pela noticia. 

Mas, então, sentiu um aperto em seu coração. E um desanimo se apossou dela. Ela não queria deixá-los. Não queria se afastar dos Darcy. Apesar disso, ficar ali seria se condenar a uma vida para qual ela não nasceu. E a mensagem era clara. Ela havia cumprido metade da missão a qual ela não sabia qual era. E logo ela estaria em casa. Na sua casa. Não havia chance de ficar com Darcy. A não ser que...

— A não ser que eu guarde o celular em um lugar que esteja fora do meu alcance. É isso – ela estalou os dedos, pela grande ideia que tivera – Vou guardar o celular, ou enterrar...não sei...só assim, ficando longe dele, não voltarei para casa e Alexander não vai poder me forçar. Eu pedirei a ele para que não me leve.

Estava decidido. Não importava que ela sentisse vontade de voltar para casa Ali, com Darcy e Georgiana, ela já se sentia em casa. E por mais apavorada que estivesse com a ideia de casamento, ficaria ao lado daquela família. Não iria embora, mesmo com saudades da sua própria casa e dos seus amigos, além da sua irmã Jane. Além do mais, o anuncio de Darcy no baile poderia não ser o casamento deles, mas outra notícia.

— Devo estar imaginativa demais. Acabamos de nos beijar, ora essa – ela pensou consigo mesma, se levantando e guardando o celular no bolso.

Voltaria para a mansão e seguiria com sua vida ali. Já estava decidido. Ela não voltaria mais para casa. Apenas precisava se livrar do celular. E ela já sabia exatamente como fazer isso.


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