Uma Noite escrita por forkswann


Capítulo 1
Capítulo Unico




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Sinto como se estivesse me afogando. Afundando cada vez mais e mais, sem retorno. Sem ar. 

Levo uma mão ao peito, tentando controlar minha respiração ofegante. Tudo vai dar certo, tem que dar certo. 

— Sra. Swan, o seu carro já está à sua espera. – Minha assistente avisa. Eu aceno para mostrar que ouvi, mas continuo de costas para ela. 

— Onde estão as crianças? – Pergunto, então, tentando manter a voz firme.

— Seu marido as pegou na escola e disse que vai tentar comparecer à sessão.

— Tentar – murmuro em voz baixa e com repulsa, ela não consegue ouvir. 

Coloco os óculos escuros para tentar disfarçar os olhos vermelhos da minha última crise de choro e pego meu casaco de sua mão estendida sem olhar para ela. Vai dar tudo certo, fico repetindo para mim mesma, como um mantra. 

O caminho até a livraria é silencioso, melancólico e um pouco patético. Em algum momento entre a empresa da minha família e a livraria, eu acabo pedindo para que o motorista levante a janela privada entre nossas cabines, apenas para poder chorar em paz um pouquinho mais.

Como ele pode fazer isso? Me pergunto. Agindo como um covarde, evitando conversas. 

Alice já está me esperando com sua bolsa de maquiagem pronta quando chego. Ela faz carinho em meus cabelos quando me sento na cadeira à sua frente e me deixa em silêncio até que eu esteja pronta para falar.

— Ele está me traindo - digo com a voz rouca e falhada de tanto chorar.

Alice não fala nada no começo, apenas olha para mim pelo espelho enquanto espera que eu continue.

— Dez anos, Alice. Ele está jogando dez anos inteiros fora!

— Ele nunca foi o cara ideal para você – ela responde com calma enquanto tenta cobrir minhas olheiras com muito corretivo. – Você não tem dormido muito bem, tem?

— O que você acha? – Levanto uma das sobrancelhas em resposta, recebendo um sorriso gentil de volta.

— Vamos dar um jeito nisso. 

— Você parece mais confiante do que eu – resmungo. 

— Tenho uma boa sensação sobre essa noite. 

Não me atrevo a discordar. Durante todos os anos em que conheço Alice, seu sexto sentido nunca falhou, e eu torcia para que não acontecesse logo essa noite. 

— Por onde a Rosalie anda, afinal? – Resolvo perguntar então. – Ela deveria ter chegado antes de mim. 

— Problema com o carro – Alice responde sem tirar a atenção do meu rosto. – Ela disse que tentou ligar, mas você não atendeu. 

Tiro o celular desligado do bolso e mostro a ela.

— Entendi – ela franze os lábios enquanto prende grampos no meu cabelo. – As coisas estão tão ruins assim? 

Suspiro. Se ela pelo menos pudesse imaginar...

— Noite passada ele chegou com uma marca de batom no colarinho – clássico, Alice murmura. – Quando eu perguntei o que era aquilo, ele respondeu: “como se você se importasse”. Quando nós viramos esse tipo de casal? 

É Alice quem respira fundo dessa vez. Ela larga seus pincéis de maquiagem na mesinha improvisada ao meu lado e gira minha cadeira para que eu fique de frente para ela, segurando minhas mãos entre as suas.

— Querida, nós sempre soubemos que Mike não era homem para você. 

Rosalie entra como um furacão antes que eu tenha chance de responder qualquer coisa. Agradeço silenciosamente por isso, porque não faço ideia se estou pronta para essa conversa. Ela coloca meu vestido com impaciência em cima de uma cadeira e se vira para mim com o rosto muito sério. 

— Certo, você vai estar deslumbrante essa noite e Mike Newton vai se arrepender do dia em que olhou para outra mulher. 

— Ele não vem. – Conto a elas, que me encaram em choque. – Disse que iria tentar, e nós sabemos o que isso significa. 

Rosalie coloca as mãos na cintura, seu rosto adquirindo um tom avermelhado pela raiva. 

— Então vamos fazer com que aquele imbecil se arrependa do dia em que nasceu.

Alice concorda com entusiasmo, batendo palmas. Eu não consigo ficar tão animada quanto ela, então resolvo ficar quieta enquanto deixo ela continuar a fazer o que quer que estivesse fazendo em meu cabelo. 

Tento disfarçar meu mau humor enquanto Rosalie tagarela sobre a diferença de dois sapatos exatamente iguais, mas é difícil fazer isso quando tudo que eu consigo pensar é sobre Mike e o quanto o odeio por, mesmo indiretamente, estar estragando uma noite que era para ser minha. 

Não percebo o que Alice está fazendo comigo até que ela tenha terminado e Rosalie me colocado dentro de um vestido em frente ao espelho. É claro que eu estou linda, com toda aquela maquiagem e um vestido mais caro que um carro popular, mas nada é capaz de disfarçar o borrão vermelho e triste que se tornou meus olhos. 

Você está linda - Alice diz orgulhosa ao meu lado, eu concordo, tentando parecer mais animada do que realmente estou. 

Encaro meu próprio reflexo, desejando que, apenas por uma noite, eu possa parecer tão confiante quanto pareço.

Num ato fútil de vingança, peço que Rosalie me ajude a tirar uma foto o mais sexy possível e posto em todas as minhas redes socais, torcendo para que Mike as veja e se sinta um idiota por ter feito o que fez.

— Está vendo? – Rose diz animada. – Um belo par de saltos faz qualquer mulher se sentir melhor! 

Eu sorrio para o espelho, concordando. 

— Não vou deixar que aquele idiota arruíne uma das noites mais importantes da minha vida. 

 

Me sento em frente a uma pilha de livros. Do meu próprio livro. Um romance ambientado no século VII que eu demorei quase sete anos para escrever. Mike dizia que eu jamais conseguiria terminar, já que me dividia entre a empresa da família e um hobby, como ele gostava de chamar. Essa era apenas uma das milhares de coisas que eu tinha orgulho de dizer que ele estava errado.

Mas o vai e vem de pessoas e as centenas de autógrafos e dedicatórias que escrevo na contracapa acaba ficando repetitivo algumas horas e várias taças de champanhe depois. E não consigo parar de checar o relógio a cada cinco minutos. Mike realmente não vem. 

Agradeço mentalmente quando a fila finalmente chega ao fim, horas depois. Assino o livro no automático, sem nem olhar para cima, minha letra já tremula e ilegível. 

— Quer uma dedicatória? – Pergunto com preguiça. Toda a magia e a empolgação do começo da noite já foram embora nesse ponto. 

— “Somos uma raça em extinção” – encaro o livro confusa, olhando para cima à procura de respostas e me surpreendo quando o vejo ali. Sorridente como sempre, o cabelo despenteado e a barba por fazer, exatamente como me lembrava, recitando a mesma frase que costumávamos falar um para o outro um milhão de anos atrás. 

— Edward! – Minha voz sai mais alta do que o planejado, pois quando olho em volta, Alice e Rosalie estão encarando tudo sem entender nada. – Ai meu Deus! O que você faz aqui? 

— Vim prestigiar uma velha amiga – ele responde casualmente, como se não fizesse quase doze anos desde nosso último encontro. – Feliz em me ver? 

Feliz não é bem a palavra. Confusa, surpresa, talvez alucinando, essas sim caberiam muito mais ao momento.

Eu assino seu livro com a mão trêmula, completamente em choque. Meu ex namorado da faculdade está parado bem ali na minha frente, me olhando exatamente do mesmo jeito que costumava olhar, como se os anos não tivessem passado e eu ainda fosse uma caloura preocupada com o que iria usar na festa dos veteranos. 

— Você não mudou nada – Edward diz com um sorriso bobo. – Está ainda mais bonita do que eu consigo me lembrar. 

Ele está sendo gentil. Edward sempre foi mais gentil do que a maioria dos outros caras da faculdade. 

— Gentileza sua – respondo sem graça enquanto tento ignorar Alice e Rosalie acenando sem parar do outro lado da livraria. Termino de assinar o livro com pressa, e acabo entregando minha caneta junta a ele sem querer. – Foi bom ver você, Edward. 

Não dou tempo para que ele possa responder, praticamente saio correndo da mesa em direção a minhas amigas e imagino se ele está ou não me encarando enquanto fujo como uma doida.

— Quem é aquele? – Alice é a primeira a perguntar, seguida por uma Rosalie meio embriagada.

— Nada demais, apenas um antigo colega da faculdade – minto. – Alguma notícia do Mike? 

— Você não deveria estar pensando no seu futuro ex marido canalha quando tem aquele belo par de olhos verdes e bíceps marcando na camisa encarando você sem piscar – Rosalie responde risonha, ela acena para o que eu espero não ser Edward e dá uma piscadinha canalha.

— Ele está me encarando? – De repente eu me vejo arrumando o cabelo e torcendo para que minha visão de costas seja a melhor possível. 

— Isabella você está corando? – Alice quase grita, e eu realmente espero que ele não tenha conseguido ouvir. 

— Não estou não!  

É uma mentira descarada, porque eu até consigo sentir meu rosto esquentando.

Merda, eu pareço mesmo com uma adolescente.

— Colega da faculdade, até parece – Rose diz com a língua já frouxa do álcool. 

— Eu bem que queria que meus colegas da faculdade se parecessem assim – Alice suspira.- Você devia voltar lá e falar com ele. 

— Acho que é hora de parar de beber – digo tirando a taça de sua mão e recebendo um olhar feio de volta. – É sério, vocês enlouqueceram. 

Rosalie ri e acena mais uma vez para ele. Baixo sua mão a força e fico a segurando como a de uma criança arteira para que ela não faça mais besteiras. 

— Eu sou casada, vocês lembram desse detalhe? – Ergo a mão com a aliança bem em frente aos seus olhos. – Por Deus, vocês estão piores que meus filhos! 

Alice revira os olhos, quase dando pulinhos de impaciência enquanto Rosalie me sacode pelos ombros, o resto do champanhe em sua taça respingando sobre meu vestido inteiro sem que ela nem perceba. 

— Você acabou de descobrir que seu marido está te traindo! Se você ainda for casada pela manhã eu mesma mato você com minhas próprias mãos!

Suspiro. Como se fosse simples assim, como se não tivessem duas crianças inocentes envolvidas, como se não existisse toda uma história que eu não sabia se estava preparada para deixar definitivamente para trás. 

— Ah! Bella, o gostosão da faculdade está chamando você. – Alice acena sorridente para ele enquanto Rosalie me gira a força pelos ombros. 

— Você definitivamente tem que voltar lá e falar com ele – Rosalie diz em meu ouvido. 

— Vocês estão completamente loucas...

— Qual é, Bella – Alice resmunga. – Nós não estamos mandando você ir lá e transar com ele, sabemos que não é tão baixa quanto o Mike. Mas nada impede você de ir lá e ter uma boa conversa com um cara legal – e muito bonito, Rose completa - e que não tira os olhos de você. 

Respiro bem fundo. Talvez, bem lá no fundo mesmo, elas tenham razão. E apenas conversar com meu ex namorado da faculdade não era de jeito nenhum uma coisa errada. 

Afinal, ele tinha ido ali só para me ver. Diferente do meu marido, que tinha feito questão de não aparecer, como sempre.

Ok, apenas uma conversa casual. Atravesso o espaço entre nós com ansiedade, quase hiperventilando. Por que diabos eu estou tão nervosa? Essa é a pergunta do ano. 

— Aí está ela, a mulher do momento! – Edward diz com um sorriso enorme quando paro em sua frente, agarrada a minha taça de champanhe como se minha vida dependesse daquilo. 

— Você está exagerando – respondo sem graça. 

Ele dá de ombros, enfiando as mãos nos bolsos da sua calça cáqui. Doze anos atrás, eu poderia dizer que o conheço o suficiente para dizer que ele está tão nervoso quanto eu. 

— Não acredito que você está aqui – digo com surpresa genuína em minha voz, sem evitar um sorriso. – Sério, não acredito mesmo! 

Edward dá um daqueles sorrisos tímidos sem mostrar os dentes antes de responder um pouco envergonhado: 

— Pois é, eu humm... estava passando e vi sua foto ali na frente e pensei comigo mesmo “essa não pode ser Bella Swan”. Bom, acabou que era você mesmo. 

Deixo escapar um riso nervoso. Então era pura coincidência ele estar ali aquela noite? 

— Eu precisava entrar e ver você, nem que fosse de longe – Edward continua. – Claro que eu não consegui me segurar. 

— Fico feliz que não. – O que eu estou falando?

— E eu fico feliz que você realmente realizou seu sonho – o encaro confusa, ele aponta para o pôster enorme com a capa do meu livro e uma foto minha meio entupida de photoshop bem na porta. – Você sempre disse que um dia se tornaria uma autora publicada. 

— Oh. Eu tinha esquecido que costumava falar sobre isso com você. – Penso automaticamente em Mike, ignorando aquela noite como se não significasse nada para mim, porque não significava nada para ele. Um hobby, uma coisa que ele nem fazia questão de ligar. Me pergunto se um dia ele já se perguntou se eu tinha sonhos. – Como você ainda lembra dessas coisas, afinal? 

Ele encolhe os ombros, arqueando as sobrancelhas exatamente como eu me lembrava que fazia em um passado que agora parecia mais presente que qualquer outra coisa.  

— Tenho boa memória, eu acho. 

Era uma grande mentira. Edward era o tipo de cara que esquecia até mesmo do próprio aniversário.  

— Eu não sabia que você estava morando em Nova York – resolvo mudar de assunto, tudo para não correr o risco de deixar o clima tenso. 

— Eu me mudei faz duas semanas, na verdade – Edward responde alegre. – Estava morando no Alasca, e antes disso estive em Seattle e Chicago. 

Inconstante. Exatamente como eu me lembrava, mesmo depois de todo esse tempo ele não conseguia ficar parado em um só lugar.

— Eu nunca saí daqui. – Por que eu disse isso? Era uma coisa extremamente triste de se dizer para um cara que gostava de viajar pelo mundo.

— Isso não fez diferença, olha quanta coisa você conquistou - Edward diz, dando uma longa olhada pela livraria.

— Bom, isso é porque eu sou herdeira – ele ri, e eu respiro aliviada com a quebra da tensão.

Edward e eu jogamos um pouco mais de conversa fora, ele fala sobre o trabalho voluntário que estava fazendo no Alasca e eu conto sobre meus filhos, mas sem dar muitos detalhes. 

— Espera, nomeou seus filhos como Darcy e Charles? – ele pergunta meio indignado, se segurando para não rir. - Como os personagens daquele livro que você gostava?

— Orgulho e Preconceito – respondo um pouco sem graça, ele mal consegue esconder a vontade de rir da minha cara. – Exatamente. E eles são as crianças mais doces desse mundo. 

— O seu marido não teve opção de veto na hora de escolher os nomes? – Edward pergunta brincando, sem conseguir segurar mais o riso. 

Tento o acompanhar, mas a simples menção a Mike acaba com todo o meu humor. Mike, que provavelmente nunca abriu um livro na vida e nem faz ideia de onde vem o nome dos filhos. Burro e estúpido Mike

— Você está bem? – Edward pergunta preocupado ao notar minha mudança de humor, e eu percebo que estou dando bandeira. – Falei alguma coisa de errado? 

— Não... – Respondo rapidamente, fingindo olhar para o relógio. – Nossa, já está bem tarde. O evento já vai acabar. 

Ele ergue as sobrancelhas, os enormes cílios fazendo sombra nos olhos verdes. 

— Ah, claro. – Diz ele meio cabisbaixo. - Foi bom rever você, Bella. 

Edward se inclina para me abraçar, mas muda de ideia no meio do caminho e apenas ergue a mão, meio sem jeito. Eu a aperto, um gesto formal demais, quase robotizado, mas que ainda assim desperta uma pequena faísca em mim. Até consigo ver Rosalie e Alice caçoando sobre isso. 

Caminho apressada até a saída, sem tirar os olhos do chão. Minha assistente sai correndo com minha bolsa e casaco logo atrás, chamando uma atenção nada bem vinda. 

— Você já está indo embora? – Um dos convidados pergunta, eu não lembro o nome dele.

— O evento já está acabando, querido – respondo com meu melhor sorriso simpático, dando apenas uma olhada para a organizadora atrás dele. Ela entende o recado.

— Uma tempestade está para chegar, nós não queremos que nossos convidados acabem se molhando – ela mente com a agilidade de quem faz aquilo há muito tempo. Faço uma anotação mental para dar um bônus a ela. 

Mal dou dois passos para fora do lugar e já sinto Alice e Rosalie atrás de mim, as duas de risadinhas. Reviro os olhos.

— O que vocês estão tramando? – Pergunto desconfiada. 

— Nada - Alice responde, risonha.

Até parece que eu acredito

— Você já vai? – Ela muda de assunto. 

— Vocês não ouviram a organizadora? O evento acabou. – Alice apenas revira os olhos, se escorando em Rosalie para conseguir ficar de pé. Só Deus sabe o quanto essas duas beberam enquanto tentavam cuidar da minha vida. 

— Ah, olha quem também está indo embora – Rosalie aponta para atrás de mim, acenando. – Ei, Edward! 

Dou um pequeno salto no lugar, sem acreditar que ela está mesmo chamando por ele. 

E acredito menos ainda quando ele vem até nós, segurando um cigarro entre os lábios e parecendo totalmente despreocupado. 

— Rosalie, não é? – Ela confirma, sorrindo como uma líder de torcida. – Bella falou muito sobre você. E você deve ser a Alice, certo? 

Alice cumprimenta ele com o mesmo entusiasmo de uma criança que acabou de ganhar um presente novo e caro. Não consigo conter meu resmungo de descontentamento.  

— Onde está meu motorista, afinal? – Pergunto impaciente. 

— Oh, você tem um motorista – Edward murmura surpreso ao meu lado.

— Ele é o motorista da empresa, na verdade – me apresso em explicar, sem saber exatamente porque preciso fazer isso.

Edward apenas ri, e eu quase consigo ler seus pensamentos. Ela continua uma patricinha mimada. De repente me sinto completamente sem jeito, desesperada para chegar em casa de uma vez, trocar os saltos por uma pantufa e maratonar Modern Family a noite inteira. 

— Talvez ele tenha ficado com medo da chuva e foi embora – Rosalie diz apontando para o clarão de uma trovoada no céu. – Ou vai ver ele achou que você já tinha ido embora.

Demoro cerca de meio segundo para perceber seu envolvimento – e com certeza o de Alice também – no desaparecimento repentino do meu motorista. Desvio o olhar de Rose para Alice, seu rosto está vermelho como um tomate. Ela é péssima inventando histórias. 

— O que vocês fizeram? – Pergunto na hora, sem conter a raiva em minha voz e fazendo Edward me encarar assustado. 

— Quer saber? Eu tenho quase certeza que ele falou alguma coisa sobre um imprevisto familiar, alguma coisa com os filhos, ou com o cachorro – Rosalie continua. É tão boa que quem não a conhecesse compraria totalmente sua história. 

Olho para Edward ao meu lado. Ele é a prova viva de que Rosalie consegue enganar qualquer um, menos eu. 

— Tive uma ideia! Você espera aqui e nós vamos buscar meu carro – ela puxa Alice pela mão, que concorda com uma cara séria e preocupada. – Edward, você faz companhia para ela, por favor? 

Ele concorda sem nem hesitar enquanto eu as encaro de braços cruzados, completamente chocada com seu plano maquiavélico e com a facilidade com que elas conseguem enganar Edward. 

— Desculpa por isso – eu peço assim que elas saem aos tropeços pela chuva e tenho a certeza absoluta de que só vão esperar virar a esquina para chamar o Uber e me deixar ali. – Você pode ir embora se quiser. 

— E deixar você aqui sozinha? Claro que não. – Edward diz de forma protetora. Seria fofo se ele não tivesse acabado de ser enganado pelas protagonistas de No Pique de Nova York 2

— Elas não vão voltar, Edward – não consigo segurar o riso com a surpresa em seu rosto quando termino de falar. 

— Mas por que elas fariam isso? – Ele pergunta confuso e sua ingenuidade é quase bonitinha. 

— Vai saber – dou de ombros, me poupando do clima estranho que ficaria se contasse para ele o verdadeiro motivo. – Então, você quer que eu chame um Uber para você ir para casa? 

Ele nega com um aceno, se encolhendo do frio dentro do próprio casaco quando o vento joga a chuva em nossa direção. 

— Eu vou andando. 

Arqueio uma das sobrancelhas, olhando para a tempestade que está caindo. 

— Sério?

Edward ri, dando de ombros despreocupadamente. 

— Tenho que fazer hora, de qualquer jeito. Estou na casa de um amigo e prometi que ficaria fora até tarde, você entende... 

— Ah... – fico sem palavras, fazendo Edward rir. 

Pego meu celular da bolsa para pedir um carro para mim, dando de cara com três mensagens de Mike e uma da minha mãe.  Abro a de minha mãe primeiro, porque ela nunca fala comigo a não ser que seja caso de vida ou morte. 

 

Renée S. (Mãe): Mike acabou de deixar seus filhos aqui. Pego um avião para Londres em vinte minutos, o que faço com eles? 

 

Com o coração saltando pela boca, corro para ler as mensagens de Mike, desesperada para saber o motivo que o fez largar meus filhos com a pessoa menos indicada no mundo para cuidar, ou sequer conviver, com crianças no mundo. 

 

Mike: Tenho uma reunião em meia hora em Nova Jersey, onde você está? 

 

Mike: Espero que saiba que seu novo hobby está prejudicando toda nossa família. 

 

Mike: Deixei as crianças com a sua mãe. Eles estão com raiva de você por ter os deixado sozinhos. 

 

Encaro a tela do celular indignada, sem saber como reagir. Mike jogando as crianças contra mim era certamente uma coisa que eu não esperava ver. E os deixar com a minha mãe como forma de me castigar

E a forma como ele continuava chamando o sonho da minha vida de “hobby”. 

Como é possível sentir tanta raiva de uma pessoa que um dia você amou? 

Tento me acalmar enquanto ligo para Darcy. Ele atende na terceira chamada, a voz sonolenta quando diz “oi mamãe”. 

— Como você está? – Me apresso em perguntar. – E seu irmão? 

— Nós estamos bem, vovó.... Espera, nós não podemos chamar ela assim. Renée – ele corrige – contratou uma babá e ela nos deixou jogar vídeo games até a hora do jantar.

Tento não resmungar, porque não é culpa deles que sua avó seja uma completa irresponsável. 

— Isso é ótimo, querido – forço minha voz para parecer feliz, mas sem sucesso. 

— Você está bem? – Ele pergunta desconfiado, confirmo com o tom de voz o mais animado que consigo, não quero preocupar meu filho de dez anos com os meus problemas de adulto. 

Digo que o amo antes de desligar, e meu humor vai mais lá pra baixo ainda quando leio a última mensagem de Mike em minha tela de bloqueio.

 

Mike: Precisamos conversar sobre o que você está fazendo com a gente.

 

O que eu estava fazendo? Porque com certeza cuidar da minha própria vida e correr atrás dos meus sonhos era muito pior do que ser ausente e infiel!

De repente sinto vontade de vomitar. 

— Você está bem? – Edward pergunta preocupado, me despertando da minha pequena e sufocante bolha em chamas. Eu quase agradeço a ele. 

— Estou – minto. – Na verdade… você gostaria de ir tomar um drink comigo? 

Ainda que confuso com minha repentina mudança de roteiro, ele aceita o convite, me seguindo pela chuva até um pequeno pub bem na esquina. 

Está quente e agradável lá dentro, cheio de bêbados amigáveis assistindo um show de karaokê e cantando junto, formando o coro mais desafinado que Manhattan já viu. Nós nos sentamos bem no fundo do pub. Edward pede uma cerveja e eu uma taça de vinho rosé e nós ficamos em completo silêncio, encarando um ao outro enquanto ouvimos um estranho estragar o refrão de “Umbrella”. 

— Isso foi bem repentino – Edward comenta de repente.

Levanto uma sobrancelha enquanto beberico um gole de vinho, fingindo não entender sobre o que ele está falando. 

— É que você passou a noite inteira fugindo de mim – ele explica meio sem jeito, esfregando a mão no pescoço num gesto nervoso. – E do nada me chama para beber. Foi repentino. 

— Ah. – É tudo que eu falo, dando um gole muito maior em minha bebida. 

— O que eu estou tentando dizer é que se você está aqui só porque suas amigas estão te pressionando, você não precisa. 

— Oh – deixo escapar, surpresa. Ele deve estar achando que eu desaprendi a falar. Quase.

Mas não sei o que responder. Esse Edward é completamente novo e me deixou surpresa. Não é o tipo de coisa que ele teria feito – ou sequer pensado em fazer – doze anos atrás. 

— Não quero que você fique aqui contra sua vontade – Edward continua. – Sei que te peguei de surpresa. Foi um gesto inesperado até para mim, mas... Eu gostaria muito que você ficasse e aproveitasse uma noite tranquila, mas com uma péssima música, comigo. 

Ele dá um sorriso torto em direção aos cantores amadores na fila para subir no palco. Até o jeito como ele faz isso é quase de perder o fôlego. 

Dou uma balançadinha em minha cabeça, tentando organizar meus pensamentos antes de abrir a boca e responder qualquer coisa. 

— Eu não estou aqui contra minha vontade – finalmente consigo reunir minhas palavras em algo que faça sentido. – Estou aqui porque, por milhões de motivos que você não sabe, eu preciso e mereço de uma noite tranquila e em boa companhia. E a música péssima é só um bônus. 

Ele ri, jogando sua cabeça para trás, os cabelos acobreados balançando em volta do seu rosto. Eu fico quase hipnotizada com a cena, mas tento disfarçar quando ele pega sua caneca de cerveja e estende à minha frente. 

— Um brinde? – Eu sorrio para ele, levantando minha taça em frente a sua caneca. – A uma ótima noite. 

Nós brindamos, e eu quase me perco no sorriso de Edward enquanto faço isso. Algo em mim não consegue evitar o comparar com Mike. Seu sorriso muito mais assimétrico e com dentes perfeitos, seu nariz é tão bem desenhado que chega a irritar, até suas sobrancelhas são mais bonitas que a média. Pobre Mike, com sua beleza mediana e entradas no cabelo

— Você está me encarando – Edward diz apoiando o rosto na mão. – Me lembrou os velhos tempos.

Arrumo minha postura em um pulo, encarando um ponto fixo na mesa de tanta vergonha. 

— Sabe no que eu estava pensando? – Edward então pergunta e eu agradeço mentalmente a mudança de assunto. – Não querendo parecer intrometido, mas o que um cara poderia fazer que é mais importante do que prestigiar sua linda esposa na noite dela? 

Isso me pega de surpresa. Engulo em seco, sem saber o que responder e sem coragem de olhar para Edward. 

— É que me passou pela cabeça que – ele segura o ar por uns segundos antes de continuar – se eu estivesse no lugar dele, eu estaria ali. 

— Seu histórico diz o contrário – rebato automaticamente, sentindo meu corpo tremer na cadeira. – Quer dizer, você me largou sozinha algumas vezes, não sei se você lembra. 

Ele fecha os olhos, distraído com a borda da mesa, um pequeno sorriso brincando em seus lábios. 

— Eu era um idiota. 

— Era? 

Ele abre os olhos, apenas um pouquinho, e me dá uma rápida olhada por baixo dos cílios espessos, seu sorriso se abrindo um pouco mais. 

— Gosto de pensar que mudei depois de todos esses anos. 

— Gosta de pensar, mas não tem certeza? 

Fico esperando uma resposta rápida de Edward, torcendo para que ele continue com nosso pequeno joguinho, porque me parece sincero e ultimamente sinceridade não tem feito parte da minha vida. 

Mas seu rosto fica sério de repente, ele ajeita sua postura, ficando rígido na cadeira.

Bella.... – ele murmura com os olhos presos em suas mãos em cima da mesa. – Eu queria que você soubesse que se eu pudesse voltar no tempo, teria feito tudo muito diferente. Você merecia mais do que eu podia te dar. Você sempre mereceu muito mais do que estava disposta a ganhar. 

Engulo em seco, sem palavras e muito ciente de que meus olhos estão quase saltando do meu rosto com o choque. Suas palavras me atingem muito mais fundo do que eu esperava. Eu não faço ideia do que responder. 

— Estou dizendo isso porque me parece que a cena está se repetindo – ele continua contra minha vontade, eu não sei se consigo aguentar mais. – E você merece muito mais do que isso, Bella. Você merece ser feliz. 

— Foi pra isso que você veio até aqui? – Crio coragem para falar, e acabo parecendo mais dura do que pretendia. – Para me dar uma lição sobre amor próprio? Ok, só não esqueça que você tem parte nisso. 

Edward respira fundo antes de responder e tento não olhar para seus olhos quando ele me encara cheio de melancolia. Essa é uma conversa muito mais pesada do que eu estava planejando ter quando decidi ir a um bar com karaokê.

— Eu sei disso – ele diz então. – Você acreditaria se eu dissesse que voltei? 

Essa informação me pega de surpresa, viro meu rosto para encarar o dele, as sobrancelhas franzidas.

— Do que você está falando? 

Edward suspira, passando a mão pelos cabelos num gesto nervoso. 

— Na noite em que te deixei... – ele começa a falar, nervoso. Não posso dizer que estou muito diferente dele.— Bella, eu voltei. Eu nem cheguei a entrar no aeroporto, porque não conseguia imaginar viver sem você. Mas quando eu cheguei na sua casa era tarde, você já tinha voltado para faculdade e recusava todas as minhas ligações. 

Fico o encarando de boca aberta, sem conseguir emitir reação alguma. Não consigo formar uma frase nem mesmo mentalmente, absolutamente nada faz sentido. 

Ele voltou? Ele não conseguiu imaginar a vida sem mim e voltou? Eu até conseguia ver a cena em minha cabeça: estava chovendo, como hoje. Era final do verão, eu conseguia até mesmo lembrar da textura do seu suéter cinza claro quando nós demos nosso último abraço. 

Não me permito imaginar como seria se eu estivesse ali, se ele realmente tivesse conseguido chegar até mim. Tudo seria tão diferente. Era doloroso demais pensar. 

— Fico imaginando como as coisas seriam se eu tivesse conseguido voltar para você – Edward deixa escapar em voz baixa, mas não permito que ele continue a falar. 

— Não. – Digo tentando manter a voz firme. – Por favor, eu não quero pensar nisso. 

— Você nunca pensou em como teria sido? – Ele pergunta com os olhos fixos nos meus.

Desvio o olhar, encarando um ponto fixo atrás dele. 

— Não posso imaginar como teria sido minha vida com você porque isso excluiria meus filhos – respondo com um suspiro. – E não me importa todos os problemas, eu não abriria mão deles. 

Edward concorda com um aceno de cabeça e não fala mais nada, mas eu sinto que o assunto não está terminado ali. Nós terminamos nossas bebidas em um silêncio desconfortável. Eu me sinto pesada, desesperada para sair correndo. Não de Edward. Mas de toda a conversa que não tivemos doze anos atrás e agora está sendo posta a mesa contra a minha vontade. 

— Sinto muito por isso – Edward pede, finalmente cortando o silêncio.

— Você não precisa sentir muito – respondo com sinceridade, inclinando meu corpo um pouquinho sobre a mesa antes de continuar a falar– Edward, as coisas poderiam ter sido diferentes, mas não foram, é a vida. As coisas poderiam sim estar um pouco melhor agora, mas eu não me arrependo de nada. 

Percebo que nossas mãos estão quase tocando uma na outra sobre a mesa, apenas poucos milímetros nos separando. Com cuidado, estico meu dedo indicador para tocar as costas da sua mão, e um arrepio se espalha por todo o meu corpo quando o faço. 

Edward ergue os olhos para mim, sei que sentiu isso também, está presente no brilho nos seus olhos verdes. 

— Nós devíamos dar um fora daqui – ele troca de assunto, se afastando do meu toque. 

— Está chovendo, não sei se você percebeu - digo.

Edward joga seu corpo para trás para conseguir ver pela única janela limpa do pub, se segurando na borda da mesa para não cair da cadeira. Aquilo, aquele seu jeito, gestos simples que ele mal devia notar, eram como entrar em uma máquina do tempo para mim. 

— É, não está mais chovendo – Edward comemora dando batidinhas na mesa. – Soube que estão encenando Macbeth no Central Park, fica a apenas algumas quadras daqui. O que você acha? 

— Atores amadores estragando um dos meus livros favoritos... – resmungo fazendo Edward revirar os olhos para mim. – Ta. Mas se for muito ruim eu juro que vou embora. 

— Vai ser péssimo – ele diz ao se levantar. – Você vai adorar! 

Não me orgulho de dizer que passo o caminho inteiro reclamando. Ainda está garoando, eu estou com frio em meus tornozelos e os sapatos que Rosalie escolheu não são nada confortáveis. Edward finge não notar, mas não consigo parar de pensar que ele está se arrependendo de estar comigo essa noite. 

Nós chegamos ao Central Park ainda no começo do terceiro ato, dá pra ver que a coisa é amadora porque o cenário é de papelão e o figurino de um tipo de TNT. Além do mais, não há lugar nenhum para sentar. 

Uma festa daremos— um dos personagens fala, eu acho que é o próprio Macbeth mas a caracterização está tão ruim que eu não tenho certeza. – Hoje, nobre senhor

— Nós já podemos ir embora? – Me viro para perguntar para Edward, que já está entretido com a peça e nem presta atenção no que eu digo. 

— Você poderia pelo menos dar uma chance? – Edward pede com um biquinho. Doze anos inteiros e certas coisas continuam exatamente iguais. – Eles estão se esforçando. 

— Mas não estão conseguindo – um cara atrás da gente pede silêncio, eu revirou os olhos, mas baixo o volume da minha voz. – Sério, isso está péssimo. 

Edward ri. Ele coloca as mãos nos meus ombros, parado atrás de mim, o arrepio dessa vez é ainda maior, mesmo por cima do casaco grosso. É como se meu estômago estivesse andando em uma montanha russa com vários loopings. 

— Relaxa – ele sussurra em meu ouvido, minhas pernas falham. – Aproveita o momento. 

Edward desliza suas mãos pelos meus braços, seus polegares deixando um breve carinho por onde passam. Prendo minha respiração, apenas aproveitando o momento. Seu corpo está tão, tão perto do meu.

Emboscada!— Grita um dos personagens, me despertando do meu transe. 

Me afasto do toque de Edward em um pulo, a respiração acelerada pelo susto. Nem sei como olhar para ele depois disso, o que nós faríamos se não tivéssemos sido interrompidos? Eu não podia me deixar levar pelo momento, não podia me rebaixar ao nível de Mike. 

— Vamos embora – digo a ele um pouco alto demais e o mesmo cara de antes pede silêncio mais um vez. 

— Por que? – Edward pergunta confuso. – Ainda está no começo! 

— Ei, vocês querem calar a boca? – O idiota que pediu silêncio grita dessa vez, avançando contra nós no meio da pequena multidão. 

— Ah, cala a boca você! – Grito de volta, deixando todo o estresse e a raiva tomar conta de mim. – No caso de você não ter percebido, isso aqui é um espaço público. Quer silêncio? Pague para ver uma peça de verdade! 

Ele me encara assustado, bufando enquanto algumas pessoas começam a vaiar e tento não me sentir intimidada já que tecnicamente foi eu quem começou isso. Já estou planejando vários tipos de resposta diferentes  antes mesmo dele responder, mas quando ele abre a boca para falar, é com Edward que ele está falando e não comigo.

— Segura sua namorada, irmão – o idiota diz risonho, sinto as mãos de Edward me segurando antes mesmo de eu perceber que estou tentando atacar o cara. – Ela está muito nervosinha.

— Eu vou mostrar para você quem é nervosinha – digo enquanto tento me soltar das mãos de Edward, mas ele está abraçado em mim agora e eu não vejo como escapar disso. – Me solta, Edward! 

— Olha, se eu fosse você pediria desculpas a ela – Edward diz tentando soar tranquilo. – Tenho quase certeza que se eu soltar ela agora, não vai sobrar muito de você para contar história.

O cara ri, eu nem sei o seu nome mas já o odeio com todas as forças do meu corpo. Ele levanta os braços acima da cabeça balançando as mãos no ar, eu sei que ele está me caçoando. 

— Mil desculpas, princesa – consigo soltar um braço do abraço de Edward, o erguendo tão rápido que o cara quase não consegue desviar seu pescoço das minhas unhas. 

Ele sai correndo enquanto me debato contra Edward como um cachorro tentando se soltar do colo do dono, a imagem é patética. Edward só me solta quando os caras já estão longe, provavelmente porque sabe que meu salto é desconfortável demais para que eu saia correndo. 

— Eu vou matar você! – Me viro para ele com raiva, os punhos fechados. 

— Eu estava tentando salvar sua vida! – Edward responde no mesmo tom que eu. 

Sinto a primeira gota grossa de chuva cair do céu, mas a ignoro.

— Eu poderia ter acabado com ele, você sabe disso! 

Edward ri, seu cabelo está começando a ficar achatado na cabeça com o peso da água. 

— Você faria o que? O acertaria com seu salto alto? 

As coisas ficam meio confusas depois disso. A chuva começa a ficar muito forte e as pessoas começam a sair correndo em nossa volta, até mesmo o elenco sai correndo, carregando o cenários de baixo do braço. Mas Edward e eu continuamos ali, encarando um ao outro debaixo de toda aquela chuva. 

— Eu poderia dar conta disso – digo, mas aquelas palavras não são mais sobre o estranho. – Eu poderia dar conta disso, Edward. Sou forte o suficiente para isso. 

Edward assente, sem falar nada. Eu sei que ele entendeu que não estou mais falando sobre a briga.

— Todos acham que eu não sou capaz de aguentar, mas eu sou – continuo a insistir, sentindo as lágrimas se misturarem com a água da chuva. – Mike? Ele sim é um covarde. Ele sim não vai aguentar ficar sem mim! 

Edward me abraça, e diferente de minutos antes, quando estava tentando de tudo para fugir, dessa vez eu me agarro a ele, e de repente parece que seus braços são a única bóia que me impede de afundar. 

— Vai ficar tudo bem. – Edward sussurra contra meu cabelo. – Ele não merece você, ninguém nunca mereceu você, Bella. 

— Isso é uma grande mentira – choramingo contra seus braços. – A maior de todas que você já contou. 

— Não, é a mais pura verdade - insiste Edward. – Você só tem que aprender a aceitar o amor que realmente merece, nunca menos do que isso. 

Desabo em seus braços, chorando como uma criança, sem conseguir parar. Nem mesmo o barulho da chuva é suficiente para disfarçar o barulho que o meu fundo do poço faz. 

Sinto os braços de Edward soltando meu corpo aos poucos, e quase automaticamente sussurro contra seu peito:

Não... 

Ele entende, pois me abraça mais forte. E esse abraço me trás lembranças. 

A tempestade lá fora, a sala de estar iluminada apenas pelas luzes de emergência, as cortinas voando com o vento da rua.... O olhar em seus olhos quando tudo terminou. E então o rosto de Mike vem a minha cabeça, imaginando como seria a cena quando tudo chegasse ao fim, um futuro muito próximo de acontecer.

Me solto do abraço de Edward, sentindo o frio do vento batendo contra meu corpo completamente molhado. Eu encaro seus olhos sem dizer nada, ele tão calado quanto eu. Ficamos assim pelo que parece uma eternidade, até que a chuva começa a acalmar e nossas visões ficam um pouco mais claras. 

— Queria que esse momento durasse para sempre – digo, enfim rompendo o silêncio entre nós. 

Edward aproxima seu corpo do meu novamente, inclinando sua cabeça sobre a minha. Eu sei que ele quer me beijar, assim como sei que também o quero tanto que chega a doer. Mas eu afasto meu rosto do seu, e no lugar de tocar meus lábios, Edward deixa um longo e delicado beijo em minha testa. 

— Me deixe ser feliz enquanto é possível – sussurro, me deixando ser abraçada por ele mais uma vez. 

 

Nós nos despedimos ali no parque mesmo, eu para um lado e Edward para o outro, sem olhar para trás. Caminho todas as nove quadras até minha casa, sentindo minha minha cabeça um pouco menos pesada e barulhenta a cada passo. 

Mike não está em casa quando chego, eu respiro aliviada com a solidão e com o silêncio. Tomo um longo banho, botando todos meus pensamentos em ordem enquanto sinto a água quente do chuveiro cair sobre meu corpo. 

Com calma, arrumo todas as minhas coisas em malas, quatro ao total, tomando cuidado de não deixar nenhuma lembrança minha em nenhum cômodo da casa. Então arrumo as coisas das crianças em outras duas malas, apenas algumas roupas e brinquedos, dando bastante atenção ao escolher seus favoritos. Já está amanhecendo quando termino tudo. Me sento na beira da cama de Charles, de frente para a janela, e observo o nascer do sol pela primeira vez no que eu me lembro ser muito tempo. 

O porteiro não faz perguntas quando peço ajuda para levar todas aquelas malas até o carro, mas sei o que ele está pensando e simplesmente não me importo com isso. Deixo o bilhete para Mike em cima do balcão da cozinha, sentindo um peso enorme sair do meu peito. 

 

Acabou. Você nunca mais vai me magoar. 

        - Bella.

 

Dirijo até a casa da minha mãe ao som de The Killers, cantando junto com a música e quando Darcy e Charles entram no carro, eles me acompanham. 

— Para onde nós vamos? – Charles pergunta curioso. 

Sorrio para ele pelo retrovisor. 

— Estava pensando em passar o fim de semana na praia. O que vocês acham? 

Eles comemoram, é claro, assim como eu. É a primeira vez que me sinto feliz em meses. 

— Ei, mamãe – Darcy pergunta ao meu lado enquanto escolhe as músicas em meu celular. – Quem é Edward? Tem um monte de mensagens dele para você. 

— É um amigo – digo sem conter o sorriso. Ele dá de ombros, escolhendo outra música da playlist.

— Um dia nós vamos conhecer esse amigo? – Charles pergunta de forma inocente lá de trás.  

Sem medo, tento imaginar uma vida com Edward, mas também com meus filhos e ela é calma e tranquila, quase como um sonho. Sorrio mais ao perceber o quanto gosto da ideia. 

— Um dia - respondo então. 

— Espero que não demore muito – ele resmunga puxando o cinto de segurança.

Respondo apenas com um sorriso, encarando a estrada em minha frente, sentindo meu coração cada vez mais e mais leve ao deixar tudo que me assombra para trás. 

Respiro tranquila. Tudo vai dar certo.

 


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