A fada que o escreva escrita por Creeper


Capítulo 9
A exorcista de Solene


Notas iniciais do capítulo

Último dia do ano e aqui vai um capítulo para vocês. Queria agradecer imensamente a todos os comentários (e logo mais estarei respondendo) e a quem vem acompanhando a história até aqui, isso é muito importante para mim, me deixa felizona ♥

Tenham uma boa leitura!
(Revisei esse capítulo um pouco na pressa para conseguir postar hoje, desculpem qualquer coisa XD)



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Nos poucos minutos que se passaram, permaneci vislumbrando o céu estrelado e a grandiosa lua acima de nossas cabeças até que uma voz feminina interrompeu meus devaneios, ecoando diretamente do bolso de Dante.

Pisquei os olhos lentamente, notando que Sybelle não escrevia o que a voz dizia, estava sentada em sua esfera com os joelhos dobrados e sustentando o rosto em uma das mãos em um misto de sono e tédio.

— Sybelle, por que não escreve isso? – enfiei a mão no bolso de Dante e agarrei sua insígnia, acordando-o de seu sono frágil.

A pedra roxa no centro da cruz prateada brilhava conforme a voz repetia:

— Se há algum exorcista próximo de Solene, vá imediatamente ao encontro de Aurora Lince no centro da cidade. Se há algum…

Aquele era outro mecanismo criado pelos magos, o qual permitia que a guilda passasse informações aos seus membros através de suas insígnias. E nem sempre eram boas notícias.

— O que foi? – Dante surpreendeu-se ao ver a luz que emanava da pedra. – O que estão dizendo? – dobrou os cotovelos e ergueu seu torso.

— Que algum exorcista deve encontrar Aurora Lince em Solene. – devolvi-lhe a insígnia e segurei Sybelle na altura dos olhos. – Não me diga que não escreve as vozes de quem não vê pessoalmente.

Sybelle cruzou os braços, empinou o nariz e agitou a cabeça em negação. Deixei meus ombros caírem e soltei um suspiro, não podia desejar que a fada fizesse tudo. A entreguei de volta para Dante, vendo-a mostrar a minúscula língua para mim.

— Vamos. – o exorcista guardou-a no bolso de cima do sobretudo. – Se Aurora está precisando de ajuda, algo sério aconteceu.

Assenti, agarrei minha maleta e seguimos nosso percurso pela floresta. Eu não sabia quem era aquela mulher, mas aquela mensagem juntamente a sensação gritante de estar sendo observado me deixaram absurdamente tenso.

— Dante... – sussurrei amedrontado e segurei a manga do rapaz.

— Eu percebi. – ele sussurrou de volta. – Falta pouco para chegar em Solene. Basta seguir reto e chegará à cidade em três minutos.

— Não me diga q… – cerrei os dentes.

— Vá sozinho. Encontre uma mulher de cabelos rosas e olhos brancos, ela deve estar com uma exploradora. – Dante tocou um de meus ombros e empurrou-me para frente. – Vou cuidar do demônio que está nos vigiando. – balbuciou em meu ouvido.

Recuei um passo e mordi o lábio inferior.

— Ainda tenho bombas de água benta, consigo te ajudar. – não era uma mentira total, eu tinha duas bombas restando. 

— Suichiro, precisa aprender a separar nossos trabalhos. – o exorcista franziu as sobrancelhas.

— Eu posso estar fazendo alguma pesquisa sobre os demônios, sabia? – torci a boca.

Meu coração estava palpitando de um jeito ansioso. Não queria sair de perto de Dante, o que fez minha mão intensificar o aperto em sua manga.

— Suichiro. – ele encarou-me sério.

Eu teria sustentado seu olhar se um barulho não me chamasse a atenção: o barulho das folhas sendo pisadas e de alguns gravetos partindo-se. Virei a cabeça endurecidamente na direção do som, captando a criatura de olhos vermelhos que se apoiava nas árvores e deixava a saliva escorrer por seus dentes pontiagudos. 

— Corre! – Dante gritou e agarrou sua corrente.

Arregalei os olhos e fiz o que ele mandou. Ignorando todo e qualquer galho a minha frente, corri o mais rápido que pude, arfando e sentindo os membros doerem pela queda no barranco. Escutei o rosnado do demônio ao longe e a corrente de Dante cortando o ar.

Uma luz amarelada brilhou entre as árvores e meus pés alcançaram a rua de pedra ao saltar por uma fileira de arbustos e cambalear, mesmo assim, não deixei de correr, continuei meu caminho até encontrar Aurora Lince.

E lá estava ela, parada de braços cruzados e com um semblante perdido ao lado de uma fonte de água responsável pelo único som da praça. Aproximei-me da mulher que trajava um casaco vermelho com detalhes dourados, parando a pouco menos de um metro para apoiar as mãos nos joelhos e recuperar o fôlego.

— Quem está aí? – ela perguntou rispidamente franzindo o cenho.

— Withlock. – ofeguei.

— Você não é exorcista, é? – Aurora cerrou os dentes. Ela não me olhava, na verdade, parecia encarar o nada.

— Não, o meu exorcista… Quero dizer, o seu exorcista, eu acho, bem, a guilda pediu um exorcista… Ah, ele está na floresta. – soltei o ar, um tanto constrangido.

— E do que você estava fugindo? – ela colocou a mão no comprido machado preso em seu cinto. 

Esfreguei um de meus braços e desviei o olhar, apreensivo.

— De um demônio. – uma voz soou atrás de mim.

Dei um sobressalto e virei-me assustado, avistando Dante repleto de suor e com o peito subindo e descendo por causa da respiração descompassada. Ele guardou sua corrente e aproximou-se de Aurora.

— Vulpecula. – ela confirmou.

— Lince. – Dante retribuiu.

— Você foi rápido. – sussurrei perplexo.

— Era um demônio fraco. – ele retirou um graveto preso em seu cabelo.

— Esse Withlock está com você? – Aurora indagou desconfiada.

— Ele é um explorador, você conhece as regras da guilda. – o exorcista cruzou os braços.

— Conheço, mas não foi você quem disse que não aceitaria ser babá de explorador? – ela ajeitou seus volumosos cabelos rosas com um ar de indiferença.

Encolhi os ombros e soltei uma risada sem graça que talvez tenha sido alta demais. Dante ergueu as sobrancelhas, olhou-me de soslaio e pigarreou.

— É uma longa história. E onde está a sua exploradora?

— Eu a perdi. – foi a vez de Aurora cruzar os braços.

— Você o quê?! – eu e Dante gritamos em uníssono. 

Aurora suspirou e estendeu o braço, indicando uma construção cinzenta a alguns metros de nós onde as palavras pintadas em preto na fachada de madeira diziam “Caixões de Redrock”.

— Ela deve estar ali. – revelou.

— Ela morreu?! – gritei boquiaberto.

— Não, idiota, ela está fazendo uma pesquisa sobre fungos zumbis encontrados em caixões. – revirou os olhos. – Estávamos juntas até o entardecer, porém, ela resolveu sair da pousada e coletar dados. 

— E por que você não entrou lá? – Dante avaliou a construção.

— Eu tentei. O dono disse que não a viu e não me deixou entrar. – Aurora rangeu os dentes. – Eu sinto algo muito forte vindo dessa loja, por isso pedi reforços, é trabalho para dois exorcistas.

A expressão de Dante tornou-se fechada e ele caminhou até estar no exato meio entre a fonte e a loja de caixões. O vento uivou e bateu em nossos cabelos, deixando uma sensação estranha em nossos corações.

— Qual a cor da névoa? – Aurora questionou séria.

— Púrpura. – o rapaz respondeu firmemente. – É enorme. 

— Enorme como? – a mulher torceu a boca.

— Digamos que eu sou o ponto onde ela termina. – ele cerrou os punhos.

Aurora fechou os olhos, soltou um suspiro trêmulo e colocou-se ao lado de Dante. Apertei a alça de minha maleta fortemente sem saber o que fazer, a rua estava deserta e não se via um único sinal de vida.

— A sétima maldição está gritando. – Aurora massageou suas têmporas. – Está preparado?

O exorcista concordou e esticou sua corrente.

— Suichiro. – me olhou por cima do ombro.

— Já sei, quer que eu fique aqui. – baixei o olhar, decepcionado.

— Não, quero que resgate a exploradora de Aurora e a leve para a pousada, por favor. 

Levantei as sobrancelhas e pisquei os olhos lentamente, incrédulo. Assim que registrei sua fala, afirmei destemido e coloquei a mão dentro do sobretudo, sabendo exatamente onde estavam as últimas bombas de água benta e o bastão.

Aurora deu um último suspiro, agarrou seu machado, girou-o nas mãos e bateu com seu cabo no chão, emitindo um baque surdo que se espalhou por toda a praça. Ela foi na frente, andando a passos longos e decididos e eu fui atrás de Dante, aproveitando para perguntar baixinho:

— Não vamos entrar escondidos como fizemos em Pomar?

— Quando somos convocados para ajudar outro exorcista, seguimos seus planos. Aurora não é do tipo que faz as coisas escondida, por isso ela tem um machado enorme. 

E foi esse mesmo machado que ela usou para fincar na porta de madeira da loja, abrindo uma grande fresta e espalhando milhares de farpas por sua superfície. Cerrei os dentes e fiquei a postos, esperando pelo momento em que o dono apareceria e começaria a gritar por algum guarda.

Entretanto, não foi o que aconteceu. Em meio a grunhidos de raiva e movimentos precisos, Aurora terminou de abrir um buraco na porta e pular por dentro dele, instigando-nos a repetir sua ação.

Velas singelas iluminavam o lugar tenebroso que guardava uma infinidade de caixões, tanto encostados nas paredes quanto descansando sobre uma bancada, apenas esperando para terminarem de serem construídos. O cheiro de madeira mofada e de algo podre invadiu minhas narinas, obrigando-me a cobri-las. 

Aurora girou em seus calcanhares e Dante rondou o local atento. O silêncio que correu foi pouco, pois logo a exorcista começou a atacar uma fileira de caixões com seu machado de modo impiedoso, jogando pedaços de madeira para todo lado.

Assustei-me por um breve momento, todavia, ao vê-la terminar seu serviço, entendi do que se tratava. Os caixões que ela destruiu escondiam um círculo vermelho na parede idêntico ao que vimos no subsolo do consultório.

— O que tem aí? – ela perguntou ofegante. 

— Algo que encontramos em Pomar. – Dante aproximou-se e tocou a parede. – É um círculo de ritual, mas não faço ideia para qual seja.

Franzi as sobrancelhas e fechei os dedos em volta do bastão. 

— Eu sabia que havia algo de errado com esse lugar. – Aurora cuspiu no chão. 

Uma corrente de ar bateu em minha nuca, arrepiando-me de cima a baixo, contudo, não vinha do buraco na porta e sim de algo atrás de mim: um caixão com a tampa entreaberta. 

Ousei afastar a tampa, arregalando os olhos ao ver que o caixão possuía uma abertura. Uma abertura escura que se estendia em forma de corredor.

— Outra passagem. – balbuciei puxando um de meus colares luminosos e jogando-o dentro do túnel. Algumas aranhas afastaram-se por causa da luz e voltaram para suas teias.

Aurora veio em minha direção feito um raio, empurrou-me e entrou no túnel sem cerimônias, abaixando-se para caber dentro dele.

— Está muito escuro, leve o colar para iluminar. – adverti.

— Com ou sem colar, eu continuarei a não enxergar nada, Whitlock. – sua voz se perdeu ao avançar para o fundo do corredor.

Contraí os lábios de maneira envergonhada. Dante colocou a mão em meu ombro, lançou-me um olhar determinado juntamente a um meneio de cabeça e adentrou a passagem, então olhei uma última vez para a porta quebrada antes de seguir os exorcistas e fechar a tampa do caixão.

Arrastamos os joelhos e cotovelos pelo túnel, voltando a ficar de pé ao chegarmos em uma sala terrivelmente sombria. Puxei todos os meus colares luminosos, enrolei-os na mão e os ergui, rodopiando pelo local para iluminá-lo.

Que erro.

Prendi um grito em minha garganta. Na verdade, Dante quem cobriu minha boca, abafando qualquer berro de pânico. Estávamos em uma sala circular repleta de correntes presas às paredes e uma porta solitária.

As movimentações agitadas e os rosnados revelaram quem estavam acorrentados. Eram cerca de dez demônios, mostrando-nos suas presas amareladas e os olhos sedentos por sangue.

— Aurora! – uma voz feminina chamou.

— Lissa! – Aurora respondeu. – Conseguem achá-la?

Minhas costas estavam grudadas ao peito de Dante, o que me permitiu sentir as batidas inalteradas de seu coração. Ignorando a nossa clara diferença cardíaca, afastei-me e girei pela sala mais uma vez, conseguindo encontrar uma mulher de cabelos loiros e semblante exausto entre as demais criaturas. Para nossa sorte, ela não era um demônio e nem aparentava estar possuída.

— Graças aos céus. – Lissa suspirou aliviada.

Aurora segurou meu antebraço firmemente e ditou: 

— Whitlock, assim que eu partir as correntes de Lissa, corra com ela para longe daqui sem olhar para trás. Eu e Dante cuidaremos do resto.


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Notas finais do capítulo

A situação ficou tensa! Espero que tenham gostado e me contem o que acharam ♥!
Caso tenha ficado alguma dúvida em relação a Aurora, ela é realmente cega, mas não nasceu assim e consegue se localizar bem e reconhecer as pessoas pela voz. Agora o pq dela ter ficado cega é história para outro capítulo...

Aqui eu desejo a vocês um feliz ano novo com muita paz, não soltem fogos e comam bastante. Valeu por tudo e até semana que vem!

Beijos.
—Creeper.