Trevo de Quatro Patas escrita por Maremaid


Capítulo 13
Epílogo


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente!
Agora é oficial: TDQP chegou ao fim :'(

Boa leitura!



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            (Alguns meses depois)

 

—  Você tem certeza que quer fazer isso? — Will perguntou ainda meio incerto.

Nico bufou. 

— Você ficou falando disso por semanas e agora quer dá para trás? 

— Não estou “dando para trás”. É só que… não quero que você pense que estou te pressionando. 

— Você não está, ok? Eu também quero. 

— Certo. — Will deu um sorriso. — Então vamos. 

Os dois saíram do carro e andaram em direção ao local. Era começo do inverno, mas como eles moravam na Califórnia não era assim tão frio. Mesmo assim, Will estava com uma jaqueta corta-vento, um suéter bem grosso por baixo e gorro na cabeça. Seu namorado simplesmente odiava passar frio, então o motivo deles terem saído de casa naquela tarde de sábado fria mostrava o quanto ele queria isso. 

Logo na entrada do parque, havia uma enorme faixa que dizia “Bem-vindos à Feira de Animais Resgatados!”. Uma tenda havia sido instalada na parte central, onde várias pessoas circulavam olhando os cachorros em seus cercados. Havia cães de todos os tipos: grandes e pequenos, peludos e com o pelo curto, de raça e vira-latas. Ver todos esses cachorros fez Nico pensar em Cérbero. 

Bem, não é como se Nico nunca mais tivesse o visto, pelo contrário, ele visitava a casa do pai com muita mais frequência agora só para poder ver o filhote — que já era quase um adulto agora e estava enorme! — e matar a saudade. Will normalmente ia com ele e eles passavam a tarde brincando com o cachorro no quintal.

Quando Hades disse que ia colocar o cachorro em aulas de adestramento, Nico ficou com medo de ele ser treinado para ser um cão de guarda e ficar agressivo, mas felizmente seu pai queria apenas um cão de companhia. Cérbero continuava sendo um cachorro carinhoso e alegre. Ele havia perdido toda aquela energia excessiva de filhote e estava muito mais calmo agora, mas às vezes ainda fazia suas traquinagens, como destruir as flores do jardim de Perséfone. 

— Ei. — Will segurou sua mão, chamando sua atenção. — O que foi?

— Nada — desconversou. 

— Nico. — Will olhou sério para ele. —Você pensou no Cérbero, não é?

Nico sempre se considerou um ótimo ator que sabia mascarar seus sentimentos muito bem. Mas bastava Will dar uma rápida olhada em seu rosto para saber quando ele estava mentindo. 

— Sim… — admitiu. 

— Você sabe que, não importa o cachorro que escolhermos, ele nunca irá substituir o Cérbero, não é? Eu sei como ele é importante para você. Ele também é importante para mim, e não estou falando isso por ele ser o motivo que nos aproximou. Realmente gosto muito daquele meu amiguinho. 

— Eu sei — respondeu. Nico se lembrava de como Will havia ficado chateado em não ter conseguido se despedir de Cérbero e a felicidade de ambos quando se reencontraram.

— E, quem sabe, os dois até podem ser amigos! Não seria legal? — ele sorriu. 

— Sim, seria — sorriu em resposta. — Vamos entrar. 

Assim que eles entraram, o rosto de Will se iluminou. Ele parecia como uma criança em sua loja de brinquedos favorita. 

— Que tal esse? — ele parou, indicando um cachorro enorme que mal cabia no cercadinho.

— Não. Grande demais. — Nico o puxou para eles continuarem andando.  

— E esse? — ele apontou para um cachorrinho caramelo que nem dava para ver os olhos por causa do pelo que cobria quase todo o rosto. — Tão fofo! 

 — Peludo demais. — Seus olhos foram diretamente para a plaquinha de identificação que dizia “Chewie”. — E eu sei que o nome dele tem relação com Star Wars, não tente me enganar. 

Will mordeu o lábio inferior, sabendo que seu truque não havia funcionado e olhou em volta, procurando sua próxima “vítima”.

— Ok, e esse aqui? — ele apontou para um cachorrinho branco de pelo curto que não parava de pular, tentando chamar a atenção de qualquer um que passasse por perto. Se o seu rabo fosse uma mola, ele já estaria longe daquele cercadinho há muito tempo. 

— Elétrico demais. 

Will fez biquinho. 

 — Poxa, namorado! Você é tão difícil de agradar! 

— Ei, não é uma escolha fácil! Não podemos escolher qualquer cachorro que gostarmos. Temos que considerar que moramos em um prédio residencial e o apartamento é pequeno. Eu não quero ouvir reclamações dos outros moradores porque “o cachorro fica latindo sem parar quando está sozinho”, por exemplo.

 — Você tem razão… — Will admitiu, meio a contragosto. 

— É claro que eu tenho. Vamos dar uma volta e olhar os outros cachorros. 

— Oi, rapazes! Vocês precisam de alguma ajuda? — uma garota de cachos ruivos usando um suéter marrom e calça jeans com pinguinhos de tinta se aproximou deles. Ela aparentava ter mais ou menos a idade deles e segurava várias pranchetas. Seu crachá dizia que ela era uma voluntária da ONG e seu nome era Rachel E. Dare. 

— Valeu, mas estamos apenas dando uma olhada. — Nico respondeu. 

Will bateu com o cotovelo nas costelas dele.

— Peço desculpas pelo meu namorado. — Ele forçou um sorriso, meio educado meio constrangido, para a garota. — Sim, precisamos! São tantos cachorros, não conseguimos entrar em um consenso!

 — Eu imagino. — Rachel deu uma risadinha. — Vocês já preencheram o formulário? Não é obrigatório, mas ajudará a descobrir qual é o tipo de cachorros que vocês estão procurando. 

 — Ainda não, mas nós vamos preencher, não é? — ele encarou Nico. Seu olhar claramente dizia: “não ouse discordar de mim, namorado”. 

— Hm, é claro… — resmungou em resposta. Nico vivia rodeado de papéis o dia todo por causa do trabalho que, no seu tempo livre, preferia passar longe de qualquer coisa que o obrigasse a escrever. 

— Ok, aqui — a garota entregou uma prancheta, que continha uma folha com algumas perguntas e uma caneta pendurada, para cada um deles. — A propósito, eu sou a Rachel.  — Apontou para o seu crachá. 

— Oi, Rachel! — ele deu um sorriso simpático em resposta. — Eu sou o Will e esse cara com uma expressão mal-humorada no rosto é o Nico. Ai! — resmungou, quando levou um beliscão no braço.

— É um prazer conhecer vocês, rapazes, e… — ela começou a falar, mas um casal com um filhinho pequeno, que olhavam para um cachorro gorducho, fez sinal para ela. — Desculpa, estão me chamando ali, eu já volto. 

— Claro, sem pressa — Will sorriu e levantou a prancheta. — Vamos preencher com calma aqui. 

 Ela assentiu e se afastou. 

“Estamos apenas dando uma olhada” — Will o imitou, começando a preencher sua folha. — Você falou como se ela fosse uma vendedora e os cachorros fossem a mercadoria de uma loja. 

— E o que deveria ter dito então? Foi isso que nós combinamos: dar uma olhada. — Nico o lembrou. 

— Eu sei, mas você poderia ter sido um pouco mais simpático com a garota. Ela só estava tentando ajudar. 

— Eu não sou uma pessoa simpática e você sabe muito bem disso. 

— Sim, e eu amo esse seu jeitinho ranzinza. — Will apertou sua bochecha rapidamente. 

Nico lançou um olhar mortal para ele e deu uma batidinha na sua mão. 

— Termine logo de preencher isso e vamos continuar olhando os cachorros. Eu não quero ficar aqui a tarde toda. 

— Ok, ok! — Will riu e voltou para a sua folha. 

Assim que eles terminaram, encontraram Rachel e entregaram os formulários totalmente preenchidos. 

— Hm — Rachel analisou as duas folhas em suas mãos. — Certo, vocês preferem um cachorro pequeno, ideal para apartamentos, preferencialmente de pelo curto, e não muito agitado. 

Nico não havia visto o que o namorado havia preenchido no formulário, então se surpreendeu como as respostas deles estavam parecidas. Ele sabia que Will não tinha grandes exigências quando se tratava de cachorros e provavelmente escreveu isso pensando justamente em Nico. 

— Então, vocês moram juntos? — Rachel perguntou. 

— Não. — Nico disse.

— Sim. — Will respondeu junto com ele. 

— Desculpe, é que no formulário vocês botaram o mesmo endereço… — ela sorriu sem graça, checando novamente as folhas que tinham em mãos. 

— Moramos no mesmo prédio e no mesmo andar, mas em apartamentos diferentes — Nico explicou. 

— Mas você sempre está no meu apartamento, é como se morasse lá — Will deu aquele seu sorrisinho irritante que fazia Nico sentir vontade de batê-lo e depois querer beijá-lo.

— Ok, vou mostrar alguns cachorros que se encaixam nos pré-requisitos de vocês — Rachel fez sinal para que eles a seguissem. 

Eles andaram por toda a Feira, olhando diversos cachorros. Mesmo com ajuda, encontrar  “o cachorro ideal" estava sendo uma tarefa complicada. 

— Você botou defeito em todos os cachorros que a gente viu até agora! — Will reclamou após Nico recusar mais um cachorro. — Estou começando a achar que a ideia de adotarmos um animal de estimação representa um grau de compromisso que você ainda não está pronto para assumir.

Nico não estava fazendo de propósito, ele realmente queria ter um cachorro, não tinha culpa que nenhum chamava a sua atenção!

— É claro que eu estou pronto, não é como se você tivesse me arrastado até aqui. — Revirou os olhos. — Apenas acho que precisamos pensar bem antes de escolhermos um.

— Will, Nico está certo. — Rachel interveio ao seu socorro. — Escolher um cachorro não é realmente uma tarefa fácil e precisa ser muito bem planejada. 

— Eu sei… — Will esfregou a nunca, sabendo que estava errado. — Olha, eu vou ao banheiro. Já volto. Continuem olhando sem mim. 

Os dois assentiram enquanto viam ele se afastar. Quando Nico olhou em volta,  percebeu como a Feira estava lotada. Definitivamente havia muito mais pessoas agora do que na hora que eles haviam chegado. Todos os corredores pareciam lotados de casais sorridentes e seus filhos enérgicos em busca de um cachorrinho perfeito para a sua família. 

— Vamos por aqui. — Rachel apontou para um corredor que parecia um pouco mais vazio do que os demais. 

— Ok — ele a seguiu. 

Eles passaram por um cercadinho onde duas garotinhas gêmeas estavam encantadas por um grupo de filhotes pequenos e peludos que mais pareciam ursinhos de pelúcia. Os cachorrinhos davam latidinhos alegres, abanavam os rabinhos, pulavam e corriam pelo pequeno cercado. 

Mesmo sem perceber, Nico parou e ficou olhando para os filhotes. 

— Você gostou deles? — Rachel perguntou em algum ponto atrás dele. 

 — Ah! Eu só estava apenas pensando… — ele deu um passo para trás como se tivesse sido flagrado cometendo um crime. — Eles não são pequenos demais para já estarem sozinhos? Cadê a mãe deles? 

— Ela está se recuperando. Nas últimas semanas, eles tiveram que tomar mamadeira para não morrerem de fome, mas agora já desmamaram e não precisam mais de leite. 

— Se recuperando? O que houve com ela? 

— Como você deve saber, a ONG trabalha apenas com animais resgatados. Esses filhotinhos foram encontrados em uma fazenda que tinha um criador clandestino. A mãe dos filhotes estava desnutrida e mal tinha leite, mas não se preocupe, ela está se recuperando bem. Após ser castrada, irá poder ser adotada também. 

Tão pequenos e já estavam longe da mãe. Pelo jeito, esses cachorrinhos tinham mais em comum com Nico do que ele poderia imaginar.

— Ei, eu perdi alguma coisa? — Will apareceu de repente, olhando para Nico e depois para Rachel e então de volta para o namorado, sem saber ao certo o que estava acontecendo.

  — Ah, eu estava apenas… olhando — ele se justificou. 

Will assentiu, ainda parecendo meio desconfiado. Quando ele enfim olhou para o cercadinho, um sorriso brotou em seus lábios. 

— Eles são tão fofos! — ele abaixou-se e estalou os dedos, chamando a atenção dos filhotes. — Ei! Aqui!

Os filhotes imediatamente vieram na direção de Will e começaram a pular na cerca, animados, com exceção de um único filhote que estava deitado sozinho no canto. Ao contrário de seus irmãos e irmãs que tinham a pelagem castanha com branca, o pequeno solitário era tricolor: preto, branco e com manchas castanhas na parte da cabeça.

Nico chegou perto de onde ele estava e se abaixou. 

— Ei, por que você está sozinho aqui? — ele murmurou para o filhote, colocando a mão no topo da sua cabeça por cima da cerca. — Você deveria estar tentando conquistar um humano, assim como seus irmãos. 

O filhote levantou a cabeça e tentou lambê-lo. 

— Ei, isso faz cócegas! — Nico riu. 

— Acho que ele gostou de você. — Rachel disse. — E parece que o sentimento é mútuo.

— Ora, ora, o que temos aqui… um cachorro finalmente chamou a atenção de Nico di Angelo? — Will estava agora ao seu lado com uma expressão surpresa no rosto.

 — Hm, bem… ele até que é bonitinho — resmungou em sua defesa. 

— Você realmente gostou dele? — seu namorado falou baixinho para que só ele ouvisse. — Podemos levar, se você quiser. 

— Ei, vá com calma! Precisamos entrar em um consenso, lembra?

— Lembro, claro. Você sabe como eu gosto de cachorros, todos aqui são fofos e adoráveis para mim, eu levaria qualquer um deles. Mas o mais importante é que você goste dele também, pois estamos adotando juntos. Então, o que você escolher, estará ótimo para mim. 

— Eu… eu não sei. — Nico respondeu, sentindo o medo se instalar dentro dele. 

E se ele não conseguisse cuidar do filhote? E se o cachorrinho ficasse doente igual aconteceu com Cérbero? E se… 

— Nico — Will segurou seu braço, o fazendo sair dos seus pensamentos. — Consigo ver seu cérebro martelando daqui, o que foi? 

— É que eu estava pensando… é muita responsabilidade. Será que eu… digo, nós, vamos dar conta? 

— Ei, claro que sim. Foi por isso que dei a ideia de adotarmos juntos, assim nós dividimos as responsabilidades. Além disso, se o treinarmos desde cedo, igual fizemos com Cérbero, ele ficará muito comportado. 

— Você quer segurá-lo? — Rachel sugeriu. Will olhou para Nico com expectativa. 

— Pode ser… — ele respondeu baixinho. 

Rachel sorriu e o pegou no cercadinho, o entregando diretamente para Nico. Ele pegou o filhote do mesmo jeito que teria pegado um bebê: totalmente desajeitado e sem saber direito o que fazer. Mas, aos poucos, o cachorrinho se aninhou no seu colo e parecia confortável ali. 

— Sabe, dizem que não somos nós que escolhemos um cachorro, ele quem nos escolhe.  — Rachei disse olhando diretamente para Nico. — E parece que esse pequenino escolheu você.

— Mas nós nem sabemos nada sobre ele! Se é um macho ou uma fêmea, se vai crescer muito, se ele é comportado... Essas coisas! — exclamou, tentando arrumar desculpas. 

— Então vamos descobrir — Will sorriu para o namorado e olhou para Rachel. — A raça dele é Cavalier King Charlie Spaniel, não é? 

— Correto! Mas esses filhotinhos não são totalmente puros. A mãe era mestiça com Cocker Spaniel e mais alguma outra raça desconhecida, tanto que esse pequenino — ela apontou para o filhote no colo de Nico. Sim, era mesmo macho. — foi o único que não puxou a cor dela, ele se parece mais com o pai. 

Assim como Nico que era mais parecido com o pai. 

  — E sobre personalidade, tamanho…? — Will quis saber. 

— Os Cavaliers, assim como próprio nome já diz, são cachorros totalmente cavaleiros e educados. Eles são fofos, fieis e muito apegados aos tutores. Gostam de crianças e são bem enérgicos, mas também gostam de receber atenção e, se deixar, pode ficar horas e horas assim no colo — ela riu e foi então que Nico percebeu que o filhote havia fechado os olhinhos, parecendo dormir ali no seu colo!  — Eles se adaptam muito fácil a qualquer lugar e são ótimos para lugares pequenos como apartamentos já que não crescem muito. Eles são inteligentes, o que facilita muito na hora de adestrar. Também são bem sociáveis e amigáveis com outros cachorros e pessoas.

 — Não parece ser exatamente o que a gente estava procurando? — Will olhou para Nico de forma animada.

— Hm... sim — concordou —, mas ele é um pouco peludo demais. Não daria trabalho para cuidar?

— O pelo dele precisa ser escovado com certa frequência, mas desde que você tenha uma escova própria não vai ser difícil. Além disso, nada impede que no verão vocês tosem um pouco o pelo dele. 

— Perfeito! — Will exclamou, sorridente. 

— Espera. Ainda tem algo me incomodando: ele não é fofo demais? — Nico lançou um olhar para a bolinha de pelo no seu colo.

—  Qual é o problema? — ele riu. — Você é fofo também! — e apertou sua bochecha.

Inferno, seu namorado nunca perdia essa mania de chamá-lo de fofo, até mesmo na frente de outras pessoas!

— Eu quero dizer… — Nico ignorou o rubor no rosto. — Lembra aquela vez que a gente viu um cara enorme com um yorkshire minúsculo e ficamos dando risada porque o cachorrinho era fofo demais para ele? Então, nós seremos os caras altos com um cachorro fofo agora!

— Ei, foi só uma brincadeira. Além disso, você ouviu a Rachel: ele nos escolheu. — Will botou a mão no rosto dele e o encarou bem nos olhos. — Então, o que você acha?

— Ok. — Nico respondeu. Will abriu um sorriso enorme. — Pare de sorrir ou eu mudo de ideia. 

— Desculpa, desculpa, já parei! — ele jogou as mãos para cima, contorcendo os lábios para não sorrir, mas a tarefa parecia muito difícil de tão feliz que ele estava. — Vamos ficar com ele! — ele disse para Rachel.

— Que bom! — Ela sorriu de forma animada. — Vocês precisam apenas preencher outro formulário para que a adoção seja confirmada. Juro que é o último! 

 Enquanto Will preenchia o formulário, Rachel disse: 

— Ah. Como vocês não moram juntos — ela olhou para Nico, já que ele havia deixado isso bem claro antes —, acho melhor vocês escolherem onde ele ficar. Será melhor para a adaptação se ele tiver apenas um lugar para chamar de “lar”.

— Verdade. Ele pode ficar no seu apartamento — Will tirou o olhar da folha por um segundo e encarou o namorado. — Afinal, você fica em casa o dia todo trabalhando. Um pode fazer companhia para o outro, não é?

Nico concordou. Ele olhou para a bolinha de pelo ainda aninhada no seu colo, sem acreditar no que estava acontecendo: ele e Will tinham um cachorrinho agora! 

***

Após terminar de preencher o formulário da adoção e Rachel ter dado algumas informações ligadas às vacinas que o filhote precisaria tomar nos próximos meses, além de outras dúvidas, eles saíram da Feira com o cachorrinho. Passaram em um Pet Shop no caminho e compraram alguns itens que o filhote iria precisar: tigelas, ração, uma cama, coleira e guia. Se dependesse de Will, eles provavelmente teriam comprado a loja inteira, então Nico teve que ficar de olho nele. 

Agora, eles estavam voltando para o prédio no carro de Will e era Nico quem estava dirigindo.

— Ok, precisamos escolher um nome para ele. — Will, sentado no banco do carona com o filhote no colo, disse. — Sugestões?

Nico pensou por alguns segundos enquanto dava seta para entrar em outra rua. 

— Hm, nada. 

— Como foi que o seu pai escolheu o nome do Cérbero? 

— No dia em que meu pai o levou para casa, ele estragou o jardim de Perséfone, arrancando as flores pela raiz. Ela disse:  “Você pode ficar com ele, mas deixe esse maldito cachorro dos infernos bem longe das minhas  flores!”. Então meu pai se lembrou do cachorro da mitologia que guardava a entrada para o mundo inferior e deu esse nome para ele. — Nico explicou. — Bem, pelo menos, foi essa a história que Hazel e Bianca me contaram. 

 — Felizmente, o “nosso” Cérbero tinha apenas uma cabeça e não três. — Will riu. — E se ele era um “cachorro dos infernos”, então esse carinha precisa ser o contrário: um cachorro dos céus.  

— Se o nome ajudá-lo a ser um cão comportado que não estraga as coisas... apoio. — concordou. — Você não gosta tanto de se gabar que conhece as constelações? Então escolha algum nome relacionado com isso. 

— Boa ideia! 

Eles pensaram em nomes de planetas, astro, estrelas, mas nada parecia combinar com o Cavalier. 

— Já sei! — Will disse de repente. — Rigel! 

— O que é isso?! Uma constelação? Nunca ouvi falar. 

— Não! É a estrela mais brilhante da constelação de Órion, e a sétima mais brilhante do céu.

— Ah, claro, eu esqueci que namorava um nerd — Nico ironizou. Em resposta, Will fez língua para ele. — É um nome diferente, mas gostei. 

— Ei, o que você acha, carinha? — Will perguntou para o Cavalier em seu colo, ele levantou a cabeça e olhou atentamente para o humano que o segurava. — Acho que ele gostou!

— Ok, será Rigel. — Nico declarou.  

— Sir. Rigel Kenobi di Angelo Solace! — Will falou  do mesmo jeito que alguém da realeza era anunciado. 

— Espera, espera! Em primeiro lugar, por que ele tem “sir” na frente do nome? Segundo, por que ele tem um segundo nome e por que Kenobi? Esse não é aquele cara lá de Star Wars? — Nico franziu o cenho, ele tinha certeza que já tinha ouvido Will falar esse nome várias vezes antes. — Em terceiro, por que ele tem os nossos sobrenomes? 

Will deu uma risadinha. 

— Certo, respondendo suas perguntas... Um: Cavalier é uma raça ligada com a nobreza e “sir” era um título da época, faz todo o sentido. Dois: ele precisa de um nome do meio! Todo mundo tem! 

— Eu não tenho um nome do meio. — Nico o lembrou. 

— Você é italiano, não conta. — Will deu de ombros e prosseguiu: — Três: porque somos os pais dele, oras!

— Ei, eu não tenho filho cachorro! — exclamou. 

— Agora tem — Will riu. — Somos pais de pet, se acostume com isso. 

Nico revirou os olhos, pois sabia que já havia perdido essa batalha. 

— Ok.  Mas eu continuo não gostando de Kenobi. Escolha outro. 

— Não tem problema! Vamos mudar! Que tal… Skywalker? — Will perguntou, mas Nico franziu o cenho. — Ah, qual é! Combina muito!

— Definitivamente não. — Ele deixou claro. — Já que ele é um cão da “realeza”, deveria ganhar um nome de alguém da família real. Como Charles, Phillip, Harry ou talvez… William? — debochou. 

Will revirou os olhos, coisa que ele dificilmente fazia. 

— Há-há, engraçadinho. — ele riu sem humor. — Que tal “Harrison” em homenagem ao Harrison Ford? Eu gosto do Han Solo e você gosta do Indiana Jones. 

“Isso ainda está ligado com Star Wars”, Nico pensou, mas sabia que seria difícil convencer o namorado a colocar qualquer outro nome que não envolvesse sua franquia de filmes favorita no meio. Ele achou melhor aceitar antes que Will sugerisse Yoda ou qualquer outra coisa  pior. Além disso, ele meio que gostava de Harrison.

— Fechado… — deu um suspiro de derrota.

— Ok! Sir. Rigel Harrison di Angelo Solace. — Will comemorou com um sorriso enorme no rosto, mas logo depois ele sumiu e seu rosto adotou uma expressão pensativa. —  Hm, o nome dele ainda parece meio pequeno para alguém da realeza. 

Nico bufou de frustação. 

— Não, chega! Você só quer dá um jeito de colocar Star Wars no meio! 

Will limitou-se a dar uma risadinha, o que significava que Nico estava certo. 

***

Já era de noite quando Nico estava escovando os dentes e ouviu uma movimentação no corredor. Ele saiu do banheiro para ver o que estava acontecendo, deparando-se com Will carregando a cama de Rigel para o quarto. 

— Ei! — ele tirou a escova da boca para poder falar. — O que você pensa que está fazendo?

Will parou no mesmo instante, como se tivesse sido pego no flagra aprontando. E, bem, ele estava mesmo. 

— Hm, eu ia colocar a cama dele no seu quarto…

— Não — Nico disse de forma firme. — Ele vai dormir na área de serviço. 

— Qual é, Nico! Você dormiria sozinho na primeira noite em um lugar estranho? Ele precisa saber que estamos por perto para se sentir mais confortável e se adaptar melhor. 

— Ah, é? Mas quando você descobriu que eu estava deixando Cérbero dormir no meu quarto, você brigou comigo. 

— É diferente. Eu só estava… preocupado com você. — ele confessou. — Cérbero estava prestes a ir embora, apenas não queria que você ficasse muito apegado a ele e depois sentisse sua falta.

E, mesmo assim, Nico havia se apegado aquele pestinha. 

— Nico — Will parou na frente dele e passou a mão pelo seu braço. — Rigel é nosso cachorro agora, ele não vai embora. Você pode se apegar a ele o quanto quiser, ok? Não quero que você se prive novamente. 

Nico se sentia frustrado com a situação, mas, ao mesmo tempo, entendia totalmente o que seu namorado estava dizendo. 

— Eu sei… — ele murmurou baixinho. — Vou terminar de escovar os dentes. Continue o que você estava fazendo. 

Dito isso, ele deu um passo para trás e se virou, voltando para o banheiro.  Quando ele enfim entrou no seu quarto, Rigel já estava devidamente instalado na sua caminha no canto do cômodo. 

— Ele provavelmente vai fazer xixi durante a noite — avisou. 

— Eu sei, por isso forrei o chão com jornais. — Will, que estava sentado na cama com o seu celular em mãos, respondeu. — Amanhã mesmo vou começar a passear com ele para ele aprender a fazer as suas necessidades na rua. Ah! E ele também precisa ser adestrado o quanto antes. 

Nico soltou um suspiro só de pensar. 

— Não acredito que vou ter que passar por tudo isso novamente! 

— Relaxa, você teve a mim para ajudar da outra vez, e terá desta vez também. — Will deu dois tapinhas no lugar ao seu lado. — Vem, deite-se. 

— O que você está lendo? — perguntou, puxando as cobertas para poder deitar. — É algo da faculdade?

— Não, era uma matéria sobre a raça Cavalier. Preciso saber mais sobre Rigel para que possamos cuidar dele direito. — ele explicou, guardando o celular na mesa de cabeceira ao seu lado. — Eu termino amanhã.

Eles se acomodaram debaixo dos cobertores e Nico apagou o abajur. 

— Está frio hoje.  — Will murmurou, se aconchegando nas costas dele em conchinha. 

— Você sempre usa isso como desculpa para me agarrar durante a noite. — Bufou, fingindo estar bravo, mas não fez menção em tirar as mãos do namorado da sua cintura. 

— Você sabe que eu não gosto de inverno, sou um cara do verão. 

— Sim, sim, você é um cara quente — concordou no automático, só querendo dormir.

— Ah, eu sou?! — ele deu um beijo no pescoço de Nico no escuro, fazendo ele levar um susto e ficar meio excitado ao mesmo tempo. 

Nico agradeceu que suas bochechas queimando não podiam ser vistas no escuro. Meses de namoro e Nico ainda conseguia ficar constrangido perto de Will. Eles dormiam juntos quase todas as noites. Às vezes, no apartamento de Nico, como hoje; às vezes, no de Will. E, bem, às vezes eles nem dormiam… se é que vocês me entendem.

— Estou com sono, vamos dormir — ele mudou de assunto. — Você não está cansado? 

— Para você, eu nunca estou cansado — Will passou as mãos por baixo da camiseta de Nico e mordeu sua orelha. — E aí, você está a fim? 

— Merda, não! — Nico afastou as mãos taradas do namorado e foi um pouco para o lado, ficando de barriga para cima. — Você só pensa nisso, hein? Não acredito que aceitei namorar com um pervertido. 

— Ei, eu só sou um pervertido com você. — Ele deixou claro. — E por que não? 

— Porque Rigel está no quarto com a gente, isso é estranho!

— Acho que estou tendo um déjà vu... — Will reclamou. Afinal, Nico usou Cérbero como desculpa na primeira noite que eles dormiram na mesma cama também.   

— É uma situação diferente e você sabe muito bem disso — bufou. 

— Será que devo apenas simplesmente botar o Rigel na área de serviço então? — ele fez menção em se levantar. 

— Claro que não! — Nico segurou o pulso dele. — Foi você mesmo quem disse que ele deveria ficar aqui conosco para se adaptar, então deixe!  Não quero que ele fique chorando lá na área.

— Então se ele dormir no quarto com a gente todas as noites isso significa que a gente nunca mais vai transar?  — Will choramingou. 

Nico revirou os olhos. Will conseguia ser tão dramático às vezes. 

— Você não acha isso descontável? Conseguiria fazer mesmo sabendo que uma criaturinha inocente está no mesmo cômodo que a gente? — questionou. 

— Qual é o problema? Você acha que os pais deixam de transar depois que tem o primeiro filho? Se isso fosse verdade, todo mundo seria filho único. Você deveria saber disso melhor do que ninguém, pois é o filho do meio. Você provavelmente foi concebido quando Bianca estava por perto e…

— Ah, inferno, para de falar sobre a vida sexual dos meus pais! — ele colocou as mãos nas orelhas, não querendo ouvir mais nem uma palavra sobre o assunto.

— Ok, ok, não vou mais falar! — Will retirou as mãos dele das orelhas e as segurou perto do peito. — Então, que tal a gente fazer durante o dia enquanto ele estiver dormindo?

Nico sentiu um calor rondar seu corpo só de pensar nisso

— William Andrew Solace! 

— Ei! Toda vez que você fala o meu nome completo, sinto que estou levando uma bronca!  

— Bem, porque estou te dando uma bronca! — exclamou.

— Por quê?! — ele perguntou como se não fosse óbvio, deixando Nico irritado. — Só estou arrumando uma solução para o nosso problema!

— Caralho, nós não temos um problema, ok? Falaremos sobre isso amanhã, vamos dormir — explicou e sabendo muito bem que Will iria acrescentar algo, disse: — Só dormir e mais nada. 

Will bufou. 

— Certo, só dormir. Você vai fazer com que eu tenha abstinência sexual desse jeito. 

— Pare de ser exagerado. A gente fez três vezes esta semana! 

— E, por mim, teríamos feito todos os dias da semana, você quem ficou me dando foras. 

Santos Deuses, onde Will arrumava tanta disposição assim? Principalmente agora que ele estava estudando e fazendo estágio no hospital. Esse cara precisava ser estudado! 

— Se você continuar reclamando, vai ser só uma vez na semana que vem. — Ameaçou.

— Nicoooo! — ele reclamou igual uma criança birrenta. — Você está querendo me matar? 

— Fique tranquilo, você não vai morrer por isso. Experiência própria. — Nico disse. Afinal, ele havia passado 24 anos da sua vida sem sexo e tinha sobrevivido. 

— É diferente quando a gente nunca experimentou. Agora você realmente conseguiria ficar um mês sem fazer? Eu duvido. 

Com Will ao seu lado frequentemente o provocando? Ele provavelmente não aguentaria uma semana.

— Hm, vamos dormir — forçou um bocejo e virou-se novamente para o lado. — Boa noite. 

Wil não respondeu de imediato e Nico se controlou para não virar e ver o que ele estava fazendo. Alguns segundos depois, seu namorado se remexeu na cama e se aconchegou novamente nas costas dele. Certo, isso significava que ele não havia ficado bravo, era um alívio. 

— Boa noite — ele respondeu. Depois de alguns segundos em silêncio, o chamou: — Nico…

— Hm? — murmurou, quase caindo no sono. 

— Eu te amo. 

Nico abriu os olhos mesmo estando no escuro. Will já havia dito isso inúmeras vezes a ele nos últimos meses, mas sempre parecia a primeira vez. Ser amado pela pessoa que você também amava era uma sensação maravilhosa que ele achou que nunca sentiria na vida. 

Então se virou na cama, ficando de frente para Will e se aconchegou nos braços do namorado. 

— Eu também te amo — murmurou baixinho, com o rosto enterrado no peito dele. 

Will balançou o corpo levemente, dando uma risadinha, e beijou o topo da cabeça dele. 

— Você fica tão fofo quando está envergonhado. 

Nico beliscou a cintura dele, que soltou um “ai” em resposta. 

— Cala a boca e durma logo, Solace. 

— Ok, ok… — ele riu. — Tenha bons sonhos, Anjo. 

No fim das contas, esse maldito apelido realmente havia pegado. Mesmo Nico dizendo que odiava, seu namorado o chamava assim só para provocá-lo. 

— Você também, Solzinho — respondeu com deboche. Afinal, se Nico tinha um apelido cafona relacionado com o seu sobrenome, Will também tinha que ter!

Nico di Angelo costumava achar que o azar sempre o perseguia, mas ele estava completamente errado. Ele tinha suas irmãs Bianca e Hazel; seu pai — que apesar de todos os problemas, se importava com ele —; sua família na Itália; sua melhor amiga Reyna; Will, seu namorado no qual ele tanto amava; Cérbero e agora também tinha Rigel. 

Nico sempre foi sortudo. E agora ele sabia disso. 


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Notas finais do capítulo

...E acabou!
Espero que vocês tenham gostado de TDQP! Muito obrigada a todos que leram (e que ainda vão ler) essa história!

* Se tudo certo, ano que vem eu volto com novas histórias do universo de PJO/HDO. Tive várias ideias, mas ainda não comecei a escrevê-las, então não posso dizer quais realmente vão sair "do papel" (mas com certeza terá mais Solangelo!). Vou tentar manter vocês informados pelo meu perfil.


Tchau e até algum dia! õ/



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